terça-feira, 15 de outubro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Novo apagão em SP expõe falha na fiscalização

O Globo

Terceiro blecaute com a mesma concessionária em menos de um ano mostra o fracasso das autoridades

Não há dúvida de que a tempestade que castigou São Paulo na noite de sexta-feira foi violenta. Ao menos sete pessoas morreram na capital e no interior. As rajadas de vento bateram o recorde de 30 anos, derrubaram árvores e fiações, destelharam casas e causaram prejuízos. Diante desse cenário, compreende-se que falte energia elétrica. Mas é incompreensível que apagões se repitam ante a incapacidade flagrante das autoridades para lidar com fenômenos climáticos mais intensos e frequentes. Em menos de um ano, é a terceira vez que São Paulo vive situação semelhante. Uma delas, em março e abril deste ano, nada teve a ver com o clima. E em todas as respostas foram frustrantes.

Luiz Carlos Azedo - Diante de uma encruzilhada do passado

Correio Braziliense

O mundo mudou, as cadeias de valor da globalização estão sendo reestruturadas, o país está com um pé em cada canoa na política internacional e a nossa “sociedade industrial”, que deu origem ao PT, não existe mais

O que ainda existe de comum entre Getúlio Vargas e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva? Uma visão na qual a centralidade da política está na ação do Estado e não na sociedade civil. Ambos privilegiaram o contato direto com o povo. E não a mediação da sociedade civil, que deixou de ser uma trincheira da esquerda, como correu durante o regime militar. Suas agências foram gradativamente controladas por setores de direita, inclusive em setores onde predominavam atores liberais, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Conselho Federal de Medicina (CFM).

Lula foi um dirigente sindical pragmático e realista. Embora dissesse que a CLT era o AI-5 dos trabalhadores, não embarcou no mito fundador do Partido dos Trabalhadores, que era emancipar o proletariado brasileiro da tutela da Consolidação da Legislação Trabalhista (CLT), cuja origem está no Estado Novo e na Carta del Lavoro, do ditador Benedito Mussolini, criador do fascismo.

Maria Cristina Fernandes - Campanha de SP será o tribunal do apagão

Valor Econômico

Apagão em São Paulo exemplifica o Nobel de Economia ao mostrar causa e efeito de instituições ruins e subdesenvolvimento

Se o jogo de empurra do apagão de 12 meses atrás ainda não apurou responsabilidades, parece improvável que o desta sexta-feira o faça nas duas semanas que restam até o segundo turno das eleições. É inevitável, porém, que a campanha se transforme num tribunal a céu aberto dos responsáveis. Abre-se uma oportunidade para que a disputa se dê mais claramente em cima do impacto da gestão pública sobre a vida real das pessoas. E também para clarear o sentido dos resultados eleitorais até aqui.

Alvejado pelo candidato do Psol, Guilherme Boulos, pelas falhas nas podas das árvores, manutenção dos semáforos e disponibilização de equipes de emergência, o candidato à reeleição pelo MDB, Ricardo Nunes, achou por bem voltar suas baterias contra o ministro das Minas e Energia que, horas antes dos 15 minutos fatídicos que apagaram São Paulo, participava de um amistoso seminário com o diretor internacional da Enel, em Roma.

Alexandre Silveira é o principal ministro do PSD, partido que, até aqui, é aquele que lidera em número de prefeitos eleitos e, cujo presidente, Gilberto Kassab, além de secretário da gestão Tarcísio Freitas, é apoiador de Nunes. Silveira vive às turras com a Agência Nacional de Energia Elétrica cujo diretor-presidente foi nomeado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro por indicação de seu então ministro-chefe da Casa Civil, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), outro apoiador de Nunes.

Maria Cristina Fernandes - Apagão acirra o clima

Valor Econômico

O primeiro turno da eleição paulistana foi tão sobressaltado que quando o candidato do Psol, logo no início do debate da Band, deixou seu púlpito em direção ao seu adversário, as cenas de pugilato incitadas pelo ex-candidato do PRTB, Pablo Marçal, vieram à lembrança.

Com o apagão que atingiu mais de 2 milhões de casas e estabelecimentos em São Paulo neste fim de semana, havia mais motivos do que nunca para um debate mais agressivo do que qualquer outro desta campanha, mas a ausência de Marçal fez diferença.

Se Boulos foi mais incisivo do que em todo o primeiro turno, o candidato do MDB, Ricardo Nunes, também incorporou ao seu modo o legado do candidato do PRTB com uma atitude que beirou o desdém com seu adversário, citando sua desvantagem nas pesquisas e acusando-o de despreparo. Citou ainda o fato de ter uma empresa “sólida e da qual me orgulho”, nascida na periferia sul de São Paulo para explorar o espírito do ex-adversário empreendedor.

