Chantagem rasteira de Trump não passará
Folha de S. Paulo
Cogitar de que a intimidação fará um Poder
independente como o Judiciário brasileiro deixar de processar Bolsonaro é
devaneio autoritário
A chantagem rasteira de Donald Trump contra
o Brasil não vai funcionar. Cogitar de que o Judiciário de uma nação soberana e
democrática, que opera com independência, deixará de processar quem quer que
seja para livrar o país de retaliações
econômicas dos Estados Unidos não passa de devaneio autoritário.
Se a manifestação foi pensada para
ajudar Jair
Bolsonaro (PL)
no julgamento em que é acusado de tramar um golpe, ela, na melhor hipótese para
o ex-presidente, terá efeito nulo. Se tentou fortalecer o deputado fugitivo
Eduardo Bolsonaro (PL-SP) para a disputa de 2026, acabará tornando o seu caso
na Justiça brasileira ainda mais complicado.
Se seu intento foi impulsionar a direita
brasileira, o resultado líquido tenderá a ser negativo. Vai ser difícil ficar
do lado de quem patrocina uma agressão estrangeira à soberania e aos
empregos brasileiros, pois tarifas adicionais de 50% sobre as exportações
teriam efeitos nefastos sobre vários setores da economia nacional.
Chegou a hora de lideranças como o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) escolherem de que lado estão. Ou bem Tarcísio defende os exportadores paulistas e a soberania brasileira ou continua posando de joguete de boné de um agressor estrangeiro e da família Bolsonaro, cujo patriotismo de fancaria se dissolve e se transforma em colaboracionismo diante da perspectiva da cadeia.
Está repleta de mentiras e incoerências a
carta em que Trump tenta justificar o ataque comercial. As trocas com o
Brasil não contribuem para o déficit norte-americano. Pelo contrário, há anos o
resultado da corrente é superavitário para os EUA. O presidente republicano diz
defender a liberdade de expressão aqui, mas lá manda deportar quem emite opiniões
consideradas erradas pela Casa Branca.
O histórico de decisões anunciadas mas nunca
efetivadas de Donald Trump faz duvidar da implementação das tais tarifas
adicionais. Ele já mandou cartas ameaçadoras a outras nações marcando prazos
para o início da vigência. A entrada em vigor de todas essas decisões causaria
tumultos graves na própria economia dos EUA, pois se trata de um imposto sobre
seus consumidores.
O sangue frio, portanto, é o melhor caminho
para lidar com o novo arreganho de Trump. Nesse quesito, o governo de Luiz
Inácio Lula da
Silva (PT) tem se portado bem, o que ficou mais uma vez atestado na reação
sóbria do Planalto ao anúncio do tarifaço.
O governo brasileiro não deve abrir mão de
seus poderes de retaliar, conferidos pelo Congresso Nacional ao Executivo em
legislação recente. Mas deveria recorrer a esse expediente apenas em casos
extremos, que ainda não se concretizaram.
Insistir em demonstrar às contrapartes
norte-americanas que não há nenhuma razão econômica para a invectiva contra o
Brasil continua a ser a linha de ação mais indicada. No mínimo se ganha tempo
para que as ciclotimias do populismo empurrem o presidente dos Estados
Unidos para outros temas em suas redes sociais.
O tempo trabalha a favor do Brasil e dos
outros países acossados pelas bravatas das guerras comerciais de Donald Trump.
Estouro da inflação expõe política econômica
inconsistente
Folha de S. Paulo
IPCA supera limite por 6 meses seguidos;
enquanto BC pisa no freio para conter preços, governo Lula acelera com gastos
Descumprimentos dos limites máximos fixados
para a inflação não
são novidade no país. Somente nos últimos quatro anos, quando se estabeleceram
metas mais ambiciosas, o teto foi rompido em três deles.
Neste 2025 teve início um novo sistema de
apuração das metas, pelo qual o estouro se caracteriza quando o IPCA acumulado
em 12 meses fica acima do permitido por seis meses consecutivos —e, como se
divulgou nesta quinta-feira (10), foi o que ocorreu já em junho, quando o
índice acumulou 5,35%, ante um teto de 4,5% (meta de 3% mais margem de 1,5
ponto percentual).
Os resultados deveriam ser suficientes para
derrubar discursos politiqueiros e teorias conspiratórias que atribuem os juros elevados
no Brasil a algum conluio entre magnatas e o Banco Central.
Se as taxas fossem desnecessariamente altas, o IPCA, por óbvio, estaria bem
abaixo da meta.
Ao contrário, o BC mostrou flexibilidade
para diluir
ao longo do tempo a dosagem da política monetária, sem derrubar a atividade
econômica na tentativa de cumprir as metas a ferro e fogo.
A questão relevante nesse caso é bem diversa:
por que uma taxa Selic que, entre idas e vindas, subiu de 2% ao ano, no início
de 2021, para os atuais 15%, maior patamar em quase duas décadas, ainda não foi
capaz de trazer de volta a inflação a limites que são usuais em países
emergentes?
