domingo, 1 de junho de 2025

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna*

“A primeira tentação para o vencedor é a de retomar o antigo repertório, revalorizando obras e instituições de provada serventia no passado. Mas o Natal mudou, a crença disseminada de que, apesar dos pesares, a sociedade estava animada por uma contínua, embora lenta, movimentação em sentido progressivo rumo a um desenvolvimento menos desigual em termos sociais e mais afluente na economia, está em franca dissipação. Os antigos partidos que sustentavam tais crenças já não existem mais, sepultados por uma aluvião de organizações sem alma e meramente fisiológicas, fora os sobreviventes como o PT e alguns poucos e minoritários como o PSOL, Rede e Cidadania, todos com baixa representação orgânica nos setores subalternos.”

*Luiz Werneck Vianna (1938-2024), Sociólogo, “Abrir a arca do tesouro”. Blog Democracia Política e novo Reformismo, 8 de fevereiro, 2023.

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Revisão completa de renúncias fiscais se tornou mais urgente

O Globo

Estimativa da Receita eleva em 47%, para R$ 800 bilhões, o total de isenções de impostos federais em 2025

Têm sido recorrentes, desde o início do atual governo, as tentativas do Ministério da Fazenda de cobrir rombos fiscais com aumento de impostos, num esforço por ampliar a arrecadação, em vez de promover um programa de controle de gastos confiável. A alta no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) é apenas a última medida num rol extenso que inclui taxas sobre importações via internet, gasolina e etanol, diesel e biodiesel, exportações de petróleo, apostas esportivas, armas e munições, painéis solares, veículos elétricos e híbridos, fundos exclusivos e offshore, além de medidas para aumentar a base de cobrança de impostos sobre o lucro das empresas. A lista é longa, não para de crescer — mas, curiosamente, não inclui a oportunidade mais óbvia diante do governo: uma revisão exaustiva das renúncias e isenções fiscais que beneficiam toda sorte de setor da economia.

Sistema disfuncional - Merval Pereira

O Globo

Enquanto os três Poderes não trabalharem na mesma direção, não teremos um país com equilíbrio econômico e social

A crise institucional que estamos vivendo nos leva inexoravelmente a uma reforma do sistema político-eleitoral que devolva o equilíbrio entre os Poderes da República. Se não formos nessa direção, continuaremos com um Executivo inoperante, um Legislativo dominante e um Judiciário empoderado em consequência da permanente disputa entre os dois primeiros. Vivemos um parlamentarismo de fancaria, que chegou em resposta a um hiperpresidencialismo que relegava a segundo plano o Legislativo, governando com decretos-lei, medidas provisórias e outros instrumentos que dispensam o sistema de pesos e contrapesos da democracia.

Durante muitos anos o Legislativo foi literalmente comprado pelo Poder Executivo, vejam-se os casos do mensalão e do petrolão, ou manobrado pelo presidente do turno liberando verbas em troca do apoio parlamentar, ou as contingenciando como uma espécie de castigo aos não obedientes. O que está acontecendo hoje, com os partidos políticos controlando uma quantidade enorme de verbas e esnobando indicações para postos no governo federal, tem a ver com uma das distorções de nosso sistema partidário.

João Campos é uma promessa de renovação da esquerda – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O país vive um interregno de lideranças políticas renovadoras e a legenda precisa repensar o seu papel na política brasileira para ultrapassar a polarização Lula versus Bolsonaro

Prefeito do Recife, João Campos é novo presidente nacional do PSB. Aos 31 anos, reeleito com 78% dos votos no ano passado, numa ampla coalizão, ocupa um cargo que já foi de seu bisavô, Miguel Arraes (1916-2005), e de seu pai, Eduardo Campos (1965-2014). Formado em engenharia civil pela Universidade Federal de Pernambuco, foi deputado federal de 2019 a 2020, quando concorreu e venceu a disputa pela Prefeitura.

Sua ascensão representa uma tentativa de renovação geracional na política brasileira, se comparada aos demais partidos de esquerda, mesmo considerando que o comando do PSB, até então a cargo de Carlos Siqueira, é compartilhado com políticos mais experientes: o vice-presidente Geraldo Alckmin; os governadores Carlos Brandão Junior (Maranhão), João Azevedo Filho (Paraíba) e Renato Casagrande (Espírito Santo); e os ex-governadores Paulo Câmara (Pernambuco), Márcio França (São Paulo) e Rodrigo Rollemberg (Distrito Federal).

