O Estado de S. Paulo
Esopo, escravo grego do século 6º antes de
Cristo, foi quem escreveu as fábulas e, entre elas, a do Lobo e o Cordeiro, que
se aplica ao tarifaço do presidente Trump ao Brasil.
A fábula teve muitas traduções e versões que não se afastam do argumento central. Eis aí. O lobo e o cordeiro encontraram-se num regato, onde foram beber água. Salivando, o lobo disse: “Vou te comer, porque há um ano falaste mal de mim.” O cordeiro respondeu que isso não era possível, porque ainda não tinha um ano de idade. O lobão, então, se apegou a outra narrativa: “Vou te comer porque estás sujando minha água.” “Não é possível, porque estás acima da correnteza e eu abaixo.” Mas o lobão não aceitou as razões do cordeiro e, crau!, o abocanhou.
No tarifaço de Trump, o castigo brutal, de
ordem econômica, não tem justificativa econômica. Acaso o Brasil está tirando
proveito desleal do seu comércio com os Estados Unidos, como apontou Trump?
Não, lobão: o Brasil compra mais dos Estados Unidos do que os Estados Unidos
compram do Brasil.
Ah, o amigo Bolsonaro está sendo processado
pelo Supremo, e isso é perseguição? Ora, se alguém não gosta de um processo que
rola num tribunal, ainda longe de uma sentença, deve tascar um tarifaço por
conta disso?
O presidente Lula fez declarações favoráveis
ao Irã e, por isso,
os 210 milhões de brasileiros têm de ser
castigados? O Brics está incomodando porque estuda o uso de moedas próprias
para liquidar as contas entre seus membros, mas apenas o Brasil, e não os
demais do grupo, tem de engolir a bomba?
Enfim, nada a ver. Não há lógica nessas
justificativas, a não ser a de que o lobo é mais forte, quer comer o cordeiro,
e esses são os dados da realidade.
Isso significa que não há negociação possível
dentro da lógica comercial e econômica, como alguns analistas vêm sugerindo.
E o tal revide, na base da reciprocidade,
como promete o presidente Lula, além de pouco abrangente, pode se tornar ainda
mais prejudicial, porque novos golpes podem ser desferidos. Sim, deve haver
diálogo, conversas e trâmites diplomáticos, mas não dá para esperar demais
deles, dadas as naturezas diferentes dos protagonistas de que fala a fábula.
Como alguns interesses dos Estados Unidos
também serão contrariados, como os dos importadores de produtos brasileiros,
será preciso, antes, esperar pela imposição de tarifas prevista para 1º de
agosto, para só então conferir sobre o que fazer.
Não são pequenos os efeitos internos. Alguns
setores e empresas ligados à exportação, como os de máquinas (Weg), commodities
agrícolas (café, suco de laranja e carne) e celulose (Suzano e Klabin), deverão
ser atingidos. Também será preciso ver os efeitos colaterais sobre o câmbio, a
inflação e os juros.
Algum impacto político interno parece
inevitável: o castigo aos brasileiros tem tudo para ser um tiro no pé nos
objetivos eleitorais do ex-presidente Bolsonaro. A conferir os efeitos da
ferocidade do lobo...
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