segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Reflexão do dia – José Serra

“Não obstante tais obstáculos, a Nova República conseguiu completar com normalidade uma conquista que permaneceu fora do alcance dos regimes do passado. A alternância tranquila no poder de forças político-partidárias antagônicas provocava sempre a polarização e a radicalização da sociedade brasileira. São exemplos os períodos de 1954-1955 e, com consequências mais graves, entre 1961 e 1964. Neste quarto de século, a alternância passou a fazer parte das conquistas adquiridas: já ninguém mais contesta a legitimidade das vitórias eleitorais, do processo democrático e do natural desejo dos adversários vitoriosos de governar sem perturbações.
O resultado é ainda mais impressionante quando se observa que uma dessas alternâncias aparentemente mais contrastantes foi a chegada ao poder do Partido dos Trabalhadores, encarado, a princípio, se não como força desestabilizadora, ao menos de comportamento radical e deliberadamente à margem na política nacional. Basta lembrar, como exemplo, a decisão do PT de punir seus deputados que votaram em Tancredo Neves no Colégio Eleitoral, em 15 de janeiro de 1985, e sua recusa em homologar a Constituição de 1988.”


(José Serra, governador de S. Paulo, no artigo “Vida longa à Nova República”, publicado na revista VEJA)

Mais pressão sobre Serra

DEU NO CORREIO BRAZILIENSE

Lançamento da pré-candidatura da ministra Dilma aumenta a irritação de oposicionistas com a demora do governador paulista para entrar no páreo. Impasse prejudica a formação de palanques regionais do PSDB

Daniela Lima

O PT já tem um nome: Dilma Rousseff. Também tem um líder, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na última semana, aprovou uma proposta de programa de governo que prevê, por exemplo, um estado forte e o compromisso com a estabilidade econômica. Até uma polêmica a campanha da ministra-chefe da Casa Civil já tem: a participação de José Dirceu, antecessor da petista no ministério, líder influente no PT, mas que monopoliza os holofotes devido ao escândalo do mensalão. Enquanto isso, no reino dos tucanos, o governador de São Paulo, José Serra, ainda se esquiva do lançamento oficial de seu nome como pré-candidato à Presidência da República.

A demora — que já irritou o maior aliado do PSDB, o DEM, e as bases do tucanato — agora enerva integrantes da cúpula do partido. “Enquanto a Dilma ocupou lugar de destaque em todos os jornais no fim de semana, nós ficamos assistindo”, diz o senador Álvaro Dias (PSDB-PR). A fala de Dias ilustra o dilema que o PSDB vive. A aparente paralisia de José Serra, deixada um pouco de lado durante o carnaval, provoca inquietude. Aparente porque, nas palavras do presidente da legenda, senador Sérgio Guerra (PE), o governador paulista tem se movimentado nos bastidores.
“Posso listar para você pelo menos 10 estados em que o Serra está atuando para auxiliar na montagem dos palanques.” Citou seis: Paraná, Pará, Alagoas, Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro.

Essa mobilização de bastidor não está satisfazendo alguns tucanos. Há entre os integrantes do partido um sentimento de que, enquanto o PSDB ainda toca a sucessão presidencial em compasso de espera, Dilma cresce nas pesquisas (1)e divulga a candidatura governista. “Todo mundo tem a sua hora. Nós temos uma estratégia e vamos segui-la. Não podemos olhar para o lado, ver o que o adversário está fazendo e tentar copiar. Isso não funciona. Temos de confiar no partido nesse momento”, declarou o líder do PSDB na Câmara, deputado João Almeida (BA).

Turbulência

Entre as unidades da Federação citadas por Sérgio Guerra como alvo da movimentação de Serra, estão aquelas em que um imbróglio político incomoda tanto a petistas quanto a tucanos. No Rio de Janeiro, no Pará e no Paraná, o PSDB tem centrado esforços mais para embaralhar do que ajeitar o jogo eleitoral. A estratégia atrapalha pretensões pessoais que afloram no tucanato. Ainda assim, Guerra garante que a sigla não está em crise. Para reforçar o discurso, ele passou a repetir como um mantra que ter pressa é bobagem. Para o senador, a movimentação de Serra só deve ganhar corpo após o fim do prazo de desincompatibilização, em 4 de abril.

“Depois disso, Dilma terá que deixar o cargo de ministra e descer para a planície onde estão todos os outros pré-candidatos. Não adianta começar agora (a campanha) enquanto ela anda com Lula para cima e para baixo, usando a máquina pública para divulgar a candidatura”, disse Guerra. Mas a demora de Serra em assumir sua posição acaba colocando o partido em situações sensíveis. Essa postura e o crescimento dos índices alcançados por Dilma nas pesquisas de intenção de voto inflam os ânimos daqueles que acreditam na possibilidade de Serra desistir da sucessão presidencial.

“Sempre que ela cresce, as pessoas começam a falar disso. Mas é uma besteira”, rechaçou Guerra. “Ele tem um compromisso partidário e tem um compromisso com a biografia também. Essa possibilidade não existe”, endossou João Almeida. Como que para afastar a crise, Guerra continuará repetindo a cantilena da paciência tucana, a fim de acalmar os ânimos dos aliados. “Eu já estive matriculado no bloco dos afoitos. Depois, me convenci do contrário. Mesmo que ele (Serra) se apresente como candidato, não poderá barrar o caminho da outra (Dilma)”, afirmou João Almeida. “Por enquanto, estamos no ‘deixa como está para ver como é que fica’. Mas isso depois pode se tornar irreversível”, alertou o senador Álvaro Dias.

Disputa acirrada

Divulgada no último dia 18, a mais recente pesquisa Ibope sobre a corrida presidencial trouxe o governador José Serra (PSDB) na liderança, com 36% das intenções de voto, seguido da ministra Dilma Rousseff (PT), com 25%, e de Ciro Gomes (PSB), com 11%. A primeira sondagem realizada pelo instituto sobre a sucessão, em julho do ano passado, trazia Serra com 38% da preferência do eleitorado, e a candidata do presidente Lula com 18%. Em oito meses, Dilma cresceu sete pontos percentuais, e Serra perdeu dois.

"Eu já estive matriculado no bloco dos afoitos. Depois, me convenci do contrário. Mesmo que Serra se apresente como candidato, não poderá barrar o caminho da outra”

João Almeida, líder do PSDB na Câmara

Indefinição nos estados

O PSDB espera que, a partir de abril, a campanha da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), à Presidência perca velocidade. Para a cúpula do partido, sem a possibilidade de percorrer o país inaugurando obras ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a petista ficará em igualdade de condições com os outros pré-candidatos. “A Dilma começou a fazer campanha há mais de um ano. Essa declaração oficial da pré-candidatura é uma mera formalidade. O PSDB não está fazendo esse jogo. Está seguindo a lei e sendo ético, mas sofre um prejuízo por isso”, disse o senador Álvaro Dias (PSDB-PR).

Dias representa a ala dos que têm pressa, porque têm pretensões eleitorais em seu estado. Quer ser candidato ao governo e critica a posição de seu partido. Segundo ele, líderes locais começaram a agir por conta própria diante da falta de direcionamento do comando nacional da legenda. “Em alguns estados, estão agindo de forma provinciana, sem pensar no projeto maior, que é a candidatura do Serra. Evidente que, se candidato, ele assume a liderança desse processo e toma frente nas negociações.”

No Paraná, o prefeito de Curitiba, Beto Richa, disputa com Dias a preferência do partido pela candidatura ao governo. Richa aparece melhor nas pesquisas de intenção de voto, mas Dias alega ser capaz de agregar mais apoio. Isso porque o senador Osmar Dias (PDT-PR), irmão de Álvaro, está na lista de concorrentes ao Executivo paranaense. “A minha candidatura contaria com o apoio do Osmar e de parte do PMDB”, declara Álvaro Dias.

Xadrez

Osmar Dias aparece em segundo lugar nas intenções de voto. Quer que Gleisi Hoffmann, presidente do PT no Paraná, esteja ao seu lado na campanha, como vice da chapa. Para o Senado, teria a companhia do governador Roberto Requião (PMDB). Os petistas, no entanto, sonham com Gleisi no Senado, não como vice de Osmar Dias. Os outros dois estados da Região Sul também estão com o jogo indefinido. No Rio Grande do Sul, o ex-ministro da Justiça Tarso Genro, do PT, enfrentará o prefeito de Porto Alegre, José Fogaça (PMDB). Ambas as siglas integram a base aliada governista. Segundo Tarso, Dilma terá dois palanques no estado.

“O PMDB sempre foi contra o PT no Rio Grande do Sul. Ela terá dois palanques, e não vejo problemas nisso”, defendeu o ex-ministro no último sábado. Fustigada por uma crise política e por denúncias de corrupção, a governadora gaúcha, Yeda Crusius, é pressionada, mas resiste a desistir da tentativa de reeleição. Em Santa Catarina, a senadora Ideli Salvatti (PT) e a deputada Ângela Amin (PP) devem disputar o governo. Os tucanos aguardam os desdobramentos da crise que se abateu sobre o vice-governador catarinense, Leonel Pavam (PSDB), para fechar uma estratégia. O DEM, partido aliado do PSDB, também tem um nome: o senador Raimundo Colombo. (DL)

Serra quer votar ''pacote'' antes de sair

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Prioridades incluem criação de 1,6 mil cargos, reforço do sistema previdenciário e melhorias para Olimpíada

Silvia Amorim

O governador José Serra (PSDB) definiu com a sua liderança no Legislativo os projetos de lei que quer ver aprovados antes de deixar o governo caso dispute a Presidência. São seis propostas que, em resumo, preveem criação de cargos, reforma no sistema previdenciário, regras para organização dos jogos olímpicos de 2016, troca do nome da Polícia Militar e reajuste do salário mínimo paulista.

Todos os textos são de iniciativa do Executivo. Os dois últimos chegaram à Assembleia Legislativa neste ano. Os demais estão lá desde 2009. Segundo o líder do governo, Vaz de Lima (PSDB), os projetos começam a ser preparados para votação a partir desta semana. "A previsão é de que sejam aprovados até o fim de março", reforçou o presidente da Casa, Barros Munhoz (PSDB). Ou seja, antes de Serra deixar o governo - prazo final é 2 de abril.

Neste início de ano eleitoral, a base governista pretende aprovar a criação de 1.618 cargos públicos. As vagas são para órgãos da administração indireta, Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp), Instituto de Pesos e Medidas (Ipem) e Instituto de Pagamentos Especiais de São Paulo (Ipesp).

A maioria dos novos postos é de provimento efetivo, ou seja, só pode ser preenchida por concurso público. Os cargos de confiança são apenas 107. Por conta das restrições em ano de eleição, o governo prevê a contratação desse contingente somente em 2010. Os projetos não trazem estimativa de gastos com o reforço de pessoal.

Mais da metade (66%) dos cargos propostos é para o Ipem, uma espécie de Inmetro estadual. Isso é mais do que o atual quadro de pessoal da autarquia, cerca de 700. Segundo o instituto, essas vagas serão preenchidas aos poucos. O governador pediu este mês que a proposta tramite em regime de urgência.

