terça-feira, 19 de agosto de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Eleição boliviana é alerta sobre risco do populismo

O Globo

Depois de engendrar crise fiscal, partido fundado por Evo Morales está fora do 2º turno e não fez um deputado sequer

O desfecho do primeiro turno da eleição presidencial na Bolívia marca o encerramento de um ciclo de 20 anos, em que o poder foi ocupado quase todo tempo pelo Movimento ao Socialismo (MAS), fundado por Evo Morales. O candidato do MAS, Eduardo del Castillo, ficou entre os menos votados. O segundo turno será disputado em outubro pelo senador centrista Rodrigo Paz, do Partido Democrata Cristão, e pelo ex-presidente Jorge Quiroga, da oposicionista Aliança Livre. O resultado traduz o esgotamento do discurso nacionalista de esquerda que sustentava Morales — ele deixou o partido no início do ano e hoje está foragido por enfrentar processo por estupro de menor e tráfico humano. O MAS não elegeu um representante sequer ao Congresso.

A missão prioritária do futuro governo será debelar a grave crise econômica, resultado da deterioração fiscal. A inflação anual era de 0,77% em março de 2022. Três anos depois, chegou a 23,96%, maior nível em 34 anos. O descontrole dos preços é acompanhado pela escassez de bens de primeira necessidade. A dívida pública, que caíra de 82% para 35% do PIB no primeiro mandato de Morales, voltou a subir e está em 95%, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI).

A crise foi fermentada durante os governos sucessivos de Morales. Eleito pela primeira vez em 2005, ele tirou proveito das grandes reservas de gás bolivianas para ampliar o gasto público e promover políticas sociais de impacto. Depois de obter a aprovação de uma nova Constituição em 2008, foi reeleito e obteve nova vitória em 2014. Conseguiu então na Justiça o direito a uma quarta candidatura em 2019, desafiando referendo de 2016 que vedava mais de duas reeleições consecutivas. No pleito de 2019, observadores da Organização dos Estados Americanos (OEA) constataram irregularidades flagrantes. Instalou-se grave crise política que culminou com sua renúncia por pressão militar e uma sucessão conturbada. A crise institucional só foi debelada quando o atual presidente, Luis Arce, do MAS, foi eleito em 2020.

A sombra de Bolsonaro, por Merval Pereira

O Globo

A discussão que se impõe é saber se um presidente da República em seu primeiro mandato quererá ter em seu encalço a figura de Bolsonaro

Caso um candidato de direita vença a eleição presidencial do próximo ano, o ex-presidente Jair Bolsonaro, que deverá ser condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe, poderá ser favorecido por uma decisão do novo governante o recolocando na disputa política. Esse é um tema recorrente no jogo pré-eleitoral, que tem nuances fundamentais na análise prospectiva da corrida presidencial. A anistia é um perdão geral, concedido pelo Poder Legislativo por lei. Pode ser de iniciativa do próprio Legislativo — como os bolsonaristas tentam agora — ou proposta pelo Executivo, mas aprovada no Congresso.

Ela apaga os efeitos do crime, tanto penais quanto extrapenais, como a inelegibilidade. O indulto, em contraste, é um perdão concedido pelo Executivo que extingue a pena, mas não os efeitos extrapenais. Na anistia, que deve sempre ser concedida a um grupo que cometeu o mesmo crime, Bolsonaro ficaria livre para voltar ao jogo eleitoral em 2028 nas eleições municipais ou em 2030.

A presença americana muda a política no país, por Fernando Gabeira

O Globo

Durante a guerra fria, os Estados Unidos derrubaram 70 governos, em operações abertas ou clandestinas

Um amigo editor de uma revista portuguesa pediu um artigo sobre o Brasil. Escrevi a respeito da crise, mostrando o que o país tem de bom para garantir sua soberania: florestas, água, minerais estratégicos, alimentos, uma lista invejável.

