- Nas entrelinhas / Correio Braziliense
A capital federal se transformou numa grande metrópole, onde o povo se mobiliza para protestar quando deseja. Entretanto, aprisiona seus governantes numa “jaula de cristal”
O Palácio de Versalhes tornou-se o símbolo do absolutismo francês a partir do momento em que Luís XIV, em 1661, resolveu transformar a residência de caça de seu falecido pai, Luís XIII, na sede da Corte francesa, logo após a morte do famoso cardeal Mazarin, até então a eminência parda do seu governo no Louvre. A reforma projetada pelo arquiteto Louis Le Vau resultou no gigantesco e luxuoso palácio que sediou a administração da França e abrigou as festas da nobreza de 1682 a 1789, ou seja, até a Revolução Francesa.
A Galeria dos Espelhos, o Grande Trianon, as alas norte e sul do palácio, a Capela Real, e o imenso jardim de autoria do paisagista André Le Notre, com seu Grande Canal, foram projetados para demonstrar o poder do autodenominado “Rei Sol”. É de Luís XIV a máxima que sintetiza o absolutismo: “L’Etat c’est moi” (O Estado sou eu). A construção de Versalhes influenciou a arquitetura da época, levando outros monarcas a construírem também grandes palácios. O Palácio de Inverno, em São Petersburgo, de Catarina, a Grande, projetado por Bartolomeo Rastrelli, com suas paredes em verde e branco, estilo rococó, possui 1786 portas e 1945 janelas.
Os palácios de Brasília não se parecem nem um pouco com o de Versalhes ou o de Inverno, embora o traçado de Brasília, com suas grandes avenidas, tenha a ver com a construção de São Petersburgo, a primeira grande cidade planejada do mundo, por Pedro, o Grande, e a reforma urbana de Paris, do barão Georges-Eugène Haussmann, prefeito da cidade durante o governo de Napoleão III, sobrinho de Napoleão Bonaparte. Ambas são símbolos da modernidade e tiveram o objetivo de melhorar as condições sanitárias, facilitar o deslocamento, aumentar a segurança e manter o povo à distância do poder. Também influenciaram as reformas urbanas das cidades brasileiras no começo do século passado, sobretudo as de São Paulo e do Rio de Janeiro, e o traçado do Plano Piloto de Brasília.
Sede administrativa do governo federal, Brasília se transformou numa grande metrópole, onde o povo se mobiliza para protestar quando deseja. Entretanto, também aprisiona seus governantes numa “jaula de cristal”, na qual o presidente da República se vê cercado de colaboradores que filtram todas as informações, enquanto do lado de fora a sociedade acompanha o que acontece atrás dos vidros de seus palácios. A imprensa torna-se incômoda por causa disso, porque seu esporte favorito é revelar o que os governantes não querem que a sociedade fique sabendo. Mesmo com o advento das redes sociais, o enclausuramento do governante persiste, porque a forma como as pessoas se articulam na internet é por afinidades.