sábado, 12 de julho de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

É deplorável celebrar tarifas para ganho político

O Globo

Direita brasileira, que brande a bandeira do patriotismo, tem o dever de repudiar a chantagem de Trump

Em entrevista ao Jornal Nacional, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou sensatez na reação à tarifa de 50% imposta pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, às importações do Brasil, caso não seja suspenso o processo judicial contra o ex-presidente Jair Bolsonaro. Em tom comedido, Lula afirmou que procurará negociar com os americanos, chamará para discussão empresários dos setores afetados, apelará à Organização Mundial do Comércio e, caso nada dê resultado, retaliará. “O Brasil utilizará a Lei da Reciprocidade quando necessário”, afirmou. Uma eventual retaliação, que poderia deflagrar guerra tarifária, deve mesmo ser o último recurso.

Num país polarizado, a chantagem de Trump suscitou uma batalha política que em nada favorece o Brasil. É hora de o país se mostrar unido na defesa da democracia, do Judiciário independente e da soberania. Agiu bem o Congresso ao não hesitar sobre que lado escolher na contenda. Em meio à queda de braço com o Planalto em torno do aumento do IOF, os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), se disseram “prontos para agir com equilíbrio e firmeza”.

Vergonhosa foi a celebração nas hostes bolsonaristas. O deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) agradeceu a Trump numa rede social. Faz parecer que o filho prefere salvar o pai da condenação a defender seu país. Ainda que esse tipo de atitude seja esperado, dada a proximidade entre bolsonarismo e trumpismo, não deixa de ser lamentável. Mostra quão distante do Brasil está o entorno dos Bolsonaros. O chefe do clã pareceu ainda mais alheio à realidade ao pedir urgência aos Poderes para resgatar a normalidade institucional. Em que planeta ele vive?

A direita brasileira, que costuma brandir o patriotismo como bandeira, tem o dever de repudiar a chantagem de Trump e de defender o interesse nacional, a democracia e a independência do Judiciário. Foram infelizes as declarações do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), em deferência a Bolsonaro, ainda que depois ele tenha prometido “abrir diálogo com as empresas” e mantido encontro com diplomatas americanos. Não é hora para posições dúbias. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), afirmou que Lula afronta gratuitamente o governo americano — pode ser verdade, mas foi Trump quem ofendeu o Brasil. O governador de Minas, Romeu Zema (Novo), depois de apoiar Trump, tentou amenizar dizendo que “erros e injustiças não devem ser consertados com mais erros e injustiças”.

É verdade que os arroubos autoritários trumpistas ironicamente podem dar a Lula — acuado pela queda de popularidade, reflexo de um governo ruim — a chance de sair das cordas, como já aconteceu noutros países, onde líderes impopulares se recuperaram com a ajuda indireta dos ataques de Trump. O episódio deu a ele um catalisador perfeito para sua popularidade: o inimigo externo.

Não há dúvida de que a decisão de Trump se presta a todo tipo de uso político. Mas questões concretas não podem ser ignoradas. A tentativa de interferir no Judiciário brasileiro é absurda. Se não for revertida, a tarifa de 50% alimentará a inflação, prejudicará o crescimento, porá em risco milhares de empregos e causará estrago em setores pujantes, como indústria e agronegócio. É interesse de toda a sociedade brasileira barrar a insanidade de Trump.

Coibir fraudes no cadastro rural exige ação de governos estaduais e federal

O Globo

Verificar localização de propriedades é essencial para evitar burla em registro usado para emitir licença ambiental

Qualquer política pública deve estar baseada em evidências científicas e dados confiáveis para obter sucesso. As fraudes no Cadastro Ambiental Rural (CAR) impedem a repressão eficaz às agressões ao meio ambiente e prejudicam a implementação de programas de prevenção ao desmatamento. O CAR é essencial para conhecer o perfil fundiário do Brasil, o tamanho das propriedades e sua localização precisa. Serve para que todos sigam as regras do Código Florestal, respeitando a dimensão das áreas dedicadas a produção e conservação. Também é essencial para emissão de licenças ambientais e para que o proprietário venda sua produção rural. Mas, como se trata de registro autodeclaratório (o próprio dono das terras fornece as informações), é intrinsecamente vulnerável a fraudes.

