quarta-feira, 26 de novembro de 2025

Opinião do dia – Karl Marx* (Eleições)

“Não se considera a eleição filosoficamente, quer dizer, em sua essência peculiar, quando ela é compreendida imediatamente em relação ao poder soberano ou ao poder governamental. A eleição é a relação real da sociedade civil real com a sociedade civil do poder legislativo, com o elemento representativo. Ou seja, a eleição é a relação imediata, direta, não meramente representativa, mas real, da sociedade civil com o Estado político.

É evidente, por isso, que a eleição constitui o interesse político fundamental da sociedade civil real. É somente na eleição ilimitada, tanto ativa quanto passiva, que a sociedade civil se eleva realmente à abstração de si mesma, à existência política como sua verdadeira existência universal, essencial. Mas o acabamento dessa abstração é imediatamente a superação da abstração.

Quando a sociedade civil pôs sua existência política realmente como sua verdadeira  existência, pôs concomitantemente como inessencial sua existência social, em sua diferença com a sua existência política, e com uma das partes separadas cai a outra, o seu contrário. A reforma eleitoral é, portanto, no interior do Estado político abstrato, a exigência de sua dissolução, mas igualmente da dissolução da sociedade civil.

Encontraremos, mais tarde, a questão da reforma eleitoral sob uma outra forma, isto é, o aspecto dos interesses. Do mesmo modo, discutiremos os outros conflitos, que derivam da dupla determinação do poder legislativo (de ser, de um lado, deputado, mandatário da sociedade civil e, do outro, simplesmente sua existência política, e uma peculiar existência dentro do formalismo político do Estado). “

*Karl Marx (1818-1883), ‘Critica da filosofia do direito de Hegel’, p.135. Boitempo Editorial, São Paulo, 2005.

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Placas tectônicas sob o conflito entre governo e Congresso

Por Folha de S. Paulo

Orçamento, inclinação do centrão por Tarcísio, impopularidade de Lula e coalizão frágil permeiam choques

Mesmo desgastado, Lula pode ser reeleito e precisar do Congresso para reformas difíceis e imprescindíveis que estão sendo adiadas

Atritos e tensões entre Palácio do Planalto e Congresso Nacional são comuns no presidencialismo brasileiro, dadas as dificuldades em gerir coalizões num sistema político fragmentado em mais de duas dezenas de partidos de escasso conteúdo programático. Entretanto há motivos para crer que hoje esteja em curso algo além das velhas barganhas por cargos e verbas.

Já seria digno de nota o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estar em conflito, simultaneamente e por motivos diferentes, com os presidentes da Câmara dos DeputadosHugo Motta (Republicanos-PB), e do SenadoDavi Alcolumbre (União Brasil-AP).

No primeiro caso, os petistas se enfureceram com a decisão de Motta de entregar a relatoria do projeto governista de combate a facções criminosas ao opositor Guilherme Derrite (PP), até então secretário da Segurança Pública na gestão paulista de Tarcísio de Freitas (Republicanos), potencial candidato pela direita à sucessão de Lula.

Sem espaço para viradas de mesa, por Vera Magalhães

O Globo

Brasil segue o caminho da normalidade institucional, superando cada uma das tentativas fracassadas de golpe

A família Bolsonaro reduziu dramaticamente o espaço para conseguir aquilo que vem tentando fazer pelo menos desde 2022: virar a mesa. Não foi possível evitar uma derrota eleitoral, não deu certo o plano para sustar a transmissão do poder, e também não há sinais de que se vá conseguir impedir o cumprimento da condenação do mentor de tudo isso, Jair Bolsonaro, e dos que colaboraram com ele.

O Brasil segue o caminho da normalidade institucional, superando cada uma dessas tentativas fracassadas de golpe. Depois do trânsito em julgado da condenação de Bolsonaro e dos demais integrantes do núcleo crucial da trama golpista, não houve a comoção social com que contava a ala mais radical do bolsonarismo. Pelo contrário: o que se viu foi uma execução rápida e sem espetáculo das ordens de prisão daqueles que não fugiram como Alexandre Ramagem, ou não deram indícios de que pretendiam fugir como Bolsonaro.

