sexta-feira, 9 de abril de 2021

Opinião do dia / Celso de Mello*


“Hoje, em nosso país, o presidente, que julga ser um monarca absolutista ou um contraditório monarca presidencial, tornou-se, com justa razão, o Sumo Sacerdote que desconhece tanto o valor da vida quanto seu dever ético de celebrá-la incondicionalmente!!! A sua arbitraria recusa e decretar o ‘lockdown’ nacional (como ocorre em países de inegável avanço civilizatório) equivale a um repulsivo e horrendo ‘grito necrófilo’.

*Celso de Mello, ex-ministro do Supremo.

Vera Magalhães - O 'aplauso necrófilo' dos empresários

- O Globo

Já estava com este texto em produção quando tomei conhecimento da duríssima, mas irretocável, mensagem que o ex-decano do STF Celso de Mello enviou a um grupo de amigos no momento em que seu substituto na cadeira, Nunes Marques, presta homenagem ao negacionismo votando pela liberação de cultos e missas quando contamos mais de 345 mil mortos.

Mello cumpria uma quarentena silente desde novembro. Mas, quando falou, deu nome às coisas. “Hoje, em nosso país, o presidente da República (que julga ser um monarca absolutista ou um contraditório ‘monarca presidencial’) tornou-se, com justa razão, o Sumo Sacerdote que desconhece tanto o valor e a primazia da vida quanto o seu dever ético de celebrá-la incondicionalmente!!! A sua arbitrária recusa em decretar o ‘lockdown’ nacional (como ocorreu em países de inegável avanço civilizatório) equivale a um repulsivo e horrendo ‘grito necrófilo’ ”, escreveu.

O “grito necrófilo” de Jair Bolsonaro, explicou no texto, é uma referência ao “grito que teria sido proferido pelo conflito entre Miguel de Unamuno, reitor da Universidade de Salamanca no início da Guerra Civil espanhola, em 1936, e o general Millán Astray, que, seguidor falangista fiel ao autocrata Francisco Franco, “Caudilho de Espanha”, lançou o grito terrível: “¡Viva la muerte; abajo la inteligencia’!”.

Na noite anterior, em São Paulo, dezenas de empresários de vários setores se reuniram com Bolsonaro, ministros e até o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para um convescote com direito a comes, bebes, perdigotos, falta de máscaras, xingamentos ao governador do estado, felicitações e… ovação!

Bernardo Mello Franco - Ministros de estimação

- O Globo

Ao apresentar seu primeiro indicado ao Supremo, Jair Bolsonaro avisou à praça que passaria a contar com um escudeiro de toga. O capitão estava tão animado que chegou a antecipar votos do futuro ministro. “Ele está 100% alinhado comigo”, sentenciou. Cinco meses depois, parece impossível contestar a afirmação.

Desde que foi nomeado, Kassio Nunes Marques se comporta como um ministro de estimação do presidente. Seus votos sempre coincidem com os interesses do governo.

Na Páscoa, Kassio deu mais uma prova de fidelidade. A pedido da Associação Nacional dos Juristas Evangélicos, derrubou os decretos que suspendiam a realização de cultos presenciais na pandemia. A liminar foi festejada pelo Planalto e pelos pastores que apoiam o capitão.

“O mérito não é do ministro, é de Deus”, celebrou Valdemiro Santiago, líder da Igreja Mundial do Poder de Deus. No ano passado, o pastor anunciou por R$ 1 mil sementes de feijão que teriam o poder de curar a Covid-19. O Ministério Público Federal apontou indícios de estelionato e “deboche da boa-fé” dos fiéis.

Malu Gaspar - Fux atuou para que Pacheco instalasse CPI da Covid-19 antes de liminar do STF

- O Globo

Não foi só a base governista  que ficou desconfortável com a decisão do ministro Luís Roberto Barroso de mandar instalar a CPI da Covid-19. Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) também não gostaram de ter tido que tomar a decisão no lugar do presidente do Senado. E fizeram chegar essa informação a Rodrigo Pacheco.

