Folha de S. Paulo
Declaração final não esconde divergências no
bloco, que é mais autoritário do que antiocidental
O mundo é um lugar ambíguo e uma boa prova
disso vem de organizações multilaterais como o Brics, que não
escondem os interesses conflitantes daqueles que pretendem formar um grupo
coeso.
O Brics surgiu em 2001 como acrônimo dos
países emergentes em que investidores deveriam ficar de olho; Brasil, Rússia, Índia
e China (a
África do Sul, o S, entrou depois). Mas os países mencionados gostaram da ideia
de formar um bloco que se orientaria por interesses econômicos comuns e o
formalizaram.
As divergências logo surgiram e se agravaram. A China se tornou superpotência em atrito com os EUA. É a Guerra Fria 2.0. Por seu peso gravitacional, Pequim é quem mais influencia o clube.
O melhor exemplo disso é a ampliação do
bloco, que passou a incluir também Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Irã,
Indonésia e Arábia Saudita, o que interessava a Pequim (quanto maior a lista de
integrantes, mais relevante em tese o grupo se torna), mas não ao Brasil, cujo
poder decisório foi diluído.
A ampliação deixou o grêmio com feições mais
autoritárias, mas não penso que seja muito exato classificá-lo como
antiocidental. Índia, Egito, Emirados e os sauditas são aliados firmes dos EUA.
Daí a necessidade de circunlóquios na declaração da cúpula do Rio, que evitou
até mencionar que Washington atacou o Irã, um dos membros do bloco.
Essa não é a única contradição. Os países
também divergem na reforma da ONU, a grande obsessão da diplomacia brasileira,
e até na busca de alternativas ao dólar. A Rússia, sob sanções, é grande
entusiasta dessa pauta, que Pequim, segundo maior detentor de títulos da dívida
dos EUA, vê com cautela e na qual prefere caminhar devagar.
Ambiguidades e inconsistências não estão
limitadas a órgãos coletivos. Trump, que agora ameaça sobretaxar países que se
alinharem ao que ele considera políticas de lesa-dólar do Brics, é quem mais
contribui para o enfraquecimento da moeda americana, ao disseminar incertezas.
O mundo é um lugar ambíguo e pouco propício a
diletantes.
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