terça-feira, 23 de dezembro de 2025

Opinião do dia – Hannah Arendt* (A propaganda totalitária)

“Somente a ralé e a elite podem ser atraídas pelo ímpeto do totalitarismo, as massas têm que ser conquistadas por meio da propaganda. Sob um governo constitucional e havendo liberdade de opinião os movimentos totalitários que lutam pelo poder podem usar o terror somente até certo ponto, como qualquer outo partido, necessitam granjear aderentes e parecer plausíveis aos olhos de um público que ainda não está rigorosamente isolado de todas as outras fontes de informação.”

*Hannah Arendt (1906-1975), “Origens do totalitarismo”, p. 474, Companhia de Bolso, São Paulo, 2020.

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Ultraliberal Milei hesita em adotar o câmbio livre

Por Folha de S. Paulo

Argentina permitirá maior variação do dólar a partir de janeiro, mas governo teme impacto nos preços

Presidente herdou inflação de mais de 200% da esquerda peronista, que a duríssimas penas para a população foi reduzida a cerca de 30%

O Brasil adotou a livre flutuação do câmbio em janeiro de 1999, rompendo com uma longa tradição de controle das cotações do dólar e de outras divisas ante a moeda nacional. Hoje o regime faz parte da rotina econômica do país, mas a decisão foi dificílima na época.

A rigor, nem mesmo foi uma decisão. O governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) se viu forçado a deixar o preço do dólar variar livremente porque as reservas em moeda forte do Banco Central estavam se esgotando.

O Brasil de todos os escândalos. Por Fernando Gabeira

O Globo

O sigilo de cem anos é sempre o vencedor, pois está na mão do poder e é uma arma que desequilibra o jogo

No passado, creio, um escândalo esperava o outro antes de aparecer. Agora já não se respeita a fila. Eles aparecem a todo instante, se chocam, se encavalam um no outro, a gente precisa escolher o que vai acompanhar.

Quem os segue por dever profissional acaba se tornando graduado em escândalos. Um dos traços mais importantes aparece no caso do Banco Master. É um escândalo, sem dúvida. Mas, logo em seguida a sua aparição, surgem novos, típicos do Brasil: os escândalos do abafa.

No caso do Master, o escândalo foi continuado. Primeiro a explosão, depois a relação com ministros do Supremo e, finalmente, a decretação do sigilo numa tentativa de bloquear seu curso. O Supremo contribuiu com Toffoli, que nesse esporte joga em várias posições: sua mulher já foi sócia de advogados do Master, ele próprio viajou para Lima com um advogado do Master e finalmente assumiu o inquérito e decretou um pesado sigilo.

Quatro perguntas para evitar brigas na ceia. Por Pedro Doria

O Globo

Elas permitem que gente de esquerda e de direita se encontre em muitas concordâncias sem falar de esquerda ou direita. Empatia nasce daí

Alguns de meus colegas na imprensa têm escrito colunas sobre como evitar brigas nas festas de fim de ano. Também acho necessário. Mas, sabe, é exigir um bocado da sociedade brasileira. Pescando, aqui, números da última Quaest: 55% de nós consideram que Lula não deveria sair candidato. É mais que a metade. O presidente sairá candidato, não importa que seja rejeitado. E 60% defendem que nem Jair nem Flávio Bolsonaro devem receber votos. São duas rejeições muito altas. A mesma pesquisa revela que os dois, Lula e Flávio, são favoritos para estar no segundo turno. Mais de metade de nós não quer nenhum — e periga sermos obrigados a escolher um deles. Como não brigar num cenário assim?

A mulher de César. Por Merval Pereira

O Globo

Se os ministros, principalmente Moraes, têm como provar que as denúncias não são verdadeiras, precisam fazê-lo de maneira cabal.

O caso da liquidação do Banco Master ganha contornos cada vez mais graves, envolvendo diversos setores da administração pública, numa demonstração de que a prática do lobby sem regulamentação envenena por dentro o governo. Envolvido especialmente nas controvérsias, o Supremo Tribunal Federal (STF) é o mais afetado pela insegurança jurídica que atitudes individuais de seus ministros geram na sociedade. O ex-controlador do banco, o empresário Daniel Vorcaro, anda com tornozeleira eletrônica e exibe sua influência à medida que se descobrem os desdobramentos do caso.

