domingo, 20 de abril de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Redução da jornada de trabalho não passa de engodo

O Globo

PIB brasileiro sofreria queda de até 16% caso houvesse mais uma folga semanal, estima estudo da Fiemg

Os projetos em tramitação no Congresso defendendo a redução da jornada semanal de trabalho ganharam apoio de setores da esquerda com base numa visão idealista e distorcida da realidade econômica. Defensores do fim da jornada de 44 horas semanais — ou 6x1, com seis dias trabalhados e um de folga — ignoram (ou fingem ignorar) que a mudança teria consequências dramáticas para o crescimento e a geração de riqueza.

Num cenário otimista, reduzi-la para 40 horas, com duas folgas semanais, provocaria queda de 14,2% no PIB, com perda de 16 milhões de empregos e de R$ 102 bilhões em impostos, segundo estudo da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg). Tal cenário considera que haveria aumento de 1% na produtividade do trabalho, patamar muito superior ao 0,2% anual registrado entre 1981 e 2024. Sem esse aumento, a queda no PIB chegaria a 16%, com perda de 18 milhões de empregos e de R$ 118 bilhões em impostos, destinados a investir em educação, segurança ou saúde.

O Capital (Prefácio à primeira edição) - Karl Marx

Crítica da Economia Política

A obra, cujo primeiro volume entrego ao público, constitui a continuação do meu escrito publicado em 1859: Zur Kritik der Politischen Oekonomie. Do longo intervalo entre começo e continuação é culpada uma doença de muitos anos que repetidamente interrompeu o meu trabalho.

O conteúdo daquele escrito anterior está resumido no primeiro capítulo deste volume. Isto não aconteceu apenas por causa da conexão e da integralidade. A exposição está melhorada. Tanto quanto o estado das coisas de alguma maneira o permitiu, muitos dos pontos anteriormente apenas aludidos estão aqui desenvolvidos, enquanto inversamente o ali circunstanciadamente desenvolvido é aqui apenas aludido. As seções acerca da história da teoria do valor e do dinheiro naturalmente foram agora completamente suprimidas. Contudo, o leitor do escrito anterior encontra patentes, nas notas do primeiro capítulo, novas fontes para a história daquela teoria.

Todo o começo é difícil — isto vale em qualquer ciência. A compreensão do primeiro capítulo, nomeadamente da seção que contém a análise da mercadoria, constituirá, portanto, a maior dificuldade. Tornei o mais possível popular aquilo que mais de perto diz respeito à análise da substância do valor e da magnitude do valor. A forma-valor, cuja figura acabada é a forma-dinheiro, é muito simples e vazia de conteúdo. Não obstante, o espírito humano, desde há mais de 2000 anos, tem em vão procurado sondar-lhe os fundamentos, enquanto, por outro lado, a análise de formas muito mais plenas de conteúdo e complicadas pelo menos aproximadamente resultou. Por quê? Porque o corpo [já] formado é mais fácil de estudar do que a célula do corpo. Além disso, na análise das formas económicas não podem servir nem o microscópio nem os reagentes químicos. A força da abstração tem de os substituir a ambos. Para a sociedade burguesa, porém, a forma-mercadoria do produto de trabalho ou a forma-valor da mercadoria é a forma económica celular. Ao não instruído a análise desta parece perder-se em meras subtilezas. Trata-se aqui de fato de subtilezas, só que, porém, do mesmo modo que delas se trata na anatomia micrológica.

Números revelam o nó inescapável - Míriam Leitão

O Globo

As contas públicas estão numa rota perigosa e para entender a situação fiscal do país é preciso fugir da polarização política

O governo Lula reduziu o déficit primário, mas a dívida pública subiu. Ele tem alguns números melhores do que os do governo Temer, e corrigiu erros de Bolsonaro. O gasto de pessoal é menor hoje do que no governo Temer. A despeito de tudo isso, as contas públicas estão numa rota perigosa. Para entender a situação fiscal do país é preciso fugir da polarização política. No Brasil, esquerda e direita gostam de gastar. A situação das contas públicas exigirá tarefas inescapáveis dos brasileiros.

