sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Mudar projeto atrasará o mercado de carbono no Brasil

O Globo

Texto do Senado não é o ideal, mas aprová-lo com rapidez será melhor que tentar corrigir as imperfeições

O governo planejava aproveitar a Conferência Climática das Nações Unidas em Dubai, a COP28, para lançar o mercado de carbono no Brasil. O projeto estava aprovado no Senado, mas o plano não deu certo. Agora, o relator na Câmara, deputado Aliel Machado (PV-PR), deveria acelerar a tramitação, evitando introduzir no texto mudanças que o levem ao reexame pelos senadores.

O projeto cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE). Empresas que lançarem mais de 10 mil toneladas de gás carbônico na atmosfera (ou o equivalente em outros gases) ficam obrigadas a apresentar um relatório de emissões e reduções, pelas quais têm direito a créditos. As que emitirem mais de 25 mil toneladas devem comprar esses créditos das que tiverem reduzido suas emissões — ou então precisam pagar multas, perdem benefícios fiscais e ficam proibidas de firmar contratos com o setor público.

Fernando Abrucio* - Os arautos do novo reformismo

Valor Econômico

Não há sistema político perfeito, mas a agenda atual de reformas tende a gerar mais fragmentação, instabilidade e ter como corolário final a produção de um clima propício à demanda por um salvador da pátria autoritário

Quando um problema público se torna de difícil resolução, há anos surge um mantra no país: é preciso fazer uma reforma política. Mas, ao contrário do que propaga o senso comum, o Brasil fez várias delas desde a Constituição de 1988. Os resultados dessas transformações foram variados e, na verdade, só podem ser avaliados em sua interligação, e não isoladamente, e por meio da análise de quais são os propósitos dos reformistas. O mudancismo está de volta na boca de importantes lideranças. Duas perguntas se tornam inadiáveis: o que querem os defensores das novas mudanças institucionais e quais os possíveis efeitos de tais alterações?

Para desmascarar a visão de big bang que alimenta o debate da reforma política, vale relembrar, de forma sintética, algumas das transformações institucionais pelas quais o país passou desde 1988. Depois de recusar o sistema parlamentarista em plebiscito, em 1993, e consagrar eleições casadas para os planos nacional (presidente e Congresso Nacional) e estadual (governador e Assembleias Legislativas), o ímpeto reformista ficou marcado pela aprovação do instituto da reeleição, no final do primeiro governo FHC, numa toada de fortalecimento do Poder Executivo em todas as esferas federativas.

Mais adiante, a agenda mudancista voltou-se, mais de uma vez, à alteração das regras das medidas provisórias, numa busca de equilíbrio dos Poderes. Houve ainda reformas para tentar reduzir a corrupção eleitoral, como a Lei da Ficha Limpa e posteriormente a decisão do STF que restringiu fortemente o financiamento privado de campanhas. No plano do sistema eleitoral, houve a alteração do modelo de coligações eleitorais e da representação congressual dos partidos. Em menor medida, ocorreram também reformas do Sistema de Justiça, como a criação do CNJ e mesmo a mudança da aposentadoria compulsória dos ministros do Supremo - que são obrigados a se aposentar aos 75 anos de idade (antes era aos 70).

José de Souza Martins* - Morar na rua é morar?

Valor Econômico

A variação do tempo de moradia na rua recomenda que o “conceito” de morador de rua é impróprio e frágil. Sugere os graus de dificuldade da vítima para retornar a uma situação de normalidade social

A divulgação, pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), com base no Cadastro Único, de estudo de Marco Antonio Carvalho Natalino mostra que o número dos chamados moradores de rua aumentou de 21.934, em 2013, para 227.087, em 2023: 935% em dez anos. Embora não sejam números relativos à totalidade da população, são indicativos de uma tendência de exclusão no que se refere a uma crise social grave. Os aspectos profundos do problema, porém, não se revelam nos fatores e motivos reconhecidos pelas próprias vítimas.

Há um conjunto imenso de complicações relacionadas com o que é de fato um dramático problema social. Os dados referem-se a causas definidas subjetivamente pelos próprios moradores de rua. É o que dificulta a pesquisa sobre suas verdadeiras causas, as estruturais, que se situam fora do marco da consciência da vítima. Porque limitada a impressões que ela pode ter de sua situação com base nos motivos de terceiros no respectivo grupo de referência, como a família, os vizinhos e outros agentes de relacionamentos cotidianos.

