O Globo
Abre-se espaço para a famosa terceira via que
quebre essa polarização que nos leva a um beco sem saída
Não fossem Trump e Bolsonaro quem são, seriam
surpreendentes os erros que cometem, um atrás do outro, na tentativa de evitar
a punição deste último, que parece inevitável. Teria também o mesmo fim Trump,
mas uma questão de prazo técnico, não de culpabilidade, o livrou da cadeia,
pois foi eleito presidente, e com isso suspendeu o processo que pende sobre ele
pelo mesmo crime, o de tentativa de golpe para impedir a posse do seu sucessor.
A Justiça brasileira, vejam só, foi mais ágil e mais eficaz que a americana, e Bolsonaro perdeu o direito de se candidatar por outro crime, cometido com a intenção de justificar perante os embaixadores dos principais países do mundo o golpe que se preparava para dar. O timing político-eleitoral não foi favorável a Bolsonaro, pois ele foi condenado à inelegibilidade pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em junho de 2023, enquanto Trump ainda não vencera a eleição americana, o que só veio a acontecer em janeiro de 2025.
Nesse intervalo, Trump tinha mais do que
fazer. Mesmo, porém, se ainda não estivesse inelegível e dependesse da decisão
do Supremo nesse processo de agora para poder se candidatar, é quase nula a
possibilidade de o presidente dos Estados Unidos, ou de qualquer outro país,
ter condições de interferir numa decisão da nossa mais alta Corte de justiça.
Tanto Trump quanto os Bolsonaro cometem um erro crasso de imaginar que um país
com instituições que resistiram a um golpe de Estado, notadamente o Supremo, possa
submeter sua soberania às ordens de um simulacro de tirano de filme de James
Bond.
Portanto, quando anuncia, no alto de sua
ignorância, que a única saída para evitar as sanções dos Estados Unidos seria
anistiar seu pai, o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro revela seu
desconhecimento do país que pretende governar, além do desprezo pela soberania
do país que o pai desgraçadamente governou. É claro que ainda falta mais de um
ano para a eleição, e nesse país em que tudo acontece, tudo pode acontecer para
virar mais uma vez a roda da fortuna.
Até o tiro no pé imperialista ( nunca esse
clichê se mostrou tão adequado), a popularidade de Lula estava em decadência e
a direita tinha um candidato com grandes chances de vencer a eleição do ano que
vem. Hoje, já não há tanta certeza assim, e temos que esperar as pesquisas para
constatar o estrago que esse arreganho autoritário provocou no sentimento do
povo brasileiro. O fato é que o nacionalismo, tão explorado por Bolsonaro e os
seus, nunca foi tão provocado quanto agora, e desta vez quem está do lado certo
é Lula.
Mesmo os que já não viam com bons olhos a
reeleição de Lula, examinando a possibilidade de apostar em um bolsonarista
menos radical como o governador de São Paulo, estão hoje sem uma boia de
salvação, pelo menos no momento. Para obter as graças de Bolsonaro à sua
candidatura, que pareceria bem encaminhada, Tarcísio de Freitas tinha que
carregar certos fardos. Mas a atitude submissa de agora, sua falta de autonomia
para se colocar a favor dos interesses nacionais contra uma agressão externa
inaceitável, o coloca como um direitista radical, não um político de direita
com propensão ao diálogo e mente mais aberta que seu tutor.
O certo é que o governador de São Paulo vai
ter que fazer muita força para voltar a ter o apoio de uma parcela do
eleitorado mais interessada no futuro do país do que no futuro dos Bolsonaro.
Se Tarcísio acha que os dois se confundem, não é o candidato procurado por
larga parcela do eleitorado. Caberia a Lula aproveitar-se da situação de
unidade nacional pela nossa soberania e voltar a atrair esse eleitorado que lhe
fugia das mãos.
Para isso, porém, teria que retomar a postura
de um candidato em busca da conciliação política e de união nacional. Não será
fácil convencer os eleitores novamente, pois seu governo, até agora, é um
fiasco nesse quesito, e promessa não cumprida, para reaver credibilidade,
precisa de esforço maior e provas incontestáveis. Abre-se espaço para a famosa
terceira via que quebre essa polarização que nos leva a um beco sem saída.
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