No projeto que trata do Ipesp, além de criar um quadro de pessoal, o governo também declara em regime de extinção a carteira previdenciária dos serventuários do Estado, a exemplo do que fez no ano passado com a carteira dos advogados administrada pelo Ipesp. É mais um passo para ajustar a previdência paulista à nova legislação federal.

SEGURANÇA

O projeto relacionado à realização dos jogos olímpicos de 2016 deve ser o primeiro a ser votado.

A previsão é do líder Vaz de Lima. "Após o carnaval, deverá ser um dos primeiros a ser deliberado. Já está bem adiantado", disse.

A proposta estabelece normas para o organização do evento. Prevê reforço da segurança pública nos locais com grande movimentação de turistas e melhoria no transito de pessoas e veículos, entre outros. Mas o ponto mais polêmico é o que suspende a concessão da meia-entrada nos eventos olímpicos. O anúncio da medida, diz o projeto, deve ser feito a 180 dias da realização do evento.

"Vamos colocar os projetos que a gente julga ser possível uma discussão mais rápida. Há outros à espera de votação, mas que devem demandar mais discussão, então deixaremos para outro momento", explicou Vaz de Lima.

O líder não acredita que encontrará resistência para aprovar a criação de cargos em ano eleitoral. "São cargos de provimento efetivo. Não tem porque ter problema." A oposição ainda não se manifestou sobre as propostas.

PAUTA DE VOTAÇÃO

PLC 45/2009 - Chegou ao Legislativo em outubro passado e propõe a criação de 1.062 cargos efetivos e 15 de confiança no Ipem

PLC 35/2009 - Foi enviado aos deputados também em outubro e cria 449 cargos efetivos e 59 de confiança na Artesp

PL 1.322/2009 - Começou a tramitar em dezembro e institui regime de extinção para a carteira de previdência dos funcionários de cartórios extrajudiciais e cria 33 cargos de confiança para o Ipesp

PL 306/2009 - Chegou ao Legislativo em maio e estabelece normas para a realização dos jogos olímpicos de 2016

PEC 1/2010- Foi enviada em fevereiro à Casa e propõe a mudança do nome da Polícia Militar

PL 135/2010 - Encaminhado em fevereiro, projeto reajusta o valor do salário mínimo paulista

Para oposição, fala de Dilma sugere governo autoritário

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

DEM e PSDB atacam discurso de lançamento da pré-candidata e apontam omissões e falta de clareza

Rosa Costa e Denise Madueño

O PSDB e o DEM, principais adversários do PT na disputa pela Presidência, criticaram ontem o discurso feito pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, no dia anterior, no lançamento de sua pré-candidatura. O Estado forte, defendido por ela no 4º Congresso do PT, foi considerado sinônimo de governo autoritário e as referências às privatizações, como tentativa de repetir "clichê" usado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A oposição criticou não apenas o que foi dito pela ministra, mas também o que considerou como omissões. O presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), afirmou que a pré-candidata deixou em suspense a posição dela e do PT quanto ao direcionamento da economia. "Não há nada claro, nem no que a ministra disse, nem nos documentos do partido", disse.

O tucano acusou ainda Dilma e o PT de ignorarem a questão dos marcos regulatórios e das agências reguladoras. "As agências estão contaminadas pela influência política, por pressões de grupos econômicos, e não têm condições de defender o interesse da população e de balizar o interesse público e o da iniciativa privada", apontou.

Guerra relacionou o "Estado forte" defendido por Dilma a um discurso ideológico aliado "à sua notória capacidade de desenvolver ações autoritárias".

Na mesma linha de discussão sobre a participação do Estado, o presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), considerou que a pré-candidata do PT reproduz o que o presidente fez em campanhas anteriores. "Ela repete o clichê de tentar colar na oposição a pecha de que íamos privatizar a qualquer preço. Isso não é verdade", disse Maia. "O discurso de Estado forte cabe em qualquer linha política e não significa governo estatizante, como prega a ministra Dilma. Nós queremos um Estado que cumpra o seu papel, que tenha força na regulação e na fiscalização do setor privado", argumentou.

No mesmo tom do aliado, Guerra criticou o modelo adotado pelo governo Lula, classificando-o de sem objetividade nem racionalidade. "Nenhum de nós quer um Estado fraco, mas o que faz um Estado verdadeiramente forte é a capacidade de intervir, colaborar, construir, não o autoritarismo", alegou. "O fundamento básico de um Estado equilibrado é a organização, o planejamento e o respeito a atribuições legais."

O presidente do PSDB resumiu o congresso petista como "um aceno aos movimentos sociais" sem "estabelecer compromissos". Já Dilma, continuou ele, "reafirmou velhas teses numa perspectiva conciliadora".

"JURÁSSICO"

O deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP) afirmou que o discurso da ministra mostrou quem é Dilma. "Ela defende a estatização e tem total aversão da participação da iniciativa privada no processo necessário para o País crescer".

Para o senador Demóstenes Torres (DEM-GO), futuramente ficará claro que a intenção da ministra foi a de agradar aos radicais do PT. "Embora ela seja cristã nova no partido, seu discurso foi jurássico, incapaz de se adequar à possibilidade de o Brasil crescer nos próximos 15 anos."

Oposição classifica de "mentirosa" fala de Dilma para petistas

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Líderes oposicionistas reagem a trecho sugerindo que FHC só não privatizou Petrobras e Caixa por que não conseguiu

Arthur Virgílio, líder dos tucanos no Senado, afirma que o governo anterior não cogitou privatizar empresas citadas pela pré-candidata

Da Sucursal de Brasília

Líderes do PSDB e do DEM classificaram de "mentiroso" trecho do discurso da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) no lançamento de sua pré-candidatura a presidente, anteontem em Brasília.

Ao defender uma participação forte do Estado na economia, ela deu a entender que o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso só não privatizou Petrobras, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal por que não conseguiu. "Aqui, o desastre [econômico] só não foi maior, como em outros país, porque os brasileiros resistiram a esse desmonte", afirmou ela.

O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), disse que em nenhum momento o governo FHC cogitou privatizar essas empresas.

"O que ela revela com isso é a cabeça de alguém que não teria privatizado a Telebrás se fosse presidenta, e nós ainda estaríamos colocando linha de telefone no IR", afirmou.

"Como boa aluna do mestre Lula, ela usa a mentira como arma essencial para a busca de popularidade. Ignorar os efeitos anteriores é desonestidade intelectual", disse o senador Álvaro Dias (PSDB-PR).

Para, o senador José Agripino (DEM-RN), Dilma confunde um Estado que promova o bem-estar social com o Estado empreendedor.

"O que ela está querendo é passar para a sociedade que o Estado forte é saída para o país fazer a distribuição de renda. Para isso, o Estado não precisa ser empregador", disse, em referência ao crescimento de cargos públicos criados pelo governo federal.

O presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), afirmou que o seu partido, desde 2004, reconhece a importância da atuação do Estado "na saúde, educação e segurança e na fiscalização e regulação da economia". "O que não acontece agora, em que o governo desmonta o papel das agências reguladoras", completou.

Outro ponto atacado pelos oposicionistas foi a troca de uma palavra no discurso da ministra. No texto original estava escrito "reconstituindo o Estado", mas ela disse "reaparelhando o Estado".

Para Arthur Virgílio, foi um ato falho, que revela a preocupação do PT em inchar ainda mais a máquina pública. "Eu tenho que agradecer esse alerta do seu subconsciente. Eu espero que ela nem reconstrua o Estado velho nem aparelhe mais do que [o governo Lula] está aparelhando. Se não vão ter que aparelhar até as crianças", afirmou o tucano.

O deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) também não poupou críticas ao discurso da petista.

"A Dilma vai derrotar o lulismo no Brasil. O povo brasileiro não admite essa tese do Estado fiscalizante, intervencionista, autoritário. O presidente Lula, vendo que não tinha espaço para aplicar essas teses, absorveu o ideia do modelo de mercado", disse.

Teresa Cristina - Doce Amor/Se Tu Fores na Portela/Portela

Mensalão, raça, catarse:: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - A expressão é um tabu. Com raríssimas exceções, ninguém ousa chamar a coisa pelo nome. Mas a verdade é que o "mensalão" esteve muito presente na cabeça e nas intervenções públicas dos petistas durante o 4º congresso nacional do partido.

Este foi, num certo sentido, o congresso da desforra. O petismo se valeu da popularidade do governo e da força política de Lula para propagar a versão dos vitoriosos -no caso, eles próprios- de que tudo não passou de golpismo frustrado.

Novo presidente do PT, José Eduardo Dutra fez seu discurso inflamado, aos berros, usando como referência a profecia infeliz feita no auge do escândalo por Jorge Bornhausen -"estaremos livres dessa raça pelos próximos 30 anos".

"Não conseguiram acabar com nossa raça" por causa disso, "não conseguiram acabar com nossa raça" por causa daquilo, urrava Dutra, lembrando um pastor em transe diante do auditório de fiéis. Depois dele veio Lula, irônico, soberano: "Nos chamavam de raça. E aqueles que queriam acabar com o PT estão quase acabando". Os delegados petistas vão à loucura ao ver seu líder transformar a corrupção em invenção da "elite" decrépita.

Se a frase de Bornhausen revela a alma profunda e autoritária do PFL, a resposta, irônica ou raivosa, expõe as vísceras do petismo. O partido faz a sua catarse e expia a sua culpa, mas deixa o mal-estar recalcado porque não é capaz de assumir sua vergonha.

Maria da Conceição Tavares comentava sobre sua tristeza de ver uma liderança política com as qualidades de José Genoino diminuída por um processo no qual entrou de gaiato. De fato, o deputado parece ainda estar preso a um luto que o partido na realidade nunca viveu.

O mensalão não está mais entalado na garganta dos petistas. Mas ele segue como ferida aberta, ou um cachorro morto na beira da estrada, do qual a gente logo desvia o olhar para não sentir engulhos ou vontade de chorar.

Sina de formiga:: Ricardo Noblat

DEU EM O GLOBO

"Dizer que Dilma Rousseff está à esquerda de Lula é uma grande besteira". (Paulo Bernardo, ministro do Planejamento.)

Era um inferno. Sempre que passava por ali, o elefante esmagava a entrada do formigueiro. Então, as formigas decidiram reagir. Um dia, aos milhares, saltaram sobre o elefante e começaram a picá-lo. Com um abanão das orelhas, o elefante livrou-se delas. Restou uma agarrada ao seu pescoço. “Esgana o bicho, esgana”, gritavam as outras em coro.

O elefante da história está mais para Lula, aprovado por oito entre 10 brasileiros, assim como as formigas estão mais para a oposição – PSDB, PPS, DEM em fase terminal e uma fatia do PMDB. Quem será a formiga que insiste inutilmente em esganar o elefante? Arthur Virgílio, líder do PSDB no Senado?

Ora, Arthur anda sumido desde que perdeu a batalha pelo afastamento de José Sarney da presidência do Senado. Há duas semanas, voou para um café da manhã com Barack Obama, em Washington. Imaginava trocar ideias com ele. Havia dois mil convidados. O Amazonas de Arthur é fortaleza do lulismo. Ele pretende se reeleger. Sabe como é...