César Felício - A interminável montagem de Lula

Valor Econômico

A impressionante demora do presidente em se decidir é um indicativo da falta de segurança em seu entorno. Lula não tem anteparo

Um ato para marcar o primeiro aniversário do 8 de janeiro deverá ser a nota final da passagem de Flavio Dino pelo Ministério da Justiça. Caso ele saia na sequência, o que é pouco provável, terão transcorrido 25 dias entre sua aprovação pelo Senado para ocupar uma vaga no Supremo Tribunal Federal e seu afastamento do governo.

A vaga de Rosa Weber no STF demorou dois meses para receber uma indicação do presidente, embora o nome de Dino tenha surgido como favorito para a função cerca de 30 dias antes.

Na ocasião em que o falatório sobre Dino começou, Lula ainda não tinha concluído a mini-reforma ministerial para entronizar André Fufuca nos Esportes e Silvio Costa Filho nos Portos e Aeroportos. Eles tomaram posse em 14 de setembro e foram escolhidos entre junho e julho.

Claudia Safatle - Mercado de crédito e o alerta feito pelo BC

Valor Econômico

Copom vem chamando atenção, ao longo deste ano, sobre o risco de alavancagem do BNDES no crédito direcionado, tal como no segundo mandato de Lula

Segundo o Relatório Trimestral de Inflação divulgado ontem pelo Banco Central, a projeção de crescimento modesto do estoque de crédito para o ano que vem passou de 8,5% para 8,8%, comparado ao aumento de cerca de 6,8% este ano. Os prognósticos são de uma inflexão na tendência de desaceleração do crédito livre para pessoas físicas, que deve crescer mais de 7% no próximo ano, taxa que é, porém, bastante inferior ao aumento do crédito para as pessoas físicas nos anos de 2021 e 2022, quando houve um acréscimo de 23% e de 17,5%, respectivamente.

Vera Magalhães - Acordo à vista com o STF

O Globo

Depois de muita fumaça, o ano termina com a tentativa de concórdia entre os Poderes, sinal de maturidade republicana

O ano termina com a pauta anti-Supremo engatilhada pelo Senado devidamente acomodada na gaveta de Arthur Lira. Enquanto isso, nos bastidores, é costurado um acordo para colocar panos quentes na disputa entre os Poderes e construir um 2024 de menos treta institucional.

O primeiro sinal de harmonia deverá ser simbólico. Lula, Lira, Rodrigo Pacheco e Luís Roberto Barroso deverão voltar a se reunir na segunda-feira, 8 de janeiro, para marcar um ano da tentativa de supressão da democracia promovida por bolsonaristas que invadiram e vandalizaram as sedes dos Três Poderes.

Os demais gestos serão menos fotográficos e mais políticos. Uma das primeiras pautas a testar até onde cada um dos vizinhos de praça está disposto a ir para reduzir as fricções será a definição quanto ao regramento para a demarcação de terras indígenas.

Bernardo Mello Franco – A validade do governador

O Globo

Fragilizado por investigações, governador do Rio já assumiu cargo na mira da polícia

Num estado que já havia visto de tudo, Cláudio Castro conseguiu inovar. Assim que chegou ao poder, foi alvo de uma operação policial.

O governador teve a casa vasculhada em 28 de agosto de 2020, por ordem do Superior Tribunal de Justiça. No mesmo dia, assumiu a cadeira de Wilson Witzel, afastado sob acusação de desviar verbas da saúde.

Witzel, o breve, nunca voltou ao cargo. Teve o mandato cassado pela Assembleia Legislativa. Castro, o interino, virou governador permanente. Mas nunca se livrou das suspeitas de corrupção.

O bolsonarista é assombrado por um vídeo que veio à tona nas primeiras semanas de sua gestão. Na imagem, gravada em 2019, ele caminha de mochila nas costas por um shopping da Barra da Tijuca.