Um exemplo ilustrativo, revelado pelo GLOBO, é a fazenda BV, com área equivalente a 126 campos de futebol no interior do Pará. Para aprovar financiamento de R$ 4,6 milhões do crédito rural para pecuária em sua área, o Banco da Amazônia se baseou em dados do CAR atestando a regularidade do imóvel, garantia do financiamento. Foi ludibriado. Pelas coordenadas fornecidas, a fazenda ficava no meio do Rio Araguaia, a 670 quilômetros de Belém. Teria sido uma informação facílima de verificar, mas não há checagem eficiente. A inscrição da BV e de mais 112 imóveis foi cancelada depois que O GLOBO procurou o governo do Pará. Todas estavam relacionadas a um mesmo CPF, atestado como inválido pela Receita Federal. Pertence a um técnico agrícola que também apresenta registro profissional falso. Um evidente caso de polícia.

Não se trata de um caso qualquer. Ele expõe um tipo de operação criminosa que se multiplica pelo interior do país, principalmente nas regiões de preservação ambiental. A manipulação criminosa do CAR faz com que propriedades rurais sejam transportadas para áreas onde nunca serão alcançadas por ações e políticas contra o desmatamento, obviamente ineficazes para fazendas cujas coordenadas as colocam dentro de rios e lagoas. O CAR reúne 7,8 milhões de propriedades rurais. Há enorme quantidade de informações a cruzar, mas a tecnologia digital pode facilitar muito o trabalho. Se houver um sistema simples que mostre a real área das coordenadas, evita-se a burla.

Esse tipo de crime contra o patrimônio ambiental precisa ser coibido com entendimento entre os governos estaduais e federal. Os estados são responsáveis pela fiscalização, têm de estar mais atentos e usar métodos mais sofisticados e eficazes contra os criminosos. Cabe aos governos da Amazônia e do Cerrado, fronteiras do desmatamento, auditar as informações do CAR para checar sua veracidade. Mas cabe ao governo federal uniformizar os métodos de auditoria do CAR. A defesa do meio ambiente requer trabalho constante e persistente de monitoramento das propriedades rurais. Antes de tudo, porém, é preciso ter certeza de sua localização. Hoje nem isso se sabe ao certo.

Agressão de Trump dificulta equilibrismo na direita

Folha de S. Paulo

Alta em tarifa põe Lula no papel de defensor do interesse nacional e força Tarcísio, Zema e Caiado a deixarem dubiedade

Se o intento de Donald Trump ao promover sua grotesca investida comercial contra o Brasil era ajudar Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados direitistas, parece claro que o tiro político saiu pela culatra.

A truculência ignara do republicano deu de imediato a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) o papel de defensor dos interesses nacionais ante a chantagem de uma potência estrangeira, para o qual pode atrair o apoio de eleitores e forças políticas ao centro, da sociedade, do empresariado e da comunidade internacional.

A Bolsonaro, inelegível e muito perto de ser condenado por tentativa de golpe de Estado, resta uma posição subalterna ao padrinho poderoso, a quem agradece de público pela imposição de tarifas brutais que ameaçam empregos e o bem-estar de brasileiros.

O debate —pertinente— sobre os excessos do Supremo Tribunal Federal (STF) que cerceiam a liberdade de expressão na internet fica interditado pela exorbitância da ingerência americana. Trump, ademais, está longe de ser um paladino dos direitos democráticos.

Quanto aos candidatos a herdeiros dos votos bolsonaristas, que hoje fazem seus cálculos para a disputa presidencial do próximo ano de olho na baixa popularidade de Lula, a agressão americana dificulta o equilibrismo entre a fidelidade declarada ao ex-presidente e a busca pelos eleitores mais moderados.

O exemplo mais evidente é o de Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo —o estado brasileiro que tem mais a perder com o fechamento do mercado americano. Tecnocrata transformado em político por Bolsonaro, Tarcísio preserva em seu governo bandeiras do ex-chefe, como as escolas cívico-militares, mas não a intolerância ante opositores e instituições.

O governador se comprometeu com um indulto a Bolsonaro, mas essa é ainda uma hipótese distante. Agora, ao ter de se posicionar sobre a ameaça premente de Trump, complicou-se.

Em sua primeira manifestação, preocupou-se apenas em culpar Lula, por colocar "ideologia acima da economia" e "agredir o maior investidor direto no Brasil". Só depois, em entrevista, lembrou-se de falar dos danos para o estado que governa, recomendando negociar e "deixar de lado as questões ideológicas".