O apagão orçamentário – Elio Gaspari

O Globo

Para gastar, os ministérios são 39. Mas quando se fala que vai faltar dinheiro, surgem apenas dois: Saúde e Educação

Na semana passada os brasileiros souberam de duas novidades: é possível que haja vida no planeta K2-12b, a 124 anos-luz de Brasília, e foram avisados por Fernando Haddad e Simone Tebet de que em 2027 o governo não terá dinheiro para honrar os compromissos de verbas para a Educação e Saúde.

A primeira novidade pertencia ao campo da busca do conhecimento. O telescópio James Webb varre o espaço desde 2021 procurando sinais de vida. A segunda novidade pertencia ao campo da empulhação, pois nada há de novo no fato de que o governo ficaria sem dinheiro para fechar suas contas, honrando os compromissos constitucionais.

Sabe-se pouco sobre o K2-12b, pois ele está a 124 anos-luz, e uma notícia vinda agora de lá teria sido emitida em 1901, quando aqui na Terra um sinal de rádio de Guglielmo Marconi atravessou o Atlântico. Já o apagão orçamentário é coisa atual, por perene.

O fantasma voltou - Merval Pereira

O Globo

Há dois líderes populares no Brasil. Um de direita, Jair Bolsonaro, e outro de esquerda, Lula. Há ainda 29 partidos políticos registrados, mas nenhum deles tem vida própria. O PT é menor do que Lula. O PL também depende de Bolsonaro, que já perambulou por oito partidos até estacionar, por enquanto, nele. Isso quer dizer que nós ainda dependemos de nomes, não de ideias.

Quando Lula estava impedido pela legislação eleitoral de se candidatar a presidente, o PT perdeu. Antes, perdera outras três vezes, duas para uma ideia, o Plano Real, e outra para outro populista, este de direita, Collor de Mello. Sem Bolsonaro para competir em 2026, o PL não tem quem o substitua, por isso o ex-presidente insiste com o governador de São Paulo Tarcísio de Freitas para que saia do Republicanos, filiando-se ao PL. Pode ser um sinal de que já começa a aceitar que não poderá concorrer, e quer fazer do PL o seu partido. Valdemar Costa Neto, que controla o PL, deve se preocupar.

Um escritor no palanque - Bernardo Mello Franco

O Globo

Depois de trocar marxismo por liberalismo e se candidatar a presidente, escritor se aproximou da extrema direita no fim da vida

Mario Vargas Llosa passava férias no norte do Peru quando ouviu pelo rádio um discurso do presidente. Era julho de 1987, e Alan García anunciava a nacionalização de bancos e seguradoras. Liberal de carteirinha, o romancista escreveu um artigo exortando os compatriotas a protestarem contra a medida, que considerava um salto para a ruína econômica.

Publicado no jornal El Comercio, o texto deu origem a um manifesto, que logo se converteu num movimento e num partido. Em menos de um mês, o autor de “Conversa no Catedral” estava no alto de um palanque, discursando para 130 mil pessoas na Praça San Martín. Vieram outros comícios, e Vargas Llosa saiu dos cadernos de literatura para entrar nas páginas de política. A aventura durou até junho de 1990, quando ele perdeu a eleição presidencial para outro outsider: Alberto Fujimori.

O (in)concebível – Dorrit Harazim

O Globo

Segundo pesquisa da revista Nature com 1.600 cientistas nos EUA, 75% declararam estudar a possibilidade de sair do país

Semanas atrás, três professores da Universidade Yale — uma das oito instituições privadas que compõem a estelar Ivy League americana — tornaram pública sua mudança para a Munk School of Global Affairs and Public Policy, de Toronto, no Canadá. Em tempos normais, a notícia nem notícia seria, dada a mobilidade inerente ao mundo acadêmico. Só que o filósofo Jason Stanley, o historiador Timothy Snyder e sua mulher Marci Shore, professora de História intelectual europeia, não são nomes quaisquer.

