- O Estado de S.Paulo
A economia americana vem crescendo numa batida em torno de 3% ao ano
Depois da grande crise global de 2008 e 2009, as taxas de juros fixadas pelos bancos centrais do mundo avançado foram para zero ou muito próximo de zero, e ficaram nesse nível por anos a fio. Na zona do euro e no Japão (país onde a taxa básica já era superbaixa antes da crise), elas ainda estão por lá, mas nos Estados Unidos, cuja recuperação econômica é mais vigorosa, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) já elevou a taxa básica para o intervalo de 1,0% a 1,25%. No Reino Unido, a taxa básica também já começou a subir.
Exatamente porque as taxas básicas foram a zero, e os BCs esbarraram num limite natural para continuar estimulando as suas economias com esse instrumento, houve o recurso de injetar liquidez comprando títulos de longo prazo em poder do mercado. Nos Estados Unidos, onde a retomada está mais avançada, também já se iniciou a reversão dessa política.
A economia americana, portanto, aparentemente já saiu da zona de risco de ser tragada de volta pelo empuxo depressivo e deflacionário que pairou como uma grande ameaça sobre o mundo rico depois da crise global. A grande questão agora, e que importa muito para o Brasil, é se a animação econômica nos Estados Unidos não vai acabar indo longe demais.
O Brasil é um país macroeconomicamente frágil por aumentar a despesa pública, de forma quase mecânica, num ritmo incompatível com a elevação das receitas num horizonte de médio e longo prazos. Hoje, a situação fiscal do País é vista como crítica, o que é atestado pelo veloz crescimento da relação entre a dívida pública e o PIB.
É verdade que, em termos cambiais, a posição do Brasil é mais sólida, com grandes reservas internacionais e um déficit externo próximo a zero – mas isso à custa da redução das importações pela brutal recessão de 2014 a 2016. Se o País voltar a crescer num ritmo mais forte, o déficit deve aumentar.
Com essas vulnerabilidades, o Brasil tornou-se extremamente dependente do cenário externo benigno, como juros internacionais baixíssimos e preço das commodities que o País exporta num nível bem razoável. O problema da recuperação americana é que, a depender do seu ritmo, ela pode pôr em risco esse cenário favorável, especialmente no que se refere aos juros internacionais.
A economia americana vem crescendo numa batida em torno de 3% ao ano nos últimos três trimestres. Se esse ritmo prosseguir, os indicadores do mercado de trabalho dos Estados Unidos vão continuar a melhorar. É uma ótima notícia para os americanos, mas, de acordo com a teoria econômica convencional, esse aquecimento pode trazer de volta a inflação via aumentos de salários – especialmente porque o desemprego e outros indicadores já melhoraram muito nos Estados Unidos nos últimos anos.
Mais inflação significa juros americanos – e, por decorrência, internacionais – mais altos, e possivelmente o fim da liquidez abundante que faz com que o Brasil siga empurrando com a barriga os seus problemas estruturais (como a Previdência quebrada) sem maiores turbulências.
Existe, é verdade, uma corrente de analistas que pensa que a inflação e os juros não vão subir como costumavam, diante do reaquecimento da economia e do mercado de trabalho dos Estados Unidos. Uma série de fatores, demográficos, tecnológicos e outros, pode ter alterado algumas premissas básicas do funcionamento das economias na atualidade.
O risco, porém, como observa um respeitado economista brasileiro, é a hipótese de que a visão convencional no fim das contas não esteja tão superada, e os mercados, e mesmo o Fed, um pouco anestesiados pela ideia tranquilizadora de que o risco inflacionário já não é o mesmo, tomem um susto caso a inflação volte a mostrar as garras com força. Esse é o pior cenário para o Brasil, porque é justamente nos sustos que os equilíbrios precários tendem a se romper.
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