Foram semelhantes, ao se concentrarem na responsabilização do governo petista, as reações iniciais dos governadores Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais, e Ronaldo Caiado (União Brasil), também potenciais presidenciáveis da direita. Só no dia seguinte, Zema chamou a medida de Trump de "errada e injusta".

Na tentativa de agradar a bolsonaristas, sem os quais não chegam a um segundo turno presidencial, e a moderados, que podem ser decisivos no pleito, a trinca de governadores corre o risco de não parecer confiável a ninguém. Uma afronta das dimensões da cometida por Trump não dá margem a pequenez, dubiedade e tergiversação.

Conciliação europeia

Folha de S. Paulo

Alvo da extrema direita, líder da UE Ursula von der Leyen dependeu de barganha com a centro-esquerda para manter o posto

Reconduzida à presidência da Comissão Europeia há um ano, a alemã Ursula von der Leyen, de centro-direita, percebeu nesta semana a importância do alinhamento ao centro político diante do avanço da extrema direita no continente. Não só para preservar-se no posto, mas a bem dos valores democráticos do bloco europeu.

Alvo de uma rara moção de censura no Parlamento Europeu, defendida por partidos de direita radical, Von der Leyen saiu vitoriosa da votação na quinta (10). Mas talvez precise reconsiderar seu distanciamento de posições caras à centro-esquerda, que relutou e barganhou para salvá-la.

Não foi uma disputa fácil para a veterana, há seis anos no comando da Comissão Europeia sob o amparo de uma base no Parlamento formada por siglas de centro, centro-direita, socialistas e verdes, que, em sua maioria, perderam cadeiras para populistas de direita em 2024.

O cerne da moção —uma compra pouco transparente de vacinas da Pfizer a preços escorchantes durante a pandemia— tornou-se secundário. A questão de fundo envolveu o compromisso da presidente com suas bases.

Acenos de Von der Leyen à extrema-direita, ao avalizar as propostas de endurecer regras de imigração e de flexibilizar as metas climáticas, erodiram o apoio vindo da centro-esquerda e dos verdes. Não à toa, convencer esses parlamentares durante a votação mostrou-se desafiador

Negociações de última hora, sem a presença de Von der Leyen, selaram sua permanência no cargo por 360 votos, num quórum de 636 eurodeputados, contra 175 em favor da moção.

O resultado sinaliza para ajustes na orientação política de Bruxelas, com maior peso de posições da esquerda moderada. Não só nos temas de imigração e clima, mas na proteção dos gastos com programas sociais no Orçamento da União Europeia de 2028 —mesmo a despeito da vulnerabilidade fiscal do bloco, agravada com a elevação de suas despesas com defesa.

O caso evidenciou a determinação da extrema direita em alavancar uma crise política, expondo a liderança da UE ao embaraço de defender seu mandato. Mas, se a centro-esquerda impediu tal desfecho, note-se que esteve prestes a lavar as mãos por intransigência em sua agenda.

Num cenário global volátil, com potencial extensão da guerra na Ucrânia, batalhas no Oriente Médio a o desmonte das balizas do comércio internacional pelos EUA sob Donald Trump, o diálogo entre polos torna-se imprescindível —na Europa e em qualquer outra parte do mundo.

A hora da prudência

O Estado de S. Paulo

Ainda que tente faturar politicamente a agressão de Trump ao Brasil, Lula precisa apostar na diplomacia, em nome do interesse nacional – o mesmo que foi ignorado pela família Bolsonaro

A ameaça feita pelo presidente dos EUA, Donald Trump, de sobretaxar em 50% as exportações brasileiras caso Jair Bolsonaro não seja desobrigado de responder pelos crimes dos quais é acusado é um teste para a maturidade institucional do Brasil. A reação das autoridades irá separar os oportunistas, que só estão interessados nos bônus eleitorais que podem extrair da crise, dos estadistas empenhados em evitar os danos à economia nacional caso a medida, de fato, entre em vigor a partir de 1.º de agosto.