A formiguinha suicida seria José Agripino Maia, líder do DEM no Senado? Agripino anda muito ocupado com o escândalo que engoliu o único governador do seu partido, José Roberto Arruda, do Distrito Federal, preso numa cela da Polícia Federal, em Brasília. O escândalo ainda ameaça engolir o vice Paulo Octávio, do DEM.

E Sérgio Guerra, presidente nacional do PSDB? Poupemos Guerra. O coração dele bate acelerado diante da demora do governador José Serra, de São Paulo, em se declarar candidato à vaga de Lula. E bate aflito diante do risco do próprio Guerra não se reeleger senador por Pernambuco. É uma carga dupla e bastante pesada.

De Aécio Neves, outra estrela do infausto formigueiro, diga-se que jamais aprovaria o plano de um ataque em massa ao elefante. Se dependesse dele, o formigueiro simplesmente teria mudado de endereço para escapar de eventuais danos. Como não o levaram em conta, mergulhou terra a dentro e foi cuidar de sua vida.

Tudo deu certo para Lula desde que se elegeu presidente em 2002. Seu governo sobreviveu ao explosivo escândalo do mensalão. A economia cresceu. Milhões de brasileiros ascenderam à classe C. A maioria dos partidos se rendeu aos seus encantos. E o PT à candidata que ele sacou do bolso.

Dizem que a próxima será a primeira eleição em 21 anos onde os brasileiros estarão impedidos de votar em Lula. De fato, é verdade. Mas na prática, não. Dilma só existe como candidata porque Lula a inventou. Nada mais direto, pois, do que o apelo que orientará sua campanha: votar em Dilma significa votar em Lula.

Caberá à oposição separar os dois – fácil, não? A ela caberá também a difícil tarefa de vender Serra como o melhor candidato pós-Lula. Melhor até mesmo do que Dilma, a quem Lula escolheu. E logo quem? E logo Serra que concorreu contra Lula em 2002. Se Serra tivesse vencido não haveria Lula presidente por duas vezes. Oh, céus!

O ex-metalúrgico que chegou ao lugar antes privativo dos verdadeiros donos do poder deixou de pertencer à categoria dos homens comuns – embora daí extraia sua força. Foi promovido nos últimos oito anos à condição de mito. E como tal deverá ser encarado pelas futuras gerações. É improvável que alguém como ele reprise sua trajetória.

A oposição se propõe a derrotar um mito. E tentará fazê-lo sem reunir sua força máxima. Serra está pronto para conversar com Aécio sobre a vaga de vice em sua chapa. Quanto a isso, há duas coisas mais ou menos certas. Serra oferecerá a vaga a Aécio. E Aécio a recusará.

Descarte-se a hipótese de Serra sugerir: “Bem, nesse caso, você sai para presidente com meu apoio e eu irei disputar um novo mandato de governador”. Aécio tem a resposta na ponta da língua: “Agora é tarde. Quis ser candidato. Sugeri a realização de prévias dentro do partido. Não fui ouvido. Serei candidato ao Senado”.

E aí, José? Aí José só vencerá a eleição se Dilma acabar perdendo para ela mesma.

A política e a rolha de Dawkins:: Fábio Wanderley Reis

DEU NO VALOR ECONÔMICO

No belíssimo livro publicado ano passado em tradução brasileira sob o título de "A Grande História da Evolução", Richard Dawkins, lidando lá pelas tantas com a contraposição, no processo evolucionário, entre movimentos de prazo comparativamente curto e tendências de mais longo prazo, recorre à imagem de uma rolha flutuando pela costa atlântica dos Estados Unidos. A ideia destacada é a de que, num minuto qualquer, haverá oscilações no movimento da rolha produzidas pelo jogo das ondas e contracorrentes, mas a Corrente do Golfo impõe uma deriva geral para o leste, e ela acabará sendo empurrada para alguma costa europeia.

Naturalmente, o problema que preocupa a Dawkins é um problema de ciência e de conhecimento adequado, que os dois tipos de movimento dificultam. Na área humana e social, a política incluída, o mesmo problema costuma surgir em termos do contraste entre a apreensão do "estrutural" e das tendências que lhe correspondem, por um lado, e das flutuações da "conjuntura", por outro. E as confusões são grandes. Assim, há os leninianos das "análises concretas de situações concretas", atribuindo status metodológico especial ao estudo da conjuntura e desatentos para o fato de que não é possível fazer sentido dela a menos que se recupere a "lógica do processo" que a engendra, o que nos leva à análise teórica, ou teoricamente orientada, das "situações concretas". E encontramos, às vezes, o equívoco oposto, em certo sentido, de restringir a possibilidade de conhecimento aos aspectos que de alguma forma se estabilizam e escapam ao dinamismo das mudanças: não seria possível teorizar sobre mudanças, apreendendo justamente as regularidades e tendências (a lógica) da mudança como tal.

Mas há, no campo humano, e em particular no especificamente político, outro aspecto de grande importância: o de que o problema intelectual de entender a complexidade de um processo dinâmico e a articulação de seus momentos diversos se liga com o problema da ação e de sua motivação, ou da multiplicidade de interesses e objetivos em jogo em qualquer momento dado e da possibilidade de eventualmente agregá-los em projetos coletivos de alguma amplitude ou abrangência. Em termos da analogia de Dawkins, a questão seria aqui a de apreender a conexão dos movimentos conjunturais com a "Corrente do Golfo" subjacente, como condição de que os projetos tenham sua viabilidade assegurada pela correção do diagnóstico das tendências. Mas, tratando-se de ação, tem de haver espaço para a consideração do fato de que as tendências podem ser ruins do ponto de vista dos interesses, quem sabe dos valores, e da necessidade eventual de agir contra elas, ainda que o êxito dessa ação seja ele próprio condicionado pelo entendimento tão lúcido quanto possível do processo geral.

Cabe um par de reservas. Por um lado, há as dificuldades ligadas à ideia de qualquer "projeto" coletivo de maior amplitude (projeto "nacional"?), que supõe não apenas o compartilhamento de traços culturais ou de identidade, mas na verdade a existência, sob a diversidade de interesses, de uma vontade comum e convergente em torno de objetivos de grande alcance - e há os perigos autoritários da problemática pretensão de uma elite real ou suposta de apreender e dar expressão a essa vontade. Por outro lado, isso se desdobra nas dificuldades acarretadas para o aspecto de diagnóstico intelectual do processo geral e das condições da ação: se tínhamos até há pouco, à esquerda, o vigor com que se brandia a ideia do determinismo histórico (a "Corrente do Golfo") a conduzir "automaticamente" ao socialismo, vimos em seguida a afirmação do neoliberalismo associada com a visão em que a afirmação irrestrita do mercado e o empobrecimento de um ideal ambicioso e socialdemocrático de cidadania seriam imposições inelutáveis de uma "Corrente do Golfo" de rumo novo, as "tendências objetivas" da realidade econômico-tecnológica dos dias atuais - até que as crises várias acabassem por empolgar o centro mesmo do sistema mundial, trazendo o que ameaçava (ameaça?) tornar-se a mãe de todas as crises. Em síntese: a lucidez no diagnóstico das tendências tende a ser comprometida por ideologias, em que a apreciação dos fatos é fortemente contaminada por interesses estreitos e de conexão problemática com um interesse abrangente ou "nacional".

Se se trata de governar países (que dizer de alguma forma efetiva de governo mundial, cuja necessidade a crise sugere com força...), tudo isso indica, naturalmente, grandes dificuldades. É talvez revelador que um Barack Obama, intelectualmente tão sofisticado e correspondendo com tanta nitidez a avanços democráticos profundos da sociedade estadunidense, se veja embaraçado e confundido nos vaivéns e contracorrentes da conjuntura. Quanto ao Brasil, além de também revelador, é talvez mesmo afortunado o fato de que, numa disputa como a que se esboça em torno da eleição presidencial de 2010, o tema central acabe sendo um pouco mais de Estado para cá, um pouco menos de Estado para lá - regulador, indutor, talvez ocasionalmente até executor. De todo modo, modernamente se vai tornando cada vez mais claro algo que provavelmente é certo a respeito da história política universal: que a "Corrente do Golfo" correspondeu sempre, de fato, aos embates em torno da democracia e seus avanços e recuos no plano político-institucional, em correspondência com o substrato do caráter mais ou menos democrático da sociedade como tal.

Fábio Wanderley Reis é cientista político e professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais. Escreve às segundas-feiras

Eleitores sem memória, política sem partidos :: Gláucio Ary Dillon Soares

DEU EM O GLOBO

A mídia descobriu, pela enésima vez, a “amnésia eleitoral”.

O Instituto Data Rio divulgou dados que mostram que somente 4% dos votantes sabiam em quem votaram para deputado federal e, em igual percentagem, para deputado estadual. Embora exista uma clara correlação entre nível educacional e lembrança, um comentarista dos dados, Pedro Fernandes, nos lembra de que 53% dos que possuem educação superior não se lembravam em quem votaram — segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas. Fernandes lembra a responsabilidade dos políticos, que contribuiriam para o esquecimento.

Sem dúvida; porém, outros fatores pesam. A experiência dos estudos policiais e criminológicos mostra que, nos alinhamentos para identificação de testemunhas, o número de pessoas colocadas no alinhamento influencia o resultado.

O número conta: quanto maior, mais erros. Experimentos desse tipo minaram a fé na prova testemunhal. Fica pior: brancos identificando negros erram mais do que brancos identificando brancos, provando que há um aspecto relacional que afeta a qualidade do testemunho. A identificação funciona melhor entre semelhantes.

O esquecimento eleitoral não opera num vácuo de instituições. As instituições e as legislações eleitoral e partidárias podem facilitar ou dificultar o esquecimento.

No Brasil, facilitam.

A “amnésia eleitoral” não começa depois das eleições: começa antes. Há dois anos, Jairo Nicolau (Iuperj) alertava para pesquisas feitas pelo Ibope e pelo Datafolha, em grandes capitais, próxima das eleições: “o percentual de eleitores que disseram não saber em quem votar na pergunta espontânea, em algumas das capitais... é muito alto, oscilando entre cerca de 30% e 80%.” Os dados permitiam concluir que o problema era nacional e não do nosso Rio. Com 66%, estávamos próximos do Recife (58%); de Porto Alegre (61%) e abaixo de Belo Horizonte (79%). Não sabiam em quem votariam, deixando ver que não havia uma relação forte com candidato ou com partido.

O sistema eleitoral se impõe como variável invisível, mas de muito peso, sobre a memória do votante. O sistema partidário também pesa sobre os resultados.

Além da amnésia individual, há uma amnésia partidária.

A permanência dos políticos num só partido favorece a identificação, por parte da população. Porém, os políticos mudam muito de partido. Como exemplo, o ex-governador Garotinho, se bem me lembro, já esteve no PDT, no PT, no PSB, PMDB e atualmente milita no PR. A pouca significação dos partidos não é um fenômeno obrigatório, da natureza, mas consequência da pouca significação atribuída a eles por parte significativa dos políticos.