César Felício - Debate da Band teve vencedor, mas pode não virar votos

Valor Econômico

Apagão domina debate com candidato do Psol na ofensiva

O apagão iniciado sexta-feira em São Paulo pautou o debate da TV Bandeirantes entre o prefeito Ricardo Nunes (MDB) e o deputado Guilherme Boulos (Psol), como era previsível A estratégia de Nunes foi bater na tecla de que cabe ao governo federal e ao Congresso atuar contra a distribuidora Enel, que seria, na visão que procurou passar, integral responsável pela anormalidade que ainda afeta a cidade. Boulos mencionou algo mais visível a olho nu, que é a responsabilidade sobre a poda das árvores que caíram. Poda de árvores é tema municipal. Programação de semáforos também.

Dentro desse formato, a discussão do tema foi desvantajosa para o prefeito, dificilmente teria como ser diferente. O eleitor afetado vê o que está adiante de si, e não o contexto do que o Ministério de Minas e Energia poderia ter feito e não fez. É o prefeito que está na ponta. A emergência da crise dificulta a abstração e a avaliação racional do contexto em que se encaixa o tema das concessões de energia elétrica.

Joel Pinheiro da Fonseca - As 'PECs anti-STF vêm de necessidade real

Folha de S. Paulo

O STF toma hoje o protagonismo no debate público, e é preciso discutir o assunto

Vivemos um conflito entre Congresso e Supremo. De um lado, o Supremo barra as emendas parlamentares e cobra maior transparência, no que presta um serviço ao país. De outro, com duas PECs —a das decisões monocráticas e a que susta decisões da corte—, o Congresso busca limitar o poder do Supremo, no que também está correto. O fato de esse conflito ser o motivador de medidas de ambos os lados —o Supremo, não menos do que o Congresso, também atua politicamente— não as invalida.

Seria um privilégio se um comitê de sábios se sentasse, sem pressões políticas, para discutir a relação ideal entre os Poderes e então a implementasse com total liberdade. Mas essa discussão de ideias pura jamais vai acontecer. Todo debate sobre a sociedade se dá em meio a conflitos políticos conjunturais, e é graças a isso que pautas, mesmo as mais importantes, avançam.

Dora Kramer - Galho que nasce torto...

Folha de S. Paulo

Defeito do financiamento de campanhas está nos abusos e na falta de punições

Nada contra o anseio de congressistas e supremos magistrados de rever os atuais termos de financiamento das campanhas eleitorais. Está ruim mesmo. A correção pretendida em 2015, quando foram proibidas as doações de empresas, não teve o efeito saneador esperado.

A coisa continuou errática e, sobretudo, desigual em relação à paridade de condições entre partidos e respectivos candidatos. Algo há, realmente, a ser revisto. Nesses nove anos, a situação piorou: concentraram-se recursos nas direções partidárias, que os distribuem como querem, dentre outras distorções.

Alvaro Costa e Silva - A infinita rave das campanhas políticas

Folha de S. Paulo

Campanha para futuro governo do Rio já começou com denúncias e xingamentos

Uma mal acaba, a outra começa. Uma rave interminável financiada com dinheiro público. É como se a única atividade política no Brasil fosse a campanha.

A que vai eleger o futuro governador do Rio de Janeiro iniciou com dois anos de antecedência. E de maneira agressiva, como virou moda no país. Além de dissimulada: os candidatos que despontam na corrida eleitoral dizem que não vão concorrer, mas ninguém acredita. Antes mesmo de cruzar a linha de largada, eles se aquecem trocando ofensas e xingamentos.

Recém-eleito para o quarto mandato na prefeitura da capital, Eduardo Paes ligou o governador Cláudio Castro —esvaziado durante o pleito municipal e criticado pela população— ao presidente da Alerj, Rodrigo Bacellar, dizendo que este agiria com "ameaças" e "extorsões" para dominar aquele. Postulante ao Palácio Guanabara e disputando o apoio de Bolsonaro (até agora só recebeu a medalha de imbrochável), Bacellar não fez por menos na resposta, chamando Paes de "vagabundo", "dissimulado", "cínico" e "menina virgem no cabaré".

Eliane Cantanhêde - HIV, tempestade e impunidade

O Estado de S. Paulo

Quem será punido pelo apagão em São Paulo e a contaminação por HIV no Rio? Só as vítimas?

