segunda-feira, 25 de novembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

É tarefa urgente do Congresso limitar os supersalários

O Globo

Em vez de diminuir, avanço da elite do funcionalismo sobre dinheiro público tem crescido, constata novo estudo

A parcela de juízes e procuradores que receberam vencimentos superiores ao teto constitucional em pelo menos um mês do ano aumentou de 83% em 2018 para 92% neste ano, de acordo com o Anuário de Gestão de Pessoas no Serviço Público 2024. Os dados do levantamento mostram que o avanço da elite do funcionalismo sobre o dinheiro público, em vez de diminuir, tem crescido. Por isso exige resposta imediata do Congresso. É preciso fazer valer o limite constitucional de R$ 44.008,52, salário dos ministros do Supremo. Supersalários já seriam injustos se sobrasse dinheiro no Orçamento. Com o Brasil enfrentando grave crise fiscal, são um disparate.

Os beneficiados por regalias que inflam sua remuneração são uma minoria: 0,06% do funcionalismo, em especial juízes, procuradores e militares. Mas custam caro. Magistrados da ativa e aposentados receberam R$ 32,8 bilhões de reais acima do teto de 2019 a 2023, entre indenizações e direitos eventuais. Olhar para fora do país dá a dimensão da incongruência. Os gastos anuais com tribunais de Justiça representam 1,6% do PIB brasileiro, ante média de 0,5% para os países emergentes e de 0,3% para as economias avançadas. Como o custo principal da atividade jurídica está no pessoal, não é difícil descobrir a causa do desperdício.

Relatório mostra táticas do crime organizado - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Participação de Braga Netto sugere contaminação do golpismo com métodos de facção criminosa

Dos fatos descritos pelo relatório da Polícia Federal, um dos mais preocupantes para o futuro das Forças Armadas não é apenas a proporção de indiciados com patente das Forças Armadas - 25 de 37. O número mostra que se ainda não é possível dizer que tenha havido uma tentativa de golpe militar, se está mais perto de se conhecer uma tentativa de golpe de militares, mas o relatório não para aí.

Ao comparar o cerco que os militares envolvidos fizeram dos alvos e aquele dos assassinos de Marielle Franco e Anderson Gomes, a PF mostra o trânsito dos mesmos métodos utilizados entre o crime organizado e o golpismo. Não se trata apenas de uma “transferência de tecnologia”. A presença do general Walter Braga Netto nos dois eventos sugere que esteja em jogo uma contaminação.

Antes de ocupar o Ministério da Defesa, a Casa Civil do governo Jair Bolsonaro e a vaga de vice na chapa à reeleição do ex-presidente, Braga Netto foi o interventor na segurança pública do Rio de Janeiro. A nomeação para o último posto que ocupou na ativa foi do ex-presidente Michel Temer.

Crise de Bolsonaro pode tirar governo das cordas no Congresso - César Felício

Valor Econômico

Com avanço das investigações contra o ex-presidente, aumentaram as chances de o governo aprovar ajuste fiscal ainda neste ano

O avanço das investigações contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) deve impactar a agenda do Congresso. Aumentaram as chances de o governo aprovar um pacote duro de ajuste fiscal ainda este ano, mesmo que implique mudanças legislativas com quórum qualificado, como propostas de emendas constitucionais e projetos de leis complementares.

O corte de gastos politicamente atenderia aos partidos do Centrão em três camadas: a primeira é se distanciar do bolsonarismo radical, que domina o PL, está enraizado no PP e no Republicanos e tem ramificações no União Brasil, PSD e MDB, entre os principais partidos. A segunda é fazer isso em uma pauta que reforçaria os elos da elite parlamentar com o empresariado e o sistema financeiro, que apontam há muito tempo para a falta de consistência do arcabouço fiscal. E a terceira é colocar o PT na constrangedora posição de endossar medidas que contrariam a sua base eleitoral e nunca foram defendidas pela sigla.

O governo iniciou o mês politicamente encurralado. O mau resultado da esquerda nas eleições municipais de outubro e a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos abriram perspectivas de poder para a oposição. O Centrão praticamente garantiu o comando futuro da Câmara e do Senado ao se unificar em torno das candidaturas do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) e do senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) para as presidências das Mesas Diretoras, sem assumir compromissos significativos nem com o governo, nem com o bolsonarismo.