Desde a véspera, os magistrados conversavam entre si e com políticos a respeito da situação. Luiz Fux, presidente do tribunal, deixou claro a senadores que a liminar de Barroso seria inevitável e que preferia que o presidente do Senado instalasse a CPI antes que a decisão fosse tomada. O recado chegou a Pacheco.

Além dos emissários de Fux, o próprio Barroso sinalizou a Pacheco que teria de acolher o mandado de segurança impetrado pelos senadores do Cidadania Alessandro Vieira e Jorge Kajuru pela imediata instalação da CPI. Na esperança de que ele se antecipasse, sugeriu também que havia tempo para o presidente do Senado agir.

Mas Pacheco indicou ao ministro que preferia não se mexer de antemão.

O cálculo por trás dessa atitude era evidente.

Eliane Cantanhêde – Vida e Morte

- O Estado de S. Paulo

Com a explosiva CPI da Covid e um ‘Deus nos acuda’ pelas vacinas, Bolsonaro perde apoios

Além de demitir o ministro da Defesa e os comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, o presidente Jair Bolsonaro trocou mais uma vez o diretor-geral da Polícia Federal, que também é uma força armada, com forte cultura de hierarquia e disciplina. O rastro é de surpresa e de dúvidas: por que e para quê?

São dúvidas pertinentes, depois da tensão criada pelo strike no comando militar e porque a PF foi o pivô da queda do “superministro” Sérgio Moro, que acusou Bolsonaro de ingerência política num órgão que, por definição, precisa de autonomia. É exatamente por causa da PF que o presidente é investigado (pelo menos oficialmente), no Supremo.

Não bastasse, continua sem explicação, e sem mandante, a iniciativa do deputado Major Vitor Hugo, bolsonarista, líder do PSL e frequentador dos palácios presidenciais, de cavar o instrumento da mobilização nacional para tirar dos governadores e dar a Bolsonaro o controle das polícias na pandemia. E com direito de convocação de civis, que vêm sendo sistematicamente mais armados pelo governo – contra, inclusive, a posição do Exército e da PF.

Bruno Boghossian – Maratona negacionista

- Folha de S. Paulo

Grupo dá palanque para propaganda de cloroquina e ataque a medidas restritivas

Em março do ano passado, o empresário Flávio Rocha reclamava das medidas de restrição decretadas nos estados. "A recessão resultante de tirar a economia da tomada vai gerar muito mais mortes", disse. Cinco meses e 115 mil mortos depois, o dono da Riachuelo falava em imunidade de rebanho e dizia que o cenário era de "pós-pandemia".

"Existem dados para todos os gostos. O ser humano é pessimista, presta mais atenção às notícias más do que às boas. Isso porque, pela seleção natural, os otimistas morreram mais rapidamente", filosofou, em entrevista à Folha, em agosto.

Com ou sem pessimismo, o número de mortes no Brasil triplicou desde então. Alguns empresários, no entanto, preferem continuar firmes na maratona negacionista da pandemia. Preocupados com o sucesso dos próprios negócios, eles aproveitam que há um porta-estandarte desse movimento no posto político mais importante do país.

Rocha e alguns colegas estiveram com Jair Bolsonaro na última quarta (7). O presidente encontrou um ambiente amistoso, recebeu alguns aplausos, repetiu sua ladainha sobre o tratamento com remédios ineficazes contra a Covid-19 e fez mais um ataque violento às medidas restritivas. Nem parecia que o país havia chegado a 4 mil óbitos num dia.

Ruy Castro - A quadrilha chamada Brasil

- Folha de S. Paulo

Vistos de fora, somos identificados com o demente que nos governa e seus cúmplices

Parabéns, Jair Bolsonaro, você conseguiu. Pária é pouco. Campeão disparado da Covid, o Brasil é hoje o pior lugar do mundo. Aos olhos internacionais, somos vistos com revolta, repugnância e medo, como nem nos tempos pré-Oswaldo Cruz, em que éramos sinônimos do tifo, da peste bubônica e da febre amarela. Somos agora o último reduto da pandemia, 215 milhões de bombas humanas, potenciais exportadores da morte.