Uma parte da resposta foi ensaiada pelo
presidente do BC, Gabriel
Galípolo, em depoimento na quarta (9) à Comissão de Finanças e Tributação
da Câmara
dos Deputados. Ele levantou a hipótese de que no Brasil a política
monetária possa não funcionar com a mesma "fluidez" observada em
outros países devido, por exemplo, a subsídios que permitem a tomada de crédito
a taxas abaixo da Selic.
A tese não é nova —novidade é vê-la esboçada
por um indicado pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva
(PT). Já se
apontou antes que a ampla oferta de financiamentos favorecidos no país, em
especial nos bancos públicos, reduz a eficácia dos juros do BC, que só afetam
as operações com taxas definidas pelo mercado.
Mais claro, no entanto, é que o estouro da
inflação reflete uma política econômica inconsistente —na qual seus dois
principais eixos, o monetário e o fiscal, apontam para direções opostas.
Enquanto o BC busca inibir o consumo e os
investimentos para esfriar a economia e tirar fôlego da alta de preços, a
administração petista estimula
a atividade com mais gasto público e novas modalidades de crédito.
Numa analogia didática, infelizmente já gasta pelo uso necessário no país, é
como pisar no freio e no acelerador ao mesmo tempo.
Como também já deveria estar claro, a troca
de comando no BC em nada alterou o diagnóstico do cenário e o rumo dos juros,
ainda que Lula e correligionários continuem alegremente a culpar a gestão
anterior. Enquanto isso, as taxas impulsionam a dívida pública e o Orçamento
federal se aproxima do estrangulamento.
Cocaína em alta e falência da guerra às
drogas
Folha de S. Paulo
Comércio global de entorpecentes aumenta;
produto da folha de coca teve expansão mais rápida, puxada pela Colômbia
A chamada guerra às drogas, que
surgiu nos Estados
Unidos nos anos 1970 e se espalhou pelo mundo, é uma política baseada
na proibição por meio do combate policial e militarizado e do aumento de penas,
com foco na redução da oferta.
Pesquisas científicas e a experiência global
mostram com clareza que tal estratégia fracassou, ao estimular a violência armada
de facções rivais que disputam fatias do mercado ilegal e dificultar o acesso a
tratamentos de usuários que desenvolvem dependência. Isso tudo sem conseguir
diminuir a oferta e o consumo.
Relatório do Escritório das Nações Unidas
sobre Drogas e Crime (UNODC) mostrou que mais de 316 milhões de pessoas no
mundo usaram drogas em 2023, o que representa alta de 28% em relação a dez anos
antes.
A maconha é
a droga mais consumida (244 milhões de usuários), seguida por opioides (61
milhões), anfetaminas (31 milhões) e cocaína (25 milhões).
Em relação a esta última, o UNODC reportou em
junho que seu
comércio global bateu recordes históricos, com 3.708 toneladas produzidas
—aumento de 34% na comparação com 2022 e cerca de um quíntuplo do registrado em
2013. O número de consumidores passou de 17 milhões em 2013 para 25 milhões em
2023.
Trata-se do mercado de droga ilegal que
apresentou a mais rápida expansão nos últimos anos, e a alta foi puxada
pela Colômbia,
onde a produção de cocaína aumentou 53% entre 2022 e 2023, quando atingiu 2.600
toneladas.
O fenômeno se deve não só à ampliação da área
plantada de folha de coca, mas a desenvolvimentos
tecnológicos que elevam a produtividade por hectare.
Grupos dissidentes das guerrilhas Farc e
Exército de Libertação Nacional (ELN), que não aceitaram o acordo com o governo
colombiano em 2016 para abandonar as armas em troca de concessões políticas,
passaram a atuar no narcotráfico e se articulam com cartéis mexicanos, que
investem em especialização técnica tanto no cultivo da planta como no
refinamento da cocaína.
Regiões de consumo também se diversificaram
para além de EUA e Europa, com
crescimento em África, Ásia e,
principalmente, Austrália e Nova Zelândia.
O cenário evidencia como a política de guerra às drogas equivale a enxugar gelo, sem contar o efeito nefasto da violência que afeta sobretudo populações mais pobres —como se viu na crise humanitária deflagrada em janeiro em Catatumbo, no norte da Colômbia, devido a disputas entre a ELN e dissidentes das Farc.
Independência da Justiça e democracia são
inegociáveis
O Globo
Exigências estapafúrdias de Trump devem ser
repelidas com firmeza para haver negociação comercial
Há mistura de chantagem, ofensa, desleixo,
ignorância, mentira e até ridículo na carta em que Donald Trump anuncia
tarifas de 50% sobre importações do Brasil caso não seja suspenso o processo
judicial contra o ex-presidente Jair
Bolsonaro. Trump costuma se gabar de seus dotes como negociador, mas
simplesmente não há o que negociar diante de exigência tão estapafúrdia. Por um
motivo singelo: tanto a independência da Justiça brasileira quanto a democracia
brasileira são inegociáveis — e é ofensivo imaginar o contrário. “O Brasil é um
país soberano com instituições independentes que não aceitará ser tutelado por
ninguém”, respondeu em tom preciso e sereno o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva.
