terça-feira, 18 de outubro de 2022

Hélio Schwartsman - Canoa furada

Folha de S. Paulo

Episódio do canibalismo e 'pintou um clima' eram falas reais do candidato

Sei que, nos tempos conturbados em que vivemos, o STF e o TSE se tornaram indispensáveis polos de resistência às investidas autoritárias de Jair Bolsonaro e sua turma. Nessa missão, os togados têm todo meu apoio. Mas gosto de imaginar que vivemos num ambiente adulto e racional, no qual críticas ponderadas são vistas como uma contribuição, não um ataque a pessoas ou a instituições.

Feito esse esclarecimento, penso que o TSE está cometendo erros em série nas decisões sobre o que constitui propaganda abusiva. A corte chegou ao ridículo de, na prática, censurar declarações de Bolsonaro para protegê-lo de si mesmo. Tanto no episódio do canibalismo como no do "pintou um clima" o que foi ao ar eram falas reais do candidato, sem adulteração ou cortes enviesados. Não acho que apetites antropofágicos e desejos pedófilos sejam as melhores interpretações para entender os dois casos, mas o ponto é que não cabe à corte tutelar interpretações. Poderia, no máximo, proscrever a falsificação de fatos incontestes e, mesmo aí, é preciso moderação, pois é difícil encontrar discursos de candidatos que não venham repletos de erros factuais. Se Bolsonaro deu declarações infelizes, é muito razoável que arque com as consequências.

Cristina Serra - Bolsonaro e os ladrões de Brasil

Folha de S. Paulo

Atual governo é uma rede de predadores da infância e de mulheres

Ao dar exemplos de profissões para os jovens, no debate da Band, Bolsonaro mencionou marceneiro e auxiliar de enfermagem, ofícios dignos e honrosos, sem dúvida. Mas o que Bolsonaro expressou foi a visão excludente (a mesma de Guedes e de Milton Ribeiro), de que a universidade não cabe nos sonhos da juventude das periferias.

A aversão aos pobres também ficou explícita quando o tema foi a visita de Lula a uma comunidade, no Rio de Janeiro. Bolsonaro disse que só tinha "traficante" em volta do ex-presidente. Para o candidato que tem conexões com milicianos (um deles, seu vizinho até ser preso), quem mora em favela é bandido.

Alvaro Costa e Silva - Compra de votos

Folha de S. Paulo

Agentes do governo e pessoas ligadas à candidatura de Bolsonaro sentem-se autorizados a burlar a lei

Além de acirrar o medo e a violência física, as eleições de 2022 estão estabelecendo um novo marco de crimes. Não há santos na hora de garantir ou virar um voto, os dois lados cometem exageros e irregularidades, mas os agentes do governo e as pessoas ligadas à candidatura da reeleição se sentem mais à vontade ou mesmo autorizados a burlar a lei.

Há episódios pitorescos, como o da tia que em Minas Gerais escondeu o título do sobrinho de 17 anos e se justificou: "Ele é abestalhado. Ganhou R$ 10 para votar no Bolsonaro". Outros resultam em tragédia: em Goiás, uma mulher foi esmagada e acabou morrendo ao participar da promoção "Picanha do Mito", que previa a venda por R$ 22 de uma peça de picanha que custa R$ 130 a quem estivesse com a camisa da seleção brasileira. Ao fiscalizar o frigorífico, depois do tumulto, o Procon encontrou 50 quilos de carne estragada.

Joel Pinheiro da Fonseca - Existe fake news do bem?

Folha de S. Paulo

Notícias falsas empobrecem o debate e tolhem a liberdade de expressão

O nível de campanha eleitoral sempre foi baixo. Mas em 2018 Bolsonaro varreu o panorama eleitoral numa campanha que bateu todos os recordes de mentiras, calúnias e fake news. Agora, em 2022, está fazendo de novo. A diferença é que a oposição hoje sabe um pouco melhor como reagir. E alguns petistas estão, inclusive, fazendo igual.

O principal exemplo é o deputado André Janones. Veicula e promove fake news contra Bolsonaro de todas as maneiras possíveis. Vídeos sensacionalistas, acusações infundadas, tom apocalíptico. Está agora criando um exército de voluntários para aumentar ainda mais o alcance desse material. Até ontem a ordem do dia era acusar Bolsonaro de pedofilia. O TSE proibiu essa, mas tenho certeza que amanhã aparecerá uma nova.