Os vizinhos já nos batem a porta na cara, e isso é só o começo. Em breve, não teremos mais para onde ir, suspeitos de estar levando cepas inéditas, de nossa exclusiva lavra. Por enquanto, essa repulsa do estrangeiro se refere apenas a nós, cidadãos brasileiros, com nossos perdigotos e resistência à máscara. Mas não será surpresa se o medo de contágio incidir sobre nossos produtos, quem sabe infectados, e o mercado também se fechar para eles.

Reinaldo Azevedo – Caem 25 Boeings todos dias, CPI já!

- Folha de S. Paulo

Em 2007, STF determinou por unanimidade instalação de CPI do apagão aéreo, que o governismo tentava evitar

A loucura, a paranoia e a incompetência derrubam 25 Boeings 737 por dia no país. A CPI da Covid-19 no Senado não é só uma imposição constitucional. Passou a ser uma obrigação moral. Agiu com acerto o ministro Luís Roberto Barroso ao determinar a sua instalação. Manda cumprir o que está na Carta.

O requerimento, com 32 assinaturas, foi protocolado por Randolfe Rodrigues (Rede-AP) no dia 4 de fevereiro. Em 11 de março, Alessandro Vieira (SE) e Jorge Kajuru (GO), ambos do Cidadania, recorreram ao STF com um mandado de segurança para que o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), cumprisse as regras do jogo. O relator é Barroso.

Pacheco vinha tentando adiar a comissão. O senador já havia afirmado que achava inevitável a investigação, ponderando, no entanto, que ela poderia ser feita mais à frente. A prioridade, insistia, era combater a doença e conseguir as vacinas. Tinha e tem razão. Mas com CPI. Em nada ela obsta o combate à doença. Quem produz vacinas no país, ainda que com Ingredientes Farmacêuticos Ativos importados, são o Butantan —80%— e a Fiocruz.

Não restava a Barroso caminho alternativo ao que estabelecem a Constituição e a jurisprudência do STF. O pedido cumpre o que dispõe o parágrafo 3º do artigo 58 da Carta, que prevê apenas três requisitos para uma CPI: a assinatura de ao menos um terço da Casa, existência de fato determinado e estabelecimento de um prazo de vigência. Inexiste arbitragem ou ato monocrático do presidente da Câmara ou do Senado a deslanchar o processo.

Luiz Carlos Azedo - Duas derrotas num só dia

- Correio Braziliense

Bolsonaro anunciou um novo remédio para o tratamento da covid-19, a proxalutamida, medicamento utilizado para tratamento de câncer de próstata e de mama

O presidente Jair Bolsonaro sofreu duas derrotas ontem, ambas no Supremo Tribunal Federal (STF). Uma foi a decisão acachapante do plenário da Corte em favor de governadores e prefeitos que determinarem o fechamento temporário de templos religiosos para combater a propagação da pandemia da covid-19, durante os períodos de rígido distanciamento social, cujo resultado foi 9 a 2. A outra, a liminar do ministro do STF Luís Roberto Barroso a favor do mandado de segurança dos senadores Alessandro Vieira (SE) e Jorge Kajuru (GO), do Cidadania, determinando a imediata instalação da CPI da Covid-19 pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que vinha empurrando o assunto com a barriga há 65 dias.

CPIs são uma prerrogativa da oposição, desde que tenham número mínimo de subscrições para instalação, o que é o caso. O que muda com a instalação da CPI é que o presidente Jair Bolsonaro, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga e, principalmente, seu antecessor, o general Eduardo Pazuello, passarão a ter muitas dores de cabeça em razão de tudo o que ocorreu durante a pandemia até agora. Na lógica da oposição, a CPI é a banda de música dos pedidos de impeachment. O negacionismo de Bolsonaro tem um histórico de atitudes e medidas contra a política de isolamento social, mas também contra a compra e produção de vacinas, o uso de máscaras etc. É um prato cheio para a responsabilização criminal pelo elevado número de mortes que vem ocorrendo.