De sandálias, no rumo da polarização sem fim. Por César Felício

Valor Econômico

Polêmica em comercial comprova resultado de pesquisa que mostra eleitor preso em moldura de 2022

O responsável pela pesquisas Quaest, Felipe Nunes, é um dos principais teóricos da tese de que há um processo de calcificação do eleitorado brasileiro em uma polarização entre lulismo e bolsonarismo semelhante ao que ocorre nos Estados Unidos, sem muito espaço para guinadas no curso da corrida eleitoral.

A mais recente pesquisa divulgada em conjunto com o banco de investimentos Genial, com dados coletados de 11 a 14 de dezembro, alimenta esta tese, adicionando a ela uma outra camada: a sensação entre os pesquisados que se está diante de um fenômeno inevitável.

Profeta do pessimismo está um pouco menos pessimista. Por Pedro Cafardo

Valor Econômico

Estimativas de economistas para o cenário do ano foram um pouco mais próximas da realidade

Nos três primeiros anos do governo Lula 3, o Boletim Focus foi um “profeta do pessimismo”. Focus é o relatório publicado semanalmente pelo Banco Central com base em pesquisas sobre as expectativas de instituições financeiras para os principais indicadores macroeconômicos do país.

A pesquisa Focus previa, em dezembro de 2022, um crescimento do PIB de 0,79% em 2023, mas o índice na realidade foi de 3,2%, três vezes maior. Em dezembro de 2023, a previsão para 2024 era de 1,5%, e a expansão atingiu 3,4%, mais que o dobro do previsto. Também houve viés pessimista nos casos de inflação, dólar, superávit comercial, investimentos diretos etc.

Acordo Mercosul e União Europeia. Por Rubens Barbosa

O Estado de S. Paulo

Se a assinatura não ocorrer em janeiro, a paciência estratégica do Mercosul deveria terminar e o grupo deveria informar que as negociações ficam oficialmente encerradas

Depois de 26 anos de negociações, o Acordo de Associação entre o Mercosul e a União Europeia (UE) com o objetivo de ampliar a cooperação entre os dois mercados regionais em três vertentes (política, cooperação e comércio) estava com a assinatura prevista para sábado passado, dia 20. Pela divisão entre os países da UE que exigiram mais medidas protecionistas contra a exportação de produtos agrícolas, o Mercosul aceitou que a assinatura seja adiada para janeiro.

Horizonte perdido. Por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Desencontro temporal entre interesses de governantes e da população torna democracias menos eficientes

Administrações petistas costumam ser pródigas em gastos, o que torna controle da inflação mais custoso

Um dos problemas da democracia é o desencontro temporal. Políticos, que dependem de eleições periódicas para manter-se no poder, pensam e agem em lapsos temporais de quatro anos. Até funciona para algumas coisas, mas não para tudo. Não são poucas as obrigações do poder público que cobram planejamento e execução em horizontes bem mais dilatados.

Fotografias e outros males rendem prejuízo à direita. Por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

A imagem do dinheiro de Sóstenes tem o mesmo efeito da foto que derrubou a candidatura de Roseana Sarney

Deputados presos, cassados, fugitivos e envolvidos em desvios integram um pacote de infortúnios para a direita

Em abril de 2002, uma foto de dinheirama apreendida pela Polícia Federal pôs a pique a candidatura à Presidência da então governadora do Maranhão, Roseana Sarney, pelo PFL. Ela subia nas pesquisas, despontava como favorita. A partir do flagrante no escritório do marido, Jorge Murad, seu nome despencou até a inevitável renúncia.

Devassa na política fluminense deixa Flávio Bolsonaro em pânico. Por Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Um dos alvos da PF é o homem de confiança do filho 01 no governo Castro

Celulares do desembargador que obstruiu a investigação já estão desbloqueados

"Cherchez la femme" é uma expressão popularizada por Alexandre Dumas no romance "Os Moicanos de Paris", de 1854, significando que, para resolver um crime, deve-se procurar a mulher. Menos misógina, "follow the money" (siga o dinheiro) é o resumo do caso Watergate, na década de 1970. Hoje a dica óbvia é quebrar a senha do celular.

O vício de usar o aparelho é tão irresistível que o bandido —seja um pé de chinelo ou um engravatado— sabe que vai se comprometer, produzindo provas contra si mesmo, mas não resiste à compulsão de teclar com os polegares.

