Para o governo, é um imposto fácil de cobrar. Para a sociedade, impõe carga maior e pune os mais pobres
Parecia já ter ficado claro no ano passado, com a saída do economista Marcos Cintra da Secretaria da Receita Federal, que era má ideia tentar recriar um imposto sobre transações financeiras. A iniciativa não tinha a menor chance de prosperar entre os parlamentares, tamanha a impopularidade do finado “imposto do cheque”, e foi torpedeada por economistas de todas as linhagens, dos liberais convictos aos keynesianos renitentes. Em que pese o retrospecto, a ideia ressurgiu.
O presidente Jair Bolsonaro disse ter dado sinal verde ao ministro Paulo Guedes para estudar o assunto, desde que promova redução noutros tributos. Ninguém sabe dizer ao certo o significado preciso da declaração. O demônio de toda mudança tributária costuma estar nos detalhes. Não se conhecem o formato nem a alíquota do novo imposto, nem que tipo de corte haveria noutros para compensá-lo. No plano da fantasia, é sempre possível que um economista do governo tenha alguma ideia genial jamais testada.
No plano da realidade, Bolsonaro só contribuiu para semear ainda mais dúvida a respeito do já conturbado projeto de reforma tributária elaborado pelo Executivo. As vantagens da nova CPMF para um governo às voltas com uma crise fiscal sem paralelo são óbvias: é um imposto fácil de cobrar e difícil de sonegar. Para a sociedade, em compensação, os argumentos contrários são bem mais fortes — e continuam os mesmos.
Impostos como a CPMF incentivam a circulação de moeda sonante e a informalidade (noutras palavras, a lavagem de dinheiro). Estimativas aventadas no ano passado sugeriam que, dependendo da alíquota, haveria queda de até 40% na arrecadação prevista. Uma segunda desvantagem está no formato. A cobrança a cada transação induz a concentração de atividades numa mesma empresa, eliminando a eficiência inerente à especialização. Se mantidas as cadeias de produção, a incidência em cascata aumenta o custo, exercendo pressão inflacionária. Como o imposto recai de modo uniforme sobre todos os contribuintes, impõe ainda peso desproporcional aos que movimentam menos recursos, os mais pobres (diz-se que é “regressivo”).
Por fim, o objetivo implícito, apesar de Bolsonaro afirmar o contrário, é ampliar a arrecadação num momento de crise fiscal. É uma incógnita a compensação que será ofertada. Desonerar a folha de pagamentos é uma ideia boa para incentivar a geração de empregos, mas não há evidência de que reequilibre a balança tributária em favor da sociedade. O mais provável é que uma nova CPMF acabe por aumentar a carga. A decisão final caberá ao Congresso, onde qualquer proposta de recriá-la enfrentará de novo enorme resistência — e onde, das reformas para conter a expansão de gastos públicos, ninguém fala.
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