Operador do mensalão
afirmou em depoimento que recursos foram enviados após a morte de Celso Daniel
Condenado no STF por
operar o mensalão, o empresário Marcos Valério relatou em depoimento dado em
setembro à Procuradoria-Geral da República que recursos do esquema foram
enviados a Santo André após o assassinato do prefeito Celso Daniel (PT),
ocorrido em janeiro de 2002. Valério disse que o dinheiro serviu para estancar
supostas ameaças e chantagens a petistas, informam Ricardo Brito e Fausto
Macedo. Segundo a revista Veja, o empresário Ronan Maria Pinto ameaçava revelar
o envolvimento do ex-presidente Lula e do ministro-chefe da Secretaria-Geral da
Presidência, Gilberto Carvalho, no esquema. Carvalho, que foi secretário
municipal em Santo André de 1997 a 2001, informou, por intermédio de nota da
secretaria-geral, que "nunca teve conhecimento de qualquer ameaça ou
chantagem" a respeito de seu suposto envolvimento em pedidos de propinas
durante a administração de Celso Daniel.
Valério disse em
depoimento que pagou para cessar chantagens em Santo André
O operador. Empresário condenado pelo Supremo afirmou à Procuradoria-Geral,
em setembro, ter repassado dinheiro a pessoas que ameaçavam dizer que Lula e
seu assessor Gilberto Carvalho estariam envolvidos num suposto esquema de
propina na cidade
Ricardo Brito, Fausto Macedo
No depoimento prestado em setembro ao Ministério Público Federal, o
empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, condenado no Supremo por operar o
mensalão, relatou que recursos do esquema foram enviados a Santo André após o
assassinato do prefeito Celso Daniel (PT), ocorrido em janeiro de 2002. Valério
disse, segundo investigadores que tiveram acesso ao depoimento sigiloso, que o
dinheiro serviu para estancar supostas ameaças e chantagens a petistas.
Em sua edição desta semana, a revista Veja informa que Valério foi procurado
em 2003 pelo então secretário-geral do PT, Silvio Pereira, a fim de que desse
dinheiro ao empresário de ônibus Ronan Maria Pinto. Ronan, como é conhecido,
estaria, segundo o petista, ameaçando dizer em público que o então presidente
Luiz Inácio Lula da Silva e seu principal assessor, o hoje ministro da
Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, seriam os beneficiários do
esquema de desvio de dinheiro público da prefeitura de Santo André.
O dinheiro do valerioduto, portanto, serviria para calar Ronan num momento
em que o Ministério Público Estadual ligava o esquema de propina ao assassinato
de Daniel, ocorrido um ano antes. Os promotores alegavam que o prefeito tentou
acabar com o esquema de desvios de verba pública na cidade do ABC e, por isso,
acabou assassinado. "Nisso aí eu não me meto", teria dito Valério a
Silvo Pereira, ainda segundo o relato da revista.
Porém, no depoimento espontâneo prestado em setembro, Valério afirmou, conforme
investigadores ligados ao caso, que repassou o dinheiro para que pessoas
cessassem as ameaças e as chantagens a integrantes do PT.
Valério, condenado a mais de 40 anos no STF, tenta com o novo depoimento,
cuja existência foi revelada na quinta-feira pelo Estado, e com promessas de
mais declarações reduzir sua pena ou até mesmo se livrar da cadeia, caso seja
incluído no programa de proteção a testemunhas.
A aposta de Valério para obter o benefício da delação premiada e sua
inclusão no programa de proteção a testemunhas é dizer que o esquema de desvio
de verbas públicas do governo Lula não serviu apenas para pagar parlamentares
do Congresso Nacional. O envio do dinheiro a Santo André seria um exemplo
disso.
Ações. A corrupção na gestão Celso Daniel é alvo de ações civis e criminais
que tramitam no Fórum de Santo André. Carvalho foi citado em um desses
processos, com base na Lei de Improbidade. Ronan também é acusado de ligações
com o suposto esquema.
O Grupo de Repressão ao Crime Organizado concluiu que o operador do esquema
era o empresário Sérgio Gomes, o Sombra. Para os promotores, Sombra encomendou
o assassinato de Daniel porque este decidiu dar um fim na coleta de propinas
quando descobriu que o dinheiro arrecadado não ia para o caixa do PT, mas servia
para enriquecimento pessoal de integrantes da organização. Sombra ainda não foi
julgado. Ele nega envolvimento.
Durante as investigações, o Ministério Público tomou o depoimento do médico
João Francisco Daniel, irmão de Celso, que fez as primeiras revelações
envolvendo dirigentes do PT.
Em maio de 2002, João Francisco afirmou que Carvalho contou a ele que levava
parcelas do dinheiro desviado diretamente para as mãos de José Dirceu, então
presidente do partido e deputado federal, hoje condenado por comandar o
mensalão.
Na ocasião, o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Luiz Antonio Marrey,
pediu ao chefe do Ministério Público Federal, Geraldo Brindeiro, que
representasse ao Supremo para que fosse autorizada abertura de inquérito
destinado a investigar Dirceu.
Ministro do STF à época, Nelson Jobim decretou o arquivamento do pedido sob
argumento de que "por ouvir dizer" não seria possível autorizar
inquérito. "Há que se exigir consistência nos indícios, o que não se
verificou neste caso. O processo democrático é incompatível com o
denuncismo." Dirceu declarou que não temia nenhuma investigação a respeito
do caso.
"Foi uma frustração muito grande para o Ministério Público porque a
decisão (de Jobim) matou na raiz uma apuração extremamente importante", disse
um promotor que fez parte da força tarefa para desvendar os meandros da trama
de Santo André. "O trânsito de dinheiro para Brasília ficou muito claro
para nós. Evidente que devia ter sido investigado."
Crime comum. A Polícia Civil paulista concluiu que Celso Daniel foi vítima
de criminosos comuns que o sequestraram para pedir resgate em dinheiro.
O promotor de Justiça Marcio Friggi tem sustentado perante o Tribunal do
Júri de Itapecerica da Serra - onde estão sendo julgados os executores de
Daniel - que o prefeito foi fuzilado por "encomenda mediante paga".
Quatro assassinos já foram condenados pela Justiça. Na véspera de um desses
julgamentos, em maio passado, o promotor afirmou: "O prefeito conhecia o
esquema de dinheiro para o caixa 2 de seu partido, para beneficiar o PT nas
eleições, inclusive para a campanha do presidente Lula naquele ano de
2002".
Fonte: O Estado de S. Paulo