O alto número de partidos e de candidatos por vaga conspira contra o voto responsável e contra a memória. Ari Ferreira de Queiroz, em interessante artigo, comenta que, em Goiânia, em 2004, concorreram às eleições para vereador nada menos do que 27 partidos, coligados ou não. É o esfarelamento partidário. Desses, 13 não elegeram ninguém. Quantos desses 27 comandam uma parcela significativa das identificações e preferências do eleitorado? Não são partidos políticos; são legendas de aluguel. Havia vinte candidatos para cada vaga de vereador, mas somente quatro candidatos a prefeito. Fica pior: o artigo 10 da Lei das Eleições estabelece que cada partido pode registrar até 150% do número de cadeiras disponíveis na Câmara Municipal. É uma aberração aritmética que permite a um hipotético partido receber todos os votos e deixar de eleger um terço dos candidatos que apresentou.

No segundo turno das eleições majoritárias há somente dois candidatos e a memória é superior.

O olhar institucional não termina aí: ainda é fácil trocar de partido. Nosso sistema pensou os mandatos como propriedade do eleito e não do partido que o elegeu. Houve mudança legislativa para reduzir a migração que, eleição trás eleição, se observa na direção do Executivo. Porém, acordos internos esvaziaram essa legislação benéfica.

Esses acordos anulam a oposição, enfraquecem o Legislativo, e fortalecem o Executivo.

Fica ainda pior: mesmo sem migrar de partido, os votos e o apoio dentro da Casa migram na direção do Executivo e os partidos dispõem de poucos instrumentos para manter um mínimo de fidelidade partidária. Essa prática também enfraquece o Legislativo.

Podemos ir além: nossas leis e cultura política concedem supremacia ao Executivo, tornando o Legislativo pouco relevante. No Brasil, o Executivo pode legislar diretamente, através de medidas provisórias, ou propor legislação que raramente é rejeitada. O contraste é grande, por exemplo, com os Estados Unidos, que levam o equilíbrio entre os poderes a sério. O Executivo não pode apresentar projetos de lei diretamente; só pode fazê-lo através de seus legisladores.

Comparativamente, os legisladores brasileiros quase não legislam.

Assim, olhar para a amnésia eleitoral como um problema do eleitor ou mesmo da pobre ou inexistente relação entre o eleitor e o eleito, conduz à condenação dos dois. É injusto, porque a amnésia varia com a legislação e as instituições políticas, eleitorais e partidárias.

Não podemos julgar e apedrejar eleitores se o sistema dificulta a identificação partidária e reduz o Legislativo à condição de coadjuvante político.

Tem jeito! Mas o jeito passa pela reforma política.

Nada de novo no front petista :: Lucia Hippolito

DEU NO BLOG DA LUCIA HIPPOLITO

A grande novidade no Congresso do PT que marca os 30 anos de fundação do partido é que... não houve novidades.

Esperava-se que a militância comparecesse, animada. Pois compareceu, e em grande animação.

Sabia-se que, como sempre, a primeira-dama Marisa Letícia iria vestida de vermelho. Pois lá estava ela, ao lado do presidente Lula, também de camisa vermelha e de DIlma Rousseff, igualmente de vermelho.

Temia-se que o presidente Lula roubasse a festa, ofuscando a candidata que deveria ser aclamada. Pois Lula roubou a festa, discursando de improviso (é quando ele é melhor), levantando a massa. Empurrando a candidatura de Dilma.

Esperava-se que José Dirceu circulasse com desenvoltura pelo Congresso, nem de longe deixando transparecer sua condição de deputado cassado por corrupção e réu no STF como chefe da quadrilha do mensalão.

Pois foi o que aconteceu. O comissário circulou livre, leve e solto, se achando. Foi o mais aplaudido depois de Lula. Tudo dentro do script.

Temia-se que a candidata Dilma fizesse um discurso longo, maçante e enfadonho, que não despertaria o entusiasmo da militância petista.

Pois Dilma fez um discurso longo, maçante e enfadonho. Não levantou a militância, segundo relato de petistas de alto coturno ali presentes.

Temia-se que Dilma cometesse alguma gafe, do tipo confundir nomes de cidades, como fez em Minas.

Não chegou a tanto, mas disse que "vamos continuar reaparelhando o Estado", em vez de "reconstruindo", como estava no discurso escrito para ela. Ato falho? Pode ser.

Esperava-se que alguns peemedebistas comparecessem, como a lembrar ao PT que, se quiser a aliança, o casamento tem que ser às claras, à vista de todos.

Pois lá estavam eles, liderados pelo deputado e candidato a vice Michel Temer, com ar ligeiramente perdido, feito cachorro que caiu do caminhão de mudança.

E assim se passou o Congresso do PT.

Novidade, novidade mesmo, só aquele casaco de lã boliviana que o presidente Lula usava por cima da camisa vermelha.

Convenhamos que, com aquele calor infernal, a gente transpirava só de olhar.

Petistas da Saúde temem confronto entre Dilma e Serra

DEU NO ESTADAO.COM.BR

Estadao.com.br acompanhou reunião que teve partipação do ex-ministro Humberto Costa

Grupo mostrou preocupação pela fragilidade com que Dilma discute a Saúde

Rodrigo Alvares

BRASÍLIA - A portas fechadas, longe dos holofotes e do discurso eleitoral, os petistas que tratam dos problemas da Saúde temem o confronto entre a candidata Dilma Rousseff e o tucano José Serra, governador de São Paulo. Menos de uma hora depois de o 4º Congresso Nacional do PT aprovar o projeto de governo para a candidata à Presidência, na última sexta-feira, 19, a reportagem do estadao.com.br flagrou uma reunião em que um grupo de petistas revelou temor pela fragilidade com que Dilma discute a Saúde e pela "vulnerabilidade" como estão entrando no debate eleitoral. O programa aprovado, afirmaram, "não vale quase nada".

Reunidos numa sala do segundo andar do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília, membros do grupo setorial de Saúde do partido queixaram-se da gestão da área no governo Lula e fizeram uma série de comentários críticos à ministra-chefe da Casa Civil. "Quem é a Dilma para nós, do ponto de vista da militância? Não podemos entrar na campanha vulneráveis como a gente está na Saúde", questionou uma das militantes.

Participaram do encontro - que foi gravado pela reportagem -, o ex-ministro da Saúde Humberto Costa (PE), o secretário de Gestão Estratégica e Participava da atual equipe do ministério, Antônio Alves de Souza, e dirigentes de todo o País.

Uma dirigente disse que ficou espantada com a falta de habilidade da pré-candidata durante um debate: "Ela entrou recuada para discutir política social na saúde. Foi um horror. Se o nosso presidente era muito verde quando entrou (para o Planalto), imagina a Dilma! Ela vai ser questionada e vai ter de falar sobre o assunto a partir de abril", acrescentou um dos participantes do encontro de sexta-feira.

"Precisamos nos organizar para influenciar nesse processo. Temos de ganhar a nossa candidata, que não tem o que o nosso presidente tem", afirmou Humberto Costa, que dirigiu a pasta da Saúde entre 2003 e 2005, na primeiro mandato do governo Lula. Parte da preocupação dos petistas deve-se a três fatos: a falta de intimidade da candidata com o setor, o fato de José Serra ter sido ministro da Saúde entre 1998-2002, e porque até hoje a gestão do tucano é uma das mais bem avaliadas.

A capacidade administrativa da ministra na área foi muito questionada durante o encontro. "O José Temporão (ministro da Saúde) já ficou quatro horas conversando sobre saúde com a Dilma", disse um dos participantes. Nem o plano de governo foi poupado: "Acho que não preciso dizer para todo mundo aqui que isso que aprovaram há pouco não vale nada. Esse programa só vai ficar pronto mesmo lá por agosto. Esse encontro é para agradar a militância", avaliou outro dos participantes da reunião.

A distância entre o ministério e o partido é outro motivo de preocupação: "Precisamos marcar encontro com ela e com Lula. O presidente vai sair com essa dívida conosco? Como vamos fazer a discussão do setor da saúde com quem não é do PT se não reconhecemos nossos méritos?". "É essa discussão que temos de fazer, porque o Lula tá pouco se lixando para a gente (petistas)", disse uma filiada. "Acho que a Dilma não representa, nem de perto, o governo Lula."

Para o grupo, o PT não pode entrar na campanha vulnerável como está na Saúde. "É contraditório. Vamos ter de apresentar à população que esses oito anos não significam o que a gente quer de saúde para o Brasil". O histórico de Serra à frente da pasta também foi mencionado. "Serra tem discurso real, (diz) que foi o responsável pela aprovação da Emenda 29 e que não conseguimos regulamentar. Todo mundo acha que ele é o papa da Saúde e tem companheiros que até concordam com isso. Bobagem. Fizemos muito mais, não dá para comparar".

Alguns admitiram que o governo deveria ter aceitado a participação das Organizações Sociais (OS) na gestão de hospitais - o PT costuma dizer que isso é "terceirizar a Saúde". "Eu não quero uma UPA na minha cidade. De que adianta se não consigo pagar os médicos?", disse um secretário. As UPAs, Unidades de Pronto Atendimento, são uma forma de o governo do Rio agilizar o atendimento nas comunidades carentes, longe dos grandes centros hospitalares.

O Fundo de Participação dos Municípios (FPM) também foi criticado: "Essa história de a receita que vem do governo ser a mesma para todos é uma furada. Tem uma cidade ao lado da minha que tem ambulância, estrutura. Eu não tenho dinheiro para nada e ainda vejo prefeito desviando a verba."

Questionado sobre a insatisfação em relação à falta de propostas específicas do programa e condução do assunto pelo partido, o novo presidente do PT, José Eduardo Dutra, negou problemas. "Isso não procede. É comum que alguns termos não sejam especificados e fiquem de fora. Tivemos reclamações de todos os setoriais".

O QUE PENSA A MÍDIA

EDITORIAIS DOS PRINCIPAIS JORNAIS DO BRASIL
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Gasto de Lula com cargos de confiança cresceu 119%

DEU EM O GLOBO

O governo Lula aumentou em 119% as despesas com as funções gratificadas, que não precisam de concurso público para serem preenchidas. De 2002 a 2009, esse gasto passou de R$ 555 milhões para R$ 1,2 bilhão. Nesses sete anos, cresceu 35% o número de pessoas que ocupam cargos de confiança e não têm vínculo com o governo, o que possibilita as indicações políticas.

Excesso de confiança

Gastos do governo com funções gratificadas crescem 119% e chegam a R$ 1,2 bi

Gustavo Paul e Cristiane Jungblut

BRASÍLIA - Além de inchar a máquina com mais funcionários públicos, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva também inflou o número de cargos de confiança e está gastando mais com essas nomeações sem concurso — grande parte fruto de indicações políticas. Dados recentes do Ministério do Planejamento apontam que, entre 2002 e 2009, o número de cargos de Direção e Assessoramento Superior (DAS) aumentou 24,6%, passando de 18.374 para 22.897. Já as despesas com essas e outras funções gratificadas do Executivo passaram de R$ 555,6 milhões em 2002 para R$ 1,222 bilhão em 2009, um salto de 119,9%.