Não nos esqueçamos: Eles ainda estão aqui - Bruno Carazza

Valor Econômico

Até quando aceitaremos passivamente a ameaça de militares à democracia?

No Brasil, a arte imita a vida e a história se repete não como farsa, mas em golpes que nos prendem a um passado que nunca deixa de nos assombrar.

Os milhões de brasileiros que têm lotado os cinemas para assistir a “Ainda Estou Aqui”, obra que narra o drama da família Rubens Paiva durante a ditadura militar, tomaram conhecimento, na última semana, de novas evidências da trama de apoiadores de Jair Bolsonaro, inclusive militares de alta patente da ativa e da reserva, articulando-se praticar atentados terroristas e anular a vontade popular expressa nas urnas em 2022.

Ao longo da nossa história, foram vários os episódios de tentativas, algumas frustradas e outras infelizmente bem-sucedidas, de intromissão dos militares no jogo político. Essa permanente ameaça traz insegurança democrática e econômica, e deveria ser definitivamente afastada. Porém, se não houver uma real mobilização de boa parte da sociedade, nada mudará.

Os limites do pacote fiscal e as fragilidades do arcabouço - Sergio Lamucci

Valor Econômico

Um pacote de R$ 70 bilhões não é desprezível, mas não deverá ser suficiente para reduzir significativamente as incertezas sobre as contas públicas

O governo deverá enfim anunciar nesta semana as medidas de contenção de gastos, após seguidos adiamentos. A expectativa é que as iniciativas poupem em torno de R$ 70 bilhões em dois anos, dos quais R$ 25 bilhões a R$ 30 bilhões em 2025 e R$ 40 bilhões em 2026. Pelo que tem dito o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a lógica é que a dinâmica das despesas obrigatórias caiba dentro do arcabouço fiscal. Em 15 de novembro, ele afirmou “que a ideia é fazer com que as partes não comprometam o todo, e o arcabouço tenha sustentabilidade de médio e longo prazo, que é a dúvida do mercado”. Um pacote dessa magnitude não é desprezível, podendo levar a algum alívio no câmbio e nos juros de longo prazo, mas não deverá ser suficiente para reduzir significativamente as incertezas sobre as contas públicas.

Rebranding da direita - Carlos Pereira

O Estado de S. Paulo

A direita vai conseguir se livrar de Bolsonaro? Ou continuará a ser refém como a esquerda é refém de Lula até hoje?

O novo indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro pela Polícia Federal pelos crimes de “abolição violenta do estado democrático de direito”, “golpe de Estado” e “organização criminosa”, abriu grande janela de oportunidade para que políticos e eleitores de direita encontrem alternativas de novas lideranças que os represente de forma competitiva nas eleições de 2026.

Não demorará muito tempo para os políticos de direita perceberem que Bolsonaro se tornou tóxico. A reação tímida das principais lideranças políticas conservadoras com o novo indiciamento do ex-presidente é um sinal claro de sua toxicidade e de que Bolsonaro já é percebido por alguns como carta fora do baralho.

O Brasil não tolera mais tutela militar - Camila Rocha

Folha de S. Paulo

Não estamos mais dispostos a passar pano para militares golpistas

O Brasil conquistou um feito histórico. É a primeira vez que a tutela militar de governos civis é posta em xeque. O indiciamento de sete generais e 18 militares por tentativa de golpe de Estado é um fato inédito. A conciliação conservadora que permeia a atuação política dos militares finalmente está abalada. Em outras palavras: não estamos mais dispostos a passar pano para militares golpistas.

Graças à atuação primorosa de nossas instituições, há um caminho aberto para que o país atinja um novo patamar democrático: submeter os militares ao controle civil.

Um golpe para o cinema – Fernando Gabeira

O Globo

O mundo avançou, e os golpistas recuaram no tempo, não chegam aos pés de seus antecessores do século passado

Presenciei dois golpes militares no século XX. Primeiro foi no Brasil; nove anos depois, no Chile. Traços comuns: ocupação de pontos estratégicos, deslocamento de tropas, prisões em massa. Não houve planos de assassinato do governante deposto, embora Allende tenha morrido resistindo no Palácio de La Moneda.