Das dezenas de cartas que Trump enviou a
diversos países anunciando aumento de tarifas, a brasileira é a única que
mistura a política comercial dos Estados Unidos às preferências políticas de
seu presidente. Tal confusão entre interesse público e afetos privados é sinal
eloquente da visão autocrática que move seu governo.
Do ponto de vista econômico, as tarifas
carecem de sentido. Os Estados Unidos compram 11% das exportações brasileiras
e, ao contrário do que Trump afirma na carta, a balança tem sido amplamente
favorável aos americanos, com US$ 410 bilhões de superávit nos últimos 15 anos
em comércio e serviços. “Trump nem finge haver justificativa econômica.
Trata-se apenas de punir o Brasil por julgar Bolsonaro”, escreveu o Nobel de
economia Paul Krugman. “Será que ele acredita mesmo que pode usar tarifas para
forçar uma nação enorme, que nem é tão dependente do mercado americano, a
abandonar a democracia?”
Trata-se, naturalmente, de questão retórica.
Dado que nada mudará nos processos contra Bolsonaro nem nas decisões da Justiça
brasileira relativas a conteúdos em redes sociais — a segunda exigência feita
por Trump —, o governo Lula se vê diante de um problema prático: como reagir?
As primeiras manifestações foram corretas. Trump deve receber o tratamento que
se dispensa a provocadores: firmeza e serenidade na exposição de seus motivos e
fraquezas. Ao mesmo tempo, o governo brasileiro faria bem em tentar retomar
negociações comerciais se houver abertura. Países como Reino Unido, México,
Vietnã e a própria China já obtiveram sucesso com diálogo.
Há, é verdade, dificuldades. No campo
externo, era previsível alguma reação americana às iniciativas diplomáticas de
Lula, sobretudo à tentativa de buscar alternativas ao dólar e à retórica que
alinha o Brasil a países no polo oposto dos valores ocidentais, como Irã e
Rússia. Escalar a disputa por motivação política só prejudicará ainda mais o
Brasil, portanto o próprio governo. Se necessária, qualquer retaliação precisa
dar ênfase a medidas que se façam sentir para as empresas americanas, como
quebra de patentes ou taxação de serviços digitais. No campo interno,
continuará a pressão de Bolsonaro. Mas a carta de Trump faz mal também à
oposição, pois traz danos a setores com ela identificados, como indústria ou
agronegócio. E, fundamentalmente, ao Brasil, empresários e trabalhadores. Não
tardará a que o país entenda as consequências das tarifas e ponha a culpa em
quem as celebrou. No passado, Trump já abandonou aliados e recuou de medidas
estapafúrdias quando a realidade se fez valer. É incerto até que ponto irá seu
apego a Bolsonaro.
Disputa política dificulta evolução do
transporte público no Rio
O Globo
Não bastasse a confusão do cartão Jaé,
licitações estaduais estão paradas em razão da briga sucessória no governo
É lamentável que disputas políticas
contribuam para travar ainda mais o ineficiente transporte público do Rio,
impondo sacrifícios e prejuízos a milhões de passageiros. Como mostrou
reportagem do GLOBO, enquanto se acirra o embate eleitoral envolvendo o presidente
da Assembleia Legislativa, Rodrigo
Bacellar (União), e o ex-secretário estadual de Transporte e
Mobilidade Urbana Washington
Reis (MDB) — exonerado por Bacellar quando substituiu interinamente o
governador Cláudio
Castro (PL) —, projetos essenciais permanecem parados.
Um deles é a licitação do problemático
sistema de trens da SuperVia. O prazo fixado em acordo judicial para a atual
concessionária deixar o serviço acaba em setembro. Faltando dois meses, não foi
formatada a licitação para escolher a nova empresa. Nos bastidores, fala-se em
adiamento, prorrogando a agonia dos 300 mil passageiros que andam de trem todo
dia. A Secretaria de Transportes diz buscar uma solução.
A licitação para conceder 1.100 linhas de
ônibus intermunicipais também não tem data para sair. O governo alega que os
trâmites jurídicos estão em fase final e que o próximo passo será enviar a
documentação para que seja validada e publicada no Diário Oficial. Ele também
se mostra hesitante na tentativa de subsidiar as passagens de trem e metrô para
reduzir a tarifa, medida que agravaria ainda mais o endividamento já
exorbitante.
Sem planejar capacidade e investimento em
nível metropolitano e sem integração eficiente entre os diversos meios de
transporte, não há como oferecer serviço de qualidade com tarifa decente. Por
isso é tão importante a negociação entre os governos estadual e municipal para
manter a racionalidade do sistema e o bilhete unificado para os usuários.
A prefeitura
do Rio anunciou que, a partir de 2 de agosto, transportes
administrados pelo município só aceitarão o novo cartão Jaé. Para pegar metrô,
trem, barca ou ônibus intermunicipal, será preciso o atual RioCard. Desde julho
de 2023, quando foi lançado o Jaé, estado e prefeitura não chegaram a acordo
para integrar os sistemas.
