segunda-feira, 4 de setembro de 2023

Opinião do dia – Friedrich Engels* (Democracia)

A ironia da história mundial vira tudo de cabeça para baixo. Nós os “revolucionários”, os “sublevadores”, medramos muito melhor sob os meios legais do que sob os ilegais e a sublevação. Os partidos da ordem, como eles próprios se chamam, decaem no estado legal criado por eles mesmos. Clamam desesperados, valendo-se das palavras de Odilon Barrot: la legalitê nous tue, a legalidade nos mata, ao passo que, sob essa legalidade, ganhamos músculos rijos e faces rosadas e temos a aparência da própria vida eterna. E se nós não formos loucos a ponto de nos deixar levar para as ruas só para agradá-los, acabará não lhes restando outra saída senão violar pessoalmente essa legalidade que lhes é tão fatal.

*Friedrich Engels (1820-1895), Prefácio {As lutas de classes na França de 1848 a 1850, de Karl Marx}. p.29. Boitempo Editorial, 2012.Texto escrito em 1895.

Marcus André Melo* - Agendas e alianças

Folha de S. Paulo

Coalizão governativa é condição necessária mas não suficiente

Governabilidade, em uma definição minimalista, denota a capacidade do Executivo de aprovar a sua agenda. Arranjos institucionais e as preferências dos atores influenciam essa capacidade. Cria-se um impasse, por exemplo, se uma maioria legislativa não aprova uma iniciativa legal, mas não é ampla o suficiente para derrubar o veto presidencial (EUA). Em regimes parlamentaristas, pode-se permanecer sem governo por 589 dias pela incapacidade de os partidos chegarem a um consenso (Bélgica, 2011)

Sim, agenda é endógena: o Executivo apenas propõe o que espera ser aprovado. Ou não. O Executivo pode tentar impor sua agenda. Ocorreu com Allende faz 50 anos nesta semana. O mandatário chileno contava com 1/3 dos votos no Congresso, mas renegou a aliança com os democratas cristãos, que viabilizara sua eleição indireta pelo Congresso. Resolveu "avanzar sin transar", em típico cesarismo plebiscitário, como mostrei aqui .

Camila Rocha* - Quem é o prefeito de São Paulo?

Folha de S. Paulo

Resta saber como Nunes, sem marca de gestão, irá dialogar com eleitorado que rejeitou bolsonarismo

Quem é o prefeito de São Paulo? Poucos habitantes da cidade conseguem responder a tal pergunta prontamente e sem erros.

Ricardo Nunes, o desconhecido prefeito da maior cidade do país, é empresário, reside na zona sul e foi diretor da Associação Empresarial da Região Sul de São Paulo (Aesul). Eleito vereador pelo MDB em 2012 com 30 mil votos, e reeleito em 2016 com 55 mil votos, fez parte das bases tucana e petista na Câmara Municipal.

Vice de Bruno Covas nas eleições de 2020, Nunes afirmava à época que seguiria a mesma linha do então prefeito, que veio a falecer em maio de 2021. Contudo, Nunes se localiza bem mais à direita do prefeito tucano.

Ana Cristina Rosa - Heróis negros "invisíveis"

Folha de S. Paulo

Brasil afora, sempre houve e há homens e mulheres pretos e pardos abrindo caminhos

Quando pensamos em antirracismo no Brasil é mais fácil lembrar de nomes do século 19 (como o do abolicionista Luiz Gama) ou de ícones do cenário internacional (como Martin Luther King) do que de nossos "heróis" contemporâneos?

A indagação foi feita pelo cientista político Ivair Augusto Alves dos Santos ao ler minha coluna "Os 60 anos de um sonho" (27/8). Segundo ele, a reiterada citação de personagens históricos ou estrangeiros apaga a atuação de figuras contemporâneas que estão na luta antirracista.