Treze dias que abalaram o país - Bernardo Mello Franco

O Globo

Da renúncia de Jânio à solução parlamentarista, Brasil esteve à beira de uma guerra civil

Em 25 de agosto de 1961, Jânio Quadros chocou o país ao renunciar à Presidência. Sem maiores explicações, alegou que “forças terríveis” o impediam de governar. O vice-presidente João Goulart estava no exterior, e os ministros militares avisaram que ele não tomaria posse. No Rio Grande do Sul, o governador Leonel Brizola distribuiu armas à população e prometeu resistir em nome da legalidade.

“A renúncia de Jânio quase leva o país a uma guerra civil”, resume a socióloga Maria Victoria Benevides em depoimento à nova série documental “1961”, de Amir Labaki. Em três capítulos, a produção reconstitui a crise que terminou sem derramamento de sangue, mas pavimentou o caminho para o golpe de 1964.

Crianças – Dorrit Harazim

O Globo

Elas nunca iniciam guerras, mas são as mais indefesas, não só em Gaza, como na Ucrânia ou nas favelas brasileiras

Golda Meir deveria conhecer a força do apego humano a um chão. Dedicara a vida à criação do Estado de Israel antes de tornar-se a primeira e única mulher a chefiá-lo. Nascida na Kiev da antiga Rússia imperial (que depois se tornaria parte da União Soviética, implodiria com o comunismo e ressurgiria como capital da atual Ucrânia), a líder sionista chegou a ser portadora de passaporte palestino à época do Mandato Britânico na região.

— Os velhos morrerão, e os jovens haverão de esquecer — garantiu a colonos judeus que se assentaram em terras palestinas e se inquietavam com a rebelião dos expulsos.

Estava errada. Os velhos foram morrendo, sim. Mas não sem antes passar às gerações seguintes os nomes e as lembranças de um vilarejo, um teto, uma oliveira perdidos. Enquanto houver herdeiros desse mapa da memória palestina, o apego ao chão e ao direito de nele viver continuarão a ser repassados aos mais jovens. Ou, como escreve a tunisiano-britânica Soumaya Ghannoushi, especialista em política do Oriente Médio, “enquanto houver crianças, a Palestina vive”.

Bets e segurança: a distorção fiscal que ameaça o interesse público - Raul Jungmann*

Correio Braziliense

A omissão regulatória não só abre espaço para evasão fiscal e lavagem de dinheiro por parte das bets, como também representa a perda de uma janela histórica para financiar setores estratégicos sem aumento de carga tributária

O Brasil enfrenta uma crise fiscal aguda, na qual medidas improvisadas, como o aumento do IOF (Imposto sobre Operação Financeira), são adotadas para tentar equilibrar as contas públicas. Criado com função regulatória, o IOF não pode funcionar como válvula de escape para fechar o caixa da União, especialmente porque essa ferramenta encarece o crédito, atrapalha as operações financeiras e de alocação eficiente de recursos e distorce os preços relativos da economia.

Em 2018, quando ministro da Segurança Pública, lideramos a criação do Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP), com a promulgação da Lei nº 13.756. A lógica era simples: construir um mecanismo permanente, estável e não tributário de financiamento para programas estruturantes de segurança, inteligência e modernização das forças policiais. Inspiramo-nos nas boas práticas internacionais que desvinculam a proteção social de ciclos fiscais — e elegemos as loterias como uma fonte segura e escalável de recursos.

Convicção ou companheirismo? – Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Quem são os dois generais que o Exército ainda espera que sejam absolvidos do golpe?

Ao não tornar réus o general Nilton Diniz Rodrigues e o coronel Cleverson Ney Magalhães, a Primeira Turma do Supremo abriu uma porta – ou lançou uma esperança – para que outros militares sejam absolvidos ao longo do julgamento pela tentativa de golpe. Os dois mais citados por chefes e colegas no Exército são os generais da reserva Augusto Heleno e Estevam Theophilo Gaspar de Oliveira.

Há uma percepção de que o relator do golpe no STF, Alexandre de Moraes, teve dúvidas sobre os “kid pretos” Nilton e Cleverson, citados numa reunião do grupo sobre o golpe, e se informou com a cúpula do Exército, inclusive com o comandante Tomás Paiva, antes de votar pela absolvição. Logo, a consulta pode se repetir no julgamento.

O novo capítulo da guerra econômica - Lourival Sant’Anna

O Estado de S. Paulo

Nova retaliação de Trump preocupa mercado de capitais por afugentar investidores

As implicações da política econômica e da ideologia de Donald Trump para os negócios e as relações internacionais ganham novas nuances. A possibilidade de a Justiça barrar a aplicação de tarifas lineares, a proposta de taxar os lucros de empresas estrangeiras e a ameaça de sanções contra autoridades que restringem a atuação das redes sociais abrem novo capítulo na guerra econômica.