O estado alega que o convênio “está em fase
final de negociação”. A prefeitura atribui a responsabilidade ao governo
estadual. “Estamos solicitando a integração ao estado tem dois anos, e
simplesmente a Riocard não recebe o comando para fazer”, escreveu numa rede
social o prefeito do Rio, Eduardo Paes,
em resposta ao editorial
publicado ontem sobre a implantação conturbada do Jaé. O governo
estadual deveria sem dúvida ser mais ágil na integração.
Governos, estaduais ou municipais, têm
obrigação de lutar por eficiência, racionalidade e tarifas justas nos
transportes públicos. A integração entre ônibus, trens, metrô e outros meios é
realidade em cidades do mundo inteiro. Não deveria ser diferente no Rio. E não
é com disputas estéreis que isso se resolverá.
Tarifas de Trump atendem sua narrativa, não a
lógica econômica
Valor Econômico
O que interessa ao presidente dos EUA é ter o
domínio da narrativa para, não importa o resultado, declarar-se vencedor
Ao anunciar uma tarifa de 50% sobre as
importações brasileiras, citando o “tratamento” dado ao ex-presidente Jair
Bolsonaro como um dos motivos, o presidente dos EUA, Donald Trump, apresenta a
nova face a sua política comercial, a de instrumento para fins de política
externa. É a ideologia se somando aos interesses econômicos — que muitas vezes
não são lógicos.
Narrativas são importantes. A capacidade de
moldar visões de mundo e ideologias — tanto das elites quanto dos eleitores
comuns — é uma arma poderosa, observou Dani Rodrik, professor de economia
política internacional na Harvard Kennedy School, em artigo publicado no Valor
no dia 10/07. Ele argumenta que com Trump e seus apoiadores Maga, a ideologia
se sobrepõe aos interesses materiais. Isso é um risco global, uma vez que a
economia, e muito menos a lógica econômica, não predominaram nesse caso. A
economia não deixou de ser um balizador nas relações internacionais, mas
frequentemente outras necessidades se impõem.
Para além do conteúdo ridículo e provocador,
a carta de Trump dirigida ao Brasil tem aspectos inegociáveis que sequer
deveriam ter sido mencionados: a democracia brasileira e a independência de
suas instituições.
Na carta enviada ao presidente Lula, Trump
nem ao menos se deu ao trabalho de dar uma justificativa econômica plausível
para a sua ação. Trump faz menção a Bolsonaro e aos “ataques à liberdade de
expressão”, em uma alusão às alegadas “centenas de Ordens de Censura SECRETAS e
ILEGAIS” emitidas pelo Supremo Tribunal Federal contra plataformas de mídia
social dos EUA. O presidente americano fala em equilíbrio comercial, mas ignora
que os EUA tiveram um superávit de US$ 7,4 bilhões em 2024, segundo dados do
Escritório do Representante Comercial americano (USTR). E que os EUA acumulam
superávit no comércio de bens com o Brasil desde 2009, que somam US$ 90,28
bilhões, considerando os números até junho, segundo dados do Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).
Uma tarifa de 50% seria uma grande disrupção
no comércio de US$ 92 bilhões em bens com o Brasil — o maior produtor mundial
de café arábica, usado em bebidas de alta qualidade. A ameaça fez disparar
ontem os preços do café na bolsa de mercadorias de Nova York. Se o café não for
isento da nova tarifa de Trump, isso terá um impacto significativo no preço do
café da manhã americano, uma vez que no ano passado o Brasil respondeu por 34%
de todo o café verde importado pelos EUA.
Além do Brasil, outros 21 países receberam
esta semana cartas contendo ameaças tarifárias sobre suas exportações para os
EUA. O texto das cartas é o mesmo: Trump notifica os governos de que estarão
sujeitos a tarifas punitivas se não agirem para “corrigir muitos anos” de
“políticas e barreiras comerciais tarifárias e não tarifárias”, que “teriam
levado a déficits comerciais insustentáveis” contra os EUA. A carta do Brasil
foi a exceção no conteúdo político e na punição mais elevada, de 50%.
Coreia do Sul e Japão, dois aliados
estratégicos na Ásia para conter a ascensão da China, também receberam
notificações de que estarão sujeitos a tarifas de 25%. Nenhum dos dois países
tem como oferecer reduções tarifárias significativas, uma vez que ambos já
praticam tarifas mínimas.
Mas o que importa para Trump é ter o domínio
da narrativa, convencer as pessoas a fazer escolhas que parecem estar em
conflito com os próprios interesses econômicos. Suas cartas não apontam um
objetivo claro para “equilibrar” a relação comercial com os EUA, pois o que
importa é obrigar o outro lado a oferecer uma concessão, seja ela qual for, que
Trump possa declarar depois como uma grande vitória.
As cartas também apresentaram um novo
adiamento do prazo de 9 de julho dado por Trump para reimpor suas chamadas
“tarifas recíprocas”. Não está claro ainda se para 1 de agosto ou 1 de setembro
ou outra data qualquer futura. É muito possível que sejam adiadas
indefinidamente, o que mantém uma persistente incerteza no comércio global,
apesar da insistência do presidente em contrário, em letras maiúsculas, no
Truth Social.