Dora Kramer - Em construção

- Revista Veja

A sociedade brasileira já demonstrou a capacidade de abraçar causas que nos levaram a remover obstáculos aparentemente inamovíveis

O manifesto de seis potenciais candidatos à Presidência da República em defesa da democracia, de maneira geral, foi recebido com alento. Visto como um primeiro passo na busca da derrubada dos muros erguidos pelos dois polos do populismo amestrado comandados por Jair Bolsonaro e Lula da Silva.

Não foram poucos, no entanto, os que consideraram o movimento muito pouco promissor. Fadado ao fracasso, até. Depois da leitura inicial, otimista, vieram as reações, não diria pessimistas, mas um tanto melancólicas e fatalistas. Como se o Brasil fosse obrigado a sucumbir à condição de refém de dois projetos desgovernados: um por capitular ante a corrupção desenfreada, o outro pelo amor obsessivo ao retrocesso.

Esse tipo de sentimento, já vimos, não dá em boa coisa, pois resulta na disseminação da ideia, entre a maioria, de que a saída é se apegar ao salvador que lhe pareça menos ruim. Aceitar esse cenário como retrato fiel da realidade equivale a ignorar a capacidade que a sociedade brasileira já demonstrou de abraçar causas que nos levaram a remover obstáculos aparentemente inamovíveis.

As lutas pela anistia, pela retomada das eleições diretas, pela transição negociada à redemocratização; a Constituinte que rendeu uma Carta à prova de autoritarismos, a derrubada do primeiro presidente eleito diretamente pós-ditadura dentro dos estritos parâmetros legais e até a adesão a um plano de combate à inflação cujo êxito se deveu principalmente à participação da sociedade.

Alon Feuerwerker - Não é o que parece

- Revista Veja

Faça como numa reunião por Zoom: ponha a política no mudo

Apesar de tudo, o universo da política continua achando mais provável Jair Bolsonaro ficar no Planalto pelo menos até 2022. E tem outra. Depois de Luiz Inácio Lula da Silva voltar à elegibilidade, diminuiu naturalmente o número de quem vê o atual presidente na cadeira até 2026. Diminuiu, mas está longe de ter virado fumaça.

O ambiente anda chacoalhado. Esqueça, porém, os discursos: os principais atores só estão de olho mesmo é em 2022. Isso seria apenas o óbvio, não comparecessem dia sim outro também diante do público para dizer que estamos mergulhados numa tragédia (e estamos mesmo) e que isso exige medidas radicais imediatas.

De vez em quando, faça como numa dessas reuniões no Zoom, ou no Teams: ponha a política no mudo. Preste atenção no que os políticos fazem, e não no que dizem. Um exemplo foi o manifesto dos seis pré-presidenciáveis. Na forma, um libelo pela democracia. Na alma, apenas um posicionamento para a eleição. Contra Bolsonaro, Lula e possíveis aliados de cada um dos dois.

Se a prioridade fosse fazer um gesto antibolsonarista, Lula teria sido convidado. Mas suponhamos que as atribulações jurídicas dele constrangeram os autores. Então por que não chamaram o Guilherme Boulos? Ele é pré-candidato. Ou seja, se tirarmos o som, conclui-se que no manifesto a dita fé democrática apenas encobriu mais uma tentativa de alavancagem eleitoral “contra os extremos”.

Murillo de Aragão - O preço das decisões erradas

- Revista Veja

O governo federal foi lento e confuso nas respostas à pandemia

A essa altura dos acontecimentos, devemos ponderar sobre os erros que nos levaram a mais de 340000 mortos pela Covid-19. Sem alarde nem radicalismos. A coleção de erros é enorme. Começa com erros estratégicos, por parte de todos os atores públicos e privados, e chega a erros táticos. Nesse rol se inclui a sociedade, que teima em não se conscientizar dos riscos. O ponto inicial reside no fato de que o mundo inteligente já sabia da gravidade do problema em janeiro de 2020. O mundo político brasileiro, porém, só reconheceu a gravidade do tema em março.