O presidente do STF, Alexandre de Moraes, foi notificado pelo Departamento de Justiça de que suas ordens “não podem ser executadas nos EUA”. A advertência foi provocada pela suspensão, no Brasil, da plataforma Rumble, que presta serviços para a Truth Social, de Trump. A Rumble se recusou a tirar do ar vídeos que, segundo Moraes, atacavam as instituições democráticas e disseminavam desinformação. A mesma acusação levou à suspensão do X no ano passado.

A caminho de uma crise como a de 2008? - J. R. Mendonça de Barros

O Estado de S. Paulo

Os mercados de risco insistem em avaliar que as tarifas do Trump não são um grande problema

A probabilidade de uma crise financeira, nos moldes da de 2008, está se elevando rápido. E são várias as razões para isso.

A incerteza segue gigantesca: poucos dias após o anúncio de um acordo EUA/China sobre tarifas, Trump dispara dois torpedos que desmontaram o ambiente de cordialidade. O Executivo americano anunciou diretriz dificultando as exportações de chips, ao lado da ameaça de cancelamento dos vistos dos mais de 270 mil estudantes chineses registrados nas universidades americanas.

Ademais, as relações diplomáticas em geral seguem agressivas com todo o mundo, exceto Rússia e Israel. Basta lembrar as emboscadas armadas para os presidentes da Ucrânia e da África do Sul na sede do governo.

O mundo reage, procurando diminuir sua dependência de exportações para os Estados Unidos e o volume de suas posições compradas em títulos do Tesouro americano. Entretanto, dado o tamanho da maior economia do mundo, isso só será feito lentamente, ao longo do tempo.

Direita mentiu sobre liberdade de expressão estelionato - Celso Rocha de Barros

Folha de S. Paulo

Direita mentiu, e culpa de ofensiva autoritária é de quem ficou do lado dos Elon Musks desse mundo

A liberdade de expressão está sob ataque nos Estados Unidos. Trump está destruindo a autonomia universitária, prendendo estudantes por suas opiniões políticas e ameaçando recusar visto de entrada no país para quem criticar seu governo em redes sociais.

A culpa dessa ofensiva autoritária é de quem ficou do lado dos Elon Musks desse mundo, contra os Alexandres de Moraes desse mundo, dizendo que defendia a liberdade de expressão.

Se você fez escândalo quando as contas golpistas em redes sociais foram suspensas em 2022, lamento, foi você quem prendeu os jovens estudantes americanos pró-Palestina. Se você deu razão aos bolsonaristas contra Alexandre de Moraes, você declarou guerra a Harvard. Se você disse que Elon Musk tinha razão contra o STF brasileiro, ou se opôs aos "fact-checkers", você é pessoalmente responsável pelo estabelecimento de censura política na concessão de vistos americanos.

A guerra dos impostos recomeça - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Gasto tributário de meio trilhão de reais beneficia mais o quarto mais rico do país

Em junho de 2024, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ficou mal impressionado ao saber do tanto de imposto que se deixa de pagar por concessão legal. No caso, tratava-se do que se classifica como "gasto tributário", certo conjunto de isenções de tributos para cidadãos, empresas e outras instituições.

Desde então, certa propaganda de esquerda dizia que havia se achado um pote de ouro no fim do arco-íris, dinheiros que, se tirados de ricos, resolveriam com facilidade os problemas das contas públicas, com justiça social.

Mexer nessas isenções pode diminuir o escândalo de injustiça na distribuição da renda e tapar buracos das contas públicas. Mas, para ser ameno, há muita fantasia a respeito.

Congresso tem o mando de campo – Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Entre Lula e seus pares, Motta e Alcolumbre ficam com quem lhes deu o comando do Parlamento

Por incrível que pareça, o governo ainda subestima o Congresso mesmo depois de os fatos terem dado repetidas mostras de que essa desatenção resulta em derrotas certas.

O presidente da República e o ministro da Fazenda pelo visto acreditaram que a mudança de comando no Parlamento alteraria a correlação de forças, devolvendo ao Palácio do Planalto o poder da iniciativa, da influência e da condução do processo decisório.

Só essa crença explica que Fernando Haddad (PT) tenha achado que poderia dar um drible no Legislativo e Luiz Inácio da Silva (PT) tenha assinado decreto de aumento do IOF fiando-se na amizade de Hugo Motta (Republicanos) e Davi Alcolumbre (União Brasil) firmada nas asas do avião presidencial mundo afora.