A direita dispensa Bolsonaro, por Elio Gaspari

O Globo

O ex-presidente virou um encosto

A direita não precisa mais de Bolsonaro. Ela lhe deve o mérito de tê-la tirado do armário, mas seus surtos transformaram-no num encosto. O patrono da cloroquina, que dizia ter “o meu Exército”, tornou-se um mau espírito encostado no velho conservadorismo nacional.

Afinal, uma direita que teve Roberto Campos, Eugênio Gudin e Castelo Branco terá perdido muito em qualidade, mas com Bolsonaro ganhou em quantidade, elegendo um presidente e grandes bancadas parlamentares. Quem tem Tarcísio de Freitas e Ronaldo Caiado governando São Paulo e Goiás produziu quadros qualificados para novos voos. Esse é o caminho da lógica, mas a direita brasileira padece de um oportunismo suicida.

Heleno no xadrez, por Bernardo Mello Franco

O Globo

Soma de destempero e desinteligência complicaram ex-ministro no julgamento do golpe

O Supremo mandou para o xadrez mais três militares de alta patente que traíram a farda e a Constituição. A estrela da companhia é o general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional. Nos tempos de glória, Jair Bolsonaro o chamava de “nosso decano”.

Heleno tem currículo. Em 1977, era ajudante de ordens do ministro do Exército que tentou dar um golpe dentro do golpe para impedir a redemocratização. Sylvio Frota foi demitido, mas seu auxiliar continuou a subir na carreira. Chefiou tropas no Haiti e na Amazônia. Só não comandou a força terrestre porque quebrou a hierarquia ao atacar o governo pela demarcação de terras indígenas.

27 dias para obter trégua e votar o que falta, por Lu Aiko Otta

Valor Econômico

Momento não poderia ser pior para a deterioração da relação do governo com o Congresso

Em termos de climão, a cerimônia de sanção da lei que eleva para R$ 5 mil o limite de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), marcada para esta quarta-feira (26), promete. Até a tarde da véspera, era incerto se o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), compareceriam.

“Boa pergunta”, reagiu um membro do governo quando questionado se os dois iriam à cerimônia. Com ou sem eles, acrescentou, haverá celebração.

É um cenário muito diferente de quando o projeto foi apresentado, em março. Naquela ocasião, Motta posou ao lado de Lula segurando o projeto. Alcolumbre foi representado pelo senador Weverton Rocha (PDT-MA), pois na mesma hora conduzia uma votação importante. Os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, iniciaram seus discursos ressaltando a presença de líderes do Congresso e falaram em aperfeiçoamentos ao texto. A proposta foi empacotada como uma parceria entre Executivo e Legislativo.

Prisão sem povo prejudica legado, por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

No dia em que Bolsonaro começou a cumprir sua pena, havia mais jornalistas que apoiadores em frente à PF

Prejudicado, pela tentativa de fuga e pelo livre acesso de médicos à sua cela, o paralelo com o ex-presidente Fernando Collor de Mello, que obteve prisão domiciliar, restou aquele da detenção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, caso que desfavorece as demandas da família e da defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro.

A começar pela interposição de embargos infringentes ou pela chance de uma revisão criminal, principal aposta da defesa. Os embargos já foram descartados pelo ministro Alexandre de Moraes com base numa decisão do ministro Edson Fachin, de 2018, referendada em plenário, que exige dois votos pela absolvição para a aceitação do instrumento. A da condenação de Bolsonaro só teve o do ministro Luiz Fux. Já a revisão está prevista no Código de Processo Penal quando surgem novas provas ou evidencia-se a falsidade dos autos. Nenhuma das condições foi preenchida até o momento.

A esquerda necessária e esgotada, por Cristovam Buarque

Correio Braziliense

Apesar de ser mais necessária do que nunca, a esquerda está perdendo por ter se tornado obsoleta ao não apresentar propostas para o futuro: em tempos digitais, manteve-se analógica

Nunca a política necessitou tanto de propostas progressistas para enfrentar os problemas de cada país e da humanidade inteira — limites ao crescimento, mudanças climáticas, desemprego estrutural, concentração de renda, manipulação de informações, poder transnacional das big techs, inteligência artificial, crime organizado, migração em massa. Apesar disso, as forças de esquerda, que deveriam ser portadoras de utopias para o futuro, estão sendo preteridas em eleições. A direita, que só chegava ao poder por meio de golpes militares, é eleita democraticamente. Apesar de necessária, a esquerda perde porque se esgotou ao não compreender o tamanho das crises e não oferecer soluções novas para os dilemas contemporâneos, em sintonia com a vontade dos eleitores.