Flávia Oliveira - A comida no prato

O Globo

A inflação dos alimentos no curto prazo guarda certa semelhança com a curva de aprovação do presidente. A melhor avaliação se deu em agosto, quando a alimentação no domicílio despencou

O ano não foi, definitivamente, igual àquele que passou. Cessou a escalada golpista, que atravessou o governo Jair Bolsonaro e se estendeu à primeira semana do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. A economia chega a dezembro com o triplo do crescimento do PIB previsto na virada do ano (quase 3%, ante 0,8%); a inflação não deve ultrapassar o teto da meta (4,75%), e o dólar está rodando abaixo de R$ 5; o desemprego (7,6%) é o menor em oito anos, a população ocupada a maior em mais de década, e a massa de rendimentos bateu o recorde da série iniciada em 2012. Pela primeira vez, o Ibovespa ultrapassou 131 mil pontos; as agências de rating voltaram a elevar as notas de crédito do país.

Rogério Furquim Werneck - O que preocupa em 2024

O Globo

Em que medida o presidente e seu partido serão capazes de mostrar a convicção requerida para manter nos trilhos a condução da política macroeconômica que se faz necessária?

O país deve terminar o ano com expansão de 3% no PIB, inflação sob controle e saldo na balança comercial caminhando para US$ 100 bilhões. Em condições normais, tudo isso deveria apontar para perspectivas promissoras em 2024.

Há, contudo, uma área de sombra. Em que medida o presidente e seu partido serão capazes de mostrar a convicção requerida para manter nos trilhos a condução da política macroeconômica que se faz necessária?

A chamada área política do governo não tem escondido suas insatisfações. Há poucos dias, foram dados a público os clamores da principal corrente do PT — à qual pertencem a presidente do partido e o presidente Lula da Silva — contra a política de “austericídio fiscal” e a “ditadura do Banco Central (BC) independente”.

Dia 9, em Brasília, Gleisi Hoffmann denunciou a meta de resultado primário zero e defendeu um déficit de até 2% do PIB. Três dias depois, foi respaldada pelo próprio presidente Lula. “Se for necessário esse país fazer endividamento para crescer, qual é o problema?”

Fernando Gabeira - Um ano trágico e as contas de chegar

O Estado de S. Paulo

Considerando a tragédia global, o Brasil se deu bem, apenas fazendo contas para o ano que começa

Na política, o ano de 2023 foi marcado por dois acontecimentos, aqui e lá fora: o 8 de janeiro em Brasília e o 7 de outubro em Israel. Ambos implicam consequências e não acabam em dezembro, como tantos procedimentos regulares do ano. Mas na economia, embora sem a grande repercussão dos fatos políticos, votou-se a reforma tributária, outro fato que vai transcender ao ano de 2023, inclusive porque só para regulamentá-la o Congresso dedicará grande parte de 2024.

Os observadores coincidem sobre o fato de que a reforma tributária vai alavancar a economia, favorecendo um processo de crescimento. Embora não tenha sido uma reforma ideal, a verdade é que essa é uma avaliação unânime.

Celso Ming - Lula, o PT e as agências de risco

O Estado de S. Paulo

O presidente Lula e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, festejaram com alarde a melhora da nota de crédito do País pela agência de classificação de risco Standard & Poors (S&P). Mas o PT-raiz e seus aliados mais à esquerda permaneceram calados. Ou, se aprovaram, fizeram isso com o freio de mão puxado.

Essa atitude eivada de restrições se deve a dois fatores. O primeiro deles é o de que essa melhora da percepção da qualidade dos títulos de dívida do Brasil se baseou em critérios fiscais. A S&P citou como galvanizador desse avanço do rating a aprovação da reforma tributária, cuja homologação aconteceu nesta quarta-feira. Mas o critério supremo é sempre a condição fiscal, a que garante o pagamento da dívida no seu vencimento. Em 2015, a própria S&P rebaixou a nota do Brasil e retirou o grau de investimento logo depois que a então presidente Dilma Rousseff apresentou proposta orçamentária que previa um rombo de R$ 30,5 bilhões.

Vinicius Torres Freire - Maioria do Congresso promete derrubar pacotão liberal de Milei

Folha de S. Paulo

Mundo político diz que decretaço é inconstitucional; presidente sofre de síndrome de Collor

A maioria do Congresso da Argentina promete derrubar o decretaço liberal de Javier Milei, anunciado na noite de quarta-feira (20).