Andrea Jubê - Pintou um clima de ‘flashback’ nas urnas

Valor Econômico

Em 2014, Dilma venceu em Minas, com o PT no governo

À medida que se aproxima o segundo turno, surgem semelhanças entre a reta final desta eleição presidencial e o pleito de 2014.

A disputa que opôs a presidente Dilma Rousseff (PT), em busca da reeleição, e o senador Aécio Neves (PSDB), foi uma das mais acirradas pós-redemocratização. Os candidatos chegaram às vésperas do segundo turno tecnicamente empatados. Num momento em que o presidente Jair Bolsonaro (PL) comemora a reação da economia e a melhora na avaliação do governo, com expectativa de conversão desse sentimento em mais votos, não é temerário afirmar que ele e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) podem chegar no dia 30 num cenário de empate técnico, tal qual Dilma e Aécio.

Alguns institutos de pesquisa já indicam essa conjuntura, a se considerar a margem de erro. O levantamento do Ipec divulgado ontem confirmou a tendência de crescimento de Bolsonaro, que oscilou de 42% para 43% das intenções de voto em uma semana, enquanto Lula caiu um ponto percentual. A dúvida é se haverá tempo hábil para Bolsonaro superar o petista, que ainda lidera a corrida sucessória.

Maria Clara R. M. do Prado* - O risco de autocracia está à espreita

Valor Econômico

É sob o regime democrático que se pode alcançar desenvolvimento sob a ótica social e econômica

Há muito tempo, talvez desde a campanha das “Diretas Já”, a palavra democracia não foi tão falada, escrita, lembrada e exaltada no país com sinais de alerta e doses de preocupação. A defesa do regime democrático tem crescido desde o início desta temporada eleitoral a ponto de ganhar recentemente demonstrações de apoio concreto ao candidato Luiz Inácio Lula da Silva por pessoas influentes, intelectuais e representantes de segmentos da sociedade civil, que até então sequer imaginavam a possibilidade de votar no PT.

A percepção de que há muito mais em jogo do que uma simples disputa eleitoral falou mais alto para aqueles apoiadores de última instância, acentuando a polarização não entre um partido de esquerda e outro de direita, mas entre o bem e o mal. Desde o início, parecia claro que a chamada terceira via teria poucas chances de emplacar e o que se vê nesta reta final é um esforço descomunal de muitos formadores de opinião no sentido de evitar a reeleição de Bolsonaro, encarnado na figura do mal que ele mesmo construiu ao longo do governo.

O presidente nunca deixou de dar indicações claras de descaso relacionadas à educação, saúde, segurança, cultura e meio ambiente, mas foram as suas declarações sobre o processo eleitoral, a configuração da Suprema Corte de justiça e os meios de comunicação que chamaram a atenção para os riscos de o país caminhar para uma autocracia.

Luiz Carlos Azedo - Talvez a pergunta seja, quem perdeu com o debate?

Correio Braziliense

O debate não é programático, para o futuro imediato ou o programa do novo governo

Sempre achei muito complicado analisar o resultado de debates entre candidatos a partir da minha própria percepção. O debate da Bandeirantes, entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL) não foge à regra. É possível fazer uma leitura racional dos debates a partir do conteúdo das respostas dos candidatos, mas existe fatores subjetivos que alteram completamente a percepção da imagem dos debatedores pelos eleitores. Tanto é assim que as pesquisas mostram uma divisão de opiniões sobre a atuação dos candidatos que mais ou menos gravita em torno dos índices de intenção de voto. Quando o resultado destoa muito, aí sim podemos afirmar que fulano ou beltrano venceu o debate. Mas não é o caso. Por isso, alguns acham que Lula se saiu bem, outros apontam Bolsonaro como vitorioso.

Como numa luta de boxe, num debate eleitoral todo mundo apanha. Alguém somente vence inequivocamente quando o adversário vai a nocaute. Quando isso não acontece, a decisão é por pontos, depende dos jurados, e nem sempre corresponde ao gosto do público.

Eliane Cantanhêde – Erros de lá, erros de cá

Estado de S. Paulo

Bolsonaro colecionou erros na semana passada, mas Lula não soube capitalizar o debate a seu favor

Se a semana passada foi péssima para o presidente Jair Bolsonaro, esta começou mal para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e essa montanha-russa das eleições acirra os ânimos na reta final até o dia 30, com expectativa de mais fake news e jogo sujo. Muita calma nessa hora, minha gente.