É com esses cargos DAS que o governo federal pode contratar técnicos qualificados de fora do serviço público e apadrinhados políticos, sem concurso. No período de sete anos, esse tipo de indicação teve um crescimento de 35%, passando de 4.189 em 2002 para 5.678 em novembro passado.

E a participação desse contingente no total dos comissionados foi a que deu o maior salto: passou de 22,8% do total para 27%.

Contratados têm vínculos com partidos

A grande maioria dos funcionários que recebem DAS, porém, continua sendo de servidores efetivos. Na maioria dos casos, eles recebem essas gratificações como adicional, ao assumirem postos de chefia. Mas esse contingente de servidores caiu de 66,2% em 2002 para 65% em 2009.

Nesse período, sob argumento de que é preciso atrair quadros de fora para a máquina pública, o governo ampliou mais os DAS que recebem remuneração maior. Ao todo são seis os níveis de DAS: o mais baixo ganha R$ 2.115 e o mais alto, R$ 11.179. Nos dois estágios mais baixos, o número de cargos aumentou apenas 3,1% e 2%, respectivamente.

Já a quantidade de cargos dos demais DAS deu saltos acima de 30%.

O número de DAS-5 (que ganham R$ 8,9 mil), por exemplo, passaram de 672 para 1.006 (49% a mais).

Um estudo sobre o perfil dos ocupantes de cargos da alta administração no governo Lula — apresentado pela pesquisadora Camila Lameirão, da Fundação Getulio Vargas, no 2° Congresso do Conselho Nacional de Secretários de Estado da Administração (Consad), em Brasília — identificou um forte engajamento social, político e sindical nesses profissionais.

Baseado em uma amostra dos ocupantes de DAS 5 e 6 e de cargos de Natureza Especial (NE), o estudo mostra que, no atual governo, 25,9% desses profissionais são filiados a partidos políticos, sendo que 80% deles declararam ser do PT. A pesquisa mostra também que há um grande contingente de profissionais com filiação sindical: 42,8%. A participação desses profissionais em movimentos sociais também é elevada.

No primeiro e no segundo mandatos, 46% dos pesquisados se declaram militantes desses movimentos.

Em recente entrevista ao GLOBO, o assessor especial do Ministério do Planejamento Marcelo Viana de Moraes argumenta que a taxa de crescimento dos DAS acompanhou a mesma curva dos servidores de carreira — desde 2002, o número cresceu 13%.

O governo se defende, alegando que é preciso reconstituir o Estado.

Ao ser lançada pré-candidata do PT à Presidência da República, no último sábado, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, prometeu continuar o “reaparelhamento do Estado” e refutou a ideia de que este governo está inchando a máquina pública.

No final do 4° Congresso do PT, ao responder sobre o aumento dos gastos com pessoal, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, preferiu alfinetar a oposição. Afirmou que o governo de São Paulo tem mais cargos em comissão do que o governo federal. Em entrevista ao jornal “O Estado de S.Paulo”, o presidente Lula disse que o número de comissionados do governo federal é proporcionalmente menor do que os do estado e do município de São Paulo.

— Lembra o que o presidente falou, comparando os cargos comissionados aqui e no governo do estado de São Paulo e no governo municipal de São Paulo? Mesmo a nota oficial que eles (estado e município) soltaram confirma que eles têm mais cargos do que nós, em relação à população — ironizou Paulo Bernardo, referindose ao número de 6.239 comissionados divulgados pela Secretaria de Gestão Pública do estado de São Paulo.

Folha de pessoal chega a 5% do PIB

Para o líder do DEM na Câmara, deputado Paulo Bornhausen (SC), o governo do PT faz um reaparelhamento político e mostra irresponsabilidade fiscal, ao criar despesas crescentes com os gastos com pessoal, que não podem ser revertidos.

— É uma característica dos governos do PT: vão inchando a máquina e criando despesas que são permanentes. Eles não têm preocupação com o inchaço da máquina e sim com o reaparelhamento, é um projeto de poder de cunho político, para controlar a máquina de dentro.

O papel de geração de empregos deve ser do setor privado — disse Paulo Bornhausen.

Em 2010, os gastos com a folha de pessoal dos três poderes chegarão a 5,09% do PIB. E o governo ainda pagará um parcela do reajuste dado, a partir de 2008, a 1,4 milhão de servidores. Só para o Poder Executivo, a parcela a ser paga este ano tem o custo de R$ 6,6 bilhões.

Uruguai e o contágio da inteligência:: Luiz Carlos Bresser-Pereira

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O Uruguai, há muito tempo estagnado, precisa de uma inteligência que recuse todas as ortodoxias

UMA AMIGA enviou-me um belo discurso do recém-eleito presidente do Uruguai, José "Pepe" Mujica, proferido em 29 de abril de 2009, durante sua campanha eleitoral. Foi um discurso para um auditório de intelectuais, com um título significativo: "Um Uruguai de engenheiros, filósofos e artistas". No começo do discurso, há uma frase deliciosa de Mujica: "Vocês se lembram do Tio Patinhas, o tio milionário do Pato Donald que nadava em uma piscina cheia de moedas? Ele tinha uma sensualidade física pelo dinheiro. Gosto de me ver como alguém que gosta de tomar banho em piscinas cheias de inteligência alheia, de cultura alheia, de sabedoria alheia. Quanto mais alheia, melhor. Quanto menos coincide com meus pequenos saberes, melhor".

O Uruguai precisa realmente de muita inteligência, de toda a inteligência que o novo presidente puder reunir, de uma inteligência que recuse todas as ortodoxias, que seja modesta e pragmática, porque sua tarefa é difícil. O Uruguai está há muito estagnado. Nos últimos 20 anos, apenas o Haiti cresceu menos. Entretanto, enquanto para um país grande como o Brasil suponho saber como aplicar o tripé novo-desenvolvimentista (responsabilidade fiscal, responsabilidade cambial e papel estratégico para o Estado na promoção do desenvolvimento econômico e social), tenho dúvidas sobre o que fazer em um país pequeno como o Uruguai, mas dotado de bom nível cultural e de renda por habitante média.

A estratégia da liberalização financeira visando tornar o país um entreposto financeiro e comercial no Cone Sul falhou. Parecia lógica nos tempos do neoliberalismo triunfante dos anos 1990; parecia lógica para um país pequeno que não dispõe de um mercado interno suficientemente grande para sustentar uma indústria diversificada. Mas falhou. Falhou a inteligência alheia -aquela que os países ricos emprestam a custos elevados. É preciso que agora funcione a própria inteligência uruguaia, aquela à qual apela com tanta força seu novo presidente.

É necessário dar prioridade à educação, mas isso é óbvio -é uma verdade para todos os países. Mais importante, porque implica uma decisão, uma escolha, é definir uma estratégia que assegure ao Uruguai um papel na economia mundial. Provavelmente a solução seja definir um ou dois setores industriais que o país julga viáveis, protegê-los fortemente por algum tempo e, depois, cobrar das empresas capacidade de competição internacional. Essa foi a política dos países pequenos da Europa no século 19. Sua tarifa alfandegária média era pequena, mas uns poucos setores eram altamente protegidos.

Em seu discurso, o presidente Mujica afirma em certo momento: "Está demonstrado que, uma vez que a inteligência adquira certo grau de concentração em uma sociedade, ela se torna contagiosa". Maravilhosa metáfora! Mas a inteligência de uma nação só é contagiosa se for realmente nacional. É inútil buscar conselhos em brasileiros, argentinos ou americanos.

São concorrentes que pouco sabem do Uruguai. O desafio é para os próprios uruguaios. Eles é que terão que saber como tornar sua inteligência contagiante, como obrigá-la a pensar, em vez de se limitar a repetir o mesmo, o já sabido. Os uruguaios deverão determinar a forma do seu desenvolvimentismo na era da globalização. Esta abriu grandes oportunidades para os países de renda média, mas o tempo da globalização é implacável. A regra que a preside é simples: quem não pensar por conta própria, quem não tiver uma estratégia nacional de desenvolvimento não sobreviverá.

Luiz Carlos Bresser-Pereira, 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Globalização e Competição"

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Reflexão do dia – Roberto Freire

Confrontada com a nova realidade imposta pelo regime militar as esquerdas ofereceram duas respostas: de um lado, os comunistas da tradição pecebista advogavam um processo sustentado na criação de uma ampla frente democrática que tinha no MDB o seu instrumento da articulação com o movimento de massas buscando isolar e derrotar o regime por meio do voto; de outro, posturas que representavam uma resposta violenta, a luta armada para derrubar o regime militar.

Essas duas concepções sobreviveram no período constituinte de 1987/88, e continuam, ainda hoje, a se enfrentar em torno da questão fundamental do processo democrático e do papel do Estado.


(Roberto Freire, em artigo “O intelectual democrata”, sexta-feira no jornal Brasil Econômico)

Vida longa à Nova República :: José Serra

DEU NA REVISTA VEJA

UM MARCO PARA O BRASIL
O comício das Diretas Já em São Paulo,em 1984, foi a senha de que a Nova República estava prestes a vir à luz

Nos 25 anos passados desde a redemocratização, a sociedade brasileira amadureceu, alcançou a estabilidade política e encontrou o rumo do crescimento

A Nova República completa 25 anos em março, mês em que Tancredo Neves deveria tomar posse na Presidência. Há razões para sustentar que se trata da fase da história do Brasil com o maior número de conquistas de indiscutível qualidade política e humana.

Em primeiro lugar, o país nunca havia conhecido um quarto de século ininterrupto de democracia de massas. É nítido o contraste com a oligárquica República Velha, de eleições a bico de pena, sacudida por intervenções nos estados, revoluções e instabilidade.

O período supera igualmente a fase democrática após a queda de Getúlio Vargas, em 1945. E não só pela duração – o regime da Constituição de 1946 foi desfeito em menos de vinte anos pelo golpe que derrubou João Goulart. A Nova República vai muito além na expansão sem precedentes da cidadania e na eliminação quase total das restrições ao direito de voto, com o eleitorado praticamente se confundindo com o universo da população adulta.

Longe de acarretar maior instabilidade, a ampliação da participação das massas populares coincide com um período de completa ausência de conspirações, golpes militares, quarteladas, intervenções preventivas e epílogos políticos trágicos ou temerários. Bem diferente do período anterior, que teve Aragarças e Jacareacanga, durante o governo de Juscelino Kubitschek; o movimento do marechal Lott, de 11 de novembro de 1955; o suicídio de Vargas, em 1954; e a renúncia de Jânio Quadros, em 1961.

Desde a Questão Militar do Império, passando pela primeira década da República, pela Revolta da Armada, pelo tenentismo, pela Revolução de 1924, pela de 1930, pela de 1932, pela insurreição comunista de 1935, pelo golpe de novembro de 1937 e pelo golpe de 1964, é a primeira vez que o fator militar desaparece da política brasileira, e a hipótese do golpe dos quartéis se torna na prática impensável.