Depois de enviar o artigo, me dei conta de que não abordei como deveria o que me parece a grande novidade na situação política nacional. Parece que ela mudou completamente. Estávamos acostumados com a polarização entre o governo e a oposição bolsonarista. De repente, entrou em cena um ator gigantesco: o governo americano de Donald Trump. A oposição bolsonarista deixou sua condição de protagonista e se tornou coadjuvante. Ela celebra ações americanas e se dedica a anunciar novas incursões punitivas. Tarifaço, supressão de vistos, Lei Magnitsky, e alguns deliram com a possibilidade de fechamento de bancos e desligamento do Waze. Parecem meninos que se agarram na perna do irmão mais velho que vai brigar por eles.

Sebastião voltou e adubou a terra, por Míriam Leitão

O Globo

Em cerimônia emocionante, as cinzas de Sebastião Salgado foram misturadas à terra onde se plantou uma peroba, em Minas

Sebastião Salgado voltou à terra onde nasceu, Aimorés, Minas Gerais, encostado no Espírito Santo. “Hoje vai ser a derradeira missão do Tião”, disse Lélia, esposa dele por 61 anos. “Ele vai ser o adubo da planta maravilhosa que vai ser essa peroba. Tenho certeza de que essa peroba vai ser a mais bonita, a maior, a mais alta aqui dessa floresta. E de longe as pessoas vão dizer, ‘está lá o Sebastião Salgado’. Como diria nosso grande amigo Saramago, Tião não voou para as estrelas, ele foi para a terra porque ele era da terra”.

As cinzas do grande fotógrafo e humanista foram misturadas à terra usada para o plantio da árvore, numa clareira bem em frente à mata que ele e Lélia plantaram na fazenda Bulcão. Os filhos, Juliano e Rodrigo, a viúva e a neta plantaram a muda de peroba, uma das rainhas da Mata Atlântica. A fazenda da família, na qual Sebastião viveu sua infância, estava completamente degradada quando ele a herdou. Lélia teve então a ideia de plantar uma floresta. Hoje, o Instituto Terra é um exemplo de que restaurar é possível e abriga três milhões de árvores.

A Meta, sempre a Meta, por Pedro Doria

O Globo

Trata-se de um padrão recorrente de comportamento: o lucro é tudo, se pessoas sofrerem com isso, danem-se

Em 2021, Frances Haugen, uma executiva de médio escalão da Meta, demitiu-se com uma denúncia. A empresa, dizia ela, tinha plena consciência de que adolescentes vulneráveis eram expostos a conteúdo que os deixava em pior estado, tanto no Instagram quanto no Facebook. Falava de jovens que se automutilavam, em casos extremos eram levados ao suicídio. A companhia tinha noção disso, porém nada fazia. Mudar algo impactaria sua lucratividade. Em 2024, documentos internos vazados mostraram que a Meta tinha conhecimento de assédio sexual contra menores de idade. Cem mil vítimas de assédio. Por dia. Todos os dias. De novo, nada fez. Outra executiva, Sarah Wynn-Williams, afirmou neste ano, perante o Senado americano, que é praxe da Meta identificar quando jovens se sentem mais frágeis para ajudar anunciantes com “oportunidades de venda”. Na semana passada, houve novo vazamento. Desta vez, das diretrizes de “ética” da Meta para inteligência artificial. Ora, pois. Nenhuma surpresa ali.

A bomba que saiu da mala de rodinha de Dino, por Maria Cristina Fernandes

Valor /Econômico

Ministro invalida eficácia da lei Magnitsky no Brasil, abre contecioso com os bancos e com o governo americano

Na quinta-feira à noite, o ministro Flávio Dino embarcou para São Luís levando, como de costume, uma mala de rodinha cheia de processos, a mesma que arrasta todas as noites para casa em Brasília. Não compareceu ao evento mais fervilhante do fim de semana, o aniversário de 73 anos da advogada Guiomar Feitosa, esposa do ministro Gilmar Mendes, que reuniu colegas de Corte, ministros do Executivo, governadores, parlamentares e empresários. Ainda de São Luís, despachou, no fim da manhã desta segunda-feira, a decisão que colocou os diretores de conformidade dos bancos entre cumprir a Lei Magnitsky e afrontar Dino ou seguir a decisão do ministro e ignorar a sanção americana.

