Folha de S. Paulo
Extrema direita precisa de crise para mudar a
Lei da Ficha Limpa ou aprovar anistia
A Polícia Federal acusa Jair
Bolsonaro de liderar uma quadrilha golpista. Entre outras atividades,
a organização criminosa tentava levar as Forças Armadas para o golpe. Tinha
apoio de uma célula de terroristas militares. Coordenava acampados diante do
Quartel General do Exército e contatos com gente que promoveu tumultos,
incêndios e ataques em dezembro e no 8 de Janeiro.
O capitão das trevas e comparsas devem ser denunciados por essas acusações ainda em fevereiro pela Procuradoria-Geral da República. Em abril, o Supremo daria início ao processo. Em novembro, essa gente poderia estar condenada.
Deputados do PL, bolsonarista, querem mudar
parte da Lei da Ficha Limpa. Mas, caso condenado por golpe, Bolsonaro
continuaria inelegível mesmo aprovada essa lei para limpar outras de suas
barras sujas.
Embora desesperada, a estratégia bolsonarista
tem algum sentido. Caso a mudança na Lei da Ficha Limpa fosse aprovada e não
fosse barrada por Executivo e Judiciário, não teria efeito prático, eleitoral,
a condenação de Bolsonaro no TSE, de 2023, por
abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação. Ao menos por
um momento nome de novo viável para 2026, o capitão das trevas teria algum
combustível extra para atacar o processo de golpe no STF.
Outra contraofensiva da extrema direita é a
anistia dos condenados do 8 de Janeiro, que poderia beneficiar, no caso de
terra em transe, também Bolsonaro. São hipóteses remotas, embora menos do que
em fevereiro de 2024, quando a campanha foi lançada.
A discussão foi reavivada por Hugo Motta (Republicanos-PB),
não se sabe por inadvertência ou como ameaça velada. O novo presidente da
Câmara disse que condenações da turba do 8 de Janeiro são exageradas, assim
como o tempo de inelegibilidade previsto pela Lei da Ficha Limpa.
Motta e Davi
Alcolumbre (UB-AP) reiteraram também que querem paz com governo e STF;
que não pretendem pautar projetos de leis divisivos e tumultuários; que vão
ouvir os colégios de líderes do Congresso.
Primeiro, Alcolumbre e Motta querem acertar
as contas —receber o dinheiro das emendas. Negociam novo acordão com STF e
governo, embora Flavio Dino, do STF, tenha marcado audiência, para o dia 27, a
fim de cobrar vergonha na cara. Segundo, o centrão discute como apoiar Lula em 2025,
em troca de cargos, sem se comprometer com apoio em 2026 —ao contrário.
São negociações de risco para o governo e,
pois, fresta de esperança para a extrema direita. Uma baixa maior da
popularidade de Lula teria efeitos dúbios. Por um lado, diminuiria a força
política do governo e favoreceria debandadas perigosas. Mas, por isso mesmo,
criaria oportunidades para várias direitas em 2026. Haveria, pois, candidaturas
interessadas em ver Bolsonaro fora do páreo.
Por ora, não há ambiente para anistiar a
cúpula golpista, seja por qual meio for. Tais projetos implicam conflito ainda
maior entre Congresso e STF. A maior parte da elite econômica não embarcaria,
sem mais, em turbulência. De resto, essa elite pega mais carona na política do
que a determina e, em caso de fraqueza de Lula, poderia entrar em outra canoa
direitista, sem precisar de Bolsonaro.
Ainda assim, a política no Brasil pode mudar
de água para vinho ou vinagre em meses (vide 2013, 2015, 2019). Atrasos do STF
no processo do golpe e brincadeiras com a estabilidade econômica podem
despertar monstros.
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