Stanley, autor de seis livros — incluindo “Como funciona o fascismo” —, centra sua obra na manipulação emocional da propaganda fascista e nos riscos de uma sociedade ignorar sinais precoces de autoritarismo. Judeu, pai de dois filhos multirraciais (foi casado com a cardiologista negra Njeri K. Thande), ele já sofreu inúmeras ameaças de morte digitais recentes. Por isso decidiu empacotar seu saber e filhos para além do ambiente político opressor instaurado por Donald Trump.

A fotobiografia de JK - Celso Lafer

O Estado de S. Paulo

JK teve a capacidade de compreender a complexidade da realidade do País, suas urgências e seus desafios

Juscelino Kubitschek – uma fotobiografia, organizada com dedicação e competência por Fábio Chateaubriand, foi recém-publicada (2024) sob os auspícios da Fundação Padre Anchieta (FPA). José Roberto Maluf, presidente da FPA, destacou o significado para o conhecimento da vida brasileira das imagens que o livro apresenta. Ele pontua que o norte e a âncora da trajetória de JK foram permeados pelos valores e pelas práticas da democracia. É o que configurou exemplarmente o parâmetro em cujo âmbito deu rumo às transformações do Brasil, que liderou como notável homem público.

A fotobiografia é um gênero pouco explorado entre nós. Tece a tradicional narrativa da palavra de uma biografia com o poder visual das fotos. As fotos compõem uma antologia que capta a experiência de uma vida. Esclarecem de onde veio, como veio e a que veio JK, e também o que padeceu no final, por conta do arbítrio do regime autoritário de 1964. Na edição comercial dessa fotobiografia, de próxima publicação, essa maior investigação iconográfica sobre JK estará distribuída em 13 capítulos, que dão o fio estruturador de um admirável trabalho de pesquisa.

‘Me first’ - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

A relação entre Brasil e China: de política e comércio a inflação; de aviões e soja a quinquilharias

Donald Trump empurrou o mundo para o colo da China e o desafio do Brasil é calibrar a intensificação da parceria, não apenas no comércio, que é óbvia, mas também na política, que é consequência. As exportações para a China vão crescer, mas as importações também tendem a disparar. O risco para os consumidores/eleitores brasileiros é aumento de preços, já excessivos. E, para a indústria, competição desleal.

A China ultrapassou os Estados Unidos como principal parceiro comercial do Brasil ainda nos primeiros governos Lula, com um detalhe que vai muito além do detalhe: o Brasil é superavitário nas relações com a China e deficitário com os EUA, o que deve ficar ainda mais estridente a partir da guerra insana, irresponsável e inconsequente de Trump contra tudo e todos. A diferença: os EUA estão reféns de Trump, impetuoso e personalista, e a China é estratégica, tem rumo e determinação.

Não vai dar certo - José Roberto Mendonça de Barros

O Estado de S. Paulo

Há uma percepção generalizada de que Donald Trump não sabe muito bem o que está fazendo

A avalanche de notícias ruins continua, sem qualquer indício de que vá parar logo. Na segunda semana de abril, o mercado de Treasures estressou, após um leilão com demanda fraca e boatos recorrentes de ordens de venda vindas da Ásia, um sinal de que a confiança nos papéis sempre considerados como livres de risco está sofrendo arranhões. Essa situação levou o presidente americano a adiar por noventa dias as chamadas tarifas recíprocas.

Poucos dias depois, foi a vez da liberação de importações vindas da China na área de telefones e outros eletrônicos, a chamada “emenda Apple”. Mas tudo isso em meio a ameaças de novas tarifas e outras retaliações.

A complicação, certamente não esperada por Trump, foi a decisão chinesa de enfrentar a guerra na linha de olho por olho, tanto na área tarifária quanto na comercial. O controle mais estrito nas exportações de terras raras e a suspensão das entregas de aviões da Boeing são bons exemplos.