Afinal, de quem é a culpa pelo apagão que atingiu e há dias continua atingindo tantos milhares de paulistas após o temporal de sexta-feira? No jogo de empurra-empurra, a Enel, a Aneel, a Prefeitura, o governo estadual e o governo federal jogam no colo uns dos outros e acusam São Pedro, coitado, a chuva, as árvores, os postes, os cidadãos. Então, ficamos assim: segundo os culpados, a culpa é da vítima, uma idiota que só sabe reclamar, ficar de mimimi e nem consegue ligar um disjuntor.

Carlos Andreazza - Má divisão

O Estado de S. Paulo

Barroso não pisa no chão do mundo real, ou não avaliaria que o tribunal cumpre ‘bem a sua missão’

Palestrante internacional onipresente e dedicado comentarista político da TV Justiça, também – nas horas vagas – ministro (presidente) do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, nosso recivilizador, falou em Roma contra a “apropriação do espaço público por elites predatórias”.

Falou isso em evento privado patrocinado por empresas privadas de elite, entre as quais a dos irmãos Batista, de muitos interesses no STF. (Estava lá também Dias Toffoli, outro palestrante requisitado; que, na sua porção juiz, suspendeu – em dezembro de 2023 – multa de mais de R$ 10 bilhões devida pelo grupo J&F, dos Batista, em função de acordo de leniência.)

Barroso tem cadeira – trono – no “espaço público”. E decerto considera que o problema – essa “apropriação” – ocorre noutros lugares da atividade pública; o que tornaria cômica a alienação, não fosse degradante.

Merval Pereira - Embate sem luz

O Globo

Há anos, portanto, as agências reguladoras vêm sendo esvaziadas e preenchidas por escolhas políticas, quando têm função puramente técnica. Essa é uma das razões para a falta de fiscalização apontada como causa das falhas constantes da concessionária Enel

As agências reguladoras foram criadas em consequência da privatização de setores da economia no governo Fernando Henrique Cardoso. A ideia central é haver agências independentes para garantir que as empresas privatizadas cumpram bem suas missões em todo o território nacional. Por isso elas têm mandato para o presidente e diretores, que não coincidem com os de governos eleitos.

Normalmente, um dirigente de agência reguladora é nomeado por um presidente da República, e seu mandato entra pelo governo que lhe sucedeu. No caso de reeleição, é possível que os mandatos coincidam em algum momento, mas a autonomia continua preservada pelo mandato fixo. Os governos petistas nunca gostaram da ideia, consideram que os ministérios ficam esvaziados.

Pedro Doria - Temos pouco tempo

O Globo

País pode estar no grupo de quem desenvolve tecnologia adjacente

Talvez não esteja muito claro, mas a gente tem tempo de entrar na era da inteligência artificial. Não seremos, os brasileiros, desenvolvedores da tecnologia. Esse bonde já partiu. Mas o número de países nesse primeiro nível será muito pequeno. Estados Unidos e China, certamente, mais uns dois ou três. Se tanto. Mas há um segundo nível nessa corrida: é quem desenvolve tecnologia adjacente. O Brasil pode perfeitamente entrar nesse jogo. Quem fará as melhores IAs para uso em agricultura? Para exploração de petróleo ou mineração? Ou para preservação de florestas, controle de queimadas? São muitas as áreas em que podemos ser líderes mundiais. A alternativa é sermos meros consumidores. Então, o que é preciso fazer?

Míriam Leitão – IR: o que o governo está preparando

O Globo

Equipe econômica formula saídas técnicas para a isenção até R$ 5 mil e a cobrança da alta renda

O projeto do Ministério da Fazenda é apresentar este ano um pacote de corte de gastos. Várias propostas já estão sobre a mesa do presidente Lula. Em relação à isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil, a fórmula desenvolvida representará um custo de R$ 35 bilhões, que será facilmente coberto pelo imposto mínimo para a alta renda. Só que isso ficará para o ano que vem, para ser apresentado junto com toda a proposta de reforma da renda. Foi o que eu apurei com fontes do governo.

Há muitos ruídos sobre todos esses assuntos, em parte porque ideias foram divulgadas antes de serem fechadas e, principalmente, aprovadas pelo presidente. São várias formas de cumprir essa promessa da isenção até R$ 5 mil. Uma delas custaria R$ 100 bilhões de perda de arrecadação. Seria subir todas as faixas da tabela do Imposto de Renda para acima desse valor. Outra alternativa seria manter as faixas atuais, mas conceder isenção para todos até o limite de R$ 5 mil. “Isso também custa caro, está na ordem de R$ 70 bilhões”, disse uma fonte. Por isso, a maneira de fazer conta muito. A escolha recaiu sobre a forma mais barata de cumprir essa promessa de campanha.