Uma janela para negociação foi aberta pelo próprio Trump em sua carta ao presidente Lula da Silva. E, para resguardo dos interesses nacionais, hão de prevalecer a racionalidade e o espírito público na opção por esse caminho. Reações figadais só tendem a atribular ainda mais a relação entre Brasil e EUA, sob a ótica geopolítica, e causar impactos negativos não triviais ao polo mais fraco do comércio entre os dois países, no que concerne à economia.

Até agora, para o bem do País, os adultos na sala têm prevalecido com seu misto de prudência e altivez. A primeira reação de Lula à carta de sua contraparte foi correta, como já sublinhamos neste espaço. O presidente da República ressaltou que o Brasil é um país soberano e que o Supremo Tribunal Federal (STF) é livre e independente para julgar Bolsonaro de acordo com a Constituição e as leis brasileiras.

O Congresso, por sua vez, também foi correto ao se manifestar sobre o imbróglio. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), assinaram nota conjunta na qual afirmam que a diatribe de Trump “deve ser respondida com diálogo nos campos diplomático e comercial”. É assim que duas nações que mantêm laços e interesses muito mais sólidos do que os de seus governantes de turno devem tratar suas divergências.

Tanto Motta como Alcolumbre lembraram ainda que, à luz da Lei de Reciprocidade Econômica, o Brasil dispõe de um instrumento legítimo para, em caso de fracasso das negociações comerciais, “proteger a sua soberania”. Na prática, isso significa impor a mesma tarifa anunciada por Trump aos produtos exportados por seu país. O governo federal também não descarta recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC) e quebrar a patente de medicamentos desenvolvidos por laboratórios americanos. Não é o desfecho esperado por este jornal nem decerto pelos que primam pelas boas relações entre as duas maiores democracias das Américas. Mas, se for esse o destino, Executivo e Legislativo dão sinais, ao menos até o momento, de que estão preparados para lidar com esse ataque não provocado.

Por se tratar de uma sanção política, e não comercial – Trump justifica a sobretaxa pela suposta “caça às bruxas” que o STF, ora vejam, estaria promovendo contra Bolsonaro –, a negociação será difícil. Afinal, o que conceder quando o que está em jogo é a soberania nacional manifestada pela independência da mais alta instância do Judiciário do País? Mas difícil não significa impossível. O vaivém do próprio Trump em relação à imposição de tarifas a outros países indica que o governo federal, por meio do competente quadro técnico do Itamaraty, tem meios para reverter ou mitigar a medida. Tudo dependerá do grau de seriedade da condução dessa negociação.

A sanção tarifária, se de fato for implementada, causará severos impactos econômicos, especialmente em setores estratégicos como o agronegócio e a indústria paulistas. Estima-se que São Paulo será o Estado mais afetado pelo tarifaço, o que torna o governador Tarcísio de Freitas peça-chave nesse tabuleiro. Como chefe do Executivo estadual e aspirante à Presidência, ele tem o dever de proteger os interesses de São Paulo, buscando dialogar com o governo federal e, principalmente, usando sua proximidade com Bolsonaro para tentar desarmar a bomba criada por Trump em nome de uma suposta “solidariedade ideológica” com seu padrinho político. Não se pode servir a dois senhores. É hora de Tarcísio mostrar se está ao lado do Brasil ou de Bolsonaro.

O ‘gabinete do ódio’ do bem

O Estado de S. Paulo

O lulopetismo orquestra a produção de desinformação para atacar o Congresso, ação que, conforme o critério ora estabelecido pelo STF, poderia ser enquadrada como ataque à democracia

Às favas o slogan “União e reconstrução”, com o qual Lula da Silva inaugurou seu terceiro mandato. Na falta do que mostrar, o governo decidiu acirrar como nunca a polarização e o ressentimento como instrumentos de sobrevivência política. Em vez da quimérica “frente ampla”, assiste-se à truculência de um projeto de poder marcado por trincheiras ideológicas, mistificações retóricas e mobilização tribal da militância. O velho “nós contra eles” saiu do porão e voltou ao Planalto com lugar de honra.

Para amparar a iniciativa, os spin doctors do Planalto convocaram militantes e influencers para “pautar as redes”. É a reedição do infame “gabinete do ódio” bolsonarista, agora com sinal trocado e chancela institucional. O que antes era denunciado como ataque à democracia virou estratégia de “comunicação participativa”.