Um ataque às instituições americanas - Lourival Sant’Anna

O Estado de S. Paulo

Trump encontrou no presidente do Fed o bode expiatório para o estrago causado por suas políticas

A ameaça de Donald Trump de destituir o presidente do Banco Central (Fed), Jerome Powell, é mais um golpe no sistema que transformou os EUA na nação mais rica e poderosa de todos os tempos. O presidente está destruindo o maior ativo do país: a independência e confiabilidade de suas instituições.

As leis americanas pressupõem presidentes que compartilham valores fundamentais do país, incluindo o respeito às normas e à Justiça e os limites do poder, sujeito a freios e contrapesos. A lei que criou o Fed, em 1913, não explicita que seu presidente não pode ser destituído, mas estabelece as condições para sua autonomia, no plano operacional e institucional: o banco não depende de dotações orçamentárias nem presta contas ao Congresso – e muito menos ao Executivo, o que parecia óbvio ao legislador, até surgir Trump.

Na Páscoa, oremos por aqueles que não têm paz nem segurança - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Há 122,6 milhões de pessoas deslocadas no mundo, segundo o ACNUR, das quais 72,1 milhões permanecem dentro de seu país e 43,4 milhões são refugiados

Na tradição judaica, a Páscoa comemora a libertação dos hebreus da escravidão no Egito, liderada por Moisés, conforme o livro do Êxodo. Essa celebração já existia, séculos antes do cristianismo, e envolvia o sacrifício de um cordeiro e uma refeição ritual. No hebraico, “Pessach” significa “passagem”; Páscoa para os cristãos.

No Brasil de maioria cristã (católicos, ortodoxos e protestantes), a Páscoa é a maior celebração litúrgica, somente suplantada pelo Natal. A Semana Santa não é apenas um feriadão. Representa a esperança, a renovação espiritual, a vitória do bem sobre o mal e da vida sobre a morte.

Missas, procissões, vigílias, jejuns e a Paixão são ritos de passagem que fortalecem a solidariedade e a fraternidade na sociedade. Mesmo o lado comercial da Páscoa tem esse significado: a origem da tradição é o culto à Eostre, deusa anglo-saxônica da fertilidade e do renascimento, que coelhos e ovos de Páscoa representam.

Brasil: país do vale tudo? - Dóris Faria*


Correio Braziliense

O vale tudo no Brasil não é só um objeto de duas edições de novela, é um processo histórico recorrente de nosso passado, presente e será que ainda do futuro?

O vale tudo no Brasil não é só um objeto de duas edições de novela, é um processo histórico recorrente de nosso passado, presente e será que ainda do futuro? A começar com a própria Proclamação da República (1889), que, desde então, sofre algumas ocorrências em processo contínuo, sob o controle das elites econômicas que dominam as políticas regionais e nacionais. Foram várias as tentativas de golpe que não tiveram punição e, mutatis mutante, se repetiram. Com anistia garantida a todos seus executores, essas recorrências foram acontecendo ao longo de nossa história republicana.  

Três períodos podem ser compreendidos com similaridades e diferenciações do vale tudo que vem dominando a nação brasileira: o primeiro, ao longo da ditadura (anos 60 a 80), garantiu aos militares torturadores a isenção de um processo de anistia; o segundo — a partir de 1985, no início do processo de democratização, conclusão da nova Constituição (1988) — ocorreu até 2002, com a primeira eleição presidencial direta e o (primeiro) governo Lula. 

Xi, me dá um dinheiro, aí - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Até o final deste ano de caos trumpista, Lula vai se reunir três vezes com Xi Jinping

Luiz Inácio Lula da Silva vai à China em maio. Assunto com a China jamais falta, menos ainda com os destampatórios do Nero Laranja, Donald Trump. Mas o que Lula ou o Brasil querem com a China?