No século XXI, os golpes de Estado tomaram outra forma. Há uma batelada de livros descrevendo-os. Agora, a democracia é devorada por dentro. O Poder Executivo aos poucos neutraliza Congresso e Judiciário e passa a mandar sozinho. É possível ver mais ou menos isso na Hungria ou na Venezuela.

O plano de golpe revelado na semana passada pela Polícia Federal representa um brutal retrocesso. Ele começaria com a morte do ministro Alexandre de Moraes, de Lula e Geraldo Alckmin. Teria características do século XIX, assim mesmo em países muito atrasados. Isso revela que o mundo avançou, e os golpistas, criando uma situação grotesca, recuaram no tempo, não chegam aos pés de seus antecessores do século passado.

Macondo é aqui - André Gustavo Stumpf*

Correio Braziliense

Se tivessem conseguido dar o golpe, além de prender, torturar, matar e censurar a imprensa, eles brigariam entre si. Jamais os generais admitiriam bater continência para capitão

As revoluções, ou suas respectivas tentativas, têm um aspecto ridículo que nunca deve ser desprezado. O realismo mágico existe. Não é invenção de escritores do quilate de Gabriel García Márquez. Eles perceberam o fenômeno na política latino-americana. Nessas histórias, há sempre um general, cheio de medalhas no peito, a proclamar-se o benefactor da pátria, em nome da defesa das instituições, da moral e dos bons costumes, que baixa o cacete nos opositores.  Às vezes, em nome de Deus.

Não será surpresa se, dentro de alguns anos, tudo isso que a Polícia Federal descobriu seja esquecido ou considerado ilegal. Foi assim com a Operação Lava-Jato, que encontrou uma roubalheira abissal nos negócios da Petrobras. Apesar das confissões, feitas em juízo, de repente, todos foram inocentados. Aqui, não há memória.

A extrema-direita e o punhal verde amarelo - Jefferson Rodrigues Barbosa *

Correio Braziliense

Bolsonaristas são exemplos de uma extrema-direita atuante que, enquanto ultradireita radical, defende o intervencionismo militar por meios violentos

A preparação de importantes membros do governo Bolsonaro e de suas bases de apoiadores para a execução de um golpe de Estado ficou mais evidente diante do avanço das investigações da Polícia Federal, que indiciou o ex-presidente, ex-ministros, militares de alta patente, sendo, ao todo, 37 suspeitos. A Procuradoria-Geral da República recebeu os conteúdos das investigações e, após análise, pode encaminhar ao Supremo Tribunal Federal (STF), que deve julgar e condenar os envolvidos no chamado Plano Punhal Verde e Amarelo.

De fato, a mobilização da extrema-direita e a agenda de seus líderes têm pontos comuns que são sempre lembrados pelos cientistas políticos, como o discurso de descrédito às instituições políticas, a negação de valores democráticos, colocando-se como portadores de uma nova política contra a velha política, e como defensores do povo contra as elites, usando retóricas nacionalistas que falseiam um discurso ultraliberal e conservador no sentido da pauta dos costumes. 

Atentados, golpes e ameaças à democracia - Marcus André Melo

Folha de S. Paulo

Resiliência democrática se revela nas respostas das instituições, mas também opera por dissuasão e pelas características constitucionais do sistema político

Em 2022, um homem partiu da Califórnia para Washington, DC, com o propósito de assassinar Brett Kavanaugh, ministro da Suprema Corte americana. Estava indignado com o voto da Corte sobre o aborto. Chegando à residência do juiz, enviou mensagem de despedida para a irmã. Fala do suicídio que cometeria após o ato. A irmã logrou dissuadi-lo e o instigou a ligar para o 911, o que permitiu sua captura.