No geral, as reações dos países a Trump
envolvem tentar mitigar os danos o máximo possível, evitando imitar as tarifas
dos EUA e com seus chefes de governo se submetendo a sessões constrangedoras em
encontros no Salão Oval da Casa Branca. Não à toa, esses encontros foram
diminuindo desde a posse de Trump em janeiro. Lula, ontem, disse que irá
aplicar os mesmos 50%.
Apesar de toda a retórica agressiva, o
governo Trump conseguiu até agora anunciar apenas três acordos comerciais com
Reino Unido, China e, mais recentemente, Vietnã. Economistas apontam, no
entanto, que esses acordos não passam de memorandos de entendimento. Acordos
comerciais amplos exigem anos de negociação detalhada, o que é trabalhoso
demais na ótica de Trump.
A falta de acordos, mesmo que superficiais,
reflete em parte o risco deste durar somente até Trump mudar de ideia
novamente. É o que mostra o USMCA, que substituiu o Nafta, negociado por Trump
durante o seu primeiro mandato. Mesmo antes de tomar posse em janeiro, o
republicano já havia anunciado seu objetivo de revisar o USMCA para torná-lo
“melhor”.
Outro risco para os países é ceder às
chantagens de um presidente dos EUA volátil e alienar seu apoio interno, para
apenas se ver às voltas com uma nova demanda sem lógica.
“Apenas os covardes pagam as suas dívidas”,
afirmou o líder russo Vladimir Putin, no fim de maio, durante uma reunião no
Kremlin com empresários russos. Esse parece ser o mesmo lema de Trump.
O favor de Trump a Lula
O Estado de S. Paulo
Ao ameaçar impor tarifas contra o Brasil em
favor da impunidade de Bolsonaro, o presidente americano deu ao petista o que
ele mais precisava neste momento de impopularidade: um inimigo
O presidente dos Estados Unidos, Donald
Trump, prestou um enorme favor ao presidente Lula da Silva com a ameaça de
impor tarifas comerciais ao Brasil para obrigar o País a se render a suas
absurdas exigências, entre as quais livrar Jair Bolsonaro pela tentativa de
golpe de Estado. Deu ao demiurgo petista tudo o que um populista como ele mais
deseja num momento de impopularidade: um inimigo para brigar. De preferência,
um inimigo que faça ameaças de tal ordem que possam, se efetivadas, causar
prejuízos reais à economia, abalar setores e negócios estratégicos como o
agronegócio e o aço, encarecer a vida dos brasileiros e, de quebra, enfraquecer
as forças políticas aliadas de Trump no Brasil.
Ainda é cedo para decretar que o tiro do
presidente americano saiu pela culatra, mas é evidente que boa parte da conta
de seu eventual tarifaço recairá sobre os ombros de quem supostamente moveu
mundos e fundos para a ação de Trump contra o Brasil. Nesse pacote, inclui-se,
em primeiro lugar, o clã Bolsonaro. Como se sabe, o ex-presidente e seus
associados liberticidas viram na volta de Trump à Casa Branca uma boia de
salvação para si e para o bolsonarismo. Alguns aliados, mais cautelosos,
trataram Trump como símbolo do nacionalismo triunfante que sonhavam em aplicar
no Brasil. Outros, mais delirantes, chegaram a clamar por uma invasão
americana. Entre um passeio e outro na Disneylândia, Eduardo Bolsonaro, filho
do ex-presidente, se apresenta como exilado político nos Estados Unidos e fez
lobby na Casa Branca para que Trump liderasse a campanha bolsonarista contra o
Supremo Tribunal Federal (STF), instituição tida como algoz de seu pai e de
aliados golpistas.
O efeito prático está aí: o risco de o
nacionalismo patriótico do bolsonarismo se converter numa oposição aos
interesses do Brasil. Pode ser de pouca serventia a tentativa dos Bolsonaros e
dos principais nomes da direita brasileira – como o governador Tarcísio de
Freitas, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, e outros de menor musculatura
política – de atribuírem culpa a Lula, ao ministro Alexandre de Moraes, do STF,
ao Itamaraty ou ao PT. Assim como ocorreu em países como Canadá, Austrália,
México e, em certa medida, Alemanha, a interferência política de Trump em
assuntos nacionais produziu resultados contrários: desmoralizou o americano e
enfraqueceu o potencial eleitoral de seus aliados.
Para um governo e um presidente com imagem
combalida pela incompetência e pela inépcia, nada mais útil do que ter um
inimigo externo e assim, em tese, tentar “unir” o País contra os prejuízos da
medida – incluindo o setor produtivo, que majoritariamente enxerga o
lulopetismo com desconfiança. Bastou a publicação da carta de Trump para que
Lula, seus exegetas no Palácio do Planalto e os habituais porta-vozes do
lulopetismo nas redes decretassem uma espécie de estado de defesa da soberania
nacional. E assim o enredo está urdido: um governo ruim, um presidente perdendo
aliados e uma base desanimada se veem ávidos para galvanizar apoios Brasil
afora contra a ameaça trumpista. A essa agenda se soma a campanha do “nós
contra eles”, deflagrada recentemente após a crise do Imposto sobre Operações
Financeiras (IOF), e assim se completa a receita populista do lulopetismo com
um só objetivo: a reeleição de Lula.