Bruno Carazza* - Reforma ministerial quase nunca dá mais votos

Valor Econômico

Histórico de votações revela que apoio partidário pouco muda após a entrada no governo

Na próxima quinta-feira completam-se dois meses em que só se fala de uma coisa nos corredores do Congresso Nacional: a reforma ministerial. No dia 7 de julho, após aprovar na Câmara a reforma tributária e o projeto de lei que altera as regras de votação do Carf, Lula recebeu no Palácio do Planalto Arthur Lira e os líderes do PP, André Fufuca, e do Republicanos, Hugo Motta.

Além de comemorar as vitórias no Legislativo, foi selada ali a entrada do Centrão no governo Lula. Desde então, já houve até o anúncio dos ministros indicados - o próprio Fufuca e Silvio Costa Filho -, mas o presidente mantém o mistério de quais pastas e estatais distribuirá aos novos parceiros. A novela se arrasta há semanas.

Sergio Lamucci - O peso do agro e do impulso fiscal nas surpresas do PIB

Valor Econômico

Efeitos diretos e indiretos da renda de commodities explicam boa parte dos erros de projeção do PIB; impulso fiscal também ajuda a entender os equívocos

A economia brasileira caminha para terminar 2023 com um crescimento de 3% ou mais, depois de uma expansão de 2,9% em 2022. Nos dois casos, um avanço do PIB significativamente maior do que o esperado pelos economistas no fim do ano anterior. Em dezembro de 2021, o consenso de mercado apontava uma alta de apenas 0,36% em 2022; no fim do ano passado, as apostas eram de 0,8% em 2023.

A dificuldade em estimar o impacto dos setores de commodities na economia, em especial da agropecuária, parece um dos principais motivos para os erros de projeção. O impulso fiscal a partir do segundo semestre do ano passado também pode ajudar a explicar os equívocos nas estimativas, num cenário em que os juros básicos subiram de 2% em março de 2021 para 13,75% ao ano em agosto de 2022 - agora, estão em 13,25%.

Jeffrey Sachs* - A guerra econômica entre EUA e China

Valor Econômico

Tentativa americana de conter a China é equivocada e está fadada a fracassar

A economia da China está desacelerando. As previsões atuais colocam o crescimento do PIB chinês em menos de 5% em 2023, abaixo das previsões feitas no ano passado e bem abaixo das altas taxas de crescimento apresentadas pela China até o fim dos anos 2010. A imprensa ocidental está repleta de supostos erros da China: uma crise financeira no mercado imobiliário, o peso excessivo das dívidas e outros males. No entanto, grande parte da desaceleração é resultado de medidas dos Estados Unidos que visam retardar o crescimento da China. Essas políticas americanas violam as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC) e são um perigo para a prosperidade global. Elas deveriam ser paradas.

As políticas anti-China resultam de uma cartilha familiar na forma de fazer política dos EUA. O objetivo é evitar a competição econômica e tecnológica de um grande adversário. A primeira e mais óbvia aplicação dessa cartilha foi o bloqueio tecnológico que os EUA impuseram à União Soviética durante a Guerra Fria. A União Soviética foi o primeiro inimigo declarado da América e a política dos EUA visava bloquear o acesso soviético a tecnologias avançadas.

Carlos Pereira - O presidente não é o único vencedor

O Estado de S. Paulo

Sistema brasileiro exige compartilhar proporcionalmente poder e recursos com os aliados

Ao invés de cortar na própria carne, como algumas lideranças do PT haviam anteriormente anunciado, Lula preferiu criar mais pastas ministeriais para acomodar os novos aliados, o Partido Progressista (PP) e o Republicanos, na sua coalizão.

A expectativa é que o número de ministérios chegue a nada menos do que 38 ou 39, o recorde atingido pela malsucedida coalizão de sobrevivência pré-impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, que terminou se quebrando.

Fernando Gabeira - Índia na Lua e as razões de perdermos o bonde

O Globo

Pandemia teve peso importante na derrota eleitoral de Bolsonaro. E teve peso importante na sua desgraça pós-eleitoral

Confesso que me impressiona o rastro de inquéritos e processos que Trump e Bolsonaro deixam na esteira de sua saída. Desvio de documentos secretos, joias, tentativa de fraudar eleições, hackers, misoginia, falsos atestados de vacina — acontece de tudo quando baixa a poeira, e se dá o balanço dos dois governos.