Bolsonaro e generais presos em regime fechado são novo paradigma, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

A execução das penas ultrapassa o alcance jurídico das sentenças: é um antídoto contra a cultura de golpismo e impunidade que marcou a história republicana

A execução das penas impostas pelo Supremo Tribunal Federal ao ex-presidente Jair Bolsonaro, a três generais de Exército, a um almirante de esquadra, a um delegado da Polícia Federal e a um deputado federal foragido representa um momento de ruptura na história política brasileira. Pela primeira vez, a democracia impõe consequências reais a altas autoridades civis e militares poderosas que tentaram subverter a ordem constitucional.

Ao decretar o trânsito em julgado dos acusados de tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023 e iniciar imediatamente o cumprimento das penas, o ministro Alexandre de Moraes, rompe o padrão de leniência com o golpismo de nossa história republicana. Consolida-se o entendimento de que Estado brasileiro não tolera aventuras golpistas como parte do jogo político. A prisão de generais de quatro estrelas e de um ex-presidente, algo antes inimaginável, estabelece precedente que protege o futuro democrático do país.

O futuro do bolsonarismo sem Bolsonaro, por Vera Rosa

O Estado de S. Paulo

Centrão só quer que ex-presidente indique logo Tarcísio e pare de derreter a imagem da direita

A prisão de Jair Bolsonaro (PL) abre caminho para que a direita, enfim, comece a acertar os ponteiros sobre a disputa eleitoral de 2026. Mas como ficará o bolsonarismo sem Bolsonaro?

O Centrão não quer saber de vigília de oração, como a que foi convocada pelo senador Flávio Bolsonaro, o filho 01, nem de uma discussão sem fim sobre anistia, com potencial de irritar ainda mais o STF – Corte onde muitos estão “pendurados”.

Na prática, o grupo que sustentou o então presidente na época do orçamento secreto reza agora para que Bolsonaro indique logo, antes que perca mais capital político, quem irá ungir como seu sucessor para a disputa do ano que vem.

Pastores ainda vestem a camisa bolsonarista, mas ela agora está desbotada, por Anna Virginia Balloussier

Folha de S. Paulo

Prisão reforçou certo desânimo de liderança evangélica com ex-presidente

Com lábia de pastor, Tarcísio empolga religiosos que um dia reverenciaram Bolsonaro

A cúpula evangélica do país continua a vestir a camisa bolsonarista, mas já admite que esse tecido esgarçou. O sentimento foi reforçado pela prisão de Jair Bolsonaro (PL), sucedida por momentos descritos como constrangedores por pastores, como o vídeo em que ele fala da tentativa de abrir uma tornozeleira com ferro de solda.

Os reveses judiciais, somados à sua derrota em 2022 para Lula (PT), após uma campanha com alta voltagem messiânica, têm desanimado boa parte dos líderes que lhe fizeram juras de amor no passado.

Aquele coro barulhento de púlpitos e lives hoje soa mais tímido, até omisso. A maioria dos pastores que faziam fila para ungir Bolsonaro já prefere o silêncio calculado.

Bolsonaro preso. Novo fim ou recomeço? Por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Pena para líderes e militares do golpe é novidade neste país de autoritários e golpistas

Democracia corre perigo ao menos de degradação profunda, pois falta reforma renovadora

Um ex-presidente, Jair Bolsonaro, foi devidamente processado e condenado por tentativa de golpe; cumpre pena. Dois ex-comandantes de Força Armada, um do Exército, outro da Marinha, também, entre outros militares. É inédito. Seria um recomeço para a democracia? Ou é um novo fim de outra onda de ataque reacionário, vitória provisória?

A condenação e a prisão de comandantes militares é novidade no sentido forte da palavra "histórica" neste país de golpes impunes (todos). É ainda atrasadíssimo acerto de contas institucional, ao menos na aparência. Isto é, pareceria agora estabelecido que militares são servidores do Estado sem prerrogativa política alguma.

