domingo, 26 de janeiro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

O que aguardar dos novos líderes do Congresso

Correio Braziliense

Por enquanto, a disputa para a presidência das duas Casas tem como favoritos o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) e o senador Davi Alcolumbre (União-AP)

Marcada para o início de fevereiro, a eleição para as presidências da Câmara dos Deputados e do Senado Federal representa a oportunidade de continuar os avanços na aprovação de matérias relevantes para o país. Isso passa por uma melhor articulação do Executivo com o Legislativo, mas também pela adoção de um espírito público por parte dos parlamentares, particularmente no que se refere ao Orçamento da União, ainda maculado por interesses paroquiais e falta de transparência, e à regulação das redes sociais, uma lacuna permanente na realidade brasileira.

Por enquanto, a disputa para a presidência das duas Casas tem como favoritos o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) e o senador Davi Alcolumbre (União-AP). Ambos acumulam um bom trânsito entre os pares, o que explica por que despontaram, com meses de antecedência, como os prováveis sucessores de Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), respectivamente. Tanto governo quanto oposição estão a calcular o melhor posicionamento nesta troca de turno no Legislativo, com impacto não apenas na votação de matérias de interesse de diversos setores da sociedade, mas também na correlação das forças políticas em Brasília.

Política de frente em tempo de crise - Luiz Sérgio Henriques

O Estado de S. Paulo

A atual crise múltipla requer bem mais do que vitórias eleitorais, ainda que imprescindíveis. Trata-se de reorientar valores e comportamentos

Quando a palavra “fascismo” escapa ao vocabulário militante e encontra guarida entre especialistas, é porque nos encontramos numa época repleta de graves ameaças e possibilidades de involução. Não por acaso, então, começa-se a falar de aliança entre forças rivais, que concordam em suspender provisoriamente suas diferenças diante do que veem como perigo maior. Nos anos 1930, correntes significativas – socialistas, comunistas, liberais, conservadores – aos poucos teceram uma complexa ação unitária para fazer face ao fascismo em marcha aparentemente irresistível.

Nasceram assim as frentes populares, cujo eco ainda reverbera e mobiliza corações e mentes, sem necessariamente ter o ar de coisa antiga. O nouveau front populaire, por exemplo, é um fato da política francesa atual, cujo sentido maior, em tese, só pode ser o de ajudar a estabelecer o cordão sanitário em torno da extrema direita em curso de “normalização” – e se não o fizer, terá contribuído para agravar o drama em curso. Bem antes, na Espanha ou na Itália, e até no Brasil, frentes antifascistas se estabeleceram com resultados muito diferentes. Entre nós, uma promissora “aliança nacional libertadora”, orientada inicialmente para a política de massas, cedeu ao vezo insurrecional, levando ao desastre de 1935 e abrindo espaço para o Estado Novo varguista.

Obstáculos no caminho - Merval Pereira

O Globo

Os erros do governo, e são muitos nesse terceiro mandato de Lula, são aproveitados para neutralizar até mesmo as medidas mais inovadoras e promissoras

O ministro Rui Costa pode pelo menos se consolar de não ter sido, na história, o primeiro - nem será o último - a ser vítima de uma frase que não disse. À rainha Maria Antonieta é atribuída a frase “se não têm pão, comam brioches” como reação à falta de comida para a população pobre do reino, mas historiadores modernos garantem que é improvável que a tenha dito, embora fosse perdulária e ostentatória. Mas tinha uma relação caridosa com os pobres.

Também o ministro, ao sugerir que, por estar a laranja muito cara, que as pessoas escolham outra fruta para comer, não deve ter tido a intenção de menosprezar os consumidores de laranja, nem pensou nos brioches de Maria Antonieta, como acusam os adversários políticos. Mas a frase do ministro, e um outro escorregão quando falou em “intervenção” nos preços dos alimentos, dando margem a que acusassem o governo de querer tabelar preços, mostram bem como é difícil a vida de um governante que tem na sua cola uma oposição afiada.

Quando “a direita” era o PSDB, o PT tinha uma vida boa, pois nem os tucanos eram direitistas, muito menos de extrema-direita, como a oposição ainda era elegante, embora o governo petista não poupasse as críticas a uma suposta “herança maldita”. Agora, os erros do governo, e são muitos nesse terceiro mandato de Lula, são aproveitados para neutralizar até mesmo as medidas mais inovadoras e promissoras, como o programa Pé-de-Meia do Ministério da Educação.