O lulopetismo não mudou. Só adaptou seu vocabulário. A retórica da “democracia” serve para sufocar o contraditório. A bandeira da “diversidade” é empunhada para macetar a uniformização ideológica. O combate a “discursos de ódio” é pretexto para advogar a censura e intimidar dissidentes. O portal “Brasil contra Fake”, da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, por exemplo, não se dedica a desfazer mentiras, mas a consagrar uma versão oficial da realidade. Quando o governo afirma que irá “taxar os ricos”, mas decreta o aumento do IOF, que penaliza os pobres, ninguém no portal se dá ao trabalho de desmoralizar a trapaça.

A hipocrisia é mais escancarada quando o PT vocifera contra “ataques às instituições” e simultaneamente investe contra o Congresso porque este não se ajoelha à agenda do Planalto. A cada derrota legislativa, ensaia-se um coro de vitimização e teoria conspiratória, como se o Legislativo fosse nada mais que um enclave reacionário impedindo a marcha do progresso. É o PT de sempre: incendiário na oposição, autoritário no poder.

Esse é o mesmo partido que votou contra a Constituição, o Plano Real e a Lei de Responsabilidade Fiscal. O mesmo que acusou Marina Silva de querer a miséria do povo por defender, na campanha eleitoral de 2014, a autonomia do Banco Central. Lula, o pacificador de palanque, é também o agitador que evoca o “exército do Stedile”, o líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), quando acuado. Agora, à frente de um governo débil, desnorteado, desconectado dos anseios populares e dependente de improvisações, opta novamente pela radicalização como estratégia diversionista. Não tem projeto de futuro, mas conjura inimigos imaginários para inflamar sua base: os pobres contra os ricos, o Planalto contra o Congresso – na verdade, Lula contra os fatos.

Mas a realidade insiste em escapar do roteiro. A inflação resiste, a bomba fiscal se avoluma e a sociedade clama por soluções, e não slogans. Mas, para um projeto de poder anacrônico, melhor insuflar a beligerância e posar de guardião dos pobres contra as elites. Que ninguém se engane: o fosso mais pernicioso que atravessa o Brasil não é entre ricos e pobres, mas entre a sociedade produtiva e a oligarquia estamental que parasita o Estado. E não há facção mais influente nesse sistema do que o PT.

União e reconstrução? Só se for da mística partidária e das fantasias de um presidente que prefere governar com slogans e bate-paus a encarar a dura tarefa de liderar um país real, complexo e cansado de ser manipulado.

Os petistas rodaram o mundo e ainda rodam denunciando que Dilma Rousseff sofreu impeachment graças a um “golpe” orquestrado pelo Legislativo, o Judiciário e o setor produtivo a serviço da CIA. Imagine o leitor as consequências se algum grupo bolsonarista andasse por aí propagando memes do Supremo Tribunal Federal (STF) em chamas, como faz a militância petista da “Frente Povo Sem Medo” com imagens do Congresso acompanhadas do slogan “Congresso inimigo do povo”. Há anos o STF conduz inquéritos secretos, elásticos e intermináveis que abrigam prisões e censuras, além de fabricar toda uma nova regulação das redes digitais, para “salvar a democracia”. Agora que o governo lulopetista inunda – mais uma vez – a esfera pública com “discursos de ódio”, “desinformação” e “ataques às instituições”, o zelo dos ministros se encherá dos mesmos brios, ou será que existe um “gabinete do ódio” do bem?

A realidade se impõe

O Estado de S. Paulo

Trump finalmente parece acordar para o fato de que Putin quer subjugar a Ucrânia

Após prometer acabar com a guerra na Ucrânia em 24 horas, humilhar o presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, e suspender a entrega de armas à Ucrânia, essenciais para os ucranianos se defenderem da criminosa agressão russa, o presidente dos EUA, Donald Trump, parece finalmente ter perdido a paciência com o ditador Vladimir Putin.

“Não estou feliz com ele”, afirmou Trump durante um encontro em seu gabinete, acrescentando que a prolongada invasão russa da Ucrânia “está matando muita gente”. Ora, a Rússia “está matando muita gente” na Ucrânia há anos, e até agora vinha contando com as boas graças de Trump – valentão com as vítimas, camarada com os agressores.

Não se sabe bem o que mudou na realidade da guerra para ter irritado Trump, nem tampouco se a mudança de atitude do presidente americano é mesmo para valer. Em se tratando de Trump, tudo é possível.

