Folha de S. Paulo
Mais um Carnaval se aproxima e Bolsonaro não está preso
A fala do ministro da Defesa, tolerante à
tentativa de golpe, não é aleatória.
Múcio é mamulengo e bolsonarista. Defendia os
acampamentos patrocinados pelo Exército golpista do Brasil. Mais do que isso,
tinha "parentes" acampados. Lula escolheu Múcio porque, quando trata
de militares, é pelego e inseguro.
Há uma operação política e jurídica para
repaginar a figura repugnante e mesquinha de Jair
Bolsonaro.
O presidente insensível e criminoso que em 2021 reclamava de "frescura", "mimimi" e "choradeira" do país diante de centenas de milhares de mortes causadas pela pandemia, derrama lágrimas ao se declarar perseguido por Alexandre de Moraes e de se revelar vítima de terríveis nulidades.
Múcio participa do ilusionismo farsante ao
conferir a Bolsonaro a aparente grandeza de ter colaborado para a transição do
governo eleito no meio militar e por reforçar a ideia de anistia. Múcio
falsifica a realidade: Bolsonaro não reconhecia a derrota, disseminava a
desconfiança no processo eleitoral, conspirava contra as instituições
democráticas e apostava na bagunça de caminhoneiros e acampados para criar
condições de golpe.
A participação e a cegueira deliberada de
Bolsonaro são cristalinas. A história da tentativa de golpe não se resume aos
acontecimentos de 8 de janeiro de 2023 e talvez não se encerre nesta data.
A expressão da língua inglesa "work in
progress", disseminada pelos universos empresarial e artístico para
designar processos produtivos e criativos em andamento, aplica-se, também, a
conceito mais contemporâneo de golpe de Estado. Muito além da antiga
quartelada, as rupturas institucionais são programadas para acontecer aos
poucos, sorrateiramente e com disfarces jurídicos.
O golpe de Estado não se consumou, entre
outros motivos, porque o governo dos Estados Unidos sinalizou expressamente
para o comado das Forças Armadas que não aceitaria a planejada ruptura
institucional. Por isso, os militares, acovardados, não embarcaram na aventura
de Bolsonaro. As oportunidades se perderam, mas não há dúvida, as Forças
Armadas são instalações incubadoras de golpistas.
Em 2025, a conjuntura se altera e nova ordem
mundial se instala. Donald Trump, sem oposição interna, tem demonstrado
arrogância, truculência e desprezo por valores éticos e democráticos.
As ameaças contra Canadá, Groenlândia,
Panamá, África do Sul, Tribunal Penal Internacional, a retirada dos EUA da
Organização Mundial da Saúde e do Conselho dos Direitos Humanos da ONU e o
projeto insano de promover o deslocamento forçado dos palestinos da faixa de
Gaza, crime contra a humanidade, são indicações de que eventual movimento
golpista para restaurar a democracia no Brasil, supostamente afetada por ação
"autoritária" do STF e desatinos de governo "esquerdista",
contaria com apoio entusiasmado de Trump e seu sócio Elon Musk –que,
registre-se, diz que o governo Biden financiou a vitória de Lula.
Tarcísio de Freitas, "longa manus"
de Bolsonaro, é outro ridículo ventríloquo do "Make America Great
Again".
Muitos dirão que se trata de percepção pessimista, irreal. Pode ser. O fato é que mais um Carnaval se aproxima, os bloquinhos já estão nas ruas, e Jair Bolsonaro ainda não está preso. Liberdade para conspirar.
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