O Povo (CE)
Na prática, o Brasil recebeu uma
carta-chantagem de Trump, que condiciona a redução da tarifa imposta à
interrupção de um processo judicial em que é réu Jair Bolsonaro, em curso no
Supremo Tribunal Federal
O que acontece quando líderes populistas usam
a economia como arma política? Donald Trump pode nos demonstrar. Embora o
americano venha utilizando seu jogo de tarifas para ameaçar parceiros
comerciais há meses, foi a decisão de sobretaxar o Brasil que expôs com
mais clareza a falta de racionalidade econômica da política tarifária de Trump.
As tarifas não seguem uma lógica econômica, são antes usadas como sanções
políticas aplicadas por um presidente imprevisível e irracional.
O caso brasileiro é mais grave também pelo ataque direto à soberania do país. Na prática, o Brasil recebeu uma carta-chantagem, que condiciona a redução da tarifa imposta à interrupção de um processo judicial em que é réu Jair Bolsonaro, em curso no Supremo Tribunal Federal. A condição é uma exigência de rendição. Nenhuma democracia livre pode submeter a autonomia de seu Poder Judiciário aos desejos de uma liderança externa.
Quem melhor definiu a medida foi o Nobel
de Economia Paul Krugman: "maligna e megalomaníaca". O
pesquisador foi além, afirmando que Donald Trump deve sofrer impeachment por
manejar de forma tão partidária a política econômica de seu país. Desde que
assumiu, o vai-e-vem das tarifas vem implodindo a ordem internacional
consolidada no pós-Segunda Guerra, trazendo uma boa dose de incerteza e risco
para as relações comerciais entre os países.
A medida contra o Brasil é resultado direto
da articulação do bolsonarismo com seus aliados internacionais. Eduardo
Bolsonaro deixou suas impressões digitais no resultado: comemorou a
medida, sugerindo que "esta não será a única novidade vinda dos EUA neste
próximo tempo". Concluiu a postagem pedindo apoio à nota de Donald Trump
na rede social do americano. Parece inédito termos um deputado federal eleito
que, embora licenciado, se ocupe unicamente de conspirar contra os interesses
nacionais em território estrangeiro.
O governo federal tende a ganhar dividendos
com esse anúncio. É extremamente difícil à oposição explicar ao povo
brasileiro as razões para comemoração. Além disso, as contradições de
Trump são evidentes demais para disfarçar: se as tarifas estão sendo aplicadas
contra parceiros que têm superávit na balança comercial com os EUA, por que
penalizar o Brasil, que importa mais do que exporta aos americanos? Se tem
alguém vem levando "vantagem", segundo a régua dos americanos,
certamente não somos nós brasileiros.
Lula tem recebido oportunidades para respirar
e construir um caminho para sua reeleição em 2026. A diplomacia da
chantagem não pode ser naturalizada, e o brasileiro é capaz de entender bem a
injustiça, seja a tributária, seja a tarifária: é só deixar a boa comunicação
fazer seu trabalho que a aprovação vem.
*Doutora em direito e professora da UFC
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