Sonhos orçamentários para o ano eleitoral de 2026. Por Aylê-Salassié Filgueiras Quintão

O Orçamento da União, aprovado no Congresso Nacional, neste fim de semana (19.12), para o  Exercício de 2026, projeta  R$ 6,5 trilhões para as despesas do Governo  no ano eleitoral. Este montante corresponde a 50 % do Produto Interno Bruto – valor total de tudo que se produz e consome durante um ano no Brasil: R$12,3 trilhões. Falar em orçamento trilhonário induz o imaginário a viajar  maravilhado pelo ranking das maiores economias do planeta:  o Brasil estaria  caminhando para deixar para trás Alemanha, Japão, França, Reino Unido, Itália, Índia, Rússia e se  aproximando do PIB da China, segunda economia do mundo (US$18 trilhões). 

Uma derrota após a outra. Por Pablo Spinelli

Em 2026 haverá a celebração pela Revolução Americana, aquela que combinou a primeira ruptura colonial com ideias iluministas em prática em um grande arranjo inventivo com sistema de freios e contrapesos e com referências à Roma Republicana. É verdadeiro dizer que houve uma grande massa de excluídos na categoria de cidadãos, mas também o é afirmar que a arquitetura institucional não só abalou o arcabouço do Antigo Regime como serviu de inspiração para o futuro, sendo essa revolução somente substituída pela de 1917, na Rússia.

Poesia | Poemeto Irônico, de Manuel Bandeira

 

Música | Pobre amor, por Roberto Riberti

 

segunda-feira, 22 de dezembro de 2025

Opinião do dia – Friedrich Hegel* (O pensar não binário)

Conhecimento é intuição intelectual com as seguintes condições:

a) Que, malgrado a divisão de todo o oposto ao outro, toda a realidade externa se conheça como a interior. E se assim vier a ser conhecida, segundo a sua essência, tal qual é realmente, então se mostra não como estável, mas como aquilo cuja essência própria é o movimento da ultrapassagem. Este ponto de vista heraclitiano ou cético, de que nada é firme, deve ser provado em todas as coisas; e assim, nesta consciência de que a essência de cada coisa é determinação e, por isso, o seu contrário, manifesta-se a unidade do conceito com o seu contrário.

b) Todavia, é também necessário conhecer esta unidade na sua realidade; esta, enquanto é uma tal identidade, deve, precisamente por isso, passar para o seu contrário, ou seja, fazer-se outro para se realizar. Assim, através dela própria, produz-se o seu oposto.

c) Acerca da oposição, temos de dizer, por seu turno, que ela não é de modo absoluto, se o absoluto é a essência, o eterno, etc. Todavia, note-se que também este é uma abstração, na qual está compreendido dum ponto de vista unilateral, e que a sua oposição tem apenas o valor de um ideal; na realidade, a oposição é a forma como momento essencial do movimento do absoluto. Este não está em repouso, aquela não é o conceito que nunca para. Pelo contrário, a Ideia, na sua irrequietabilidade, está em repouso e em si satisfeita.

Deste modo, o puro pensamento chegou à oposição do subjetivo e do objetivo: a verdadeira conciliação da oposição consiste em entender como esta oposição, levada ao ponto extremo, se resolve, de sorte que os opostos, como diz Schelling, sejam em si idênticos. Mas não basta afirmar isto, se não se acrescenta que a vida eterna é propriamente este produzir eternamente a oposição e eternamente conciliá-la. Possuir o oposto na unidade e a unidade na oposição, eis o saber absoluto; e a ciência consiste precisamente em conhecer esta unidade, no seu pleno desenvolvimento, através dele mesmo.

*Friedrich Hegel (1770-1831), “Introdução â História da Filosofia”, p.158, v. II, Nova Cultura, 1989.

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Governo precisa fazer sua parte para juros caírem

Por O Globo

Enquanto Lula continuar a varrer despesas para fora da meta fiscal, BC terá de manter taxa nas alturas

Não faltam motivos para o Banco Central (BC), por meio do Conselho de Política Monetária (Copom), manter a taxa básica de juros, a Selic, em 15%. Para entender as razões do BC, nem é preciso ler a ata da última reunião do Copom que manteve a Selic inalterada. Basta acompanhar o noticiário do dia a dia. Na semana passada, o governo obteve do Congresso mais um Projeto de Lei excluindo do cálculo da meta fiscal certos gastos temporários com saúde e educação. Tais despesas não precisarão, portanto, ser compensadas com cortes no Orçamento para que a meta de 2026 — superávit primário de 0,25% do PIB — seja considerada cumprida. E essa é a apenas a última de uma série de exceções às regras fiscais que somarão, de acordo com reportagem do GLOBO, R$ 170 bilhões nos quatro anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva. O resultado dessa contabilidade nebulosa é o crescimento inexorável das despesas, portanto do endividamento.