Em abril de 2011, no início de seu primeiro mandato, Dilma Rousseff foi à China. Queria diminuir o "desequilíbrio comercial". O Brasil vendia à China commodities (comida e minérios), então 82,4% do total das exportações (dados da Secretaria de Comércio Exterior, aritmética deste jornalista). Importava manufaturados, mais de 99% das compras.

Débora é Jair de peruca? - Celso Rocha de Barros

Folha de S. Paulo

O projeto de anistia legaliza o golpe, mas não faz só isso: ele ressuscita o golpe

A menos que a cabeleireira Débora seja a versão drag queen do Jair ou do Braga Netto, o projeto de anistia que tramita na Câmara dos Deputados não foi feito para salvá-la.

Agora, se ela for a versão drag queen de um dos dois, deixo aqui meus parabéns ao maquiador. Se ele quiser um desafio ainda maior, proponho o Magno Malta.

Para se ter uma ideia do quanto Jair e sua quadrilha se preocupam com Débora, lembre-se de que, logo após o fracasso do 8 de janeiro, a versão oficial do bolsonarismo era de que os golpistas eram petistas infiltrados, criminosos que, além de serem presos, deveriam ser desmascarados como comunistas.

Governo subestima a oposição – Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Alguma anistia haverá, e a responsabilidade é do Palácio que tira por menos a força dos oponentes

Incrível como o governo é pego desprevenido pela oposição. Leva rasteira atrás de rasteira e ainda se surpreende. Isso acontece porque subestima o oponente.

Acabou se acontecer com o projeto de anistia aos golpistas. O Palácio dormiu no ponto, acordou tarde e o líder no SenadoRandolfe Rodrigues (PT), para justificar a inércia, saiu-se com esta: "Não entramos em campo antes porque quando o adversário está errando não se deve interrompê-lo".

A vez da performance do papagaio - Muniz Sodré

Folha de S. Paulo

Na verborragia, importa a voz da chefia e o desempenho, não o significado das palavras

O democrata Cory Booker, primeiro senador negro de New Jersey, bateu o recorde mundial de duração de um discurso parlamentar, falando em pé na tribuna contra Trump 25 horas ininterruptas, sem pausa para a toalete. Oposicionistas insinuaram o uso de fralda, mas o fato é que ele superou o recorde do republicano Strom Thurmond, supremacista branco da Carolina do Sul que, muitos anos atrás, deblaterou por 24 horas contra a Lei dos Direitos Civis.

Em termos de energia física, essas façanhas evocam as maratonas de dança durante a Grande Depressão nos EUA, cujos participantes iam até a exaustão para ganhar alguns trocados. Foram dramatizadas em "A noite dos desesperados", filme célebre de Sidney Pollack (1969). Algo não tão estranho quanto a famosa epidemia de Estrasburgo (1518) em que as pessoas dançavam até a morte, mas extremo ainda assim.

A arte da incerteza - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Livro discute a natureza da estatística e conclui que probabilidades não são uma propriedade objetiva do mundo

Seres humanos temos horror ao acaso, mas é ele quem dá as cartas nos mais diversos aspectos de nossas vidas. Pior, a estatística, que é a ferramenta de que dispomos para entender o acaso e lidar com ele, é irredutivelmente subjetiva. Esse é um resumo, só um pouquinho floreado, de "The Art of Uncertainty" (a arte da incerteza), de David Spiegelhalter (Cambridge).

O que eu gostei em "The Art..." é que o autor não se furta às questões difíceis, que ficam na zona cinzenta entre a matemática e a filosofia. Um exemplo? Ele chega a afirmar que a probabilidade, compreendida como uma propriedade objetiva do mundo, não existe. Quer dizer, talvez até exista em nível subatômico, no mundo quântico. Mas, nas dimensões em que operamos, probabilidades só refletem expectativas subjetivas de quem as enuncia.