Entre picanha e salsicha, o marketing reverso de Lula – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O preço dos alimentos tem dinâmica própria, influenciado por oferta e demanda, clima, safra, cotações internacionais. Não existe bala de prata para derrubá-lo

Na publicidade, o marketing reverso é uma inversão de perspectivas. O processo mais comum e tradicional é a busca da atenção e dos recursos dos consumidores. O marketing reverso faz com que o consumidor passe a procurar pelo serviço e/ou produto oferecido de forma mais orgânica. É uma estratégia menos invasiva e agressiva, mas, às vezes, dá errado.

presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um comunicador nato e voltou ao poder com uma narrativa ancorada nos seus dois mandatos anteriores. Um dos motes de sua campanha foi uma espécie de marketing reverso: a esperança dos pobres de que voltariam a comer picanha no churrasco do fim de semana.

Governo num mato sem cachorro - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Alimentos: sem intervenção, sem subsídio ou mudança na data de validade e... sem solução

Enfrentando várias frentes de batalha por causa da inflação dos alimentos, o governo Lula conseguiu vencer a primeira, ao impedir que a onda contra “um conjunto de intervenções” virasse tsunami, como no caso do Pix. Mas a guerra continua, e em terrenos mais pantanosos: como reduzir os preços e dar uma resposta principalmente para a baixa renda, sem bater de frente com o mercado e o já arisco agronegócio?

Sidônio Palmeira reagiu rapidamente a uma palavra maldita usada pelo chefe da Casa Civil, Rui Costa, ao anunciar “intervenções” contra a inflação da comida. “Intervenção” remete a “boi no pasto”, “fiscais do Sarney”, “congelamento” e seus efeitos bumerangue nos objetivos, na economia e na popularidade dos invencionistas.

Inflação é mistura na comida caseira - Rolf Kuntz

O Estado de S. Paulo

Em países como o Brasil, onde as desigualdades são amplas e a alimentação pesa muito no orçamento familiar, a importância política dos preços agrícolas é especialmente grande

No país do feijão com arroz, comer em casa ficou 8,23% mais caro, no ano passado, enquanto o custo de vida subiu em média 5,08%, de acordo com a inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). As mais prejudicadas foram obviamente as famílias de baixa renda, aquelas com maior gasto proporcional em alimentação. Comida mais cara significa menos dinheiro para blusinhas, para um fim de semana mais divertido ou até para o material escolar das crianças, um dos desafios do começo de ano. Para o presidente da República, empenhado na reeleição ou no apoio a um sucessor, inflação acima do teto da meta tende a ser um alerta de emergência.

O alerta soou, nos últimos dias. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva logo reagiu, discutindo medidas para conter os preços e garantir um boa produção neste ano. A resposta seria mais simples, mais pronta e mais eficaz se o governo tivesse estoques para abastecer o mercado. Cuidar da nova safra seria o passo seguinte, dentro da rotina de uma política agrícola normal. Mas essa política tem sido, há alguns anos, bem menos “normal” do que havia sido nas últimas quatro ou cinco décadas.

'Arte cívica' - Dorrit Harazim

O Globo

Trump deu 60 dias para a entidade que gerencia os prédios do governo alinhar a arquitetura oficial aos princípios ‘clássicos’

O último ato do bota-fora de um ocupante da Casa Branca costuma se dar no Salão Oval da Presidência. Ele precisa ser rápido, bem ensaiado e cronometrado. Não foi diferente na segunda-feira 20 de janeiro de 2025, dia da posse de Donald Trump. Faltando menos de duas horas para o juramento do novo mandatário no Capitólio, com Joe Biden ainda perambulando pela residência, o troca-troca de móveis, tapetes, porta-retratos e adereços seguiu marcha célere. Foi dali, sentado na maciça Resolute Desk, presente da Rainha Vitória, que Trump daria sequência, naquela noite, à cinematográfica assinatura de seus quase cem decretos iniciais.

Um ensaio fotográfico divulgado horas depois da posse pelo Wall Street Journal revelou as mudanças mais óbvias. De volta ao Salão Oval estão algumas das peças defenestradas por Biden quando sucedeu a Trump quatro anos atrás. Entre elas, as três imensas bandeiras das armas militares, um lugar de honra para seu ídolo Andrew Jackson (o sétimo presidente americano, que dizia “Nasci para a tempestade, a calmaria não me cai bem”), a popular escultura de bronze de um caubói domando sua montaria, “Bronco Buster”, de Frederic Remington. De serventia mais imediata, foi ressuscitada também a famosa caixa de madeira com campainha, que Trump aciona quando quer mais uma Diet Coke. Saíram de cena o gigantesco retrato do democrata Franklin D. Roosevelt e o busto do líder trabalhista chicano César Chávez.

