sexta-feira, 11 de julho de 2025

Além de tudo, ruim de mira - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Trump deu a Lula uma chance de ouro de recuperar apoios políticos e popularidade

Com sua megalomania, impulsividade e imprevisibilidade, Donald Trump deu a Lula tudo o que ele precisava para recuperar apoio político e popularidade: um inimigo externo e um discurso. Um discurso catalisador, resumido no slogan que o Planalto produziu, mas terceirizou para seus militantes e aliados massificarem nas redes sociais: “Lula quer taxar os superricos, Bolsonaro taxa o Brasil”. É assim, unindo o “pobres contra ricos” com a “defesa da soberania”, que Lula tem sua grande chance de sair das cordas.

Se Lula recorre à “soberania”, o bolsonarismo tenta usar a “democracia”. Porém, a agressão do império à economia, às instituições e à democracia – e, portanto, à soberania nacional – é real, mas a alegação de Trump de que há censura, ameaça à livre expressão e “caça às bruxas” no Brasil é tão mentirosa quanto a própria “carta” de Trump para anunciar tarifas de 50% a todos os produtos brasileiros.

No texto, ele cita “déficits comerciais insustentáveis” que o Brasil causaria aos EUA, mas é o oposto! O Brasil teve um déficit de US$ 400 bilhões com os EUA em 15 anos, e oito dos dez produtos americanos exportados para o Brasil chegam aqui com... tarifa zero. Além de mentirosa, a carta é malcriada, grosseira e foi divulgada antes de chegar ao destinatário – o presidente do Brasil. O Itamaraty devolveu.

É isso que Jair Bolsonaro, Eduardo Bolsonaro e a imensa militância do grupo defendem e pregam no governo e no Congresso dos EUA? Taxação no comércio, sanções a ministros do Supremo, avacalhação da imagem do Brasil no exterior? E “o Brasil acima de tudo” que embalava multidões no pico de popularidade de Bolsonaro?

O ataque de Trump não muda o julgamento de Jair Bolsonaro no Supremo por tentativa de golpe, mas pode piorar um bocado a investigação do filho Eduardo por coação e obstrução do processo contra o pai. E o pior para o bolsonarismo é que divide, confunde e amedronta aliados. O grande teste será a pesquisa que a Quaest começou ontem, dia seguinte ao míssil de Trump, quando só se fala nisso. Foram 240 milhões de menções na internet em menos de 24 horas.

Trump mirou o governo Lula, o STF e o Brics, mas errou o alvo e acertou Bolsonaro e pode se transformar no marco da reviravolta de Lula rumo a 2026. Mas, assim como reuniu os Poderes e a Federação na defesa da democracia após o 8/1, Lula precisa, como analisa o professor Roberto Menezes, da UnB, unir Congresso, setores privados, entidades e os brasileiros em torno do interesse nacional. Só Trump poderia dar essa chance a Lula. E deu.

 

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