Silêncios que gritam no caso do contrato milionário. Por Bruno Carazza

Valor Econômico

Código de ética no Judiciário é necessário, mas não devemos nos esquecer de quem está do outro lado do balcão

Corre pela internet um meme sobre o prêmio da Mega da Virada, que neste ano pode chegar à estratosférica cifra de R$ 1 bilhão. Segundo a piada, com esse dinheiro o ganhador teria condições de comprar 12.500 carros populares, 1.666 casas de ótimo padrão, 142 Lamborghinis, dar 20 mil voltas ao mundo ou... pagar 8 consultorias como a que a advogada Viviane Barci de Moraes, mulher do ministro Alexandre de Moraes, prestou ao banco Master.

A divulgação das cifras do contrato assinado entre a instituição liquidada por evidências de fraude contra o sistema financeiro e o escritório de advocacia da esposa do ministro do Supremo Tribunal Federal (R$ 3,6 milhões mensais, entre 2024 e 2027, perfazendo um total de R$ 129 milhões) é mais um episódio sobre conflitos de interesses envolvendo a cúpula do Poder Judiciário.

Brasil, o campeão mundial de gastos com juros. Por Sergio Lamucci

Valor Econômico

Reverter esse cenário requer uma mudança estrutural na condução das contas públicas, que passa pelo controle do ritmo de expansão das despesas obrigatórias

O Brasil é o campeão mundial de pagamento de juros. Com uma dívida pública elevada e uma taxa básica nas alturas, o resultado é um volume altíssimo de despesas financeiras, que deverão superar R$ 1 trilhão neste ano. De uma lista de 153 países, o Brasil teve os maiores gastos com juros pagos sobre a dívida pública em 2024, atingindo 8,28% do PIB, segundo números mais recentes do Fundo Monetário Internacional (FMI), compilados na Base de Dados das Finanças Públicas na História Moderna, atualizada neste mês.

Candidatura de Flávio provoca imbróglio na direita para 2026 e é potencial para fogo amigo. Por Mauro Paulino* e Alessandro Janoni*

O Globo

Estratégia do clã Bolsonaro inibe a migração em massa do contingente dos sem candidato

Era o “ensaio sobre a lucidez” de Saramago — a cegueira do ensaio anterior se espraia sobre o processo eleitoral aumentando de maneira expressiva o contingente de eleitores que pretendem votar em branco ou anular o voto. Foi o que aconteceu em agosto de 2018. Apesar de preso, Lula gerou ruído ao registrar sua candidatura à Presidência da República, chegando a 39% das intenções de voto e liderando a disputa. Sem o petista, quase um terço do eleitorado (28%) se mostrava sem candidato, patamar que superava a taxa do primeiro colocado, Jair Bolsonaro, então no PSL, com 22%.

A estratégia do PT de manter a candidatura de Lula até sua inelegibilidade em setembro daquele ano acabou por retroalimentar seu antagonista — depois do atentado em Juiz de Fora, Bolsonaro passou a ser tratado de maneira predominantemente neutra pela mídia, e a apresentação tardia de Fernando Haddad como substituto demandava o esforço adicional de não posicioná-lo como adversário de uma vítima.

Favela precisa se beneficiar de sua potência criativa. Por Preto Zezé

O Globo

O mercado criativo brasileiro foi organizado para capturar valor nos centros formais da economia

Quando se fala em economia criativa no Brasil, ainda é comum tratar cultura como adereço, inovação como promessa e favela como cenário. Os dados mais recentes desmontam essa narrativa. Em 2023, a economia criativa movimentou cerca de R$ 393 bilhões, algo em torno de 3,5% do PIB nacional, empregando mais de 7,7 milhões. Cresceu acima da média da economia e já supera setores considerados tradicionais. Não se trata de vocação futura, mas de setor produtivo consolidado.