Não se pode atribuir essa tranquilidade à ausência de fatores de desestabilização, que foram às vezes dramáticos: a doença e a morte inesperada do presidente eleito no momento mesmo da transição do regime militar para o civil, o processo de impeachment e afastamento de Collor.

Muito menos se pode alegar que tudo se deve a uma conjuntura econômico-social particularmente favorável. Ao contrário: boa parte dos últimos 25 anos se desenrolou sob o signo da aceleração da inflação, até atingir o limiar da hiperinflação, com o agravamento dos conflitos distributivos. Em seguida, houve a fase das grandes crises financeiras mundiais (1994-1995, 1997-1998, 2007-2008). Convém não esquecer a coincidência também com as décadas perdidas em matéria de crescimento econômico. Não faltaram reveses sérios que, em outras épocas, teriam abalado as instituições. Um dos maiores foi o fracasso do Plano Cruzado e dos inúmeros planos que se sucederam, alguns com medidas draconianas, como o confisco da poupança.

Não obstante tais obstáculos, a Nova República conseguiu completar com normalidade uma conquista que permaneceu fora do alcance dos regimes do passado. A alternância tranquila no poder de forças político-partidárias antagônicas provocava sempre a polarização e a radicalização da sociedade brasileira. São exemplos os períodos de 1954-1955 e, com consequências mais graves, entre 1961 e 1964. Neste quarto de século, a alternância passou a fazer parte das conquistas adquiridas: já ninguém mais contesta a legitimidade das vitórias eleitorais, do processo democrático e do natural desejo dos adversários vitoriosos de governar sem perturbações.

O resultado é ainda mais impressionante quando se observa que uma dessas alternâncias aparentemente mais contrastantes foi a chegada ao poder do Partido dos Trabalhadores, encarado, a princípio, se não como força desestabilizadora, ao menos de comportamento radical e deliberadamente à margem na política nacional. Basta lembrar, como exemplo, a decisão do PT de punir seus deputados que votaram em Tancredo Neves no Colégio Eleitoral, em 15 de janeiro de 1985, e sua recusa em homologar a Constituição de 1988.

O PT, aliás, acabou por ser, por paradoxal que pareça, um dos principais beneficiários dos grandes erros históricos de julgamento que cometeu. Nos dois primeiros casos, porque a eleição do primeiro presidente civil e as conquistas sociais e culturais da Constituição foram os fatores-chave que possibilitaram criar o clima que eventualmente conduziria o partido ao poder. Outros erros históricos seguiram-se àqueles. O partido também se opôs à estabilização da economia brasileira, denunciando com estridência o Plano Real, o Proer e a Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas soube, posteriormente, colher seus bons frutos.

Este último exemplo, o da estabilização, é especialmente notável. Os governos militares, apesar dos 21 anos de poder discricionário em termos de elaboração de leis e normas, com elevado grau de repressão social e sindical, fracassaram por completo em liquidar a herança da inflação, acelerada na segunda metade dos anos 1950, mas que provinha do fim da II Guerra Mundial. Pior do que isso: agravaram em muito o problema ao criar a indexação da moeda, que tanto iria complicar o combate à inflação. Ao mesmo tempo, conduziram o país para a gravíssima crise da dívida externa a partir de 1981-1982, dando início a quase uma década e meia perdida no que respeita ao crescimento econômico.

O Brasil, que, segundo os estudos do professor Angus Maddison, havia sido por mais de um século, entre 1870 e 1980, o país de maior crescimento médio entre as dez maiores economias do mundo – EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, China, Índia, União Soviética, Brasil e México –, esqueceu a fórmula do crescimento e passou até a menosprezá-lo, como, aliás, ainda o fazem alguns.

Pois bem, o período de um quarto de século da Nova República, sem repressão nem poderes especiais, conseguiu finalmente derrubar a superinflação. Fez mais: resolveu o problema persistente da dívida externa herdada e até deu começo a uma retomada promissora do crescimento econômico, e à expansão do acesso das camadas de rendimentos modestos ao crédito e ao consumo, inclusive de bens duráveis.

Duas observações acautelatórias se impõem a esta altura. A primeira é que as conquistas da Segunda Redemocratização não foram o resultado de milagres instantâneos. Custaram esforços enormes e, com frequência, só se deram depois de muitas tentativas e erros. É por isso que o período tem de ser analisado na sua integridade, êxitos e fracassos juntos, já que estes são partes inseparáveis do processo de aprendizagem coletiva, para o qual contribuíram numerosos dirigentes e cidadãos numa linha de continuidade, não de negação e ruptura.

A segunda é que nenhuma conquista é definitiva, nenhum progresso é garantido e irreversível.
Assim como não somos escravos dos erros do passado, tampouco devemos crer que a eventual sabedoria dos acertos de ontem se repetirá invariavelmente hoje e amanhã. É necessário destacar tal aspecto porque a estabilidade, o crescimento e os ganhos de consumo, no que concerne ao panorama econômico-social, ainda não têm garantidas as condições de sustentabilidade no médio e no longo prazos.

Nosso dever é, por conseguinte, o de assumir com humildade e coragem a herança desses 25 anos, não para negar o passado, mas para superá-lo, a fim de fazer mais e melhor. Não é apenas por uma coincidência deste momento com o aniversário dos primeiros 25 anos da Nova República que devemos reclamar essa denominação, injustamente esquecida devido talvez às decepções dolorosas dos primeiros anos, quando a história nos surpreendeu com o desaparecimento prematuro de Tancredo Neves, o galope da superinflação e a renitência do patrimonialismo na vida pública brasileira. Mas o Brasil mudou para melhor.

A verdade é que os fatos alinhados acima, indiscutíveis na sua consistência e na sua imensa importância, atestam o discernimento e a sabedoria que deram perenidade à obra fundadora dos grandes responsáveis pela Nova República. E aqui evoco os nomes de alguns que já nos deixaram, além de Tancredo: Ulysses Guimarães, Franco Montoro, Leonel Brizola, Teotônio Vilela, José Richa, Mário Covas, Sobral Pinto, Raymundo Faoro e Celso Furtado.

O exemplo inspirador de Nelson Mandela está aí para nos mostrar que a grandeza do instante fundador não se esgota naquele momento da partida, mas continua a fazer diferença no futuro. As fases da história não podem ser arbitrariamente datadas a partir de um ou outro governante ao qual queiram alguns devotar um culto de exaltação. Elas só terão coerência se corresponderem a instantes decisivos de mudança institucional: a República, a Revolução de 1930, a Primeira Redemocratização, em 1945, o golpe de 1964, a Segunda Redemocratização ou Nova República. A razão não é difícil de compreender e já está presente em Maquiavel: os fundadores de uma nova ordem na base da virtude em grande parte determinam como haverão de viver os homens e mulheres de acordo com as leis e a Constituição criadas.

O Brasil de hoje tem a cara e o espírito dos fundadores da Nova República: senso de equilíbrio e proporção; moderação construtiva na edificação de novo pacto social e político; apego à democracia, à liberdade e à tolerância; paixão infatigável pela promoção dos pobres e excluídos, pela eliminação da pobreza e pela redução da desigualdade. É na fidelidade a esse legado que haveremos de manter e superar o que até aqui se tem feito e realizar mais e melhor para o crescimento integral do povo brasileiro.

José Serra é governador de São Paulo e provável candidato do PSDB à Presidência da República

O lulismo e o petismo:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O Partido dos Trabalhadores chega aos 30 anos ainda com o peso da crise do mensalão de 2005, marcado pela acusação do procurador-geral da República de ter organizado “uma quadrilha” para comprar votos dentro do Congresso Nacional em apoio ao governo Lula. Nada menos que 40 pessoas, entre elas os principais dirigentes do partido, estão arroladas como réus no processo que tramita no Supremo Tribunal Federal.

A candidatura da ministra Dilma Rousseff, saída da cartola de Lula, tem essa origem, segundo um dos principais líderes petistas, o ex-ministro da Justiça e candidato ao governo do Rio Grande do Sul Tarso Genro.

O vazio político criado dentro do PT após a crise do mensalão teria aberto, para Genro, o caminho para uma decisão unilateral de Lula, sem que o partido tivesse condições de reagir.

Outra liderança histórica petista, Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do presidente Lula e um de seus principais interlocutores, admitiu em entrevista recente que a principal perda do partido desde a sua fundação foi ter adquirido “o vício da corrupção”, fato explicitado no escândalo do mensalão.

O que se viu no Congresso petista foi uma tentativa infrutífera de exorcizar esse fantasma, a começar pelo exministro José Dirceu, acusado de ser o chefe da quadrilha no processo do STF e que, prestes a reassumir um cargo no Diretório Nacional do partido e na campanha eleitoral da candidata oficial, disse que, para ele, o mensalão não é corrupção, mas financiamento eleitoral com caixa dois.

O próprio presidente Lula referiu-se ao episódio dizendo que os que queriam acabar com “a raça” do PT em 2005 estão, eles sim, acabados, numa citação indireta ao ex-presidente do DEM Jorge Bornhausen.

O fato é que, a partir desse episódio, o PT perdeu espaço político no governo para o surgimento do fenômeno do “lulismo”, devido ao protagonismo pessoal do presidente Lula, que conseguiu se distanciar do escândalo ora afirmando que fora traído, ora insinuando que o mensalão simplesmente não existiu.

Na entrevista publicada no “Estadão” na sexta-feira, Lula chegou ao ridículo extremo de dizer que, quando deixar o governo, pretende investigar pessoalmente “algumas coisas que eu não sei e que me pareceram muito estranhas ao longo de todo o processo”.

Perguntado sobre quem o traiu, Lula saiu-se com um enigma: “Quando eu deixar a Presidência, eu posso falar”.

É o caso de perguntar por que não utiliza todos os órgãos de informação e mais a Polícia Federal para investigar um caso tão grave, se acredita que há “coisas estranhas” no processo.

O fato é que o PT hoje, depois do mensalão e subordinado ao “lulismo”, é cada vez mais um partido igual aos outros.

O cientista político Paulo Roberto Figueira Leal, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), diz que o PT de hoje é, em alguns sentidos, mais parecido com as siglas que criticava e combatia: “Tornou-se um partido mais profissionalizado (vide o perfil daqueles que participam de seus encontros nacionais) e mais focado no pragmatismo em nome do sucesso eleitoral (vide a ampliação do arco de alianças a partidos notoriamente conservadores)”.

Para Paulo Roberto, se essa trajetória foi fundamental “para sacramentar vitórias no plano nacional, ao conseguir eleitores centristas que historicamente não votavam no partido, ela também cobrou um preço: o da percepção, por parcelas mais à esquerda, de uma tendência (em curso, ainda não totalmente consumada) à indiferenciação do PT em relação às demais siglas”.

Para ele, a radicalização ou não dessa tendência à indiferenciação dependerá, em grande medida, do resultado de Dilma em 2010. “Em caso de vitória, e obrigados o governo e o partido a assegurarem a governabilidade, nada sugere que o PT se afastará dessa linha de lançar pontes ao centro e de diálogo com partidos e segmentos do eleitorado para muito além daqueles que apoiaram o PT em seus primeiros anos”.