O Brasil venceu? Por Mariliz Pereira Jorge

Folha de S. Paulo

Prender golpistas deveria ser o básico, não o auge da democracia

A risada vem fácil porque estamos exaustos; somos um país emocionalmente quebrado

Nas redes sociais, a notícia da condenação definitiva de Jair Bolsonaro a 27 anos e a prisão de generais golpistas virou piada. Tem figurinha, montagem, dancinha, decreto de que o "Brasil venceu". Como cidadã, me peguei com um sorrisinho safado no canto da boca; como jornalista, só penso no grau de esgotamento coletivo que essa frase esconde.

Não é só o ex-presidente que sai dessa história com uma certa "confusão mental". Se Alexandre de Moraes fosse, de fato, impiedoso, aumentaria a pena pelo trauma nacional causado por ele.

Divisão na direita beneficia Lula? Por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Eleição em dois turnos reduz riscos de fragmentação de uma das alas ideológicas

Introdução de voto valorativo permitiria superar quadro de polarização cristalizada

Se a direita sair dividida para a disputa presidencial do ano que vem, o maior beneficiário será Lula? Eu subscreveria essa tese, se nosso pleito fosse decidido em turno único. Não sendo esse o caso, discrepo.

Qualquer que seja o nome do candidato da direita que passar para o segundo escrutínio, ele receberá o voto até dos bolsonaristas mais radicais que agora esperneiam e acusam traições generalizadas. É o que acaba de ocorrer no Chile. A direita saiu dividida, a esquerda chegou à frente, mas é o candidato pinochetista que desponta como favorito na disputa final, já que a soma dos votos conservadores supera com folga a dos progressistas.

As excelências estão zangadas, por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Não há mistério algum nas escaramuças dos presidentes da Câmara e do Senado com líderes petistas

Lula é candidato, enquanto Motta e Alcolumbre são de partidos que estarão em palanque adversário

Os presidentes da Câmara e do Senado trocaram de mal com dois petistas com papel de liderança do Congresso, respectivamente o deputado Lindbergh Farias, líder do PT, e o senador Jaques Wagner, líder do governo. A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT), também andaria se estranhando com Hugo Motta (Republicanos).

As alegações correntes —indicação de Guilherme Derrite (PP-SP) para relator do projeto antifacção e a escolha de Jorge Messias para o STF— explicam apenas em parte o desassossego. Não seriam motivações suficientes para zangas tão explícitas, pois ambos os atos são prerrogativas de Motta e do presidente Luiz Inácio da Silva (PT).

A dificuldade de ser crítico quando nos querem militante, por Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

Quando tudo vira militância, a independência passa a parecer traição

Democracia exige críticos livres não soldados de causa ou porta-vozes de grupos

"Você virou um perseguidor ferrenho, um crítico feroz de Lula e Dilma, quem diria? Tá difícil te seguir, fico querendo te entender, mas não consigo; parece até que tem alguma coisa por trás."

Caro leitor, confesso: eu falo mal de Lula. Falo mesmo, não nego. Não de Lula, a pessoa física que não conheço, mas de quem tenho informações de fontes seguras de ser pessoalmente adorável. Da figura pública de Lula, chefe deste Estado e do nosso governo, não apenas falo mal quando acho que devo, mas o faço com a convicção de que é isso o que honestamente devo fazer enquanto crítico de política e intelectual público.

Lá se vão mais de 30 anos como professor e pesquisador das áreas de política e democracia e mais de 15 participando da discussão pública sobre política nacional. De FHC para cá, tenho criticado cada governo com igual afinco e atenção. Assim como falei da oposição a eles, das instituições, do jornalismo político e até do ativismo. Falo até, vejam só, de ideias, princípios e valores políticos. Por que razão deveria abrir uma exceção e tratar Lula como se vestíssemos a camisa do mesmo time disputando um decisivo campeonato político e moral?