Especialista em dar tiro no pé e no peito, Bolsonaro fez feio no Círio (não Sírio…) de Nazaré, fez pior ainda em Aparecida e ele e seus seguidores não param de açoitar a Igreja Católica e pressionar fiéis evangélicos. E a agenda foi incompreensível. Comício no Recife um dia antes de Lula, que teve 66% de votos em Pernambuco? E a ida a Fortaleza, se Lula teve o mesmo índice no Ceará?

Para fechar a semana, depois da “revelação” grotesca até de estupros de bebês em Tapajós (PA), feita pela senadora eleita Damares Alves, ex-ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos (?), veio mais um de tantos vídeos aterrorizantes de Bolsonaro. Neste, o presidente fala que, numa motociata, “pintou um clima” com venezuelanas de 14 anos. Mundo cão…

Merval Pereira - Um valor mais alto

O Globo

Dificilmente Bolsonaro conseguirá virar o jogo, mas ele se solidifica como líder da direita no Brasil

A estarem corretas as pesquisas eleitorais, dificilmente Bolsonaro terá condições de virar o jogo no segundo turno, superando o ex-presidente Lula. Mas, se o tempo ruge no cangote do presidente, seus pequenos avanços em setores importantes, como no Sudeste e no Nordeste, na redução da rejeição, nos anunciam que ele vai solidificando sua posição de líder da direita no país, partindo de uma base de extrema direita que sempre o caracterizou.

Como constatado desde 2018, e confirmado no primeiro turno, com uma votação surpreendente para quem se guiou pelas pesquisas, Bolsonaro capturou o eleitorado que há anos votava no PSDB como alternativa do PT. O que restou da social-democracia dos tucanos ficou ao lado de Lula nesta eleição, e o centro, a direita, os liberais e os extremistas fecharam com Bolsonaro, não apenas no voto antipetista, mas também entre liberais que ainda alimentam esperanças de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, possa influir mais decisivamente num segundo mandato.

O combate à corrupção e o medo de um comunismo que não existe mais como quando da Guerra Fria têm seu papel nesse apoio a Bolsonaro, surpreendente diante do que ele fez durante seus quatro anos, e especialmente do que não fez. Não fez, por exemplo, o combate à corrupção que prometeu ao levar o ex-juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Carlos Andreazza - Pintou um clima

O Globo

O clima: Ciro Nogueira e Sergio Moro unidos por Jair Bolsonaro na plateia do debate. Bonito. Unidos e atuantes. Ambos trabalhando por subsidiar o candidato. Que um já chamou de fascista. Que o outro acusou de interferir na autonomia da Polícia Federal; para então sua honra, na hipótese de que houvesse uma, ser enxovalhada pela máquina de moer do bolsonarismo.

Releve-se. Há que ganhar a vida, afinal.

Pintou um clima. Bolsonaro une, o cupido. Bolsonaro, o cupido, degenera. Nogueira e Moro, porém, já vieram prontos. Feitos um para o outro, os unidos pelas circunstâncias. Velho e novo senadores da República. Um, o ministro que botou Guedes no bolso e instaurou a PEC Kamikaze. O outro, o ex-ministro cuja farsa foi biombo para que, à sombra, ascendesse um Augusto Aras.

Nogueira e Moro. O orçamento secreto e o combate à corrupção. Unidos sob os escombros da imaginação moral, o orçamento secreto e o combate à corrupção. Dois homens objetivos. Um pela permanência; o outro pela existência. Nogueira e Moro. O orçamento secreto, um complexo esquema de corrupção, e o combate à corrupção, que o tempo exporia ser pura fachada para o exercício do antipetismo.

Míriam Leitão - Bolsonaro e o seu desprezo ao pobre

O Globo

Bolsonaro não consegue se conectar aos mais pobres por fobia e preconceito. Por isso, os eleitores de menor renda são os que mais resistem a ele

Bolsonaro tem dado demonstrações seguidas de desprezo aos pobres. Isso explica vários erros. No debate da Band ele confundiu moradores de favela com bandidos, no fim de semana ofendeu adolescentes venezuelanas pobres, após o primeiro turno chamou nordestinos de analfabetos para explicar sua derrota na região. Simplesmente ele não consegue se conectar com o pobre por fobia e preconceito. Por isso, pesquisa após pesquisa, e isso deve enfurecê-lo, os eleitores de menor renda são os que mais resistem a ele.