Os EUA e seu presidente antiliberal – Juliana Diniz*

O Povo

É muito difícil imaginar que tal deterioração aconteça tão rapidamente. Por enquanto, assistimos um tanto incrédulos à passividade de uma sociedade que vê ruir, em meses, toda uma centenária tradição de defesa das liberdades. A América livre acabará?

O que acontece quando a autoproclamada maior democracia do mundo elege um presidente contrário ao liberalismo? Não devemos nos deixar enganar pelas aparências: mais do que o discurso, liberal é aquele que age como tal, que respeita os pressupostos do liberalismo, tanto na política quanto na economia. Donald Trump, por tudo que já fez em seu segundo mandato, é um presidente antiliberal, um dirigente mais aproximado a um autocrata do que a um presidente republicado contido pela "rule of law".

Leôncio Basbaum, sempre – Ivan Alves Filho*

Pernambucano, de origem judaica, Leôncio Basbaum foi um pensador refinadíssimo, sabendo aliar, como poucos, formulação política e participação militante. Preso 11 vezes ao longo da vida, esse comunista histórico seria o primeiro secretário-geral da Juventude Comunista, por indicação de Astrojildo Pereira. Em 1929, abriu conversações com Luiz Carlos Prestes, então no exílio, com o objetivo de lançá-lo candidato à Presidência da República pelo PCB, já no ano seguinte. Levava na bagagem um programa de governo, que submeteu ao Cavaleiro da Esperança. Prestes, naquele momento, considerou o programa partidário um tanto quanto radical para as condições do país.

Além de ter sido um dos representantes do PCB junto à Internacional Comunista, Leôncio Basbaum chegou a assumir, durante alguns meses, a secretaria geral do Partido, em 1932. Foi nesse ano que se deu o afastamento de Astrojildo Pereira da agremiação, por divergências em torno do chamado “obreirismo”: Astrojildo não via com bons olhos a política de “classe contra classe” defendida pelos partidários de Joseph Stalin no movimento comunista internacional, apontando para a diversificação existente na sociedade brasileira, onde as camadas médias assumiram funções cada vez mais importantes.  

A democracia é uma construção social conflitiva - Elimar Nascimento*

Revista Será?

Comentários do livro A construção da democracia no Brasil de Alberto Aggio

Os 40 anos ininterruptos de democracia no Brasil, comemorados no dia 14 de março, é um feito, em um País que tem uma história de muito autoritarismo. Na história republicana brasileira tem-se apenas uma feito maior, se, e com benevolência, considerarmos a estreita e elitista democracia a dobra dos séculos XIX/XX, entre 1889/1930. Tomando em consideração os dados mais consistentes, o percentual de eleitores no Brasil naquela época não chegava a 2% da população, enquanto o percentual de eleitores nas eleições de 2022 foi de 77%. A título de ilustração, analfabetos e mulheres não votavam em 1889, e como o regime eleitoral era censitário, além de ser homem o eleitor tinha de ser alfabetizado e ter um mínimo de renda.

Foram muitas as comemorações no passado mês de março por ocasião dos 40 anos de retorno à democracia que se deu com a posse do vice-presidente José Sarney, após a internação do presidente eleito pelo colégio eleitoral Tancredo Neves. Foram dias tensos naquele março de 1985, pois ainda havia, no âmbito das Forças Armadas, militares que não concordavam com o fim da ditadura. 

No sábado de 14 de março de 2025, a Fundação Astrojildo Pereira promoveu, com apoio do Correio Braziliense, no Panteão da Pátria, uma cerimônia comemorativa com a presença de José Sarney que discursou do alto de seus 95 anos a respeito do seu mandato presidencial, no qual o País dotou-se de uma nova Constituição. Seu maestro, o então deputado Ulisses Guimarães, denominou-a de Constituição Cidadã. Finalmente, depois de 21 anos os brasileiros voltavam a ter plena liberdade de se organizar e se expressar.

Poesia | Sim, sou eu, eu mesmo, tal qual resultei de tudo, de Fernando Pessoa

 

Música | Las Tres Grandes - Gracias a la Vida (Violeta Parra)