Mas que Lula e a companheirada não se
enganem. Apesar do favor político oferecido por Trump, o tarifaço, se vier,
resultará em prejuízos econômicos consideráveis – ao agronegócio, à indústria e
aos consumidores –, e com o tempo é provável que parte de tais efeitos seja
debitada também da conta de Lula, sobretudo porque este não atuou para reduzir
as tensões com os Estados Unidos de Trump. Recorde-se que Lula, ao contrário,
investiu na aproximação com a China, advogou pela substituição do dólar como
moeda do comércio global e fez campanha contra companhias americanas de
internet. Por ora, o jogo favorece Lula, mas a eleição ainda está muito longe.
Por uma cidade menos barulhenta
O Estado de S. Paulo
Abandonados pelo poder público, que ignora
seu padecimento, moradores de SP atormentados pelo barulho lançam movimento
para fazer valer o direito ao sossego. Eis aí uma causa justíssima
Moradores de diversas regiões da cidade de
São Paulo se uniram para formar a Frente Cidadã pela Despoluição Sonora. O
movimento denuncia os danos físicos e mentais causados pela exposição aos
ruídos excessivos. Como individualmente as reclamações parecem não sensibilizar
as autoridades paulistanas a agir em defesa da qualidade de vida na metrópole,
a frente, ao juntar esforços, pretende pressionar o poder público a restaurar a
paz e a promover a saúde coletiva.
Um passeio pela Avenida Paulista num fim de
semana basta para entender por que esse movimento nasceu naquela região.
Fechada para lazer aos domingos, a via foi tomada por potentes caixas de som.
São cantores, bandas de diversos estilos musicais e jovens em exibição de
passinhos de dança, que, juntos, formam uma balbúrdia. Há ainda inúmeras
queixas de barulho em obras públicas e privadas, bares e casas noturnas,
festivais no Vale do Anhangabaú, shows no Allianz Parque e até eventos no
Parque da Água Branca. Na periferia, são os bailes funk, mais conhecidos como
pancadões, que tiram o sono.
Contra toda essa desordem, a frente acabou de
lançar um manifesto público em uma plataforma eletrônica no qual alerta que São
Paulo vive uma “crise de saúde pública”, que, embora evitável, está em estágio
de “epidemia urbana”. Segundo o documento, a população está exposta “a níveis
de ruído que ultrapassam os limites” considerados suportáveis pela Organização
Mundial de Saúde (OMS). Por isso, o manifesto afirma que o barulho generalizado
adoece. E são muitas as enfermidades, como as doenças auditivas, as doenças
cardiovasculares, os distúrbios do sono, o estresse, a ansiedade e a depressão.
A frente começa a ganhar o apoio de
especialistas em saúde coletiva. Professor da Faculdade de Saúde Pública da
Universidade de São Paulo (USP) e ex-presidente da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa), o médico sanitarista Gonzalo Vecina Neto enviou
uma carta ao movimento na qual afirma que a iniciativa é “legítima” e
“necessária” porque a poluição sonora é um dos “principais riscos ambientais à
saúde humana nas cidades modernas”. E esse problema, diz ele, não deve ser
subestimado em virtude dos fortes impactos no Sistema Único de Saúde (SUS) e
até na expectativa de vida.
A frente lista seis legislações vigentes que,
em tese, deveriam coibir esses abusos e proteger os cidadãos. Mas essas regras,
que se dividem entre município, Estado e União, não são respeitadas ou, na
melhor das hipóteses, são mal fiscalizadas.
O jornal Folha de S.Paulo mostrou
recentemente que só a Central 190 da Polícia Militar recebeu mais de 100 mil
chamados por perturbação nos cinco primeiros meses deste ano. E, segundo
reportagem da GloboNews, com base na Lei de Acesso à Informação (LAI), o
Programa Silêncio Urbano (Psiu), da Prefeitura de São Paulo, registrou 43 mil
denúncias em 2024, mas apenas 669 multas foram aplicadas. Como se vê, as leis
têm se revelado ineficazes.
E não faz muito tempo que a Câmara Municipal
aprovou e o prefeito Ricardo Nunes sancionou uma mudança na lei que, em vez de
combater a poluição sonora com mais rigor, afrouxou as regras ao tirar os
grandes eventos do limite de decibéis imposto pela fiscalização do Psiu. Tudo
isso ocorreu sob o argumento de que shows geram emprego e renda, embora não
haja notícia de que o desenvolvimento econômico seja incompatível com a
salubridade e a urbanidade.
