quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Não deve haver perdão a multas da Odebrecht

O Globo

Empresa recorreu a Toffoli para deixar de pagar por crimes confessados com fartura de provas

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STFDias Toffoli recebeu no último dia 9 um pedido da Novonor — novo nome da Odebrecht — para suspender os pagamentos à União relativos à multa de R$ 3,8 bilhões imposta pelo acordo de leniência firmado pela empresa na Operação Lava-Jato. A Novonor reivindica tratamento semelhante ao recebido de Toffoli pela holding J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista. Em dezembro, numa decisão provisória que ainda não foi examinada por outros ministros do Supremo, Toffoli suspendeu os pagamentos da multa de R$ 10,3 bilhões que a J&F concordara em pagar no acordo de leniência com o Ministério Público Federal no âmbito de outra operação paralela à Lava-Jato, a Greenfield.

Vera Magalhães - Feliz 2004?

O Globo

Desdém com fórum mundial e ideia de controle político sobre empresa privatizada há décadas mostram Lula preso a ideias do passado

Que políticos têm obsessões particulares, fruto de seu repertório cognitivo e afetivo e de sua história, é óbvio. Mas, que um político tão experimentado, tanto no triunfo quanto na queda, como Lula se mostre tão aferrado a essas cismas num mundo tão complexo quanto o de hoje, é um tanto alarmante.

Desde que assumiu pela primeira vez a Presidência, em 2003, Lula trata com certo desdém o Fórum Econômico Mundial, em Davos. A forma de mostrar que esnobava a meca do capitalismo global foi dar o mesmo peso à ida à cidadezinha da Suíça e a Porto Alegre, onde anualmente se realizava o Fórum Social Mundial. Ok, tinha seu charme e fazia sucesso junto à militância, uma vez que a importância do encontro anual em Davos tinha sido uma das marcas do “neoliberal” Fernando Henrique Cardoso, que veio logo antes e cujo legado era moda derrubar.

Mas o contraponto Davos-Porto Alegre sempre foi um reducionismo não verdadeiro. Para ter maior igualdade social, é preciso mudar estruturas da ordem global, e é em palcos como o suíço que um país bem articulado deve se fazer ouvir e mostrar que tem projetos para isso.

Malu Gaspar - O que diz Rui Costa sobre o retorno da comissão de mortos e desaparecidos políticos

O Globo

Desde março do ano passado, o governo Lula já tem uma minuta de decreto com a reinstalação do grupo

Enquanto o governo Lula coloca em banho-maria a recriação da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, o ministro-chefe da Casa CivilRui Costa, disse à equipe da coluna que não tem particularmente nenhuma resistência à retomada dos trabalhos do grupo.

Desde março do ano passado, o governo Lula já tem pronta uma minuta de decreto com a recriação da comissão, mas até agora não bateu o martelo sobre quando isso ocorrerá.

A questão enfrenta forte resistência nas Forças Armadas, ao ponto de o presidente do Superior Tribunal Militar (STM), Joseli Parente Camelo, declarar ao blog que o retorno do colegiado é “completamente desnecessário” e falar que não se pode “olhar o país pelo retrovisor”.

Questionado pela coluna sobre o impasse, Rui Costa disse que a Casa Civil não tem "nenhum óbice" à reinstalação da comissão.

Elio Gaspari - O Brasil tem uma indústria cega

O Globo

O carro elétrico não é problema, é solução

Ricardo Bastos, presidente da guilda dos carros elétricos, mostrou, numa entrevista ao repórter Eduardo Sodré, que o Brasil pode perder o bonde de um novo salto industrial:

— Você pode escolher se fechar, se esconder e postergar um problema que vai atingi-lo daqui a um par de anos ou um pouco mais. Em 2023, as exportações brasileiras [de veículos] começaram a cair. E não podemos culpar a Argentina, porque existem outros mercados que cresceram, como o mexicano.

Bastos defende os interesses de sua guilda, e os números sugerem que ele deve ser ouvido. A chinesa BYD ultrapassou a Tesla na produção de carros elétricos. Quando Juscelino Kubitschek fez-se fotografar ao volante do primeiro Volkswagen, a China produzia bicicletas. Há dez anos, fabricava carros, mas exportava pouco. É possível que em 2030 o Império do Meio tenha um terço do mercado mundial de veículos.

