quarta-feira, 21 de maio de 2025

Opinião do dia – Norberto Bobbio*

“Na memória histórica dos povos europeus, a democracia apresenta-se pela primeira vez através da imagem da agorá ateniense, a assembleia ao ar livre onde se reúnem os cidadãos para ouvir os oradores e então expressar sua opinião erguendo a mão. Na passagem da democracia direta para a democracia representativa (da democracia dos antigos para a democracia dos modernos), desaparece a praça, mas não a exigência de “visibilidade” do poder, que passa a ser satisfeita de outra maneira, com a publicidade das sessões do parlamento, com a formação de uma opinião pública através do exercício da liberdade de imprensa, com a solicitação dirigida aos líderes políticos de que façam suas declarações através dos meios de comunicação de massa.”

*Norberto Bobbio(18/10/1909-09/01/2004), filósofo político, historiador do pensamento político, escritor e senador vitalício italiano. ”Teoria Geral da Política - A Filosofia Política e as Lições dos Clássicos”. P.387.Editora Campus, Rio de Janeiro. 2000

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Ibama acertou ao autorizar simulação na Margem Equatorial

O Globo

Qualquer exploração de petróleo deve estar sujeita a exigências rigorosas, mas não faz sentido atrasar pesquisa

Apesar da demora, o Ibama fez bem em permitir à Petrobras trabalhar na Margem Equatorial. A autoridade ambiental deu sinal verde para a petroleira simular o resgate de animais na região da Foz do Amazonas, faixa oceânica entre os litorais de Amapá e Pará. Trata-se do último passo antes da licença ambiental necessária a prospectar petróleo e gás. Um novo pedido de licenciamento será necessário para exploração, caso a prospecção constate haver viabilidade econômica. Não fazia sentido o Ibama continuar a atrasar a etapa de pesquisa, como vinha fazendo.

Na simulação de um vazamento de petróleo em alto-mar, as autoridades avaliarão a agilidade na resposta, a eficiência dos equipamentos e a comunicação com comunidades e o poder público. Ciente do desafio, a Petrobras contará durante o teste com um contingente de 400 profissionais, navios de grande porte, helicópteros e uma sonda de perfuração que virá do Rio.

A República em seu labirinto - Marcelo Godoy

O Estado de S. Paulo

O general parece sepultar com seu depoimento toda uma época de golpes, rebeliões e ditaduras

“Se dissemos que não há inocentes na política, isso se aplica mais aos juízes do que aos condenados”, assim Merleau-Ponty tratou a confissão de Nikolai Bukharin no julgamento de Moscou, o terceiro do Grande Terror. O depoimento do dirigente bolchevique foi o ponto alto do processo. Descrito por Lenin em seu testamento como “o preferido do partido”, Bukharin confessou o que lhe atribuíam. Queria salvar a pele de sua mulher, Anna Larina, e do filho do casal. Mas, para surpresa de todos, negou a acusação de ter tramado a morte de Lenin. Mesmo assim, foi condenado e executado com os demais réus. A engrenagem que se moveu em Moscou naqueles anos está no centro de Humanismo e Terror, de Merleau-Ponty.

Diante do gigantismo do espetáculo que se começou a encenar em Brasília, é possível relembrar o filósofo francês. Cada vez que Alexandre de Moraes interpelava o general Marco Antonio Freire Gomes, o magistrado despertava na audiência a impressão de estar diante de um Andrei Vichinski, o implacável acusador de Bukharin. Mas, se é verdade que os juízes não são inocentes na política, os acusados – e as testemunhas – também não são. É o que, no fim, mostrou o depoimento do general.

A importância do ‘habeas corpus’ - Nicolau da Rocha Cavalcanti

O Estado de S. Paulo

Persistem e revivem ainda hoje algumas incompreensões sobre o ‘writ’, o que acaba por reduzir ou mesmo tolher sua eficácia

No início do mês, noticiou-se que a Casa Branca estuda suspender o habeas corpus nos EUA, como medida da política anti-imigração de Donald Trump. Em outro contexto, mas com semelhante raiz autoritária, em dezembro de 1968, o Ato Institucional n.º 5 (AI-5) suspendeu no Brasil “a garantia de habeas corpus, nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular”. É incrível como se manifesta, em diferentes circunstâncias políticas, a mesma lógica do arbítrio: enxerga-se na proteção da liberdade – no habeas corpus que assegura limites ao poder estatal – um obstáculo a ser removido, sob pretexto de defesa do interesse nacional.