Fachin tem razão: o STF precisa de um código de ética. Por Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

Um ministro não deve pegar carona em jatinho de empresário para assistir a uma partida de futebol

É constrangedor que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, encontre resistência interna para a introdução de um código de ética. Ainda bem que parece firme sua disposição. Disse ele no discurso de encerramento do ano jurídico:

— Não poderia deixar de fazer referência à proposta, ainda em gestação, de debatermos um conjunto de diretrizes éticas para a magistratura.

A Europa joga seu futuro na Ucrânia. Por Demétrio Magnoli

O Globo

A paz, nos termos de Trump, implodiria o edifício nacional ucraniano

Na hora da verdade, a União Europeia (UE) só deu meio passo à frente. No lugar do plano de um multibilionário empréstimo à Ucrânia baseado nos ativos russos congelados, fechou um empréstimo de € 90 bilhões com recursos próprios. É sua resposta ao intercâmbio diplomático bilateral Trump-Putin, destinado a traçar o destino da Ucrânia à margem da Europa — e da própria Ucrânia. Mas, sobretudo, surge como réplica à Estratégia de Segurança Nacional (NSS, na sigla em inglês) divulgada pela Casa Branca.

A NSS diagnostica um declínio histórico radical da Europa: “apagamento civilizacional”, derivado do abandono de “valores” e da perda de “identidades nacionais”. Sentença de morte da aliança transatlântica? Quase. Segundo a doutrina Trump, uma reversão providencial dependeria da transferência do poder aos “partidos patrióticos europeus”.

A luta anticorrupção está de volta. Por Carlos Pereira

O Estado de S. Paulo

Mais do que retorno espontâneo, o novo ciclo reflete escolhas estratégicas do Sistema de Justiça

O Brasil voltou a ser sacudido por uma sequência de escândalos de corrupção. Operações da Polícia Federal, solicitadas pela PGR e autorizadas pelo STF, recolocaram o tema no centro do debate público. Há denúncias de fraudes no INSS, desvios de emendas parlamentares e apreensões de grandes quantias em dinheiro com deputados. Diante desse cenário, reaparece uma pergunta que parecia superada: a luta contra a corrupção está de volta?

Durante algum tempo, consolidou-se a percepção de que o combate à corrupção havia sido esvaziado com o fim da Operação Lava Jato. Para muitos, aquele encerramento simbolizaria o retorno automático a padrões históricos de impunidade. Essa leitura, no entanto, ignora mudanças institucionais que permaneceram – como a Lei da Ficha Limpa, a Lei de Acesso à Informação, a Lei Anticorrupção e os mecanismos de delação premiada e leniência.

Dino indica que STF deverá julgar em 2026 validade das emendas impositivas

Hugo Henud / O Estado de S. Paulo

Ministro sinaliza que Corte deve discutir no ano que vem constitucionalidade dos repasses de pagamento obrigatório; investigações que atingem parlamentares ampliam embate institucional

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino indicou que, em 2026, a Corte deverá discutir a constitucionalidade das emendas parlamentares impositivas, aquelas que obrigam o governo federal a pagar os recursos indicados por deputados e senadores. A movimentação tensiona ainda mais a relação entre STF e Congresso – especialmente em ano eleitoral – e ocorre em meio ao avanço de operações autorizadas pelo ministro contra parlamentares e ao julgamento de congressistas investigados por desvios de recursos do orçamento secreto, revelado pelo Estadão.

O que está acontecendo com o Brasil? Por Marcus André Melo

Folha de S. Paulo

Não há crise de governabilidade, mas clara degradação da República

A PF é um bastião de credibilidade, mas sua autonomia é vulnerável à interferência do Executivo e do STF

Não é novidade que o Brasil político vai muito mal. Os sintomas estão em toda parte, mas há diagnósticos equivocados. Desde visões hiperinstitucionalistas, que atribuem o atual estado de coisas ao desenho institucional, no qual o suspeito usual é o presidencialismo multipartidário, até o diagnóstico de que forças malignas estariam usurpando poderes do Executivo.

Há, no entanto, uma explicação parcimoniosa que dá conta da maior parte do conflito: forças políticas rivais conquistaram o Executivo e o Legislativo. Sob qualquer sistema de governo, haveria conflitos importantes entre os Poderes. É claro que, sob o presidencialismo, eles assumem mais contundência e possuem especificidades (em alguns casos, implicam em shutdown).