A primeira delação de Mauro Cid – Elio Gaspari

O Globo

Em seu primeiro depoimento sobre planos golpistas, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro implicou ex-primeira-dama Michelle em ala mais radical

O ministro Alexandre de Moraes mantém sob sigilo os depoimentos do tenente-coronel Mauro Cid na sua colaboração premiada para a investigação dos planos golpistas de 2022/2023. São mais de dez depoimentos. Veio à tona o primeiro, de 28 de agosto de 2023. Tem seis páginas, algum método e menciona mais de 20 pessoas.

Segundo Cid, depois da vitória de Lula, três grupos gravitavam em torno de Jair Bolsonaro.

O primeiro queria que ele mandasse as pessoas para suas casas, tornando-se o grande líder da oposição. Nesse núcleo estavam o senador Flávio Bolsonaro, o chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, o advogado-geral da União, Bruno Bianco, e o brigadeiro Baptista Júnior, comandante da Força Aérea.

O segundo grupo, ainda mais moderado, dizia que “nada poderia ser feito diante do resultado das eleições”. Uma virada de mesa “representaria um regime militar por mais 20, 30 anos”. Temiam que radicais levassem Bolsonaro a “assinar uma ‘doideira’”. Nele, segundo Cid, estavam os generais Freire Gomes (comandante do Exército), Paulo Sérgio Nogueira (ministro da Defesa) e Júlio César de Arruda.

Entre Davos e a COP30 - George Gurgel*

O Papa Francisco, em fala recente, dias depois da posse do Presidente Donald Trump, chamou atenção para o fato de que todos nós somos imigrantes. Tão oportuna declaração nos leva a refletir sobre uma maior responsabilidade e compromisso de cada ser humano, das nossas Organizações Multilaterais, a exemplo da ONU, FMI, Banco Mundial e das Organizações Mundiais da Sociedade Civil; assim como dos EUA, da Europa, da China e da Rússia - principais economias mundiais, responsáveis pela maior geração dos gases de efeito estufa no planeta – devem implementar medidas efetivas que minimizem as causas e os efeitos das mudanças climáticas ora em curso, atingindo as populações e os ecossistemas do planeta.

No entanto, as declarações e os decretos assinados no início do segundo governo do presidente dos EUA, Donald Trump, não são alvissareiros. Afrontam acordos internacionais, descomprometem o governo americano com o Acordo de Paris e com a Organização Mundial de Saúde; reorientam a economia americana para a produção e consumo de petróleo; além de declarações preocupantes em relação à autodeterminação do Canadá, do México, do Panamá e da Groelândia, diante de um complexo e beligerante cenário internacional, que tem os EUA, Israel, Palestina, China, Rússia, União Européia e os Brics, como atores relevantes.

40 anos de democracia e economia ruim - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Vivemos a ilusão de que em um momento milagroso voltaríamos à terra prometida do crescimento veloz

Em março, vai fazer 40 anos que acabou a ditadura militar. O Brasil não voltou a crescer como se vira na maior parte do século 20.

Dada a experiência dos países que se industrializaram mais na base da força bruta, como nós, e considerados os poucos casos de nações que conseguirem escapar da renda medíocre, não somos caso assim lá extravagante. Atualmente, o Brasil figura lá pelo meião do ranking mundial da renda (PIB) per capita.

Como os dados do crescimento anterior à Segunda Guerra estão sob debate, considere-se o período seguinte. A renda (PIB) per capita dobrou de 1945 a 1961, por aí. Dobrou de novo de 1961 a 1977. Desde então, até 2023, cresceu pouco mais de 60%.

O inferno astral de Haddad - Catia Seabra

Folha de S. Paulo

Adeptos da astrologia podem até enxergar na queda do dólar um sinal de desanuviamento para o novo ano

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, completa 62 anos neste sábado, 25 de janeiro. E o mês que antecedeu seu aniversário faz jus ao conceito popular de inferno astral.

A disseminação de informação falsa sobre taxação de operações via Pix, a partir de uma norma da Receita Federal, abalou o governo e a imagem do ministro. Foi obrigado a recuar.

Às vésperas do aniversário, Haddad foi repreendido, interna e publicamente, pelo presidente Lula (PT), que também cobra dele medidas para redução do preço dos alimentos.

Nomeado em janeiro, o novo chefe da Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência), Sidônio Palmeira, chegou ao Palácio do Planalto como mais um conselheiro de Lula em matéria econômica.