O ataque de Trump ao dólar global - Martin Wolf*

Valor Econômico

Embora outros países possam desejar diversificar-se para além da moeda americana, eles carecem de uma alternativa atraente

Estaria o domínio do dólar prestes a desaparecer? “Se perdermos o dólar como moeda mundial [...] isso seria o equivalente a perder uma guerra”, insiste em dizer Donald Trump. Ele próprio, contudo, poderia ser a causa dessa derrota. Confiar em uma moeda estrangeira depende de confiar na própria liquidez e solidez dessa divisa. A passos lentos, a confiança no dólar vem se desgastando já há algum tempo. Agora, com Trump, os Estados Unidos se tornaram erráticos, indiferentes e até hostis: por que alguém confiaria em um país que deu início a uma guerra comercial contra aliados?

O livro que Lula levou para a viagem a Rússia e China - Fernando Exman

Valor Econômico

Presidente carregava um exemplar de “O Animal social”, de Elliot Aronson

Seis dias antes do fatídico jantar em que ocorreu o constrangimento diplomático com a China provocado pela intervenção não programada da primeira-dama Rosângela da Silva em uma conversa sobre regulação das redes sociais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarcou na base aérea de Moscou para participar das homenagens aos 80 anos da vitória contra os nazistas na Segunda Guerra Mundial. Tudo seguiu como previsto pelos zelosos cerimonialistas dos dois países. Contudo, um detalhe se sobressaiu nas imagens divulgadas pelo Planalto.

Aberta a porta do avião, Lula desceu calmamente os cerca de 20 degraus da escada. Um tapete vermelho decorava a estrutura. Após breves honras militares, ao presidente foi exibida uma brochura comemorativa em alusão ao fim do conflito. Sorrisos. Os fotógrafos oficiais registraram, então, o objeto que Lula carregava consigo: um exemplar do livro “O animal social”, de autoria do psicólogo social Elliot Aronson, que nessa edição contou com a parceria de seu filho, Joshua, para desbravar fenômenos como a ascensão de bolhas de informação e o comportamento polarizado dos Estados Unidos.

Começou a temporada das ‘jenialidades’ - Lu Aiko Otta

Valor Econômico

Ano pré-eleitoral e crise na popularidade de Lula colocaram em força máxima a usina de ideias de novas medidas para conquistar o coração do eleitor

O ano pré-eleitoral e a crise na popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva colocaram em força máxima a usina de ideias de novas medidas para conquistar o coração do eleitor. O problema é que o governo cuida mal dos programas que já existem, como mostra o recente escândalo dos descontos não autorizados no INSS.

Além disso, por serem genéricas, informações sobre planos e ideias deixam no ar a dúvida se representam ou não pressão para aumentar gastos, já fortemente comprimidos pelo arcabouço fiscal. Ou, como tem sido a tendência mais recente, se são despesas que, por serem financeiras, não afetam o resultado primário das contas públicas e o arcabouço, mas podem aumentar a dívida.

Renda do trabalho em alta e supersafra fazem marcado elevar projeção do PIB

Mayra Castro / O Globo

Desaceleração adiada de novo

A desacerelação da economia foi, mais uma vez, adiada — e, talvez, a freada seja menor do que a que vinha sendo esperada. Com mais uma supersafra cada vez maior, o mercado de trabalho aquecido, com rendimento nas máximas históricas, e o crédito ainda em expansão, mesmo com juros em alta, economistas já estão revisando para cima suas projeções de crescimento econômico para o primeiro trimestre.

Já era esperado que a agropecuária puxasse a economia, com clima favorável e boa quantidade de chuvas desde outubro do ano passado, mas a freada no consumo deverá ficar mais para este segundo trimestre e, principalmente, para a segunda metade do ano.

Uma confirmação do adiamento da desaceleração veio anteontem. O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) indicou que a economia brasileira cresceu 1,3% no primeiro trimestre ante o período de outubro a dezembro de 2024.

Vaias são trilha sonora de crise sem fim - Vera Magalhães

O Globo

Fragilidade de Lula diante de cenário adverso em que problemas se acumulam ficou evidente na marcha dos prefeitos

As vaias se sobressaíram aos aplausos na recepção ao presidente Lula na marcha dos prefeitos em Brasília nesta terça-feira. O petista poderia ter passado batido pelos apupos, mas acusou o golpe ao dizer que nunca fez distinção partidária ou ideológica para atender a municípios e seus representantes em todas as vezes que ocupou o Planalto. Sua fragilidade diante de um cenário cada vez mais adverso, em que as crises, em vez de ser debeladas, vão se somando, é cada vez mais notória.