O fato, contudo, é que Trump foi forçado a reconhecer que convencer o presidente russo a encerrar a guerra na Ucrânia provou-se mais difícil que ele pensava. “É assim que as coisas são”, declarou Putin sobre a aparente frustração de Trump. E acrescentou: “A vida real é sempre mais complicada do que a visão que temos dela”.

Por estratégia, o Kremlin tentou minimizar as recentes declarações de Trump, afirmando esperar continuar o diálogo com Washington, bem como os esforços para reparar o suposto abalo nas relações entre Rússia e EUA.

Mas a verdade é que Trump embarcou na ideia de que poderia convencer Putin a pôr um fim ao banho de sangue na Ucrânia porque julgava que bastava sua vontade para isso. Não há necessidade de estratégia quando se está no terreno da megalomania.

O objetivo de Putin é, sempre foi, submeter a Ucrânia completamente. Tanto é assim que, enquanto sinaliza para a manutenção do diálogo com Washington, já estaria preparado para a possibilidade de que os EUA, após seis meses de pausa, imponham novas sanções sobre a Rússia.

Putin não sacrificou nem a vida de milhares de militares russos nem vultosos recursos financeiros para abandonar a ofensiva na Ucrânia só porque Trump pediu. E mesmo assim, até o momento, do lado norte-americano, há apenas a sugestão de que Trump possa retomar sanções contra a Rússia, que aliás é uma das poucas nações poupadas da guerra tarifária que o republicano promove contra o mundo.

Além disso, apesar de ter retomado o envio de armamento e munição para a Ucrânia, a intensificação do apoio militar norte-americano aos ucranianos segue incerta. Enquanto isso, a Rússia recentemente promoveu o pior ataque de drones contra a Ucrânia desde o início da invasão, em 2022.

Sem apoio efetivo dos EUA, a Ucrânia dificilmente resistirá a Putin, que está convencido de que a superioridade russa no campo de batalha aumentou e que as forças de defesa ucranianas podem entrar em colapso nos próximos meses.

A realidade, como se vê, está claramente desenhada. Resta saber se a paciência de Trump com Putin realmente acabou e se vai resultar em uma resposta baseada não em delírios, mas em medidas efetivas contra um evidente inimigo dos EUA e do mundo.

Reações acertadas aos ataques de Donald Trump

Correio Braziliense

Diante de ameaças à soberania nacional, o caminho adequado é a ação coordenada entre Executivo, Legislativo e Judiciário — dentro dos marcos legais, com serenidade e firmeza, e nos fóruns internacionais

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outras autoridades brasileiras têm agido com correção ao preparar uma resposta institucional aos ataques injustificáveis do presidente Donald Trump contra a economia e a democracia do Brasil. Diante de ameaças à soberania nacional, o caminho adequado é a ação coordenada entre Executivo, Legislativo e Judiciário — dentro dos marcos legais, com serenidade e firmeza, e nos fóruns internacionais.

Carl von Clausewitz, teórico prussiano da guerra, ensinou que "a guerra é a continuação da política por outros meios". No mundo atual, sanções econômicas, tarifas unilaterais e retaliações diplomáticas são formas de conflito travadas sem armas, mas com as estratégias de guerra. A política comercial agressiva de Trump se insere nessa lógica. A nova rodada de tarifas contra produtos brasileiros, incluindo aço, alumínio e agrícolas, deve ser interpretada não apenas como protecionismo, mas como instrumento de coerção.

Em 2023, os Estados Unidos foram o segundo maior parceiro comercial do Brasil, com US$ 88,7 bilhões em trocas bilaterais. As exportações brasileiras somaram US$ 36,3 bilhões, lideradas por petróleo, semimanufaturados de ferro e aeronaves. Já as importações atingiram US$ 52,4 bilhões, com destaque para máquinas, eletrônicos e produtos químicos. A escalada tarifária colocará em risco milhares de empregos e setores estratégicos da indústria nacional.

A resposta brasileira deve ser pragmática e inteligente. É necessário acionar mecanismos da OMC, articular-se com parceiros estratégicos — como União Europeia, países do Sul Global e os demais membros do Brics — e reforçar o diálogo com atores internos nos Estados Unidos, especialmente com nossos parceiros comerciais, no Congresso e nos governos estaduais.