Confesso também que me sinto aprisionado a esse entulho processual. Gostaria de falar de outras coisas. Por isso simplificarei um pouco minha descrição do governo Bolsonaro. Possivelmente, ele caiu, como caem os aviões, por múltiplas causas. Mas, no meu entender, foi atropelado pela pandemia.

Demétrio Magnoli - Francisco, Putin e a ‘Terceira Roma’

O Globo

O Papa exaltava a trincheira oriental (e ortodoxa) da cristandade

‘Não esqueçam sua herança. Vocês são os descendentes da Grande Rússia: a Grande Rússia de santos, governantes, de Pedro I, Catarina II, aquele império.’ As palavras do Papa Francisco a jovens católicos de São Petersburgo, que surgiram de improviso, em italiano, após um discurso preparado em espanhol, referiam-se ao passado distante. Seus ecos presentes, porém, provocaram indignação em Kiev e júbilo no Kremlin. A guerra russa diz respeito aos “santos”, Pedro e Catarina, “aquele império”.

A Igreja estabeleceu-se em Roma, no Ocidente, e Constantinopla, no Oriente. Depois da tomada de Constantinopla pelos turco-otomanos, em 1453, Santa Sofia foi transformada em mesquita, e a Igreja oriental encontrou amparo na Rússia de Ivan III (1462-1505). Ivan, o primeiro governante a adotar o título de czar, casado com Sofia Paleóloga, sobrinha do último imperador bizantino, converteu Moscou na “Terceira Roma”.

Morre aos 92 anos José Gregori, ministro da Justiça na era FHC

Valor Econômico

O jurista, que morreu no domingo, 3, estava internado no Hospital Sírio Libanês e deixa três filhas

De São Paulo - Morreu neste domingo, dia 3, José Gregori, ex-ministro da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso e ex-secretário nacional dos Direitos Humanos, aos 92 anos, em São Paulo. Ele estava internado no Hospital Sírio Libanês e deixa três filhas.

Gregori comandou o Ministério da Justiça no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso, entre 2000 e 2001. No mesmo mandato, comandou a Secretaria Nacional de Direitos Humanos.

O advogado foi um dos signatários da “Carta aos Brasileiros”, divulgada em 1977, em meio à ditadura militar, em defesa dos direitos humanos, da Justiça e da cidadania.

Zé Gregori, como era conhecido, fundou e integrava a Comissão Arns, organização da sociedade civil que atua na defesa dos direitos humanos.

O que a mídia pensa: editoriais / opiniões

Entendimento sobre denúncia anônima favorece o crime

O Globo

Justiça deveria rever decisão que manda anular provas mesmo se informações se mostram verdadeiras

Em janeiro deste ano, um homem foi preso em flagrante quando transportava drogas. Dentro do veículo, foram encontrados dois quilos de cocaína e dois de crack, acondicionados numa caixa de papelão. Ao ser abordado por policiais, que haviam entrado em ação depois de uma denúncia anônima, o motorista alegou ter recebido o carregamento de um desconhecido em Ribeirão Preto (SP) para entregá-lo em São José do Rio Preto (SP), serviço que lhe renderia R$ 800. Acabou atrás das grades.

A mobilização da polícia foi em vão. O réu, que cumpria prisão preventiva por tráfico de drogas, foi beneficiado por um habeas corpus. O ministro Rogerio Schietti Cruz, da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, determinou a soltura e o trancamento da ação penal por entender que houve irregularidade na abordagem e na apreensão da droga, anulando as provas reunidas pela polícia. Afirmou que, pelo entendimento consolidado na Corte, a denúncia anônima “por si só não configura fundada suspeita de posse de corpo de delito apta a validar a revista”.

Poesia | Pablo Neruda - Perdão se pelos meus olhos

 

Música | Chico Buarque - Paratodos