Poesia | Monotonia, de Fernando Pessoa

 

Música | Celso Viáfora e Ivan Lins - Boa nova

 

terça-feira, 25 de novembro de 2025

Opinião do dia -: Karl Marx* (Democracia)

“Hegel parte do Estado e faz do homem o Estado subjetivado; a democracia parte do homem e faz do Estado o homem subjetivado. Do mesmo modo que a religião não cria o homem, mas o homem cria a religião, assim também não é a constituição que cria o povo, mas o povo a constituição. A democracia, em um certo sentido, está para as outras formas de Estado como o cristianismo para as outras religiões. O cristianismo é a religião ’preferencialmente’, a essência da religião, o homem deificado como uma religião particular. A democracia é, assim, a essência de toda constituição política, o socializado como uma constituição particular; ela se relaciona com as demais constituições como gênero como suas espécies, mas o próprio gênero aparece, aqui, como existência e, com isso, como uma espécie particular em face das existências que não contradizem a essência. A democracia relaciona-se com todas as outras formas de Estado como com seu velho testamento. O homem não existe em razão da lei, mas a lei existe em razão do homem, é a essência humana, enquanto nas outras formas de Estado o homem é a existência legal. Tal a é a diferença fundamental da democracia. "

*Karl Marx (1818-1883), Critica da Filosofia do Direito de Hegel, p. 50. Boitempo Editorial, 2005

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Sabatina de Messias deve se concentrar no aspecto jurídico

Por O Globo

Como manda a Constituição, cabe ao Senado avaliar credenciais técnicas, deixando de lado inclinações políticas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicou o ministro Jorge Messias, advogado-geral da União, à vaga aberta no Supremo Tribunal Federal (STF) com a aposentadoria antecipada do ministro Luís Roberto Barroso há pouco mais de um mês. A despeito da demora no anúncio, não se pode dizer que tenha causado surpresa. Messias sempre foi favorito. Por mais que fosse esperada, a escolha gerou mal-estar no Senado, onde ele será sabatinado. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP), queixou-se de não ter recebido ao menos um telefonema sobre a indicação. Alcolumbre defendia o aliado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para a vaga.

O fim da farsa, por Merval Pereira

O Globo

Proximidade da eleição presidencial no ano que vem impossibilita que Executivo e Congresso continuem o simulacro de entendimento a que dedicaram esforços vãos nos tempos recentes, fingindo que temos um governo de união nacional

A proximidade da eleição presidencial no ano que vem impossibilita que Executivo e Congresso continuem o simulacro de entendimento a que dedicaram esforços vãos nos tempos recentes, fingindo que temos um governo de união nacional. Nunca se gostaram, têm ideologias distintas e, ao contrário da vitória apertada do candidato petista sobre o bolsonarismo, no Congresso a vantagem deste, aliado ao Centrão, dá larga margem vitoriosa à oposição. O rompimento quase simultâneo dos líderes governistas com os presidentes da Câmara e do Senado reflete a impossibilidade de a farsa continuar. Daqui para a frente os embates serão permanentes.

A escolha do deputado Guilherme Derrite para relator do Projeto de Lei Antifacção na Câmara explicitou a distância que separa o governo da maioria dos parlamentares, e não poderia ter sido lida de outra maneira pelo governo. Causou o rompimento do presidente Hugo Motta com o líder petista Lindbergh Farias, mas foi mais profundo que isso. O próprio presidente Lula sentiu-se traído por Motta, pois acreditava piamente conseguir lidar com os políticos do Centrão. Esqueceu, Lula, que há em jogo o controle do poder central — o que sempre interessa ao Centrão.

O ostracismo de Bolsonaro, por Míriam Leitão

O Globo

O episódio do ataque à tornozeleira deixa o ex-presidente ainda mais enfraquecido politicamente

Preso e inelegível, o ex-presidente Jair Bolsonaro está duplamente fora do jogo político. Está muito próximo o fim do prazo dos embargos e o início do cumprimento da longa pena a que foi condenado. “Os prazos conduzem a isso”, disse uma fonte sobre a perspectiva de Bolsonaro seguir da prisão preventiva para o cumprimento da pena, sem voltar à prisão domiciliar. O episódio revela um personagem que lembra o realismo fantástico latino-americano. Um ex-presidente que imaginava estar acima da lei, com uma solda na mão, insone, no meio da noite, tortura uma tornozeleira para que ela confesse ter uma escuta embutida. Preso, alega delírio persecutório.

Para esquecer o chanceler alemão, por Fernando Gabeira

O Globo

O Brasil está tranquilamente inserido no mapa dos lugares atraentes do mundo. Isso não significa que todos gostarão

Ao sair de Belém, o chanceler alemão, Friedrich Merz, disse que a comitiva do seu país ficou contente ao deixar aquele lugar. Foi um deus nos acuda; do presidente ao Senado, muitos protestos. Volto ao assunto para propor uma visão mais leve, quem sabe para ser usada numa próxima vez.