O Reich do Silício - Celso Rocha de Barros

Folha de S. Paulo

O que parecia exagero retórico em 2014 já não é mais o caso

A expressão "Reich do Silício" foi criada pelo jornalista Corey Pein em um texto publicado no site The Baffler sobre ideias autoritárias que começavam a fazer sucesso no Vale do Silício. Em 2014, quando o artigo saiu, parecia um exagero retórico para criar um bom título.

Não é mais o caso.

Elon Musk, o homem mais rico do mundo, aproveitou a posse de Donald Trump, o homem mais poderoso do mundo, para anunciar sua adesão às ideias da extrema direita europeia dos anos 30.

Só há uma interpretação possível para a saudação de Musk, e é a óbvia. Se você discorda, repita o gesto dentro de uma Sinagoga e veja se alguém não entende do que se trata.

Mas Musk não era o único representante do Reich do Silício na posse de Trump. Como mostrou Patrícia Campos Mello em matéria publicada nesta Folha em 24 de agosto, o novo vice-presidente americano, J.D. Vance, é um entusiasta das ideias autoritárias que prosperaram entre os bilionários da tecnologia.

A invenção do bem e do mal - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Livro combina ciência e filosofia para fazer uma genealogia de instinto moral dos humanos

Gostei de "The Invention of Good and Evil" (a invenção do bem e do mal), de Hanno Sauer. O livro é, literalmente, uma genealogia da moral. O autor combina conhecimentos de vários campos da ciência com filosofia, a sua área de atuação, para nos contar como o instinto moral surgiu em nossa espécie e se desenvolveu.

Sauer começa bem no começo, 5 milhões de anos atrás, quando, por alguma razão geológica, nossos ancestrais se viram sem a proteção de uma frondosa cobertura vegetal e se tornaram muito mais vulneráveis a predadores do que os primos chimpanzés.

Trocando história por histeria - Muniz Sodré

Folha de S. Paulo

Mediado por cultos, o deslocamento dessa afecção patológica para o campo político alojou-se na extrema direita

Passou sem comentários o diagnóstico de histeria, por um ministro do STF, sobre os atos extremistas que culminaram no ataque golpista do 8/1. Referia-se não só às depredações, mas ao desconexo comportamento de massa que oscilava entre orações a pneus de caminhão, marchas patéticas e fragmentos verbais sem contexto.

É provável que a desatenção se deva ao juízo estranho a padrões jurídicos. Magistrados não trafegam na via psiquiátrica. Fato, porém, é que o conceito de histeria perdeu exclusividade freudiana, emigrando para reapropriações no campo socioestético, designáveis como "histeresia". Em "Histeria na Mídia", Raquel Paiva aplica com propriedade essa ideia ao discurso compulsivo e redundante da mídia. Uma visão próxima à análise existencial que demonstra o caráter secundário e inautêntico do falatório (Heidegger).

Histeria é doença da representação, afetada pela repressão sexual.

Teatro pervertido das proibições introjetadas, o corpo é compelido a exibir-se por fala e atuações. Em formas convulsivas se registram possessões ditas "demoníacas". Há relatos de letramentos obscenos esculpidos por sintomas na pele de internas em conventos europeus. Matéria-prima para bispos e Hollywood.

Graziela Melo* - A prisão

Dois de setembro de 1970. Dia terrível. Fatídico. Inesquecível. A essas alturas de nossas vidas já havíamos nos mudado cinco vezes em pouquíssimo tempo. A cada suspeita ou medo de sermos descobertos, nos arrancávamos carregando, além dos filhos, pouquíssima coisa, deixando para trás as estruturas das casas montadas. Carregar mudança era um risco que não se podia correr. Era fornecer nosso roteiro para os olheiros de plantão, tanto da polícia como do Exército. A tensão era tal que contraí uma ulcera. Tensão essa que aumentou quando comecei a desconfiar que estava sendo seguida. No bondinho de Santa Teresa, ao meu lado, sentara um sujeito. Tive a nítida impressão de já tê-lo visto em alguma parte. Desci no meu ponto na Almirante Alexandrino. Ele seguiu. Na outra noite quando desci, às 7h da noite, aproximadamente, lá estava ele no nosso portão. Às 6 horas da manhã do dia seguinte a campainha toca com muita estridência. Eu sabia que eram eles. Tinha certeza. Gilvan acordou assustado. Fui até a porta. Abri o postigo. Pelos vazios entre as grades colocaram uma arma em meu peito. “Abre ou eu atiro”. Não abri. Estranha reação de uma mulher tímida quando se sente na obrigação de proteger. Não cedi a pressão que continuou abre ou atiro, abre ou atiro.

Poesia | João Cabral de Melo Neto - Alguns Toureiros (por ele mesmo)

 

Música | Milton Nascimento e Alaíde Costa - Me deixa em paz