Zeina Latif - O grande teste de Haddad

O Globo

O quanto será possível a Fazenda esticar a corda é difícil dizer, mas a contenção de gastos se tornará crescentemente necessária

É cansativa a insistência no tema fiscal. Ele acaba tomando um espaço que caberia aos muitos temas de política pública que definem o caminho para o desenvolvimento econômico e social do país.

Como o país insiste em não enfrentar os desafios para conter o crescimento da dívida pública, cuja trajetória destoa do observado na maioria dos países, o tema fiscal está sempre no radar.

As dificuldades da gestão fiscal serão crescentes, o que poderá demandar mudanças de rota na estratégia atual, sob pena de comprometer a credibilidade do time econômico.

Inicialmente, é necessário reconhecer que a vida do time econômico não é fácil. Todos os conflitos distributivos e pressões de segmentos organizados deságuam na Fazenda. O entorno ideológico, do PT, que defende o expansionismo fiscal, aumenta o desafio. Por esse aspecto, há grande mérito na definição de uma regra para o aumento dos gastos.

Roberto Luis Troster* - Obsolescência do paradigma financeiro

Valor Econômico

Dinâmica perversa de acesso ao crédito traz prejuízos ao país e precisa ser revertida

Dever bem é bom. Contribui para que as micro, pequenas e médias empresas invistam, cresçam e empreguem. Dever bem é uma questão mal resolvida no Brasil. Por um lado, o Sistema Financeiro Nacional é tecnologicamente sofisticado e o acesso a serviços e produtos bancários é alto. Por outro, sua serventia no crédito é inadequada, com impactos adversos no bem-estar do país.

O que preocupa é que não se avança. Desde janeiro de 2019 a relação crédito/PIB para pessoas jurídicas está em 20%. Nesse período, observou-se uma adição de 437.277 micro e pequenas empresas negativadas pelo Serasa, totalizando 5.821.694 de negativações - um recorde histórico.

A esse número deve acrescentar-se parte das negativações para pessoa física, que aumentaram em 9.645.760, totalizando 71.822.149 cidadãos com nome “sujo”. Microempreendedores Individuais (MEIs) acessam o crédito por meio da pessoa física, assim como avais pessoais de empresários a empréstimos para suas firmas.

Fernando Exman - Marinha e Secex de olho nas ações dos houthis

Valor Econômico

Para secretária de Comércio Exterior do Mdic, situação exige atenção, mas, neste momento, não é caso de alarme

A cena impressiona. Com uma câmera acoplada à própria cauda, um helicóptero camuflado em tons de deserto se aproxima de um navio e pousa sobre o convés. Seis homens armados com fuzis de assalto desembarcam e, em formação militar, avançam sobre o piso branco. Passo a passo, vão conquistando o barco que, consideram, tem conexões com Israel e, por isso, não poderia trafegar pelo Mar Vermelho.

Um ponto crítico é o Estreito de Bab-el-Mandeb, passagem de 32 quilômetros de largura na comunicação com o Oceano Índico. Em árabe, o nome do acidente geográfico significa “Portão das Lágrimas”, e não por acaso: é uma referência aos perigos para quem tenta por lá trafegar, como correntes marítimas, ventos, conflitos e piratas. Neste caso, contudo, está em curso mais um ataque dos houthis, grupo rebelde do Iêmen apoiado pelo Irã.

Cláudio Carraly* - A Urgente Quebra de Paradigma da Segurança Pública

Nos últimos 30 anos, a segurança pública tem sido uma das principais preocupações dos brasileiros, o aumento da criminalidade, a sensação de insegurança e a violência nas ruas têm afetado a qualidade de vida de milhões de pessoas em todo o país, além disso, para entender a complexidade da segurança pública no Brasil, é essencial adotar para além de uma perspectiva policial, uma abordagem sociológica. A segurança não pode ser vista apenas como uma questão apenas policial, muito menos apenas como punição, mas sim como um fenômeno social que envolve fatores econômicos, políticos e culturais, todo esse amálgama de desigualdade social, exclusão, educação precária e impunidade, são raízes da violência e da criminalidade em nosso país.

