Folha de S. Paulo
No que estava a seu alcance, atenuar altas de
dólar e juros, presidente deu tiros no pé
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva
deu de falar do preço do ovo. Faz um mês, o
governo diz que vai tomar providências a fim de conter a alta do preço dos
alimentos. Não fez nada a respeito, até porque não tem quase nada a fazer.
No que pode fazer, evitar sobressaltos no
dólar ou nos juros,
falhou, quando não deu tiros no pé. Dólar caro encarece alimentos. Juros altos
causam problemas de amplo espectro. Até mesmo interrompem a concessão adicional
de crédito
subsidiado pelo Tesouro para agricultores, como se soube nesta quinta.
No meio do sururu dos alimentos, vem ainda mais essa. A oposição e a direita vão fazer festa.
Lula talvez acredite que, falando, demonstre
solidariedade com as dores do povo, com o que perderia menos pontos nas
pesquisas de opinião. Pode ser, por outro lado, que crie apenas expectativas
irrealistas e, pois, mais frustração quanto à carestia de ovo, gasolina, diesel, óleo de
soja etc.
Quem sabe conte com a sorte. Com um dólar
mais ameno e com a provável grande safra, poderia surfar em uma possível onda
minguante de preços.
Lula parece desnorteado e boa parte do
governo também. Nem é de hoje. Vide a frustração com o desempenho ou com o
efeito político prático das ações na saúde, na segurança ou na energia
elétrica. Lula 3 não tinha plano ou lideranças capazes de fazer reformas e dar
conta de gargalos maiores nesses setores —tanto que a coisa não andou ou deu
com os burros n’água.
Lula acredita mesmo nas fantasias
intervencionistas?
A carestia do ovo ainda nem começou no
varejo, na média. Desde que Lula assumiu, o preço do ovo caiu 1%. Nos últimos
12 meses, até janeiro, baixou quase 2%. A encrenca deve começar agora. O preço
subiu, no atacado, pois a produtividade das galinhas cai com o calorão e, além
do mais, milho e soja ficaram mais caros, também por causa do dólar. Frangos e
galinha são milho ambulante. Não há "Ovos para Todos" que resolva o
problema, no curto prazo.
O óleo de soja ficou 25% mais caro nos
últimos 12 meses, outra preocupação de Lula. Ficou mais caro porque a safra de
soja de 2023/2024 foi menor, porque o dólar ficou mais caro, um tantinho mais
por causa de compras extras da China e, efeito pequeno, por causa do biodiesel.
Dia sim, dia não, Lula diz que vai
"conversar" com empresários. Agora, quer "abrasileirar" os
preços, quer que o dólar não tenha efeito em custos e preços de insumos e
alimentos. Quer um tabelamento voluntário, enfim —não vai dar certo, como o
tabelamento obrigatório. Quanto a combustíveis, começou a atacar
"atravessadores", uma demagogia velhíssima e, no Brasil, esquecida
desde o Real.
Em casos extremos, pode haver medidas
extremas (compras públicas excepcionais, racionamentos, tabelamentos): no caso
de guerra, fomes abruptas. Mudanças na agropecuária dependem de políticas de
prazo médio a longo, de pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico,
crédito, assistência técnica, infraestrutura, logística, impostos, uso da
terra.
O que temos quanto a isso, sob Lula 3? Não
temos.
No curto prazo, um ano, por aí, o que dá para
fazer é não criar problema. Isto é, ter uma política macroeconômica razoável e
um governo que não crie instabilidades outras, de modo a não provocar saltos
nas taxas de juros e de câmbio (o "preço do dólar").
Quanto a isso, Lula deu tiros no pé mesmo
antes do começo do terceiro mandato.
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