— Eu conheço o Rio de Janeiro. O senhor esteve recentemente no Complexo do Salgueiro, não tinha nenhum policial do seu lado. Só traficante — disse Bolsonaro.

Isso permitiu a Lula corrigir a geografia e a visão do presidente. Lembrou que foi ao Complexo do Alemão e se encontrou com trabalhadores:

— Os bandidos você sabe onde estavam, um vizinho seu tinha 100 armas dentro de casa. Achar que os bandidos estão só no lugar dos pobres?

Ligia Bahia* - Identidade médica e saúde da população

O Globo

Médicos confundidos com um regime, um governo, entraram para a História como carrascos

O dia 18 de outubro costumava ser uma data protocolar. Por décadas, mensagens entre colegas de profissão, poucos anúncios na imprensa parabenizando médicos por sua dedicação e eventos mais para festivos de entidades de representação da categoria compuseram um repertório comemorativo repetitivo, mas simpático e inclusivo. Neste ano, as divergências político-eleitorais engoliram a tradição. O princípio da profissão — definido por suas competências e também interdições de práticas, um espaço comum para o exercício de atividades — passa por uma reviravolta. O que era partilhado em função do que se faz, como e onde se trabalha está sendo substituído por um fanatismo político que rejeita diferentes e diferenças.

Faculdades públicas, acervos comuns e textos científicos — disponíveis para qualquer médico — subverteram antigas hierarquias e se tornaram núcleo de uma comunidade profissional mais democrática. Um árduo processo, atravessado por ilusões e desilusões. Divergências entre médicos acompanham a constituição das alternativas para projetos nacionais. Não fossem as polêmicas entre Afrânio Peixoto e Oswaldo Cruz sobre a compreensão dos “nossos males”, possivelmente teríamos demorado ainda mais tempo para a transição da medicina bacharelesca para a científica.

Lula se diz preocupado com extrema-direita em alta

Petista reuniu-se por mais de duas horas com padres, freiras e religiosos na capital paulista

Cristiane Agostine / Valor Econômico

18/10/2022 05h01  

Candidato do PT à Presidência, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou nesta segunda-feira (17) preocupação com o crescimento da extrema-direita no Brasil e o com o clima de “ódio” de parte da população. A uma plateia de religiosos católicos, o petista avaliou que o bolsonarismo está “criado” no país, afirmou que será um problema depois das eleições e disse que é preciso evitar que se transforme em uma “política definitiva”.

 “Nós vamos ter um problema, [porque nós vamos ganhar as eleições, nós vamos derrotar o Bolsonaro, mas o bolsonarismo está criado”, disse Lula, em referência ao presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL). “Mas depois nós temos que conscientizar a sociedade para que ela não crie no bolsonarismo uma política definitiva no Brasil, que é o que a extrema-direita está tentando fazer aqui e em outros países”, afirmou.

O petista reuniu-se por mais de duas horas com padres, freiras e religiosos na capital paulista, em um ato para reforçar o apoio de grupos católicos à sua candidatura.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

Debate foi mais civilizado, não mais propositivo

O Globo

Brasileiros já sabem quem são e o que fizeram Lula e Bolsonaro. Precisam saber o que farão no futuro

O primeiro debate do segundo turno entre os candidatos à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), promovido por um pool de veículos liderado pela Band, foi mais civilizado do que se imaginava diante da guerra suja conflagrada na campanha. Não deixa de ser um avanço. Mesmo assim, se o eleitor pretendia esclarecer dúvidas para decidir, consolidar ou mudar seu voto, é provável que tenha saído frustrado. Fora as reiteradas vezes em que um chamou o outro de “mentiroso”, Lula e Bolsonaro falaram mais do passado que de seus projetos para o futuro governo.

A economia foi relegada a segundo plano. Instado por Bolsonaro, Lula mais uma vez se negou a dizer quem será seu ministro ou a detalhar seus planos para a área. Ao responder a questionamento sobre a corrupção na Petrobras, reiterou sua posição equivocada sobre a necessidade de manter refinarias em poder do Estado e defendeu o indefensável desperdício de bilhões nos governos petistas com programas megalomaníacos que jamais saíram do papel. Quanto ao teto de gastos, apesar de ambos já terem manifestado intenção de acabar com a única âncora fiscal que resta ao país, nenhum dos dois explicou o que será colocado no lugar.

Poesia | Cora Coralina - O Sentido da vida

 

Música | Gabriela Machado - Caminhando (Nelson Cavaquinho)