Uma das principais questões que precisamos abordar para reinventar a política de segurança pública no Brasil é a busca por identidade, o país é marcado por uma diversidade cultural e étnica única, mas muitas vezes falta uma compreensão profunda de nossas próprias raízes, ao promover uma educação inclusiva e uma valorização da diversidade, poderemos construir uma sociedade mais pacífica e tolerante, a valorização da identidade cultural contribui para uma coesão social mais forte, reduzindo os conflitos de proximidade.

Vinicius Torres Freire – O doido otimismo com a Argentina

Folha de S. Paulo

Nas previsões, recessão seria bem menor que a do Brasil de 2015-16 e PIB subiria em 2025

Argentina passará por um ano ruim de rearranjo econômico em 2024, mas o pior efeito colateral do remédio passa logo. O doente levanta da cama já em 2025.

A julgar pelas previsões econômicas do final de 2023, a economia argentina, ou pelo menos o crescimento do PIB, não sofreria nem metade das dores da desgraça que se abateu sobre o Brasil em 2015-2016, os anos da Grande Recessão.

No ano passado, o PIB argentino deve ter encolhido 1,4%. Nas estimativas de consultorias e outras instituições compiladas pelo Banco Central da Argentina (BCRA), o PIB cairia 2,6% neste 2024. Para os economistas do brasileiro Itaú, 2,5%. Em 2025, haveria crescimento em torno de 2,5%.

Bruno Boghossian - O balé de Bolsonaro e Valdemar

Folha de S. Paulo

Sustentar discurso de que o PT é um inimigo terrível fica mais difícil quando figuras da direita têm relação civilizada com o governo

Jair Bolsonaro é um político que gosta de lavar roupa suja em público. Quando Tarcísio de Freitas apareceu numa fotografia ao lado de Fernando Haddad, o ex-presidente reclamou das "escorregadas" do aliado. Agora, ele afirmou que Valdemar Costa Neto poderia implodir seu partido, o PL, por dizer que Lula tem prestígio e popularidade.

Bolsonaro não vai romper com Tarcísio nem trocar de legenda. O ex-presidente simula crises desse tipo para usá-las como mecanismos de disciplina em seu grupo político.

Wilson Gomes* - A esquerda autoriza o 'ódio do bem', enquanto se queixa do ódio dos maus

Folha de S. Paulo

Como pode reivindicar ser mais democrático quem demostra diariamente a brutalidade do seu autoritarismo

Dentre as sugestões para uma agenda da esquerda em 2024, faço questão de incluir a necessidade de desautorizar o "ódio do bem". Pois é justamente neste quesito que a esquerda e os progressistas perdem a prerrogativa da superioridade moral que tanto reivindicam sobre os seus adversários.

"Ódio do bem" é obviamente uma expressão irônica para designar o ódio quando a sua fonte são pessoas que reivindicam uma posição moral superior. O ódio, em seu sentido político, é fundamentalmente o sentimento intenso de aversão ou hostilidade em relação a um grupo, ideologia ou pessoa.

Embora não seja possível controlar sentimentos, é crucial intervir, no caso do ódio, quando esse sentimento aflora em atitudes ou comportamentos, tanto individuais quanto coletivos. Isso inclui a expressão pública de aversão e desprezo por determinados alvos, assim como interações sociais que oprimem e degradam os outros. Por isso se fala em "crimes de ódio" e "discursos de ódio", no âmbito propriamente jurídico, e em promoção e disseminação de ódio, em âmbito político.

Hélio Schwartsman - Arroubos retóricos

Folha de S. Paulo

Sem revolução no horizonte, esquerda desloca radicalidade para palavras de ordem

Já torci publicamente pela morte de um ex-presidente, mas nunca o chamei de genocida. É preciosismo, admito, mas procuro sempre utilizar termos politicamente carregados da forma mais precisa possível.

A gestão da pandemia sob Bolsonaro foi desastrosa, causando um excesso de mortes na casa das dezenas de milhares. Penso que o ex-mandatário deveria ser responsabilizado por isso. Acho difícil, contudo, provar que ele tivesse a intenção de destruir, no todo ou em parte, o grupo nacional dos brasileiros, que é o que justificaria a imputação de genocídio. Melhor chamá-lo de homicida serial por negligência.