Os mitos pelos quais vivemos - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Livro mostra pontos fracos de raciocínios que tentam justificar a adoção de valores liberais

A maioria dos valores liberais que nos são caros estão calcados em mitos, que não resistem a uma análise lógica. Isso vale para a democracia, a igualdade republicana, direitos humanos e até mesmo para os discursos de reparação histórica. Essa é a tese de "The Myths We Live By", do filósofo Peter Cave.

Cave corre riscos. Especialmente nos tempos histéricos em que vivemos, a problematização de ideias liberais pode ser lida como um ataque a elas, e não como um exame crítico, que, pelo menos no âmbito da filosofia, é sempre bem-vindo. No mais, Cave, embora toque em feridas, em nenhum momento sugere que devamos abandonar democracia, igualdade diante da lei ou direitos humanos. Pelo contrário, ele é detentor de impecáveis credenciais humanistas.

O ponto central é que muitos dos raciocínios costumeiramente utilizados para justificar instituições têm mais buracos do que um queijo Emmental. Tomemos o caso da democracia.

Um berçário de arapongas - Muniz Sodré

Folha de S. Paulo

Diversidade étnica que faz do brasileiro um cidadão universal e facilidade para se obter documentos contribuem para o país ser base de espiões

Fato espantoso: enquanto o filme "O Agente Secreto" fazia sucesso em Cannes, a Polícia Federal desmontava uma rede de espionagem russa no país. O choque deve-se à raridade do fato entre nós. Mas persiste na memória coletiva o caso vexaminoso dos nove chineses que, três dias após o golpe de 64, foram presos como espiões, supostamente armados com agulhas envenenadas, prontos para atacarem não se sabia o quê (eram agulhas de acupuntura). Torturados, condenados a dez anos de prisão, confirmou-se depois que eram uma delegação comercial de algodão. Um escândalo diplomático, fiasco dantesco, prenúncio das violências da ditadura.

Caixões ao relento – Ruy Castro

Folha de S. Paulo

A Via Veneto do filme 'A Doce Vida' era de estúdio. Hoje, a verdadeira está morta e, talvez, nunca tenha existido

É como se os fantasmas de Federico FelliniMarcello Mastroianni e Anita Ekberg tivessem sido despejados de seu habitat —Fellini, o cineasta, com suas câmeras; Marcello, o jornalista, com seu caderninho de telefones das maiores mulheres da Europa; e Anita, a deusa descalça, de preto longo e busto continental. O cenário é o Café de Paris, em Roma, território de "A Doce Vida", o filme com que Fellini parou o mundo em 1960 —o Vaticano tentou proibi-lo, os liberais o defenderam, e todo mundo quis vê-lo para conferir. Mas há muito não há mais a doce vida. Não aquela que Fellini mostrou.

Nova edição de 'O Capital' reaviva debate sobre traduções de Marx

Carolina Azevedo / Folha de S. Paulo

Versão dos anos 1980, coordenada por Paul Singer, é reeditada pela editora Ubu

[Resumo] Tradução consagrada de "O Capital", obra-prima de Karl Marx, publicada nos anos 1980 no Brasil volta agora às livrarias, com texto revisado, pela editora Ubu. Nova edição reacende debate a respeito das qualidades e dos problemas das versões brasileiras, como a publicada pela Boitempo uma década atrás, que virou alvo de controvérsias quando se soube que seu tradutor era amigo de Olavo de Carvalho e pesquisador de autores antimarxistas.

Em um texto intitulado "Como não traduzir Marx", Friedrich Engels escreve que, para traduzir "O Capital", não basta conhecimento razoável do alemão literário: "para entendê-lo, deve-se ser, de fato, um mestre do alemão".

Ciente disso, a editora Ubu acaba de relançar, em edição revisada, uma consagrada tradução da obra-prima de Karl Marx, realizada por Flávio R. Kothe e Regis Barbosa, com coordenação e revisão do economista Paul Singer.

Publicada originalmente entre 1983 e 1985 pela editora Abril, a tradução surge no contexto dos chamados "seminários de Marx", grupo de estudos formado em 1958, na faculdade de filosofia da USP, para analisar "O Capital".

O grupo reunia professores e alunos interessados em explorar um "marxismo rigoroso mas não dogmático", como escreve Roberto Schwarz, que "afrontava o direito de exclusividade que os partidos comunistas haviam conferido a si mesmos" sobre os clássicos marxistas. Além de Schwarz, integraram o grupo Ruth e Fernando Henrique Cardoso, José Arthur Giannotti, Octavio Ianni, Bento Prado Jr., Michael Löwy e Paul Singer, que morreu em abril de 2018.

Poesia | A mesa, de João Cabral de Melo Neto

 

Música | Suíte Nordestina - Orquestra Arte Jovem (Duda)