Há muito parlamentar que concorda com alguns dos 366 artigos do pacotão baixado pelo novo governo, mas a gritaria é quase geral contra o método: um DNU (Decreto de Necessidade e Urgência), que tem validade quase imediata, bem parecido com as medidas provisórias aqui no Brasil.

Em dez dias de governo, Milei detonou uma crise constitucional, mas não está nem aí. Para surpresa de ninguém, atropelou o Congresso. De resto, prometeu para esta sexta-feira um pacote de medidas de reforma do Estado.

O DNU de Milei tem o objetivo declarado de desregulamentar e liberalizar a economia argentina, de fato o império da intervenção estatal aloprada, ineficiente, clientelista e o defeito que se quiser imaginar. Muitos políticos argentinos dizem que concordam com parte das mudanças, desde que possam aprovar apenas o que jugam razoável.

Certos governadores até aceitam engolir inteiro o sapo autoritário, em nome da "governabilidade" (e de algum dindim); outros estão fulos porque, um dia antes do anúncio do decreto, estiveram todos em reunião com Milei, que não tratou do assunto.

Hélio Schwartsman - Lula e o centrão

Folha de S. Paulo

Parlamento reflete as preferências do eleitor com mais granularidade do que a Presidência

Quem representa melhor o Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou o Congresso Nacional, dominado pelo centrão? Ambos têm a mesma legitimidade, que extraem do fato de terem sido os escolhidos pela população num processo eleitoral livre e limpo. Lula foi ungido para ocupar a chefia do Poder Executivo; deputados e senadores, para legislar.

Em regimes presidencialistas, nutrimos um certo fetiche pelo primeiro mandatário, parcialmente justificado pelo grande poder do cargo e por ser essa a disputa eleitoral mais simbólica e, portanto, a que mais mobiliza as atenções. Em termos de representatividade, contudo, não há como negar que o Parlamento traduz de forma muito mais precisa e granular as preferências da população. A principal razão para isso é matemática. O presidente é apenas um, em alguma medida escolhido por voto negativo (rejeição ao adversário em vez de apoio explícito às suas ideias); os parlamentares são 597, eleitos num sistema em que prepondera o voto proporcional que dá voz às mais diferentes tendências. Gostemos ou não, o Congresso é a cara do Brasil.

Bruno Boghossian - Congresso usa emendas para amarrar mãos de Lula em 2025

Folha de S. Paulo

Verba deve reduzir ainda mais a influência do governo em eleições para presidências da Câmara e do Senado

Sem olhar para trás, Câmara e Senado atropelaram o governo para turbinar as emendas parlamentares do ano que vem. Não haverá deputado ou senador, governista ou de oposição, sem dinheiro grosso para abastecer suas bases eleitorais em 2024. Para um punhado de cardeais, no entanto, esse jogo já está em 2025.

O aumento da verba dá um nó precoce nas mãos do governo para a disputa pela sucessão de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco. O reajuste das emendas fortalece a lógica sindical que rege a Câmara e o Senado, ao mesmo tempo em que diminui ainda mais a influência do Palácio do Planalto sobre os plenários.

Ruy Castro - Defesa a longo prazo

Folha de S. Paulo

Não se discute o direito de defesa de um acusado, mas isso inclui os rococós que a tornam interminável?

Dois advogados do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), em carta para o jornal nesta terça (19), referiram-se à minha coluna "Crime à vista; castigo, a prazo" (13), em que lamentei a lentidão da Justiça no julgamento dos acusados da morte de Santiago Andrade, cinegrafista da TV Bandeirantes, numa manifestação no Rio em 2014. Santiago estava no caminho de um rojão que eles dispararam e teve sua cabeça explodida pelo artefato. Morreu três dias depois. Os responsáveis levaram os quase 10 anos seguintes se defendendo em liberdade, e só agora foram julgados. Um foi condenado; o outro, absolvido. O condenado continuará livre, defendido por um recurso.

Os advogados "lembram" que todos têm direito de exercer a ampla defesa. Concordo e pergunto em que trecho da coluna afirmei o contrário. Esse direito é essencial no Brasil, onde a polícia mata primeiro e acusa depois. Pena que o próprio Santiago não tivesse tido direito a qualquer defesa, muito menos ampla.

Poesia | Vinicius de Moraes - Poema de Natal

 

Música | Geraldo Vandré - Pra não dizer que não falei das Flores