O segundo erro estratégico foi cometido pelo governo federal, ao não coordenar uma ação conjunta com governadores, prefeitos, Judiciário e Legislativo. Prevaleceram o conflito, as egotrips e, sobretudo, a descrença de que o problema era muito sério.

O terceiro erro estratégico foi não optar pela compra das várias vacinas que estavam em desenvolvimento. O governo federal apostou apenas na AstraZeneca, cujo processo de produção é insuficiente para nossos desafios. Fica a questão: por que a Fiocruz, berço do partido sanitarista, não propôs uma compra abrangente de vacinas de várias procedências até que o Brasil dominasse a produção?

Ricardo Noblat - Em um único dia, Bolsonaro é derrotado duas vezes no STF

- Blog do Noblat / Veja

Vem aí a CPI da Covid para acuar o governo

O fracasso do governo do presidente Jair Bolsonaro no combate à Covid-19 subiu à cabeça de Marcelo Queiroga, o quarto ministro da Saúde em menos de um ano.

Anthony Fauci, o mais respeitado imunologista americano e conselheiro do presidente Joe Biden, disse que o Brasil virou uma “ameaça mundial” porque a pandemia aqui só faz crescer.

Em visita a Porto Alegre, perguntado a respeito, Queiroz estufou o peito, imitou a arrogância do seu chefe, e respondeu assim:

– Ele [Fauci] deve cuidar dos Estados Unidos. Do Brasil, cuido eu.

Bolsonaro amou a resposta de Queiroga logo no dia em que o vírus matou no país mais 4.190 pessoas. Foi o segundo dia com mais mortes desde o começo da pandemia.

A quarta-feira havia sido um dia ameno para Bolsonaro. Ele fez o que mais gosta: viajar, falar o que lhe vem à cabeça sem ser contestado, e arrancar aplausos dos seus devotos.

Esteve em Chapecó, em Santa Catarina, em Iguaçu, no Paraná, e em São Paulo onde jantou com empresários amigos escolhidos a dedo e que acabaram por ovacioná-lo.

A quinta-feira foi um dia pesado para Bolsonaro. Não pela morte de tanta gente, mas porque ele colheu duas derrotas importantes no Supremo Tribunal Federal.

Simon Schwartzman* - A doença da cleptocracia

- O Estado de S. Paulo

Ela vai crescendo aos poucos e precisa ser debelada antes que seja tarde demais

Um tema importante, mas pouco estudado nas ciências sociais, é o das causas e efeitos da cleptocracia, termo de origem grega que significa, literalmente, governo de ladrões. Em todos os regimes políticos, democráticos ou autoritários, os governantes e seus apoiadores se beneficiam de seus cargos. Mas o que marca a cleptocracia é a pilhagem sistemática dos recursos públicos em benefício dos governantes e seus familiares, atropelando as instituições ou manipulando-as a seu favor. Os cleptocratas têm muito pouco apoio na sociedade, no entanto, conseguem se manter por longo tempo no poder. Como isso é possível?

Cerca de 20 anos atrás, Daron Acemoglu, economista de origem turca que ficou famoso por combinar a análise econômica com a história e as ciências políticas, tratou de responder a essa pergunta, que é mais atual do que nunca, sobretudo no Brasil (*). Ele tomou como exemplo os casos extremos do Congo, com Joseph Mobutu, e da República Dominicana, com Rafael Trujillo, que governaram por décadas e arruinaram seus países, mas o modelo que desenvolveu é de aplicação muito mais ampla.

