- O Estado de S.Paulo
Acreditamos que o tempo trabalha a nosso favor, e optamos por ignorar evidências
Um dos aspectos mais fascinantes da crise política brasileira e do comportamento de elites pensantes é a perda da noção de tempo. Não se detecta sentido de urgência no trato de qualquer questão essencial para arrancar o País do buraco ao qual teríamos chegado de qualquer jeito – à incompetência, irresponsabilidade e voracidade de governos do PT e seus associados devemos “agradecer” por terem apressado nosso encontro com a hora da verdade (a de que estamos ficando velhos sem termos ficado ricos).
Sociedades caem vítimas de seus próprios mitos com mais frequência do que se pensa. Para permanecer em tempos recentes, e como caricatura para ilustrar o argumento, pensem nos nazistas (que se achavam imbatíveis) ou nos soviéticos (que se achavam donos do futuro). No caso brasileiro, o título do clássico de 1941 de Stefan Zweig – Brasil, Um País do Futuro – às vezes parece uma maldição. É óbvio que o livro não tem a menor culpa disso, mas a postura de boa parte de elites aqui sugere terem se tornado adeptas da crença de que o futuro nos pertence e inevitavelmente será risonho. Como se sabe, em História não há o inevitável.
Em outras palavras, acreditamos que o tempo trabalha a nosso favor, sobretudo quando lidamos com prazos mais dilatados, e optamos por ignorar evidências. A principal chama-se janela demográfica, que está se fechando e foge ao nosso controle. Nos acostumamos a crescer nos últimos 30 anos incorporando ao mercado de trabalho um número grande e aparentemente inesgotável de jovens mal qualificados. Para crescer e enfrentar agora a competição lá fora teremos de melhorar índices de produtividade estagnados há décadas, e com menos jovens à disposição – algo que já se reflete no eleitorado: pela primeira vez a proporção de jovens entre 16 e 24 anos diminuirá em 2018 em relação à última eleição, enquanto cresce o peso relativo dos eleitores acima dos 60.