Um escândalo. Por Camila Rocha

Folha de S. Paulo

Não há comoção sobre a dosimetria das penas dos cerca de 950 mil brasileiros no sistema prisional

É escandaloso aliviar o lado de quem planejou um golpe de Estado

Não há mobilização política ou comoção social sobre a dosimetria das penas ou as condições de encarceramento dos cerca de 950 mil brasileiros que se encontram no sistema prisional do país (Secretaria Nacional de Políticas Penais).

Desse amontoado de gente, uns 40% ainda nem foram julgados, mas já estão privados de liberdade. O furto e o tráfico de pequenas quantidades de drogas são os crimes que mais levam à prisão provisória, ou seja, infrações que poderiam ser tratadas com medidas alternativas. Mas não são.

Esse quase um milhão de pessoas é tratado pior do que bicho, já que estão submetidos a condições que ferem a dignidade e impedem (ou dificultam) a reabilitação e uma futura reintegração à sociedade.

Por que será que não há "refresco" para essa gente?

Kast aposta em xenofobia na América Latina. Por Camila Rocha

Folha de S. Paulo

Admirador de Pinochet promete criar 'corredor humanitário de devolução' para venezuelanos

Diferente de Bolsonaro e Milei, novo presidente chileno torna central expulsão de estrangeiros

José Antonio Kast, recém-eleito presidente do Chile, certamente não será um novo Bolsonaro ou Milei, mas algo muito pior. Admirador do ditador Augusto Pinochet, já declarou que defende "qualquer situação" para acabar com o regime de Nicolás Maduro na Venezuela e já adiantou que deve criar um "corredor humanitário de devolução" para imigrantes em situação irregular, citando o caso dos venezuelanos no Chile.

A crise da Venezuela foi fortemente influenciada pela desvalorização do petróleo no mercado internacional a partir de 2014. Dependente dessa commodity para importar itens básicos de consumo cotidiano, o país sofreu um desabastecimento generalizado. Em 2017, as sanções impostas por Trump ao país pioraram a crise econômica, fomentando uma crise migratória sem precedentes.

A vitória de Jo Ann. Por Ruy Castro

Folha de S. Paulo

Uma menina de 14 anos foi símbolo da luta pelo direito de seus colegas à educação

600 membros da Guarda Nacional em farda de combate garantiram a integração racial numa escola

Em 1964, a revista americana Look, com seus seis milhões de exemplares semanais, dedicou a página dupla central a uma ilustração feita pelo artista Norman Rockwell. Na cena, uma menina negra, escoltada por quatro agentes federais a caminho de uma escola pública branca, passa diante de um muro onde se leem as pichações "nigger" e "KKK" (referência à organização supremacista Ku Klux Klan) e se vê a mancha de um tomate escorrendo, atirado contra o muro —ou contra ela. Era o auge do movimento pelos direitos civis nos EUA, cem anos depois de uma guerra civil que se propunha a evitar que tais coisas acontecessem.

Poesia | O Operário em Construção, de Vinicius de Moraes (Por Odete Lara)

 

Música | Maria Bethânia (Paulo Vanzolini)

 

domingo, 21 de dezembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

UE é responsável pela sina do acordo com Mercosul

Por O Globo

Protecionistas são poucos, mas fizeram de tudo para torpedear qualquer tipo de tratado

Em comunicado à Câmara dos Deputados da Itália na semana passada, a primeira-ministra Giorgia Meloni afirmou que a assinatura do acordo de livre-comércio entre União Europeia (UE) e Mercosul era “ainda prematura”. “É necessário aguardar que o pacote de medidas adicionais para proteger o setor agrícola seja aperfeiçoado e, ao mesmo tempo, apresentá-lo e discuti-lo com nossos agricultores”, disse Meloni. Ela cerrou fileiras contra o tratado com o presidente francês, Emmanuel Macron. Os dois comandaram a barreira erguida na reunião de cúpula dos 27 integrantes da UE em Bruxelas que deveria ter referendado o documento a tempo de ser assinado ontem, em Foz do Iguaçu (PR), na cúpula do Mercosul. Sem aval do Conselho Europeu, o acordo não saiu. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, afirmou que uma nova data será marcada em janeiro.