Mais do que uma disputa comercial, o Brasil enfrenta o avanço de uma estratégia política autoritária transnacional, que inspira parte da extrema-direita brasileira. A retórica golpista, já condenada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nos atos de 8 de janeiro de 2023, reaparece agora travestida de discurso antiglobalista e de alinhamento automático ao governo Trump e ao movimento Maga (America Great Again, Torne a América Grande Novamente, em português).

Não se trata de repetir erros do passado nem de alimentar confrontos ideológicos esquerda versus direita. Trata-se de defender a democracia e os interesses nacionais com os instrumentos do direito, da diplomacia e da razão. O eixo da reunião do Brics no Rio de Janeiro, nesta semana, não deu as costas ao Ocidente, apenas reafirmou o multilateralismo, que precisa ser reformado, mais equilibrado e eficaz, até para que os países em desenvolvimento possam mitigar os efeitos deletérios do protecionismo exacerbado e da agressividade tarifária dos EUA.

O tempo das alianças históricas se encerrou para os Estados Unidos, haja vista suas posições em relação ao Canadá, ao México e ao Japão. O mundo caminha para uma ordem mais fragmentada e instável. Nela, o Brasil precisa combinar sobriedade diplomática com defesa firme da legalidade e da soberania. A lição de Clausewitz continua válida: política e guerra não se separam — mas a política deve prevalecer.

A taxação de Trump e os prejuízos ao Nordeste

O Povo (CE)

O aumento das tarifas tem o potencial de afetar R$ 16 bilhões de exportações na região. Ceará, Bahia e Maranhão serão os mais atingidos

A taxação de 50% de todos os produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos vai afetar todo o Brasil. No entanto, o impacto será sentido de maneira diferente, a depender do produto e da região exportadora. Pela determinação do presidente americano, Donald Trump, as novas tarifas serão cobradas a partir do dia primeiro de agosto.

Segundo levantamento da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), o aumento das tarifas tem o potencial de afetar R$ 16 bilhões de exportações no Nordeste. Ceará, Bahia e Maranhão, pela ordem, serão os mais atingidos. Segundo a Sudene, esses três estados venderam R$ 14 bilhões de produtos no mercado americano em 2024. "Será uma perda significativa para a economia regional, declarou ao O POVO José Farias, coordenador de Estudos, Pesquisas, Tecnologia e Inovação da Sudene.

Entre os produtos exportados destacam-se o aço, frutas, pescado e calçados, que saem principalmente do Ceará, "com alta concentração de produtos com valor agregado médio", que poderão perder competitividade com o aumento da taxação, segundo Farias.

Além dos prejuízos que recairão sobre todo o país, como a redução do PIB e a perda de empregos, as consequências indiretas serão piores para os sistemas produtivos regionais. Farias explica que os produtos de exportação já suportam "uma longa cadeia de atividades no território", que aumentam o custo final do produto, situação que se agravará com o aumento do imposto.

Com relação ao País, economistas avaliam que o aumento das tarifas pode provocar uma redução de meio ponto percentual no produto interno bruto (PIB), índice que pode ser considerado elevado, pois o crescimento do Brasil está na marca de 2,5%.

O Brasil não poderia deixar de dar uma resposta vigorosa, como o fez à carta desaforada de Donald Trump, para demonstrar que não se submeteria às vontades do presidente americano, muito menos àquelas que ferem a soberania brasileira.

No entanto, diante de uma situação com potencial de provocar danos ao País, o governo brasileiro, corretamente, evitou bravatas, deixando claro, desde o início, que estava aberto a negociações. A reciprocidade seria posta em prática como último recurso, caso as iniciativas de resolver o impasse por meio de acordo entre as partes resultasse em fracasso.

Assim, o Palácio do Planalto responde às provocações americanas em duas frentes. Por um lado, procura abrir canais de negociação para levar o confronto para o campo da diplomacia. Ao mesmo tempo, estuda medidas retaliatórias, caso o governo Trump resolva insistir nas propostas absurdas, exigindo intervenção no Judiciário para livrar o ex-presidente Jair Bolsonaro dos processos a que responde no Supremo Tribunal Federal (STF).

Será um litígio longo e penoso, difícil de prever qual saída prevalecerá, mesmo quando se sabe que o melhor seria um bom acordo.

 

 

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