A decisão não menciona a Magnitsky, mas não poderia ser mais clara. Refere-se a uma ação, movida pelo Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) contra a litigância de 59 municípios de três Estados (MG, BA e ES) e entidades como a Confederação Nacional das Indústrias e a Federação das Indústrias do Espírito Santo e de Minas Gerais em tribunais do Reino Unido, da Alemanha e da Holanda contra mineradoras e empresas arroladas pelo rompimento de barragens mineiras de Mariana e Brumadinho.

Reação do STF, interna e externa, por Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

STF pega em armas para se defender e, se necessário, contra-atacar quem o ataca

Na falta de munição do governo, e de diálogo entre Lula e Trump contra os ataques americanos, quem toma as rédeas da resistência aos EUA é o Supremo, buscando uma agora incerta união interna e articulando reações consensuais contra as ameaças que vêm de fora: de Trump e da família Bolsonaro.

Sem citar a Lei Magnitsky contra Alexandre de Moraes, mas evidentemente em resposta a ela e aos EUA, o ministro Flávio Dino decidiu que leis e determinações estrangeiras não têm valor contra brasileiros, bens e empresas instalados no Brasil e acordos jurídicos selados no País. A violação dessas regras, acentuou, configura “ofensa à soberania nacional, à ordem pública e aos bons costumes”.

Os ratos na ratoeira, por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Na sexta, Flávio Bolsonaro disse que o Brasil terá “o trágico destino” de os EUA não reconhecerem suas eleições, caso Jair Bolsonaro não a dispute. Fala garantida pela nave Magnitsky, que Trump estacionou sobre o País. Os bolsonaristas vão radicalizar; sabem que o chamado Centrão já se articula para futuro sem o ex-presidente.

No domingo, Carlos Bolsonaro publicou que os “governadores democráticos” – como classifica tarcísios e outros caiados – são “ratos”, que “sacrificam o povo pelo poder”, que “não representam o coração do povo” e que, preocupados “com seus projetos pessoais”, “querem apenas herdar o espólio de Bolsonaro”.

Programa Mais Médicos: um legado democrático, científico e humanitário, por Maria Fátima Sousa*

Correio Braziliense

O Mais Médicos significou a redução de desigualdades e ampliou o direito ao cuidado em saúde a milhões de pessoas. Inúmeras pesquisas indicaram o caráter inestimável da política

Segundo o Ministério da Saúde, o país conta com 26.414 médicos vinculados ao Programa Mais Médicos pelo Brasil, em quase 82% dos municípios. Segundo a Demografia Médica no Brasil 2025, em dezembro de 2024, havia 353.287 médicos especialistas e 244.141 médicos generalistas. Deveríamos desfrutar de uma assistência ampla e equânime; no entanto, o mesmo estudo revela que a maioria dos profissionais está concentrada na rede privada.

Instituído pela Lei nº 12.871/2013, durante o governo da presidenta Dilma Rousseff, sob a liderança do ministro da Saúde Alexandre Padilha, o Programa Mais Médicos constituiu-se como uma das políticas públicas mais inovadoras e estratégicas para o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS), incluindo a formação de especialistas em medicina de família e comunidade, cuja legislação atualizada pela Medida Provisória 1.165/2023 estabeleceu a Estratégia Nacional de Formação de Especialistas para a Saúde no âmbito do programa.

Soberania ou interesse nacional, por Joel Pinheiro da Fonseca

Folha de Paulo

Inteligência e estratégia nos levarão muito mais longe do que gestos grandiosos de afirmação

A soberania nacional é um valor importante. Mas não é o único. E se a afirmação dela colocar em risco o bem-estar das pessoas e empresas do nosso país, aí é questão de pensar duas vezes antes de fazer grandes gestos de enfrentamento à ingerência de potências estrangeiras.

É o que Flávio Dino faz ao decidir que leis e ordens unilaterais estrangeiras não valem no Brasil. A decisão foi tomada no contexto de nossa relação com a Justiça inglesa e o desastre de Mariana. Seu impacto maior, contudo, está na aplicação das sanções da Lei Magnitsky a instituições financeiras brasileiras. Segundo a decisão, antes de obedecer a determinações estrangeiras, estas precisam ser homologadas pela Justiça. Será que o Supremo homologará as sanções Magnitsky?