O que permite que a cleptocracia se estabeleça e se mantenha, diz Acemoglu, é a debilidade das instituições de um país. “Quando as instituições são fortes”, diz ele, “os cidadãos punem os políticos retirando-os do poder; quando as instituições são fracas, os políticos punem os cidadãos que não os apoiam. Quando as instituições são fortes, os políticos competem pelo apoio e endosso de grupos de interesse; quando as instituições são fracas, os políticos criam e controlam os grupos de interesse. Quando as instituições são fortes, os cidadãos exigem direitos; quando as instituições são fracas, os cidadãos imploram por favores”.

Ignácio de Loyola Brandão - Improvável, mas a carta chegou

- O Estado de S. Paulo

Francine contava da sua vida, de costumes, corrigia meu francês, me indicava livros e filmes

Nos anos 50, meu sonho era ter uma jovem correspondente no exterior. Preferia uma francesa, adorava a língua, conseguia ler e escrever razoavelmente. E as francesas tinham um quê de sensualidade, eu via filmes com Cécile Aubry, Martine Carol, Pascale Petit, Françoise Arnoul, que o escritor Alex Salomon idolatrava. Fanny Marracini, professora de francês, me impressionou na primeira aula no ginasial: “Bonjour mes enfants. Isso quer dizer bom dia. Bom dia serão as duas únicas palavras em português que me ouvirão falar durante o curso”. 

Francês ela falou ao longo de muitos anos e assim estudamos Chateaubriand, Lamartine, Stendhal, Flaubert, Prévert, Balzac, Victor Hugo, Dumas, Cocteau, chegamos a Collette, George Sand, Camus e, quando surgiu Françoise Sagan, célebre aos 18 anos, best-seller, com um romance que assombrou o mundo, Boa Dia, Tristeza, vi que se podia ser uma estrela, escrevendo. Esperem aí, não explica minha carreira, não. Foi dona Fanny quem me conseguiu uma correspondente na França, Francine Defrancq e era de Mulhouse, Alsácia. Levei dois dias para escrever em francês, levei à dona Fanny, que me corrigiu e elogiou. 

Maria Cristina Fernandes - Rejeição empresarial a presidente se mantém ascendente

- Valor Econômico

Propaganda de apoio do PIB nacional com jantar em São Paulo foi tiro que saiu pela culatra

Se o jantar oferecido pelo dono da empresa de segurança Gocil, Washington Cinel, ao presidente da República tinha por objetivo propagandear o apoio desfrutado por Jair Bolsonaro no meio empresarial, o tiro saiu pela culatra. Grupos de WhatsApp de grandes empresários e investidores amanheceram indignados com a percepção vigente sobre o encontro. A avaliação é de que o Palácio do Planalto foi bem sucedido em passar a percepção, que asseguram equivocada, de que Bolsonaro tem apoio na elite econômica do país. A reunião, dizem, limitou-se a um punhado de empresários e banqueiros que responde a um dos critérios ou a ambos: são do núcleo duro raiz do bolsonarismo e estão sempre a assediar o presidente de plantão. A casa que sediou o jantar é um reflexo simbólico desta percepção. Vizinha do ex-deputado Paulo Maluf, nos Jardins, em São Paulo, a casa um dia pertenceu a um dos grandes industriais do país, José Ermírio de Moraes, e hoje é do empresário da segurança privada, ramo que cresceu junto com violência decorrente da falta de rumos do país.

A posição do grande empresariado e da grande finança estaria bem mais refletida, na visão deste interlocutor, em iniciativas como a Coalizão Brasil e a Concertação pela Amazônia, motivadas pelos equívocos da política ambiental brasileira, ou mesmo o apoio ao manifesto dos economistas por saídas para a pandemia. Essas mobilizações reúnem CEOs de grupos como Itaú, Klabin, Gerdau, Amaggi, Natura, Ambev, Gávea e Marfrig. Jantares do gênero são comuns em momentos de descrença sobre o apoio empresarial a um presidente em crise, mas a baixa representatividade do encontro de quarta-feira saltou aos olhos. A política dos “campeões nacionais” e a fartura do BNDES poupou a ex-presidente Dilma Rousseff de quóruns tão pouco representativos, o que não a impediu de cair.