Quem ou o que estava em risco neste episódio? Certamente o juiz cuja vida esteve por um fio. Mas a democracia americana não estava em risco; conclusão que não se alteraria caso o plano tivesse tido êxito. Tratava-se de uma ação isolada, mas com inequívoco conteúdo político-partidário: "eu poderia pelo menos pegar um deles, o que iria mudar os votos por mais de uma década, e eu vou atirar em três. Todas as principais decisões nos últimos dez anos têm sido partidárias, então se tiver mais liberais que conservadores eles terão o poder".

Golpe e castigo no Brasil em transe - Sérgio Abranches

Correio Braziliense

"O inquérito do golpe não estará completo até que toda a cúpula de responsáveis por seu planejamento, custeio e operação sejam punidos, inclusive, aqueles que escaparam ao indiciamento no primeiro relatório"

O inquérito sobre os atos antidemocráticos, a trama de golpe de Estado e o uso da desinformação como estratégia de desestabilização da democracia chegou aos estágios finais, após dois anos de investigação. A Polícia Federal indiciou formalmente Jair Bolsonaro, toda a cúpula militar da Presidência, o delegado Alexandre Ramagem, da Polícia Federal, ex-chefe da Abin, e o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, por tentativa de golpe de estado, tentativa de abolição violenta do estado democrático de direito e por organização criminosa. Foram 36 indiciados, entre eles 24 militares, além de Bolsonaro. A única exceção entre os oficiais palacianos foi o ex-secretário-geral da Presidência, general Luiz Eduardo Ramos.

Os golpistas foram reunidos em seis núcleos diferentes: desinformação, jurídico, operacional, inteligência, oficiais de alta patente e responsável por incitar militares a apoiar o golpe. A Procuradoria-Geral da República deve oferecer denúncia contra todos. Muitos dos oficiais de alta patente eram do grupo de elite do Exército, as Forças Especiais, os "kid pretos".

Entrevista |Felipe Soutello: ‘Há uma avenida enorme para o centro democrático em 2026′

Por Bianca Gomes / O Estado de S. Paulo

Em entrevista, Felipe Soutello aponta potencial em uma chapa entre MDB e PSD e considera que a melhor estratégia para a esquerda será abrir mão de espaços regionais em favor de uma coalizão mais forte com o centro; no entanto, segundo ele, as definições sobre a próxima eleição presidencial ainda dependem dos próximos passos de Lula

Idealizador da chapa que reuniu dois históricos rivais em 2022, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Geraldo Alckmin (PSB), Felipe Soutello diz que as principais marcas dos governos petistas, como o Bolsa Família e o Prouni, já foram apropriadas pela população e podem não ser suficientes para impulsionar a reeleição de Lula. Segundo ele, o nível de exigência dos eleitores aumentou, e enfrentamos uma crise internacional na qual as promessas de prosperidade não estão se concretizando.

“As pessoas não estão vislumbrando uma melhora de vida sustentável no tempo”, observa Soutello, que vê o fim da jornada 6x1 e a eliminação dos supersalários no setor público como “excelentes oportunidades” para o governo. Para ele, uma estratégia mais eficaz para a esquerda em 2026 seria abrir mão de espaços regionais em nome de uma coalizão mais forte com o centro, concentrando esforços na eleição de uma bancada mais robusta no Congresso.

Soutello começou sua trajetória em campanhas eleitorais em 1986, atuando pela candidatura de José Serra à Câmara dos Deputados – na época, tinha apenas 15 anos –, e a paixão pela política se tornou profissão. Filiado ao PSDB desde a fundação em 1989, o estrategista, como prefere ser chamado, trabalhou para figuras de peso, como Serra, Alckmin e Bruno Covas.

Entrevista | historiador Carlos Fico: ‘Ter investigação é o novo num caso de golpismo’

Por Bernardo Mello / O Globo

Notório pesquisador da História política brasileira e da ditadura militar, o professor da UFRJ Carlos Fico afirma que nunca houve no país, até 2022, um plano para matar o presidente eleito no contexto de um golpe de Estado. Outro ineditismo no caso que resultou no indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 36 pessoas, diz, é o próprio fato de estar havendo investigação.

Veja abaixo a entrevista ao GLOBO:

Poesia | Viver não dói, de Carlos Drummond de Andrade

 

Música | Gal Costa - Força Estranha