Para começar, confesso que gosto de Belém. Passo manhãs inteiras no Mercado Ver o Peso, deslumbrado com a profusão de cores e aromas dos produtos da floresta. Frequento o Museu Goeldi e sua área externa com a velha sumaúma e vitórias-régias. Gosto de comer um peixe chamado filhote, numa crosta de castanha, com risoto de jambu.

Fiz um curto documentário sobre a música, focado em Nilson Chaves, e, às vezes, me vejo cantarolando uma de suas canções: O sol da manhã rasga o céu da Amazônia /Eu olho Belém da janela do hotel.

A guerra está chegando, por Pedro Doria

O Globo

Chineses e americanos, em algum ponto, começarão a trabalhar para evitar que o outro chegue na ponta

Existe um jeito de compreender o movimento da inteligência artificial (IA), seu desenvolvimento, que explica muito da maneira como os Estados Unidos entendem a relação com a China neste governo Donald Trump. Essa maneira de compreender IA encontra eco em alguns, no Vale do Silício. Mas não todos. Independentemente disso, todos no Vale acreditam que a tese mais popular em Washington os beneficia. Então, seja por apoio sincero, seja por puro cinismo, todo mundo embarcou.

A ideia começa pela crença de que a Inteligência Artificial Geral (IAG) está a poucos anos de distância. Para os mais pessimistas, até cinco. Alguns acham que vem antes. IAG é, na definição usada por quem pensa geopolítica, um sistema de IA capaz de desempenho superior à maioria dos humanos em análise de informação, ciberataques, desenho de armas químicas e biológicas. Também na prevenção. Inteligência capaz de fazer melhor que a maioria de nós pesquisa científica, desenvolvimento de software, desenho de logística, robôs. Inovação industrial e predição financeira. E, naturalmente, persuasão, propaganda, manipulação política.

Bolsonaro preso e indicação de Messias estressam relações no Congresso, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Lula faz avaliação de que deve resistir às chantagens do Centrão, que gosta de ser tratado como governista e se comporta como oposição

A semana começa com o governo politicamente fragilizado em duas frentes simultâneas: no Senado, com a reação negativa do seu presidente, Davi Alcolumbre (União-AP), à indicação do advogado-geral da União, Jorge Messias, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o Supremo Tribunal Federal (STF); e na Câmara, cujo presidente, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), rompeu com o líder do PT, Lindbergh Faria, por causa de agendas identificadas com a oposição nas quais o Palácio do Planalto foi derrotado.

O clima está ainda mais tenso porque a prisão preventiva do ex-presidente de Jair Bolsonaro no sábado, por causa da violação de sua tornezeleira eletrônica, reanimou articulações por uma anistia e reacendeu o confronto com o Judiciário.

A escolha de Messias contrariou diretamente o presidente Davi Alcolumbre, que atuava para emplacar o nome do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Irritado com o anúncio, Alcolumbre pautou horas depois a votação de uma proposta de aposentadoria especial para agentes comunitários de saúde, considerada uma “pauta-bomba” pelo impacto fiscal. A leitura entre parlamentares foi imediata: o Senado decidiu impor custo político à decisão do Planalto.

Mudanças que blindam contra a chantagem, por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

O reforço na governança do BC impediria que o crime organizado faça uso do sistema financeiro em larga escala

Com o rompimento do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), com o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), a crise entre Congresso e governo perdeu o disfarce. Enquanto o estremecimento se restringia ao Senado, ainda se podia considerar o fator Jorge Messias, ministro da Advocacia-Geral da União escolhido para o Supremo Tribunal Federal em detrimento do preferido da Casa Legislativa que o chancela, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Com a adesão de Motta, sem ingerência sobre o mandato em questão, ficou claro que a crise extrapola o STF. A única pauta em que cabe a zanga do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP) e de Motta é aquela que mora na intersecção de duas operações da Polícia Federal, a Carbono Oculto e a Compliance Zero, que levou à prisão de Daniel Vorcaro e à liquidação do seu banco, o Master.