Para crescer com produção de riqueza e
qualidade de vida, São Paulo terá de discutir com seriedade medidas para pôr
fim à poluição sonora. A Frente Cidadã pela Despoluição Sonora já realizou um
grande feito ao colocar esse problema em pauta.
Cabe às autoridades públicas o engajamento na
busca por uma solução para o caos sonoro, com a elaboração de uma lei e a
adoção de uma fiscalização mais efetiva para limpar São Paulo da poluição
sonora, nos moldes do que fez a Lei Cidade Limpa ao varrer a poluição visual da
metrópole. Hoje, os cidadãos afetados pela barulheira estão abandonados pelo
poder público, que ou ignora seus pedidos de socorro, ou dá razão aos que
promovem um ruidoso inferno na cidade.
Colheita recorde sem celeiro
O Estado de S. Paulo
País terá nova safra histórica de grãos, mas
só tem como guardar pouco mais da metade
Entra ano, sai ano, e a celebração das
sucessivas quebras de recordes agrícolas continua a ser ofuscada pelo problema
crônico da falta de armazéns para estocagem, que ameaça minar a competitividade
da safra nacional de grãos. Recente reportagem do Estadão mostrou
que, nos últimos 20 anos, a safra tem crescido à média anual de 5,3%, enquanto
o ritmo de crescimento da capacidade de armazenagem, já deficitária antes,
segue vários passos atrás, em 3,4% ao ano, incapaz de acompanhar o avanço da
produção agrícola.
No início do ano, uma compilação de projeções
feita pelo Estadão/Broadcast Agro apontou aumento entre 2,5% e 6% do
PIB da agropecuária em 2025, reunindo estimativas que levavam em conta, além da
maior produção brasileira de grãos, a recuperação dos preços das commodities
agrícolas e a valorização do dólar. Naquela ocasião, a previsão da Companhia
Nacional de Abastecimento (Conab) era de uma safra 322,42 milhões de toneladas,
estimativa revista em julho para 339,6 milhões de toneladas, recorde histórico.
Somente no primeiro trimestre do ano, a
agropecuária cresceu 12,2%, em relação ao trimestre anterior, e puxou o avanço
de 1,4% da economia nacional no período. Um quarto do crescimento de 2,9% do
PIB brasileiro em relação ao primeiro trimestre do ano passado deveu-se à
agropecuária, como constataram os técnicos do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística. Mas, apesar do bom desempenho, a Confederação da Agricultura e
Pecuária do Brasil (CNA) alertava que o nível de investimento estava em risco.
Pesavam contra as incertezas globais e o alto custo do financiamento.
O gargalo criado pelo déficit de
armazenamento é o exemplo mais visível dos prejuízos logísticos que a
agricultura enfrenta, que embaça o avanço tecnológico que deu ao País o
diferencial de colher três safras por ano em uma mesma área. Acontece que, como
mostrou este jornal, somente pouco mais de 63% dos grãos colhidos têm armazéns
garantidos. O restante é deixado ao relento, exposto a intempéries, fungos e
outras pragas que comprometem a qualidade do produto.
A Organização das Nações Unidas para
Alimentação e Agricultura (FAO) recomenda que a capacidade estática de
armazenamento de um país deve ser 1,2 vez maior que a sua produção anual. Ou
seja, para a safra estimada pela Conab, o Brasil deveria dispor de armazéns
para, ao menos, 407,5 milhões de toneladas, mas a disponibilidade hoje é de
pouco mais da metade desse volume, com apenas 214,9 milhões.
Os produtores reclamam do alto custo de financiamentos para investir em infraestrutura e da burocracia bancária que penaliza, principalmente, médios e pequenos agricultores, problema ainda mais grave nas fronteiras agrícolas que se abrem nos Estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, região conhecida como Matopiba. A demanda dos produtores que tentam escoar rapidamente suas colheitas encarece o frete ao mesmo tempo em que a necessidade de vender rápido a safra joga o preço do grão para baixo. Planejar a infraestrutura é tão urgente quanto benéfico não só para os produtores, mas aos consumidores e ao País.
Tiro ideológico de Trump pode sair pela
culatra
Correio Braziliense
Impor taxa de 50% sobre os produtos
brasileiros exportados aos EUA pode, na verdade, prejudicar o ex-presidente
Bolsonaro, afastando dele aliados importantes ligados ao agronegócio e à
indústria
Desde que reassumiu a Casa Branca, Donald
Trump adotou as sanções comerciais como estratégia para resolver qualquer
questão diplomática, diante da sua postura política sempre baseada na coerção.
Se a coisa aperta, o líder conservador apela para o tamanho da economia
estadunidense para desafiar adversários geopolíticos. Perante a possível
condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF),
na esteira dos ataques à democracia culminados no 8 de Janeiro de 2023, Trump
invocou o mesmo receituário: impôs uma taxa de 50% sobre os produtos
brasileiros exportados aos EUA.
Trump tenta também reagir aos acenos do
presidente Lula às negociações entre os países do Brics com moedas próprias,
descartando o dólar como papel internacional. Um dos maiores temores do líder
estadunidense é justamente o enfraquecimento da noção de que sua moeda é a mais
indicada para a reserva econômica mundial.