César Felício - Bolsonaro e os ungidos do Senhor

- Valor Econômico

Presidente deve redobrar aposta conservadora

Na Assembleia de Deus - Ministério de Madureira no Parque Jandaia, em Guarulhos, só se admitiu a presença no culto do domingo a quem se apresentou de máscara e com álcool gel. Foi feito um rodízio para cumprir o protocolo de se garantir a lotação de apenas 25% da capacidade do templo. O frequentador é convidado por mensagem de aplicativo a comparecer. Quem vai em um culto, precisa aguardar uma semana para ser chamado de novo. Antes, havia fiéis que batiam ponto no templo todos os dias. A empolgação de cantos de louvor não existe mais, para evitar a emissão de partículas de aerosol.

É muito difícil convencer um religioso praticante que, mesmo com a adoção de todos estes cuidados, não há segurança sanitária para se promover a aglomeração em um evento fechado. Como de fato não há, por mais protocolos que se adotem.

A ilusão de que se pode driblar o vírus com cautelas, profilaxias e precauções, no entanto, é por demais persuasiva. E para os fiéis, há uma estrada aberta para se acolher como verdadeira a narrativa de que não passam de preconceito contra os religiosos os bloqueios à realização de cultos, referendada por governadores, prefeitos, ministros do Supremo Tribunal Federal e pelo consenso do entendimento científico,

Claudia Safatle - Competição entre bancos, fintechs e cooperativas

- Valor Econômico

Discussão sobre assimetria regulatória no setor vai esquentar nos próximos meses

Está em curso nos bancos uma discussão que vai esquentar nos próximos meses em relação à assimetria regulatória a que eles estariam submetidos frente as outras empresas da área financeira que não são bancos. O mote do debate é

“mesmo produto, mesmo serviço, mesma regulação”. Os bancos se queixam sobretudo das grandes fintechs, a exemplo de Stone e XP Investimentos, que cresceram demais e disputam o mercado com vantagens regulatórias, trabalhistas e tributárias. Incomodam, também, as cooperativas de crédito, que já se instalaram na Faria Lima. Esse é um debate que ocorre no mundo todo, salientam fontes do setor.

Há, no Brasil, 168 casas bancárias com 18,9 mil agências, além de milhares de postos de atendimento. Elas empregam diretamente 503 mil pessoas e geram outros quase 900 mil postos de trabalho indiretos. A remuneração média dos bancos é de R$ 7 mil, ou seja, 144% acima da média nacional, de R$ 2,9 mil. No ano passado, diante da pandemia, foi o setor da economia que menos demitiu. E se orgulham de ser um segmento em que a rotatividade da mão de obra é baixa.

José de Souza Martins – Governo Invisível

- Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

O derrotado pelo populismo do governo foi o ministro da Economia e sua política econômica neoliberal obsoleta

O embaralhamento das relações de mando na estrutura de poder do Estado brasileiro, em dias passados, com as quedas de ministros, fez revelações importantes sobre as peculiaridades deste governo e sobre quem governa e quem pensa que governa. Sobretudo, vai ficando evidente que o Estado brasileiro, em decorrência dos oportunismos que colheram os bagaços do poder na insurreição eleitoral de 2018, criaram uma ordem política de poderes multifocais e concorrentes.

A fragilização do Estado, em decorrência da postura anticientífica do presidente e seus adjuntos quanto à pandemia, nos episódios que resultaram em notório descontrole na política de saúde, propiciou o surgimento de outros focos de decisão. É o caso da Câmara, na manifestação do seu presidente, quando alertou o governo de que estava acendendo o sinal amarelo para o risco de remédios políticos penosos e dolorosos. Sugestão para que o Centrão governe, não a família, nem os bajuladores não profissionais.