Já o cientista político Hamilton Garcia de Lima, professor do Laboratório de Estudos da Sociedade Civil e do Estado da Universidade do Norte Fluminense, a disjuntiva petismo x lulismo só será útil para o entendimento da dinâmica interna do PT “se não cair na tentação simplista de uma dicotomia que ignore a relação carnal siamesa entre ambos os setores, relação essa que está na base da conquista do poder pelo partido”.

Diante das vitórias conquistadas desde então, diz ele, “é pouco provável esperar o fim da parceria histórica a partir de uma iniciativa da esquerda”.

Hamilton Garcia acha que Lula está “fadado a brilhar sobre o cenário político nacional, quer como líder inconteste da oposição, quer como líder natural da situação”, e por isso não tem interesse em alterar o status de um partido “que parece ter encontrado seu ponto de equilíbrio no desempenho do papel clássico de um partido trabalhista”.

Garcia faz uma ironia dizendo que o cenário de “uma Dilma vitoriosa e pretendente ao papel de um Leonel Brizola dos anos 1960 pode não ser impossível, mas parece improvável diante de um Vargas, digo Lula, ainda vivo”.

O cientista político também não vê possibilidade de recuo petista do que chama de “pactos escusos e sombrios costurados no pântano da política nacional”.

O professor Paulo Roberto Figueira acha que “quanto mais depender desses setores do eleitorado e quanto mais caminhar em direção ao centro — ou seja, quanto mais indiferenciarse —, mais o PT pagará o preço de depender de líderes carismáticos como Lula, seja como candidato, seja como “transferidor de prestígio para seus apoiados”.

Elis Regina O Bebado e A Equilibrista

Com Aécio, Serra quer sinalizar candidatura

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O governador de São Paulo, José Serra, vai fazer uma visita ao colega mineiro, Aécio Neves, ainda nesta semana. O objetivo é mostrar que fará gestos para não deixar dúvida de que será o candidato do PSDB a presidente. Diversas alas do partido concordam que os prejuízos para Serra por causa da superexposição de Dilma Rousseff (PT) vão se manter até maio, o que tornaria inútil apressar o lançamento do candidato.

Encontro com Aécio sinalizará candidatura

Serra espera apenas desembarque do mineiro hoje, após férias no exterior, para acertar visita esta semana

Christiane Samarco

BRASÍLIA - O governador de São Paulo, José Serra, espera apenas o desembarque do colega mineiro Aécio Neves, que retorna hoje de férias no exterior, para marcar a visita que pretende lhe fazer ainda esta semana. Além de selar as costuras políticas no segundo maior colégio eleitoral do País, o encontro dos dois é tático. Serra quer mostrar que fará gestos cada vez mais firmes para não deixar dúvida de que é o candidato do PSDB à Presidência, mesmo sem assumir a candidatura.

Independentemente da movimentação de Serra e do anúncio oficial, que setores do partido apostam que se dará em meados de março, "no máximo", as várias alas do PSDB concordam em um ponto: o inferno astral do candidato tucano se arrastará maio adentro. Isso porque, até lá, a "superexposição" da candidata petista e ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, será acentuada pelos programas partidários do PT e dos partidos aliados do Planalto, em rede nacional de rádio e televisão. É diante desse quadro que serristas do grupo mais próximo ao governador, como o deputado Jutahy Júnior (BA), sustentam a tese de que apressar o lançamento de Serra é inútil.

"Antecipar a campanha é só ampliar o período de travessia do deserto", diz Jutahy, convencido de que o tucano amargará desvantagem durante toda essa fase em que a disputa se dá entre uma ministra que viaja o País inteiro ao lado de um presidente popular e um governador de Estado. O presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), concorda que o jogo só começará a ficar equilibrado quando o enfrentamento for entre dois candidatos.

"O que a gente precisa, até lá, é ter nervos de aço. E temos de nos mexer muito no Congresso e nos Estados, com uma forte atuação parlamentar e muita articulação", sugere o senador, animado com os resultados da última pesquisa Ibope. O levantamento divulgado semana passada colocou o tucano 11 pontos porcentuais à frente da petista, no cenário em que Ciro Gomes (PSB) e Marina Silva (PV) também são candidatos. Apontou, também para uma vitória do PSDB em segundo turno, com o placar de 47% a 33% sobre Dilma. "Os números são bons. Confirmam uma situação real, que não é brilhante, mas é segura", analisa Guerra.

"COMERCIAIS"

O PT, assim como o PSDB, tem o programa de 10 minutos do horário partidário a ser exibido em rede nacional de rádio e TV, além de quatro dias de comerciais a ser veiculados até junho. A lei prevê dez inserções de 30 segundos em cada dia. Um comercial os petistas já usaram, para comemorar os 30 anos de fundação do partido. Restam, portanto, três inserções marcadas para 6, 8 e 11 de maio.

Com esse calendário, os tucanos mais otimistas buscam consolo na aposta de que, até lá, Dilma não deve crescer nas pesquisas. Acreditam que quem vai ganhar fôlego agora é Ciro, que apresentou sua candidatura no programa do PSB de quinta-feira passada e ainda terá inserções até o início de março. No ano passado, Ciro ganhou entre 6 e 8 pontos porcentuais nas pesquisas, por conta do programa e dos comerciais.

O tucanato aposta ainda que a propaganda do DEM, entre 18 e 25 de maio, vai "demolir a Dilma" e destacar Serra. Em seguida, na primeira quinzena de junho, o PPS exibirá seu programa, com elogios ao governo de São Paulo, do qual participa. A última etapa da propaganda partidária virá em junho, com o PSDB encerrando a temporada no dia 29. "A exposição final é do Serra", comemora o dirigente do PSDB responsável pela programação perante a Justiça Eleitoral.

Para ter mais conforto na "travessia do deserto", Serra quer investir especialmente em São Paulo, considerado o "motor" da campanha presidencial. O tucanato reconhece que as chuvas ainda atrapalham muito, prejudicando não só a agenda de inaugurações como as intenções de voto na corrida sucessória. Ainda assim, o cronograma de entrega das obras de maior visibilidade, como o Rodoanel, está mantido para março. A programação inclui também duas estações intermediárias da linha 4 do metrô, nas Avenidas Paulista e Faria Lima.

Haverá ainda entregas semanais de novas estações de tratamento de esgoto e escolas técnicas, além de uma nova faculdade de tecnologia a cada mês. E estradas vicinais São Paulo afora. "Se Serra tivesse assumido a candidatura, seria multado, questionado, e não poderia mais inaugurar obras no Estado, porque diriam que é palanque público", insiste Jutahy, em defesa da tese de que o anúncio oficial da candidatura se tornou "secundário".

Serra quer neutralizar discurso social do PT com pacote para baixa renda

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Governo paulista expandirá investimento em programas de microcrédito, de moradia popular e de escolas técnicas

Julia Duailibi

Na corrida pela conquista do eleitor de baixa renda, maior parte do eleitorado e fiel da balança na disputa presidencial, as principais vitrines sociais do governo do tucano José Serra serão encorpadas e servirão de arma na campanha eleitoral deste ano. A ideia no PSDB é usar iniciativas de cunho popular no Estado para neutralizar o discurso social do governo e do PT, principalmente na campanha eleitoral no rádio e na TV.

A contabilidade tucana para este ano prevê a expansão do programa de microcrédito, o anúncio da liberação dos créditos da Nota Fiscal Paulista numa frequência maior, a duplicação dos Ambulatórios Médicos de Especialidades e até a abertura de restaurantes populares em comunidades carentes. Tudo casado com uma maratona de inaugurações, antes do prazo para a desincompatibilização de quem ocupa cargos no Executivo, em 3 de abril.

A ação dos tucanos ocorre no momento em que o governo federal prepara uma série de eventos para relacionar a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, a projetos sociais. Até abril, a petista terá o nome vinculado, por patrocínio do governo, aos lançamentos do PAC 2, do Plano Nacional de Banda Larga e do projeto de Consolidação das Leis Sociais, que Lula quer deixar como legado na área.

As vitrines tucanas não só municiarão o futuro candidato no debate eleitoral, como devem ilustrar e balizar o programa de governo do partido. Somam-se a elas outras iniciativas de Serra que o PSDB aposta que terão repercussão nacional, como o recente anúncio do novo salário mínimo regional, de R$ 560. Depois de debates internos entre integrantes da equipe econômica de Serra, o governo resolveu mudar o critério de reajuste para conceder neste ano um aumento acima do que estava previsto.

Na semana passada, Serra ensaiou agenda de campanha e inaugurou na Brasilândia, zona norte da capital paulista, um dos restaurantes Bom Prato, que vendem almoços a R$ 1. Mas a ida do governador ao local teve um componente diferente. Aquele foi o primeiro modelo inaugurado em uma comunidade carente - as 30 unidades anteriores foram abertas em locais de passagem, como ruas de comércio popular e estações do Metrô. A orientação agora é que este novo modelo seja levado para outras comunidades até o final da gestão - as próximas serão Paraisópolis e Heliópolis, a maior favela da capital paulista.

Beneficiado por esses programas, o eleitor que ganha até dois salários mínimos corresponde a mais da metade do eleitorado. Pesquisa Ibope, feita entre 6 e 9 de fevereiro, mostra que a maior parte dos eleitores (34%) quer que o próximo presidente dê "total continuidade ao governo atual". De acordo com os dados, 79% dos que ganham até um salário mínimo consideram o governo Lula bom ou ótimo, o que explica a resistência de parte do tucanos em criticar a atual gestão. Os números vão além. Expõem a necessidade de um discurso para esse perfil de eleitor.

"Neste ano, o PSDB vai precisar desconstruir o que Lula diz. Vai ter que defender o que foi feito durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, comparar os candidatos e mostrar o que tem sido feito em São Paulo", afirmou o cientista político Rubens Figueiredo.

CRÉDITO

Na esteira do governo federal, que aumentou a oferta de crédito impulsionando o consumo das famílias, que este ano deve crescer 6,1%, o governo tucano engordou o programa de empréstimos populares. De olho na classes de renda mais baixa, resolveu aumentar em 30% os recursos para empréstimos do Banco do Povo Paulista, que chegam a R$ 120 milhões neste ano, o maior valor desde que foi criado em 1998.Os contratos variam de R$ 200 a R$ 7.500 e têm como alvo pequenos trabalhadores autônomos.

Agora em 2010, os mutirões anuais de crédito passam a ser semestrais. Até a divulgação conta com a ajuda do Palácio dos Bandeirantes. "Um grande entrave era a pouca divulgação ou a ausência dela. Antes ficava a cargo das prefeituras, mas desde o ano passado ficou centralizada", disse Antonio Mendonça, diretor executivo do Banco do Povo, ao falar da nova campanha no rádio e na TV que deve ir ao ar em março - a última foi no final do ano passado.

Serra também pediu um estudo da Secretaria da Fazenda para alterar o prazo de resgate dos créditos que o consumidor acumula com a Nota Fiscal Paulista. A ideia é que no segundo semestre se anuncie a mudança no resgate, que passaria de semestral para trimestral.