Os perigos externos. Por Merval Pereira

O Globo

Lula alerta que uma intervenção armada dos EUA na Venezuela seria “uma catástrofe humanitária” e um “precedente perigoso para o mundo”.

Quando as ameaças dos Estados Unidos cada vez mais se transformam em possibilidade real de uma intervenção armada na Venezuela, o presidente Lula alerta que ela seria “uma catástrofe humanitária” e um “precedente perigoso para o mundo”. Mesmo com o Brasil se afastando da ditadura de Nicolas Maduro depois da eleição fraudada que o manteve no poder, não nos é possível, como principal líder da América do Sul, aceitar uma invasão militar num país vizinho. A questão em jogo tem duas faces, a política e a militar.

Os donos do futuro. Por Dorrit Karazim

O Globo

Filosofia de vida de barões da IA não se assenta na gestão da ordem existente, mas, pelo contrário, num desejo irreprimível de tudo chacoalhar

Tem sido difícil pinçar algo apaziguante sobre o amanhã à nossa espera — o futuro chegou muito antes de 2025 se esvair, e coisa boa não é. Veio a galope, sem pruridos de atropelar a cosmologia anterior. Para o veterano analista Alastair Crooke, ex-agente do serviço de inteligência britânico MI6 e fundador do Fórum de Conflitos com sede em Beirute, o pensamento populista conservador ocidental já conseguiu criar raízes como algo mais bruto, coercivo e radical.

Noturno do Chile. Por Bernardo Mello Franco

O Globo

Novo presidente se aproxima de Milei e Bukele; Trump amplia influência na América do Sul

O sorriso de Augusto Pinochet voltou às ruas de Santiago no último domingo. Eleitores de José Antonio Kast exibiram retratos do ditador para comemorar a vitória do ultradireitista na eleição do Chile.

O novo presidente nunca disfarçou a admiração pelo velho general. Votou contra o retorno à democracia no plebiscito de 1988 e prometeu tirar da cadeia militares condenados por crimes contra a humanidade.

“Se estivesse vivo, Pinochet votaria em mim”, garantiu Kast, na primeira campanha ao Palácio de La Moneda. Na terceira tentativa, ele chegou lá. Foi eleito com 58% dos votos em disputa com a comunista Jeannette Jara, apoiada pelo atual presidente Gabriel Boric.

Eu sou da América do Sul. Por Míriam Leitão

O Globo

Intensificação da presença militar americana na Venezuela eleva risco de intervenção e desafia o Brasil

A América do Sul vive neste fim de ano a tensão de uma situação militar de desdobramentos imprevisíveis. Os Estados Unidos instalaram seu maior porta-aviões, submarino nuclear, dez navios e tropas perto da região. Caças americanos sobrevoam áreas a 100 quilômetros de Caracas. O governo Donald Trump nem chega a alegar que está fazendo isso para defender a democracia, lembra o embaixador Roberto Abdenur. “Ele diz claramente que quer retomar os poços de petróleo que foram desapropriados de empresas americanas em tempos anteriores”. Abdenur acha que foi importante o Brasil se oferecer como mediador, ainda que não haja qualquer possibilidade de o governo americano aceitar.

Lulinha e o Careca no voo JJ-8148. Por Elio Gaspari

O Globo

Na noite de 8 de novembro de 2024, dois passageiros embarcaram no voo JJ-8148 da Latam com destino a Lisboa. Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, filho do presidente da República, foi para o assento 6J. Antônio Carlos Camilo Antunes, o Careca do INSS, foi para o assento 3A.

A revelação é do repórter André Shalders.

O fato de terem embarcado no mesmo voo para Lisboa meses antes da mudança de Lulinha para Madri não prova coisa alguma. O cheiro de queimado vem da conduta da tropa de choque do Planalto, bloqueando todas as tentativas da CPI do INSS para ouvir Lulinha. Bloquearam até mesmo o acesso à lista de passageiros do voo JJ-8148.

Já haviam bloqueado a tentativa de ouvir o irmão mais velho do presidente, diretor de um sindicato envolvido no roubo de dinheiro dos aposentados.