A crise foi uma crise reveladora das invisibilidades do poder de fato, disperso e contraditório. Uma coalizão de incompetências descomprometidas com uma política de primado dos interesses da nação.

Flávia Oliveira - Precisamos falar de Política Social

- O Globo

Quando prestarem contas sobre as centenas de milhares de vidas que a pandemia da Covid-19 ceifou no país, o governo Jair Bolsonaro e o Congresso Nacional também terão de explicar por que aprovaram e aplicaram um programa tão errático para enfrentar a fome e a pobreza. Fundamental para atenuar a vulnerabilidade decorrente da combinação nefasta de crises sanitária, econômica e social, o auxílio emergencial está longe de ser uma política social de excelência, por ineficiente, mal elaborada, imprevisível. Após o hiato injustificado de um trimestre, retornou neste abril em valor e formato claramente insuficientes para dar alívio às famílias e, como em 2020, ajudar no combate à pandemia e na recuperação da atividade.

Qualquer indivíduo minimamente envolvido no debate sobre políticas públicas sabe que não é eficiente um programa em que um quinto dos recursos teve destino irregular. Foi essa a conclusão do ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União, no “Balanço da fiscalização do auxílio emergencial”, publicado em fevereiro passado. “O Auxílio Emergencial foi tempestivo e alcançou trabalhadores sem renda formal, porém os altos índices de pagamentos indevidos resultaram em desperdício de recursos públicos”, resume o documento de 34 páginas.

Nelson Motta - O amor nos tempos do ódio 2

- O Globo

Depois do primeiro beijo / Será que eu te amo / ou apenas te chamo / de meu amor?

 Em mais uma tentativa

de não falar naquela pessoa,

nem nos horrores da pandemia,

(o que é quase a mesma coisa)

a pedidos, voltemos à poesia.

________

Depois do primeiro beijo

Será que eu te amo

ou apenas te chamo

de meu amor?

será que é amor de verdade

ou pura vontade

de sentir-se amado?

será que te amo mesmo

ou apenas desejo

teu corpo e teus beijos?

será que amo tanto

o teu silêncio,

quanto o teu riso

ou os teus suspiros?

amo mais as tuas coxas,

ou teus peitos, boca, pés,

ou amo mais o teu jeito

de me ouvir e me falar?

amo a emoção forte e funda

das bocas coladas no primeiro beijo

dos corações acelerados,

das mãos alisando suas coxas,

dos dedos apertando a sua bunda.

Será amor ou vício

essa delícia que sinto

desde o início

quando penso em você?

Ruth de Aquino - "Vamos virar essa página. Faz outro filho".

- O Globo

Dói escrever sobre o Mal. Personificado num padrasto e numa mãe, brancos, ricos, bonitos e de olhos verdes. O que faz um monstro como esse Dr. Jairinho espancar até a morte seu enteado de 4 anos, com pouco mais de 1 metro de altura e pesando 20 quilos? Covarde. Cínico. O pai de Henry, Leniel Borel, chorava na emergência do hospital, onde o garoto chegou morto de madrugada, quando ouviu palavras de consolo de Jairinho: “Vida que segue, vamos virar essa página. Faz outro filho”. 

Vereador e médico. Nomeado para o Conselho de Ética da Câmara três dias após a morte do menino. Com histórias anteriores de agressões a mulheres e crianças, agora reveladas. Uma caiu da rede, outra foi afundada na piscina, ele subiu na barriga de mais uma, torceu o braço de outra e tem a que quebrou a perna num passeio. Crianças vomitavam ao ver Jairinho. Mulheres tinham medo de denunciar, por seu poder. A ex-esposa Ana Carolina, que teve dois filhos com Jairinho, chegou a fazer exame de corpo de delito comprovando lesões por chutes, equimoses e hematomas, mas depois retirou a denúncia. Vizinhos relataram gritos semanais de socorro. Eu desejaria prisão perpétua se houvesse.

Música | Maria Bethânia e Chico César - "Antes que amanheça

 

Poesia | A vida - Mario Quintana