SAÚDE

Amparado por pesquisas que mostram a saúde com um dos pontos mais frágeis da gestão Lula, o PSDB avalia que o discurso social do partido deve rememorar a atuação de Serra no Ministério da Saúde, durante a gestão FHC - as pesquisas mostram que o eleitor se recorda e avalia positivamente a passagem do governador pela pasta.

Ao lado da Lei Antifumo, a aposta dos tucanos para a área são os Ambulatórios Médicos de Especialidades para consultas e exames médicos. Trabalha-se para a inauguração de 20 novos ambulatórios no ano. Isso corresponde à mesma quantidade de unidades criadas desde 2007, começo da gestão.

A produção de moradias populares também será recorde neste ano, na comparação com os três primeiros anos de gestão do tucano. A previsão é investir R$ 2,2 bilhões, quase o total de R$ 2,4 bilhões aplicados nos anos anteriores. Também pretende-se inaugurar 42.585 unidades e intervenções habitacionais - mais da metade do que foi entregue no ano passado.

O pé no acelerador também passa pelo ensino técnico, onde, diferentemente de outros casos, tucanos pretendem tomar a frente das comparações. O governo de Serra diz que deve ultrapassar a meta de entregar 52 novas faculdades de tecnologia neste ano - já foram abertas 49. Em quatro anos de governo, serão investidos R$ 3,2 bilhões, mas somente em 2010 o valor aplicado alcança R$ 1 bilhão.

Lula, Dilma e a "xepa":: Clóvis Rossi

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Esqueça as propostas supostamente radicais apresentadas no Congresso do PT. Esqueça, aliás, o próprio Congresso. Não passa de "uma feira de produtos ideológicos", em que "as pessoas compram o que querem e vendem o que querem". Não, não é a avaliação de algum subintelectual de direita, para roubar a expressão de Dilma Rousseff/Marco Aurélio Garcia, mas da pessoa que mais entende de PT, por ter sido seu idealizador, por ser seu líder de toda a vida e por ser a única figura verdadeiramente popular de um partido que se pretende popular.

Sim, é de Luiz Inácio Lula da Silva que estou falando. As aspas do primeiro parágrafo correspondem a frases suas em entrevista publicada sexta-feira pelo "Estadão".

Alguma chance de as propostas da feira, digo, do PT, serem incorporadas por um governo Dilma? Zero, sempre segundo Lula: "Não há nenhum crime ou equívoco no fato de um partido ter um programa mais progressista do que o governo. (...) O partido, muitas vezes, defende princípios e coisas que o governo não pode defender".

O governo Dilma será mais do mesmo, deixa claríssimo o presidente que inventou a candidata: "Quero crer que a sabedoria do PT é tão grande que o partido não vai jogar fora a experiência acumulada de ter um governo aprovado por 72% na opinião pública depois de sete anos no poder. Isso é riqueza que nem o mais nervoso trotskista seria capaz de perder".

Nem trotskista nem petista de qualquer coloração. As declarações de Lula, de um meridiano sentido comum, mostram que, menos do que uma "feira", o Congresso do PT é a "xepa", o fim de feira em que o pessoal se diverte, lançando uma pilha de teses a que nem os próprios autores prestam atenção porque sabem que o espetáculo é Lula e que Dilma pouco ou nada comprará da "feira".

Dilma, o PT e o "depois"::Eliane Cantanhêde

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O PT fala uma língua, a sua candidata à Presidência fala outra. Faz sentido. Dilma Rousseff louva sua história de resistência à ditadura militar, mas trata de garantir o alegre apoio dos banqueiros e grandes empresários, que se deram bem no governo petista. E o partido se empenha em manter viva a fé das bases sindicais, estudantis, agrárias, todas devidamente dóceis ao poder na era Lula.

No seu quarto congresso, aos 30 anos, o PT aprovou o apoio integral ao programa de direitos humanos, ao imposto sobre grandes fortunas, à maior liberdade para as invasões do MST, à jornada de 40 horas semanais e ao fim do "monopólio" dos meios de comunicação, cultura e entretenimento.

Dilma não abriu a boca sobre nenhum deles no seu discurso. Seguiu a máxima de Lula, de unir "a cabeça e a emoção", e falou de Minas, onde nasceu, do Rio Grande do Sul, onde se fixou, de filha, genro, o futuro neto (ou neta), de companheiros que caíram na resistência à ditadura. E expôs o seu delicado equilíbrio ao se comprometer com os pequenos e os grandes produtores rurais -sempre eleitos como cruéis inimigos pelas bases petistas.

Como previsto, o "happening" foi para lançar o futuro, mas festejou principalmente o presente: Lula foi a grande estrela nos discursos, nos filmes, nas fotos, nos aplausos. Aliás, registre-se que as estrelas que haviam sumido em 2006 estão de volta. Com toda a força.

A dúvida é quanto ao depois. Na campanha, fala-se o que convém. No governo, faz-se o que se quer e o que se pode. Se Dilma for presidente, ela vai seguir o que o PT prega ou o que a candidata hoje diz? A resposta está nas alianças que fizer e também na sua biografia, nas suas crenças, nos seus traumas, na sua personalidade. Lula não se arvora "de esquerda" e foi muito hábil ao equilibrar interesses e fazer prevalecer os seus. Mas não custa lembrar:

Dilma não é Lula.

Indicada pré-candidata do PT, Dilma prega Estado forte

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Ministra rejeita "aventuras" na economia e faz promessas na área social

Indicada ontem como pré-candidata do PT à Presidência, a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) defendeu o fortalecimento do Estado em seu discurso. Ela enfatizou a determinação de "continuar valorizando o servidor público" e "reconstituindo o Estado" e rebateu as críticas de que o PT inchou a máquina pública. Por outro lado, Dilma afirmou que a preservação da estabilidade econômica, do equilíbrio fiscal, o controle da inflação e do câmbio flutuante será a base das ações de seu governo. "Temos rumo, experiência e impulso para seguir o caminho iniciado por Lula. Não haverá retrocesso nem aventuras. Mas podemos avançar muito mais. E muito mais rapidamente", disse ela. Boa parte das promessas se concentrou na área social. "As crianças e os mais jovens devem ser, sim, protegidos pelo Estado, desde a infância até a vida adulta".

Pré-candidata, Dilma defende Estado forte e rejeita ""aventuras""

Em discurso no 4.º Congresso do PT, ministra garantiu que tudo será feito para manter estabilidade econômica

Vera Rosa, Clarissa Oliveira, Wilson Tosta e Lisandra Paraguassú


BRASÍLIA - Aclamada ontem como pré-candidata do PT à Presidência, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, encarnou o pós-Lula e ensaiou o discurso de sua campanha. No encerramento do 4.° Congresso Nacional do PT, preparado para sacramentar sua candidatura e aprovar as diretrizes do programa de governo, Dilma pregou o fortalecimento do Estado, mas fez questão de defender com todas as letras a preservação da estabilidade econômica, com manutenção do equilíbrio fiscal, controle da inflação e câmbio flutuante.

"Não haverá retrocesso nem aventuras", avisou a ministra no ato político que também comemorou os 30 anos do PT. "Mas podemos avançar muito mais e muito mais rapidamente." Atrás dela, um painel com sua foto ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva exibia a inscrição "Com Dilma, pelo caminho que Lula nos ensinou".

Vestida de vermelho, a cor do PT, a chefe da Casa Civil falou por uma hora em um salão decorado com estrelas, logo após Lula apresentá-la como herdeira para a plateia, assumindo o papel de avalista da candidatura. "Eleger a Dilma é a coisa mais importante do meu governo", disse. "Eleger a Dilma não é secundário para o presidente da República: é a coisa prioritária na minha vida neste ano."

Lula não escondeu a emoção ao apresentar a ministra. Contou que a conheceu quando ela foi secretária de Energia do Rio Grande do Sul no governo de Olívio Dutra (1999-2002), fato que muitos petistas não sabiam. Depois, teceu elogios à sua capacidade de trabalho, dedicação e solidariedade nos momentos difíceis, como na crise do mensalão, que, no seu diagnóstico, não passou de um "golpe" contra o Palácio do Planalto.

O presidente recomendou à candidata que esteja pronta para responder aos ataques da oposição na campanha. "Vão dizer que a Dilma vai ser estatizante. Se prepare", afirmou, olhando para a ministra. "Isso não é ruim, não. Isso é bom." Logo depois, porém, emendou:

"Claro que você não vai querer estatizar borracharia, bar, pizzaria, cervejaria. Mas aquilo que for estratégico, não estiver funcionando e precisar colocar para funcionar, a gente não tem que ter medo de tomar decisões importantes para o nosso país."

Em meio a promessas de continuar investimentos sociais iniciados no governo Lula, Dilma encontrou espaço para críticas à oposição. E foi com elas que arrancou os primeiros aplausos. "Não praticamos casuísmos. Basta ver a reação firme e categórica do presidente ao frustrar as tentativas de mudar a Constituição para que pudesse disputar um terceiro mandato. Não mudamos, como se fez no passado, as regras do jogo no meio da partida", insistiu.

Ao citar os poetas Carlos Drummond de Andrade, mineiro, e Mário Quintana, gaúcho, e relembrar seu passado de combate à ditadura, ela afirmou que nunca esperou ser candidata, mas disse estar preparada para o desafio.

Na tentativa de tranquilizar quem viu viés estatizante nas diretrizes de sua plataforma, Dilma garantiu que tudo será feito para manter a estabilidade. Enfatizou, no entanto, a determinação de "continuar valorizando o servidor público" e "reconstituindo o Estado" e rebateu as críticas de que o governo petista inchou a máquina pública. "Alguns ideólogos chegavam a dizer que quase tudo seria resolvido pelo mercado", comentou, atacando a defesa da privatização, feita por tucanos.

O discurso de Dilma, lido em dois teleprompters, demorou para empolgar os petistas. Com menos espontaneidade que Lula, ela se revelou um tanto dura ao falar e seguiu praticamente à risca o pronunciamento escrito dias antes, com a colaboração do ex-prefeito Belo Horizonte Fernando Pimentel, do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci e do coordenador do programa de governo, Marco Aurélio Garcia.

"Quem duvidar do vigor da democracia em nosso país, que leia, escute ou veja o que dizem livremente as vozes oposicionistas. Mas isso não nos perturba. Preferimos as vozes dessas oposições, ainda quando mentirosas, injustas e caluniosas, ao silêncio das ditaduras", afirmou.

Ex-guerrilheira, a ministra se emocionou ao citar três companheiros mortos na luta armada. Eram Carlos Alberto Soares de Freitas, desaparecido em 1971; Maria Auxiliadora Lara Barcelos, exilada que se matou em 1976, em Berlim; e Iara Iavelberg, morta em 1971.

Dilma também foi acompanhada no Congresso do PT pelo presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), cotado para vice na chapa. O comando do partido só foi à festa depois que Temer e o líder do governo no Senado, Romero Jucá (RR), pediram a Lula sua interferência para resolver impasses em Estados onde os dois partidos disputam a cabeça de chapa.

"Acho que foi boa a presença do PMDB aqui", disse ela. "O Brasil precisa de um governo de coalizão. Não acho bom para o País governo de um partido só."