Fatores decisivos nas eleições de 2026, por Christopher Garman

Valor Econômico

Para antecipar o resultado das urnas será útil observar se a economia e os programas do governo podem ajudar a aprovação de Lula, e quais temas geram mais preocupação entre os eleitores

Quem será o candidato de oposição à Presidência em 2026 parece ser a pergunta que está consumindo a atenção tanto de Brasília quanto do mercado financeiro. Lideranças dos partidos de centro — e de boa parte da direita — estão em campanha aberta para que o ex-presidente Jair Bolsonaro apoie uma candidatura de Tarcísio de Freitas. Bolsonaro segue dividido entre apoiar alguém de sua própria família e o governador de São Paulo, que só disputará o Planalto com a bênção do ex-presidente. A prisão antecipada de Bolsonaro e sua saúde e seu estado emocional potencialmente mais precários tornam cada vez mais difícil antecipar qual será sua decisão.

Há um fato novo no combate ao massacre dos juros, por Pedro Cafardo

Valor Econômico

Investimentos bilionários têm sido inviabilizados por uma Selic e por spreads bancários que a CNI considera ‘bem acima da dose de remédio necessária para domar a inflação’

Mais de uma vez observou-se neste espaço que a indústria brasileira jogou contra seus próprios interesses durante décadas ao fazer lobbies (legítimos) no Congresso Nacional.

Durante um longo período, de 1996 a 2021, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) conseguiu incluir mais de 3 mil projetos no Congresso que teoricamente beneficiariam a indústria, mas que, na prática, colaboraram para a desindustrialização.

A nova Doutrina Monroe e o PT, por Rubens Barbosa

O Estado de S. Paulo

A nova atitude de Washington para com as Américas cria grandes desafios para a política externa do PT

O ministro da Guerra dos EUA chamou as Américas de “quintal dos EUA” e o presidente Trump disse que “os países da região terão de optar entre os EUA e a China”.

No início de seu mandato, o presidente dos EUA ameaçou ocupar o Canal do Panamá e renomeou o Golfo do México como Golfo da América. Nos últimos meses, medidas de força e de favorecimento, como o apoio a Javier Milei, na Argentina, têm indicado o crescente interesse de Washington sobre a região. Na semana passada, três medidas confirmaram a mudança da política e da estratégia dos EUA em relação às Américas.

‘Terrivelmente evangélicos’, por Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Não é com vigília ou uma nova toga no STF que Bolsonaro e Lula vão converter o eleitorado

Quando o presidente Lula indica Jorge Messias para o Supremo e o senador Flávio Bolsonaro convoca uma “vigília de oração” em apoio ao pai, a um ano das eleições, eles escancaram o quanto os líderes políticos e candidatos estão cada vez mais “terrivelmente evangélicos”, numa competição que tem pouco a ver com religião e muito com votos.

Como se sabe, Messias ganhou as bênçãos de Lula por ter apoio do PT e do Planalto e lealdade inquestionável ao atual presidente. Mas não foi à toa que Lula, sem dizer isso, deixou clara a escolha de Messias numa roda de orações com pastores no Planalto, onde o único convidado foi justamente ele.

Agora é Flávio, por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Jair Bolsonaro violou a tornozeleira eletrônica. Ato individual objetivo. E admitido. Meteu-lhe um ferro quente. Descumprimento de medida cautelar. Razão para que a prisão preventiva fosse decretada. A razão. A única incontroversa. Razão que é marginal na decisão de Alexandre de Moraes, merecedora de parágrafo en passant, inserido improvisadamente na sequência de um “além disso”, à décima-quarta página de um documento com dezessete. A referência à fuga do deputado Ramagem – como exemplo do “perigo da liberdade” – leva mais atenção.

O ex-presidente seria preso preventivamente no sábado ainda que com o aparelho intacto, prisão que tem como centro a convocação de vigília pelo senador Flávio Bolsonaro; e que se dá nos termos do 8 de Janeiro permanente, o fundamento mantenedor – a ameaça golpista constante – dos inquéritos xandônicos. Prisão, de Jair, que tem como agente o filho Flávio, “the next”, cujo chamamento ao “Senhor do Exércitos” para salvar o Brasil de “ladrões, bandidos e ditadores” – ação-discurso de um terceiro – materializou o descumprimento de cautelar pelo pai.

