- Nas entrelinhas | Correio Braziliense
Bolsonaro não esconde seu desacordo com as medidas de “distanciamento social”, mas finalmente considerou o país em “estado de calamidade pública”
O presidente Jair Bolsonaro finalmente se deu conta de que os vírus são mais teimosos do que ele próprio. Ontem pela manhã, em entrevista à Rádio Tupi, o presidente da República criticou os governadores por adotarem medidas para evitar aglomerações, o que classificou de “histeria”. No final do dia, declarou “estado de calamidade pública” em todo o país e pediu ao Congresso a aprovação da medida. Vírus são parasitas intracelulares obrigatórios (característica que os impede de serem considerados seres vivos), dependem de células para se multiplicarem. Diferentemente dos organismos vivos, são incapazes de crescer em tamanho e de se dividir. Porém, uma vez dentro da célula, a capacidade de replicação dos vírus é surpreendente: um único exemplar é capaz de multiplicar, em poucas horas, milhares de novos vírus. Não foi à toa que apenas um dos 30 infectados na Coreia do Sul foi o responsável pela transmissão da epidemia que atingiu 196 mil pessoas.
Os vírus são capazes de infectar todos os seres vivos de todos os domínios e representam a maior diversidade biológica do planeta, sendo mais diversos que bactérias, plantas, fungos e animais juntos. Desde o século XIX, cientistas travam uma batalha silenciosa contra os vírus, iniciada por Louis Pasteur, com a teoria microbiana das doenças, que teve um grande avanço quando o microbiologista Charles Chamberland, em 1884, conseguiu filtrar as bactérias. Coube ao microbiologista Martinus Beijerinck, em 1898, identificar pela primeira vez um contagium vivum fluidum (fluido vivo contagioso).Ele introduziu o termo ‘vírus’ para indicar que o agente causal da doença do mosaico do tabaco não tinha uma natureza bacteriana, e sua descoberta é considerada como o marco inicial da virologia.
A partir daí vieram as grandes descobertas: Em 1898, o vírus da febre aftosa (Aphtovirus; em 1901, Walter Reed identificou o primeiro vírus humano, o vírus da febre amarela (Flavivirus). Em 1908, Vilhelm Ellerman e Olaf Bang demonstraram o vírus da leucose aviária. E em 1911, Peyton Rous transmitiu o vírus do sarcoma de Rous de uma galinha para outra. Em 1915, o bacteriologista Frederick William Twort observou que as colônias morriam e que o agente dessa transformação era infeccioso. Em 1937, Max Theiler cultivou o vírus da febre amarela em ovos de galinha e desenvolveu uma vacina a partir de uma estirpe do vírus atenuado.
Em 1949, John Franklin Enders, Thomas Weller e Frederick Robbins cultivaram o vírus da poliomielite em culturas de células embrionárias humanas, o primeiro vírus a ser cultivado sem a utilização de tecido animal sólido ou ovos Este método permitiu a Jonas Salk desenvolver uma vacina eficaz contra a poliomielite.Mas somente após a segunda metade do século XX. a luta contra os vírus ganhou escala: foram reconhecidas mais de 2000 novas espécies de vírus de animais, plantas e bactérias. Em 1957, descobriu-se o arterivírus equino e o vírus da diarreia bovina (um pestivírus). Em 1963, Baruch Blumberg descobriu o vírus da hepatite B, e em 1965, Howard Temin descreveu o primeiro retrovírus. A transcriptase reversa, que é a enzima fundamental dos retrovírus, foi descrita em 1970, por Howard Martin Temin e David Baltimore. Em 1983, a equipe de Luc Montagnier do Instituto Pasteur, na França, isolou pela primeira vez o retrovírus que hoje conhecemos por HIV, ou seja, o vírus da AIDS.