Historicamente, entre outros fatores, o dólar
sempre foi usado como referência no mercado internacional por uma eventual
independência do Fed, o Banco Central estadunidense, da Casa Branca. As
políticas intervencionistas de Trump, por outro lado, abalam essa noção, o que
abre portas para negociações entre países usando outros papéis — medida
defendida por Lula na mais recente cúpula do Brics.
Na prática, porém, a estratégia de Trump não
parece surtir os efeitos vislumbrados. Politicamente, o agronegócio brasileiro
reagiu. Até mesmo a ex-ministra da Agricultura e senadora Tereza Cristina
criticou a sanção trumpista. "Brasil e Estados Unidos têm longa parceria,
e seus povos não devem ser penalizados", disse.
A Frente Parlamentar da Agropecuária,
dirigida por deputados e senadores ligados à direita brasileira, foi na mesma
linha e manifestou sua "preocupação com a decisão de Trump". "A
medida (...) representa um alerta ao equilíbrio das relações comerciais e
políticas entre os dois países", informou em nota. Na mesma toada, a
Confederação Nacional da Indústria (CNI) expressou sua "preocupação e
surpresa" com os "impactos graves" para o setor.
Números traduzem a preocupação do agro e da
indústria com a taxa elevada dos EUA. Nos últimos cinco anos, o Brasil exportou
US$ 165,8 bilhões para os Estados Unidos, segundo dados do Comex Stat, o
sistema oficial para consulta e extração de dados do comércio exterior
brasileiro. Os principais produtos foram petróleo, ferro, aço, café e pastas
químicas de madeira, além de outros itens importantes, como aeronaves, suco de
laranja e carne bovina.
Se o objetivo principal era pressionar a
soberania e a democracia brasileira em prol da liberdade de Bolsonaro, Trump
pode, na verdade, prejudicar o ex-presidente com a tarifa, afastando dele
aliados importantes ligados ao agronegócio e à indústria, seus maiores
financiadores na campanha de 2022.
Ao mesmo tempo, a taxação de Trump tem contornos teatrais. Nos últimos cinco anos, ainda de acordo com o Comex Stat, o Brasil importou US$ 190,6 bilhões dos Estados Unidos. Quem, em sã consciência, colocaria um lucro de aproximadamente US$ 25 bilhões em cinco anos em risco?
Resposta soberana
O Povo (CE)
Impossível não se indignar frente à carta
desaforada e mentirosa que o chefe do Executivo americano, Donald Trump, enviou
ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tratando o Brasil como se fosse uma
colônia dos Estados Unidos. É preciso que as nações democráticas deem um basta
nesse tipo de "diplomacia", que procura submeter todos os países à
vontade de um único homem.
É difícil encontrar paralelo na história, a
não ser em regimes totalitários, em que um chefe de Estado tenha agido dessa
maneira, atropelando todas as regras e costumes civilizatórios que regem as
relações internacionais.
A carta de Trump é uma mistura de tentativa
de intervir na Justiça brasileira, em favor de seu aliado Jair Bolsonaro, e de
inconformismo com a atuação no Brasil na presidência do Brics, em busca de uma
ordem multipolar. Em resumo, o destampatório trumpista é um ataque frontal à
soberania brasileira.
Trump exigiu que o julgamento de Bolsonaro
parasse "imediatamente", como se pudesse dar ordens ao Supremo
Tribunal Federal (STF). Ainda acusou falsamente o Brasil de não ter promovido
"eleições livres"; de supostamente ter violado a "liberdade de
expressão" e de ter prejudicado empresas americanas — e mentiu ao dizer
que os Estados Unidos tinham déficit na balança comercial com o Brasil: é o
contrário.
Com essa mixórdia de argumentos, que não
param de pé, transitando entre a mentira e o absurdo, Trump ameaça cobrar
tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros que entrarem nos EUA a partir
de 1º de agosto. A insolência chegou a tal ponto que ele não garantiu baixar as
taxas, nem mesmo se o Brasil cumprisse todas as suas exigências.
Por isso, Lula acertou ao dar uma resposta
contundente aos ataques de Washington, repondo as coisas em seu devido lugar,
mas sem ataques despropositados ao homólogo americano.
"O Brasil é um país soberano, com
instituições independentes, que não aceitará ser tutelado por ninguém",
escreveu o presidente brasileiro. Lula acrescentou, em relação ao aumento
unilateral das tarifas, que o Brasil responderá nos termos da lei de
reciprocidade.
O que espanta são os áulicos do presidente
Trump no Brasil, que se regozijam com as medidas anunciadas pelos Estados
Unidos, mesmo sabendo que o prejuízo recairá sobre a nossa economia. Chega às
raias da incompreensão verificar que um segmento político trabalhe, dentro do
País, para defender interesses americanos, contrários ao povo brasileiro.
É lamentável que a desqualificação política
tenha atingido de tal maneira o bolsonarismo ao ponto de esse grupo político,
autodeclarado "patriota", ter perdido completamente a noção do
significado dessa palavra.
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