Toda a saga vivida por Jair Bolsonaro é um manual de estupidez na vida política, por João Pereira Coutinho

Folha de S. Paulo

É como se ele proclamasse 'nenhum fato me vai derrotar'

Ele teve opções, mas fatos não mudam 'cabeças blindadas'

Acompanho a saga de Jair Bolsonaro com fascínio quase filosófico: o que leva um homem a agir, de forma tão consistente, contra seus próprios interesses?

A pergunta surgiu durante o seu governo, continuou com sua reação à pandemia , aprofundou-se com a tentativa de golpe —e encontra agora um desfecho teatral com a prisão preventiva depois de tentar arrancar a tornozeleira eletrônica.

Por "curiosidade", justificou ele.

A vigília convocada pelo filho é apenas mais uma prova de que genética não perdoa.

Alguns dirão que essa tendência antecede a política e já vem dos quartéis —o que talvez autorize a piada "de soldado a soldador" que anda circulando por aí.

Mas o assunto é sério: como explicar a estupidez na política?

O tema raramente recebe a devida atenção. Hannah Arendt, em análise célebre, afirmou que Adolf Eichmann representava a "incapacidade de pensar" que define a "banalidade do mal". Eichmann seria estúpido —e sua estupidez foi instrumentalizada no Holocausto.

Reeducando Bolsonaro, por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Sistema permite abater quatro dias de pena para cada livro lido

Sugiro que ex-presidente comece seu programa de leitura por Hegel

Dentro de mais alguns diasJair Bolsonaro se tornará oficialmente um reeducando, que é como chamamos os presos com sentença condenatória que cumprem a pena que lhes foi imposta. O radical "educ" entra aí porque um dos objetivos do Estado ao punir um criminoso é reintegrá-lo à sociedade, um processo no qual a educação é variável-chave.

Não é por outra razão que o sistema prevê a remição de pena por leitura, o que significa que reeducandos podem abater quatro dias de prisão para cada livro lido, até o limite de 12 livros anuais ou 48 dias. O ano do preso bibliófilo fica um mês e meio menor.

STF virou joguete dos Poderes, por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Cadeiras no Supremo viram objetos de interesses pessoais do Executivo e arma de pressão do Legislativo

A preservação da independência e do prestígio do tribunal é ignorada no jogo rasteiro das indicações

O Supremo Tribunal Federal é um lugar sério demais para se brincar de diversidade. Ali, o jogo tampouco permite que o dono da banca se dê ao dever de observar preceitos relativos às profundidades do saber jurídico.

Tudo indica serem essas as ideias que motivam o presidente Luiz Inácio da Silva (PT) na escolha de suas indicações ao STF.

O festival de burrices e bandidagens de Bolsonaro, por Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Grande parte da classe política continua a defender o capitão preso

Colaborador do ex-presidente, Ramagem prova que a Câmara é uma mãe com golpistas

Não importa o que Jair Bolsonaro faça: uma longamente planejada ruptura da ordem democrática, enfraquecendo as instituições e valendo-se de meios violentos, ou, condenado a mais de 27 anos de prisão, um lance grotesco de bandido pé de chinelo, tentando violar a tornozeleira eletrônica.

Qualquer que seja a última burrice ou pilantragem, uma grande parcela da classe política continua sempre ao lado do capitão —por interesses eleitorais e golpismo enraizado. Tarcísio de Freitas escreveu nas redes que ele é inocente e sua prisão, injusta. Ao menos ficou ruborizado?

Coop30 - Sonhos que quase viraram pesadelos, por Aylê-Salassié Filgueiras Quintão*

Prisão de Bolsonaro, do presidente do Banco Master, dos  responsáveis  pelo assalto aos aposentados do INSS,  discussão da PEC da Bandidagem, prejuízo bilionário nos Correios, indicação, pelo mesmo  presidente, do 11o ministro do Supremo Tribunal Federal  com ligações políticas  explícitas, destaque midiático para os líderes de quadrilha presos, há anos, na Papuda, culminando o noticiário dos jornais com o comovente  assassinato, em Brasília, de uma criança de 7 anos por ciúme entre casal. Este foi  cenário  de fundo  que abrigou a trigésima  Conferência do Clima, realizada  em Belém (Pará), na última semana.