Orçamento sob medida para as eleições: R$ 61 bi em emendas impositivas. Por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Na prática, o que se vê é a substituição do planejamento público por uma lógica clientelista, em que a distribuição de verbas obedece mais à geografia eleitoral

Esqueçam o baixo clero, pois a expressão que designava os deputados que não decidiam os rumos da política do país caiu em desuso. Não se fala mais nisso. Hoje, o baixo clero manda na Câmara, já que os velhos cardeais que sobreviveram eleitoralmente estão na planície. Outra geração de políticos assumiu o protagonismo, numa Câmara que funciona a partir de um grupo restrito de líderes, agora em torno do deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB). O rally regressivo e as nas votações do Congresso mostram as consequências.

Conflito entre Poderes não é baderna institucional. Por Carlos Pereira

O Estado de S. Paulo

Democracias não operam em harmonia perfeita – operam por meio de tensão perpétua

Em qualquer democracia, independentemente do modelo institucional, os Poderes constituídos estão permanentemente engajados em disputas por influência e controle do processo decisório. O equilíbrio entre Executivo, Legislativo e Judiciário nunca é ótimo, tampouco estático. Ele é, por definição, dinâmico, contingente e frequentemente subótimo. Democracias não operam em harmonia perfeita – operam por meio de tensão perpétua.

Medicina: o futuro já chegou? Por José Gomes Temporão

O Estado de S. Paulo

A questão decisiva é se será também mais humano, equitativo e efetivo. Isso dependerá das escolhas que fizermos hoje

Vivemos um ponto de inflexão na história da medicina. Em poucas décadas, a convergência entre biotecnologia, inteligência artificial (IA), novos materiais, robótica, entre outras tecnologias, deslocou o centro de gravidade do cuidado de um ato isolado e prescritivo para um ambiente de cuidado tecnológico contínuo, preditivo e conectado. Novas tecnologias, como biópsia líquida e imagem molecular, possibilitam diagnósticos mais precisos e permitem que testes avançados sejam realizados fora de grandes centros hospitalares, chegando a Unidades de Saúde da Família e comunidades remotas.

Brasil precisa de um plano de inserção. Por Lourival Sant’Anna

O Estado de S. Paulo

Brasil tem de fazer acenos à Ásia-Pacífico, que concentra muitos países dinâmicos e abertos aos negócios

O ano de 2025 valeu por uma década. Uma nova ordem geoeconômica toma corpo. O Brasil precisa se elevar acima de suas aflições e disputas internas para elaborar um plano de inserção nesse mundo repleto de riscos e de oportunidades.

Assistimos a um encolhimento abrupto do Ocidente, entendido não como geografia, mas como conjunto de valores do pós-2.ª Guerra. A aliança transatlântica, que sustentava essa ordem, sofreu uma fratura muito difícil de reparar, porque envolve confiança.

Ela foi formalizada na nova Estratégia de Segurança Nacional (ESN) dos EUA, na qual a Europa é apresentada como adversário, por causa de seus valores liberais. Esse documento desloca as preocupações americanas da Ásia, Oriente Médio e Europa para a América Latina.

Congresso legalizou roubar voto de pobre. Por Celso Rocha de Barros

Folha de S. Paulo

Legislativo traiu os trabalhadores que, para votar, tiveram que driblar bloqueios de estrada ordenados por Bolsonaro

Roleta será instalada na porta do Congresso para que o sujeito de direita compre revisão de dosimetria em caso de golpe fracassado

Congresso Nacional reduziu a pena de quem tentou roubar voto de pobre.

Os que tentaram roubar as armas da República para perpetuar sua facção no poder e matar seus adversários sob tortura também foram beneficiados.

De agora em diante, uma roleta será instalada na porta do Congresso para que o sujeito de direita, em caso de golpe fracassado, já se dirija ao centrão para comprar "revisão de dosimetria" com emendas do orçamento secreto. Aceitarão dinheiro vivo também, Sóstenes, pode ficar tranquilo.

Com Marçal, Flávio Bolsonaro pode reviver campanha disruptiva de 2018. Por Juliano Spyer

Folha de S. Paulo

Silas Malafaia é contrário à candidatura do senador à Presidência

Conflito entre pastor e influenciador pode voltar à cena eleitoral

Estamos caminhando para um rompimento entre Jair Bolsonaro e Silas Malafaia? Na semana passada, o pastor se posicionou publicamente contra a pré-candidatura presidencial de Flávio Bolsonaro.

As declarações de Malafaia circularam nos jornais ao lado de outra notícia relevante: o influenciador Pablo Marçal se encontrou com Flávio e, durante um culto, orou por sua pré-candidatura.