Licença para transgredir, por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Foco do Congresso é voltar ao tempo em que ações do Supremo dependiam de aval dos parlamentares

O presidente da Câmara dos Deputados apregoa rejeição à anistia ampla a golpistas e impõe reparos ao fim do foro privilegiado para deputados e senadores, mas avisa que há "ambiente na Casa" para tirar do Supremo Tribunal Federal o poder de abrir ações contra parlamentares.

Hugo Motta (Republicanos-PB) vocaliza, assim, o desejo primordial reinante no Congresso: a retirada definitiva de seus pares do alcance dos rigores do STF.

É a maneira mais eficiente de assegurar que ali não se instaurariam inquéritos como as dezenas que correm para apurar ilícitos no uso de emendas ao Orçamento.

Trump age como pistoleiro de Putin, por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Ao constranger Ucrânia a aceitar perdas, presidente americano também golpeia ordem mundial baseada em regras

Pela ótica do realismo, a Ucrânia não teria muita chance em guerra de atrito contra a Rússia. A população russa é mais de três vezes maior que a ucraniana, e Moscou tem muito mais recursos bélicos à sua disposição. Num conflito longo, o tempo joga a favor de Vladimir Putin.

Para tornar o quadro mais desfavorável a Kiev, a máquina militar ucraniana é totalmente dependente de ajuda ocidental. E ninguém, nem mesmo Blanche DuBois, protagonista de "Um Bonde Chamado Desejo", poderia razoavelmente esperar que a "generosidade de estranhos" fosse eterna. Era mais ou menos fatal que, com o tempo, a ajuda oferecida pelos EUA (até Donald Trump) e pelos vizinhos europeus diminuísse, mesmo porque os países da UE precisam agora, diante da ameaça russa, direcionar mais recursos para seus próprios exércitos.

Felca revela, bolsonaristas escondem, por Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Influenciador sacudiu a opinião pública, mas bolsonaristas querem travar projeto contra violência sexual infantil

Afeito a obstruções e viagens de turismo 0800, o Congresso Nacional está devagar —e às vezes é forçado a parar. O ano de 2025, se acabasse hoje, estaria perdido para aqueles que têm a obrigação de criar, alterar e revogar leis. A maioria está mais interessada em viver com a cara enfiada no celular, faturar com emendas secretas e promover a própria blindagem. Além de relativizar os ataques de Trump ao Brasil.

A PEC da Segurança, por exemplo. Já aprovada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, aguarda a votação em plenário, mas não há sinal disso.

Se está acabando el tiempo para los golpistas, por Fernando de la Cuadra

El Clarin (Chile)

Ya existe fecha para la condenación de los golpistas. El ministro Cristiano Zanin, presidente de la Primera Turma del Supremo Tribunal Federal fijó para el próximo 2 de septiembre el inicio del juicio final de la acción penal en la que a partir de ese día y hasta el 12 del mismo mes, los cinco ministros que integran esa turma del STF deberán pronunciarse sobre la inocencia o culpabilidad del llamado “núcleo crucial” del golpe, que incluye a Jair Bolsonaro y otros siete cómplices procesados por los crímenes de intento de Golpe de Estado, organización criminal armada, abolición violenta del Estado Democrático de Derecho, daño calificado de la infraestructura pública y destrucción del patrimonio nacional.

La etapa final de esta causa comienza con el Procurador General de la República, Paulo Gonet, que sustentará durante una hora los aspectos centrales de la acusación contra los 8 inculpados. Luego los abogados de los reos deberán realizar sus respectivas defensas orales. Después viene la exposición del ministro relator del caso, Alexandre de Moraes, seguido por los otros cuatro ministros de la primera turma. Por lo tanto, la expectativa es que el viernes 12 de septiembre salga el veredicto final, excepto que uno de los ministros solicite un “pedido de vistas”, es decir, un mayor plazo para analizar las acusaciones contra los procesados, lo cual puede retardar la decisión final de los jueces por hasta 90 días.

Poesia | Verbo Ser, de Carlos Drummond de Andrade

 

Música | Beth Carvalho — Feito o Mar, de Moacyr Luz e Aldir Blanc