O contingente que compareceu ao evento anual dos prefeitos é aquele que emergiu das urnas no ano passado, sem que o entorno de Lula desse a devida importância: administradores oriundos de partidos do Centrão, em grande parte reeleitos ou eleitos com apoio de gestores alimentados à base de emendas direto na veia. Esses políticos são dissociados de qualquer vínculo mais forte com o Planalto, por isso não estão nem um pouco preocupados em demonstrar um tipo de gratidão com que Lula se acostumou nos mandatos anteriores — e não entendeu que não existe mais.

Israel escancara uso da fome como arma de guerra em Gaza - Bernardo Mello Franco

O Globo

Foto de palestinas com panelas vazias é novo retrato da barbárie que parte do mundo finge não ver

As fotos correram o mundo nesta segunda-feira. Num campo de refugiados ao norte de Gaza, dezenas de palestinos famintos estendem suas panelas vazias. Tentam receber alguma comida após quase três meses de bloqueio à entrada de ajuda humanitária.

Em março, o governo de Israel fechou a passagem de comboios com doações para a população civil. A atitude escancarou o uso da fome como arma de guerra contra inocentes.

Nesta segunda, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu finalmente autorizou a entrada dos primeiros caminhões com alimentos. Fez questão de informar que agia a contragosto, por “razões diplomáticas”.

Depois de um longo silêncio cúmplice, países que apoiavam Israel incondicionalmente enfim começam a se manifestar contra a calamidade em Gaza. Em declaração conjunta, os governos de Reino Unido, França e Canadá afirmaram que o nível de sofrimento humano na região se tornou “intolerável”.

O Brasil estará preparado para as oportunidades do futuro? - Zeina Latif

O Globo

A insegurança jurídica, disseminada, retira potencial de crescimento do país e poderá impedi-lo de aproveitar satisfatoriamente as novas oportunidades

Tornou-se um mantra entre os economistas a frase “o Brasil está ficando velho antes de ficar rico”. Não é um problema exclusivamente brasileiro, sendo um tema para muitos países emergentes, mas aqui preocupa mais.

O Brasil tem envelhecimento populacional mais rápido do que a América Latina. O percentual da população acima de 60 anos correspondeu a 13,4% na América Latina e 15,8% no Brasil em 2022, aponta o IBGE. A taxa de fertilidade é baixa (1,6 filho por mulher), e a taxa de mortalidade de jovens, elevada (34% delas por homicídio, em 2023). As falhas nas políticas públicas pesam nesse resultado.

Para se ter uma ideia, enquanto a França demorou mais de 100 anos para que o número de pessoas com 65 anos ou mais passasse de 7% para 14% do total da população, o Brasil o fez em 25 anos. Os EUA, por sua vez, conseguiram que transição demorasse 67 anos, por conta da imigração em larga escala e de taxas de fecundidade historicamente mais estáveis.

Julgamento dos "kids pretos" coloca em questão o papel das Forças Armadas – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O grupo é integrado por militares formados pelo Curso de Operações Especiais do Exército Brasileiro, treinados para atuar nas missões sigilosas

Por unanimidade, os ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram para tornar réus mais 10 acusados de tentativa de golpe de Estado. O ministro Alexandre de Moraes foi o primeiro a votar e liberou o coronel da reserva Cleverson Ney Magalhães e o general Nilton Diniz Rodrigues por "falta de justa causa". Todos os outros quatro integrantes da Primeira Turma o acompanharam. Foram rejeitadas todas as chamadas "questões preliminares" apresentadas pelas defesas dos acusados de integrar o Núcleo 3 da suposta tentativa de golpe de Estado.

Para Moraes, a denúncia não comprovou de maneira satisfatória a participação de Nilton Diniz Rodrigues, general que assessorava o ex-comandante do Exército Freire Gomes, e Cleverson Magalhães, que auxiliava o general Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira na trama golpista. Ambos foram acusados de agir para influenciar o Alto-Comando a aderir ao golpe.