Paul Krugman - Trump se desvinculou do tempo

The New York Times / Folha de S. Paulo

Candidato republicano parece preso no passado ao repercutir uma imagem dos EUA que não corresponde mais com a realidade

Você se lembra da crise de eletricidade na Califórnia em 2000 e 2001? Eu me lembro, porque escrevi muito sobre isso na época e me arrisquei ao argumentar, com base em evidências circunstanciais, que a manipulação do mercado provavelmente era um fator importante.

Um colega economista me acusou de "ir para o lado Nader", mas eventualmente obtivemos evidências diretas de manipulação de mercado: gravações de traders da Enron conspirando com funcionários de empresas de energia para criar escassez artificial e aumentar os preços.

As memórias desse episódio me tornaram mais simpático do que muitos economistas às alegações de que a exploração de preços desempenhou um papel na recente inflação, embora eu não acredite que tenha sido um fator principal. Neste ponto, no entanto, tudo isso é história antiga; além de alguns apagões durante uma onda de calor em 2020, a Califórnia não teve grandes faltas de eletricidade em décadas.

Thomas L. Friedman - Conflito árabe-israelense continua sem solução clara ou narrativa unificada

The New York Times / Folha de S. Paulo

Um ano após seu início, a guerra entre Israel e Hamas segue sem vencedor, seja no campo de batalha ou no campo das ideias

Então, no que estou pensando neste mês de aniversário da guerra entre HamasHezbollahIrã e Israel? Estou pensando no que meu professor de estratégia, John Arquilla da Escola de Pós-Graduação Naval dos Estados Unidos, me ensinou —que todas as guerras se resumem a duas perguntas básicas: quem vence no campo de batalha? E quem vence na luta pela narrativa?

E o que estou pensando hoje é como, mesmo após um ano de guerra, uma guerra na qual Hamas, Hezbollah e Israel impuseram terrível dor às forças e civis uns dos outros, ninguém venceu de forma decisiva a disputa no campo de batalha ou a disputa pela narrativa.

De fato, um ano após o 7 de outubro de 2023, esta ainda é a primeira guerra árabe-israelense sem nome e sem um vencedor claro, pois nenhum lado obteve uma vitória evidente ou conseguiu apresentar uma narrativa unificada.

Podemos e devemos nos preocupar com a condição de apátridas dos palestinos e com os árabes da Cisjordânia que vivem sob pressão dos assentamentos e restrições israelenses. No entanto, para mim, nada justifica as ações dos terroristas do Hamas em 7 de outubro de 2023 —assassinatos, mutilações, sequestros e abusos sexuais de qualquer israelense ao alcance, sem nenhum objetivo, narrativa ou propósito além de destruir o Estado judeu.

Se você acredita, assim como eu, que a solução para o conflito é a existência de dois Estados para dois povos nativos da região entre o rio Jordão e o mar Mediterrâneo, esse ataque do Hamas foi um retrocesso imensurável a essa perspectiva.

Ehud Olmert / Nasser Al Kidwa - Um farol de esperança Israelense e palestino

O Expresso (Portugal)

Em 7 de outubro de 2023, um novo e devastador capítulo na história dos encontros violentos entre palestinos e israelenses ocorreu, dando início à guerra mais devastadora da história desses dois povos. Agora, quase um ano após esse dia horrível, milhares de pessoas morreram de ambos os lados. A Faixa de Gaza foi destruída, a maioria de seus habitantes tornou-se refugiada mais uma vez, e há cerca de 2 milhões de desabrigados. Mais de 200 mil israelenses também ficaram desabrigados, forçados a abandonar suas casas destruídas e incendiadas.

Não nos conhecíamos no passado, em nossos cargos oficiais a serviço de nossos povos. Nossas trajetórias profissionais não se cruzaram nem nos levaram a trabalhar juntos, até agora. O que nos uniu foi nossa busca para encontrar um parceiro do outro lado do conflito para trabalhar juntos, com respeito mútuo, com o propósito de encontrar uma solução para acabar com a guerra em Gaza e iniciar novas negociações entre Israel e a Autoridade Nacional Palestina, com a aspiração de chegar a um acordo que ponha um fim definitivo ao conflito violento entre nossos dois povos.

Poesia | De que serve a bondade, de Bertold Brecht

 

Música | Elba Ramalho, Alceu Valença - Flor de Tangerina