segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

O risco de 'Bidenização' de Lula em 2026 - Bruno Carazza

Valor Econômico

Nova pesquisa do Datafolha liga sinal de alerta sobre popularidade do presidente

Os números do Datafolha caíram como uma bomba no Palácio do Planalto. A queda de mais de dez pontos na aprovação de Lula é um acontecimento nunca visto em seus três mandatos como presidente.

A se confirmar essa tendência, fica cada vez mais palpável o risco de uma espécie de “Bidenização” de Lula até 2026. Os paralelos existem, e vão muito além da idade avançada.

Lula não apresenta os sinais de senilidade que forçaram Biden a desistir de concorrer à reeleição. A popularidade do brasileiro, porém, começa a ser assombrada por uma circunstância que, no caso de Biden, foi muito mais nociva do que os lapsos de memória e o raciocínio lento no debate presidencial.

Mesmo antes da campanha começar, trumpistas já bombardeavam as redes sociais com críticas sobre o aumento do custo de vida. Por mais que Biden comemorasse que a inflação havia caído de 9% para menos de 3% ao ano, a mensagem martelada pelos republicanos era que o bife estava quase 40% mais caro e abastecer o carro custava quase 60% a mais do que no final do governo Trump.

Situação semelhante vem sendo enfrentada por Lula. Embora a inflação tenha caído do patamar de 12% em 2022 para 4,5% ao ano atualmente, com o café 50,4% mais caro nos últimos doze meses, acompanhado de itens como contrafilé (20,6%), gasolina (10,7%) e serviços como o de manicure (10,1%), a sensação que se difunde na sociedade é que Lula não cumpriu a promessa de oferecer picanha barata para o eleitor.

Os integrantes da equipe econômica de Lula podem até argumentar que o aumento de preços foi mais do que compensado pela elevação do rendimento médio real da população. De fato, dados do Dieese mostram que o comprometimento do salário-mínimo com o custo da cesta básica caiu nos dois anos da gestão petista (veja o gráfico). No entanto, como aconteceu nos Estados Unidos, Lula não conseguiu reverter o forte aumento do custo de vida observado desde a pandemia.

Outro aspecto que chama a atenção é que Biden e sua vice, Kamala Harris, mostraram-se inviáveis eleitoralmente mesmo com a economia operando em pleno emprego. E mesmo com o mercado de trabalho superaquecido, com os empresários com dificuldades para contratar mão-de-obra, a direita americana conseguiu convencer parte significativa do eleitorado de que os imigrantes eram causa dos problemas do país.

No Brasil o foco da direita não são imigrantes, mas nos últimos tempos recrudesce o sentimento de que os benefícios sociais, principalmente o Bolsa Família, desestimulam as pessoas a procurarem emprego.

Apesar de hoje termos mais pessoas recebendo o benefício (eram 14,5 milhões de famílias em 2021 e agora são 20,5 milhões) e seu valor médio ter sido turbinado de R$ 190 para R$ 670 mensais, não há evidências, porém, de que essa situação tem afetado o mercado de trabalho. Segundo dados da PNAD Contínua, o número de pessoas fora do mercado de trabalho ficou praticamente estável nos dois últimos anos. Além disso, a quantidade de pessoas desalentadas e que trabalham menos horas do que gostariam está caindo, enquanto o número de empregados cresce em todas as categorias - exceto trabalhadores domésticos com carteira assinada.

O fato de Lula não conseguir capitalizar, em popularidade, os níveis historicamente baixos de desemprego e a principal vitrine de sua gestão ser vilipendiada pelos adversários dão a dimensão do problema que o líder petista enfrenta.

Por fim, é inevitável não fazer um último paralelo com Biden. Caso o presidente decida não concorrer à reeleição, por motivos de saúde ou devido à popularidade baixa, o tempo joga contra. Escolher um sucessor perto demais da eleição, como aconteceu com Kamala Harris, pode ser fatal.

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