Tostão - Grandes equipes da história têm a capacidade de simplificar o jogo

Folha de S. Paulo

No Manchester City, a bola sai do goleiro, de pé em pé, geralmente com um ou dois toques, sem complicação

Quando comecei a estudar psicanálise, imaginava que jamais entenderia as ideias de Freud, que elas seriam assunto para intelectuais, psicólogos e filósofos. Logo percebi que seus textos eram tão claros, precisos, convincentes e simples que até os mistérios da alma tinham lógica. Era a vida retratada nos seus livros. Freud colocou ordem no caos.

Quando atuei ao lado de Pelé, vi que, além de sua técnica exuberante, inigualável, uma das suas principais qualidades era tornar simples o que era complexo. Com poucos gestos, ações, tudo se iluminava à sua frente.

As grandes equipes da história, como o atual Manchester City, possuem, além de grandes jogadores e ótimos conjuntos, a capacidade de simplificar. A bola sai do goleiro, de pé em pé, geralmente com um ou dois toques. Não complicam. Quando o time se aproxima da área adversária, surgem os dribles e as jogadas de gol. Quando não dá para completar os lances, a bola volta, com frequência para o centromédio (volante) Rodri, que reinicia a jogada. Tudo simples.

Martin Wolf* - O que realmente sabemos sobre a economia global

Folha de S. Paulo

Da demografia à tecnologia, devemos prestar atenção nas forças que certamente moldarão nosso futuro

O que vai acontecer com a economia mundial? Nunca saberemos a resposta para essa pergunta.

Década após década, algo grande e em grande parte inesperado ocorreu —a grande inflação e os choques do petróleo na década de 1970, a desinflação no início da década de 1980, a queda da União Soviética e o surgimento da China na década de 1990, as crises financeiras nas economias de alta renda na década de 2000 e a pandemia, inflação pós-pandemia e guerras na Ucrânia e no Oriente Médio nesta década de 2020.

Vivemos em um mundo de riscos concebíveis e obviamente importantes. Alguns —guerra entre grandes potências nucleares— poderiam ser devastadores. A dificuldade é que eventos de baixa probabilidade e alto impacto são quase impossíveis de prever.

No entanto, também sabemos de algumas características importantes de nossa economia global que não são incertas. Também devemos considerá-las. Aqui estão cinco delas.

A primeira é a demografia. As pessoas que serão adultas daqui a duas décadas já nasceram. As pessoas que terão mais de 60 anos daqui a quatro décadas já são adultas.

Paul Krugman* - O pleno emprego é bom para a sociedade

Folha de S. Paulo

Desigualdade e disparidades raciais estão finalmente diminuindo nos Estados Unidos

No dia em que Martin Luther King foi baleado, em 1968, ele estava em Memphis para demonstrar apoio aos trabalhadores de saneamento em greve. Naquela época, ele já havia percebido que lutar pela igualdade econômica era uma parte crucial da luta pelos direitos civis.

Infelizmente, houve pouco progresso nesse sentido nos cinquenta anos seguintes. Por muitas medidas, a divisão econômica entre afro-americanos e brancos era tão grande no final da década de 2010 quanto era no final da década de 1960.

A boa notícia: nos últimos anos, vimos uma queda significativa na desigualdade em várias dimensões, incluindo uma redução na diferença entre afro-americanos e brancos.

A persistência da disparidade econômica racial durou tanto tempo porque o movimento pelos direitos civis não conseguiu fazer nenhum progresso contra o racismo e a discriminação? Não.

A discriminação racial explícita se tornou relativamente rara —em parte por causa do Ato dos Direitos Civis de 1964— e a discriminação implícita provavelmente diminuiu, porque somos uma sociedade menos racista do que éramos.

Poesia | Tecendo a manhã - João Cabral de Melo Neto

 

Música | Edu Lobo, Mônica Salmaso, Vanessa Moreno, Zé Renato e A.Montarroyos em Ponteio de E. Lobo e Capinan