Hamas venceu: inteligência morreu - Cristovam Buarque*

Correio Braziliense

A política externa israelense não consegue construir uma nação em paz com seus vizinhos porque, ao serem provocados por grupos terroristas, seus dirigentes abandonam a inteligência da diplomacia

Em geral, artigos em jornal morrem no dia seguinte à sua publicação. Mas, ao assistir ao noticiário do último fim de semana sobre a violência do exército israelense em Gaza, 20 meses depois de um artigo, publicado em outubro de 2023, creio que se justifica republicá-lo, sem mudar uma vírgula, nem título:

"Nenhum país do mundo tem o acervo de Israel em inteligência. Apesar disso, a política externa israelense não consegue construir uma nação em paz com seus vizinhos porque, ao serem provocados por grupos terroristas, seus dirigentes abandonam a inteligência da diplomacia, construtora da convivência no longo prazo, e optam pelo poder militar, da destruição da população palestina. Caem nas armadilhas dos que precisam incentivar o radicalismo que se retroalimenta impedindo a paz e promovendo o ódio que os terroristas precisam.

Avaliação de Trump despiora - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Confiança do consumidor afunda; efeito político e econômico maior só a partir de julho

A avaliação de Donald Trump despiorou. Não é tão baixa quanto no final de abril. Mas está longe do nível do início de mandato. A despiora ocorreu depois de Trump desistir do aumento mais lunático dos impostos de importação (tarifas), rendendo-se à reação dos mercados financeiros e às pressões de executivos de grandes bancos e empresas. No Brasil, talvez dissessem que Trump foi vítima de ataque especulativo.

O ruído político-midiático diminuiu, o preço das ações aumentou —62% das famílias têm ações, segundo pesquisa Gallup de 2024. A confiança do consumidor americano, porém, desceu aos piores níveis da história registrada, mais de 70 anos.

Expulsando ‘fascistas’ do campus - Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

Performance alimenta a ideia de que a universidade é um feudo ideológico

A imagem das universidades públicas brasileiras talvez nunca tenha sido tão ruim. É crescente o número de pessoas convencidas de que se trata de um desperdício de recursos, já que essas instituições estariam mais empenhadas em formar militantes radicais de esquerda —e não os profissionais de que o país precisa—, além de oferecerem a estudantes privilegiados um parquinho privado e caríssimo para o desfrute narcisista, entre pares, de sua ideologia.

Em vez de entregar formação de alto nível, ciência e inovação, as universidades seriam parte da linha de produção da elite identitária. E, longe de espaços de liberdade intelectual, teriam se tornado ambientes intolerantes ao pluralismo de ideias e clubes privados dos progressistas, desconectados da população que os sustenta.

Não deveria ser necessário dizer isso, mas, nestes tempos em que a raiva política precede a leitura do texto, é preciso esclarecer: trata-se da percepção pública. Sei que as universidades públicas são muito melhores do que a imagem que delas fazem seus detratores. Acontece que, na hora da decisão parlamentar sobre os enormes orçamentos das universidades, ou quando se discute, por exemplo, se vale a pena gastar tanto com o ensino superior em vez da educação básica —dado o cobertor curto da fazenda pública—, é essa percepção, não a realidade, que costuma decidir as coisas.

Janja (desta vez) está certa - Raphael Di Cunto

Folha de S. Paulo

Primeira-dama fez bem ao tratar com presidente chinês da influência das redes sociais sobre os jovens

A primeira-dama Janja da Silva tem cometido muitos erros ao longo do mandato de seu marido, que lhe renderam a fama de deslumbrada e atrapalham o próprio governo, mas a fala sobre a necessidade de regulação das redes sociais num jantar com o presidente da ChinaXi Jinping, não se enquadra em um desses episódios.

As críticas da oposição à quebra de protocolo são, no mínimo, descabidas. A conversa foi muito, mas muito menos grave do que os ataques públicos e reiterados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao governo chinês, que até derrubaram o seu ex-chanceler.

A Europa sucumbiu ao fascismo? - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Chega, o partido de extrema direita, se torna segunda força política de Portugal, mas discussão é mais complexa

desempenho do Chega, o partido de extrema direita português, no pleito de domingo (18) nos dá razões para preocupação. A legenda, que fizera um único deputado na eleição de 2019, obteve agora 23% dos escrutínios, empatando com os socialistas como segunda força da política lusitana.

Quem explica bem a trajetória de partidos como o Chega é o cientista político Vicente Valentim (Oxford) em "The Normalization of the Radical Right", livro que já comentei aqui. Num resumo grosseiro, eleitores têm ideias de direita, mas, por motivos reputacionais ou estratégicos, não as expressam em público nem nas urnas enquanto sentem que existe reprovação social a essa ideologia. Os diques, porém, só funcionam até certo ponto.

Poesia | Sobre a Velhice, de José Saramago.

 

Música | Verônica Ferriani e Manoel Cordeiro - Construção (Chico Buarque)