quarta-feira, 13 de agosto de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Punição a motim no Congresso deve ser ágil e rigorosa

O Globo

Atos do corregedor e histórico sugerem sanções brandas aos amotinados. Parlamento sairia desmoralizado

Diante do espetáculo deprimente de atropelo das normas regimentais protagonizado por parlamentares durante o motim de 30 horas no Congresso na semana passada, é de esperar que a Casa reaja com presteza e rigor. Até para que os acontecimentos não se repitam. Mas, a julgar pelos primeiros movimentos da Corregedoria, que analisará o comportamento de 14 deputados acusados de envolvimento no episódio, a celeridade ficará para depois.

O corregedor parlamentar, deputado Diego Coronel (PSD-BA), decidiu adotar um rito longo, com prazo de 50 dias úteis. Inicialmente, a previsão era de 48 horas, como estabelecido em ato da Mesa Diretora assinado em maio pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Coronel se baseou noutro ato, de 2009, que concede prazo maior. Afirmou que cada uma das 14 representações será analisada de forma individual, descartando sanções coletivas. As punições previstas vão de simples advertência a suspensão do mandato por até seis meses.

Tudo ainda por fazer - Vera Magalhães

O Globo

De crise em crise, projetos se acumulam no Legislativo e carro-chefe de Lula corre riscos

De paralisação em paralisação, a verdade é que 2025 é um ano que ainda não começou no Congresso Nacional. As cenas do motim incivilizado dos bolsonaristas só escancararam o funcionamento precário que já vinha do primeiro semestre e, agora, faz com que haja uma pauta quilométrica e irreal a cobrir até o fim do ano.

A queda de braço entre Executivo e Legislativo para o cumprimento da meta fiscal foi um dos fatores a explicar a inação, mas não o único. Depois, a briga em torno da elevação do IOF para várias operações foi engolfada pelo susto do tarifaço dos Estados Unidos sobre produtos brasileiros, e aquela discussão também resta inconclusa.

Com uma crise atropelando a outra, vai sobrando pouco tempo para discutir com o rigor necessário o projeto que amplia a faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física para quem ganha até R$ 5 mil mensais. Era o carro-chefe de Lula para o ano, tratado internamente no governo como marca simbólica do terceiro mandato, assim como foram Bolsa Família, Prouni, cotas e PAC em mandatos anteriores. Agora, o relator Arthur Lira (PP-AL) já diz que a votação da matéria pode ficar para dezembro, mês sabidamente corrido, tomado pela necessidade (não cumprida no ano passado, diga-se) de votar o Orçamento da União.

Gritos na Esplanada - Bernardo Mello Franco

O Globo

A professora Eneá de Stutz afirma ter sido vítima de assédio moral na Comissão de Anistia do governo federal.

Ela renunciou ao cargo de conselheira no último dia 2, sete meses depois de ser afastada da presidência do órgão. Antes disso, diz ter relatado os episódios à ministra dos Direitos Humanos, Macaé Evaristo.

Segundo Stutz, a ministra não tomou providências e evitou recebê-la novamente após ouvir as queixas, em dezembro de 2024. “Cansei de apanhar. Não me restou outra alternativa a não ser deixar a comissão”, afirma. Em nota, a pasta sustenta que Evaristo “não tinha conhecimento das denúncias”.

Votar a anistia é o melhor remédio – Elio Gaspari

O Globo

Depois da muvuca bolsonarista da semana passada, parlamentares ligados ao presidente da Câmara, deputado Hugo Motta, bem como alguns petistas, passaram a defender a votação de um projeto de anistia para os golpistas de 2022/23. Ele já recebeu o número suficiente de assinaturas para tramitar com rapidez. Engavetá-lo equivale a igualá-lo à tática (carnavalesca) da obstrução dos demais trabalhos da Câmara. Seriam formas distintas de interdição dos debates. Uma é legal e a outra, além de ridícula, é ilegal.

Desde a Independência, quase todas as gerações de brasileiros viveram revoltas e 48 anistias. Algumas, como a de 1979, foram pacificadoras. Outras, como a que Juscelino Kubitschek mandou ao Congresso em 1959, perdoando os militares revoltosos de Aragarças, foram simples gambiarras. Cinco anos depois, os anistiados entraram no bloco da deposição de João Goulart, humilharam, cassaram e exilaram JK. Ele morreu em 1976 sem recuperar a plenitude de seus direitos políticos. O major Haroldo Veloso, líder da revolta, voltou à Força Aérea, chegou à patente de brigadeiro e, em 1966, elegeu-se deputado federal pelo partido do governo.

Poucos precisam poupar no Brasil - Nilson Teixeira

Valor Econômico

Regras do BPC estimulam a informalidade e desestimulam a contribuição previdenciária

O Brasil é, e provavelmente continuará sendo, um país em que se poupa pouco. A taxa de poupança de uma nação depende de fatores como crescimento, estrutura etária, produtividade, propensão a investir, escolaridade, juros reais, estabilidade da inflação, previsibilidade, qualidade do sistema financeiro, profundidade do mercado de crédito, solvência da dívida pública, magnitude das políticas previdenciárias e de proteção social, incentivos à poupança e aspectos culturais. No Brasil, esses condicionantes ajudam a explicar por que a taxa de poupança está há anos em torno de 15% do PIB, abaixo da média dos países da OCDE e insuficiente para sustentar crescimento superior a 2,0% ao ano por período prolongado.

A enorme concentração de renda tem limitado a poupança no Brasil, pois os mais pobres têm alta propensão a consumir, agravada por baixa educação financeira e pouco acesso a instrumentos que estimulem a poupança. A isso se soma um ambiente volátil, com períodos de elevada inflação, crises cambiais e instabilidade fiscal, que reforça a preferência por ativos de curto prazo e baixo risco.

Recondução de Gonet na PGR entra no xadrez - Fernando Exman

Valor Econômico

Políticos estão de olho em cada passo que o PGR dá em relação ao julgamento da tentativa de golpe e aos casos envolvendo emendas parlamentares

No xadrez político jogado em Brasília, a todo momento há quem pense algumas jogadas à frente. Fazem parte desse seleto grupo de estrategistas articuladores do governo, líderes da oposição e, sempre eles, integrantes do Centrão. Pois os jogadores já começam a formular cenários sobre a reta final do mandato do procurador-geral da República, Paulo Gonet, a grande probabilidade de o presidente Lula decidir reconduzi-lo ao posto para mais dois anos e o “timing” que o Palácio do Planalto deveria encaminhar a indicação ao Congresso.

O difícil diálogo com a Casa Branca - Lu Aiko Otta

Valor Econômico

Dificuldade não significa que o Brasil sairá da mesa de negociações com os EUA

Até a próxima segunda-feira, administração pública e empresas brasileiras enviarão ao Representante Comercial dos EUA (USTR, na sigla em inglês), suas manifestações a respeito da investigação aberta por aquele órgão a respeito de supostas práticas brasileiras que estariam prejudicando a competitividade das empresas americanas. Entre elas, o Pix e o comércio na 25 de Março, passando pelo desmatamento, o combate à corrupção e a regulação das plataformas digitais.

Uma audiência pública está marcada para 3 de setembro e o desfecho do processo preocupa: pode resultar na aplicação de mais tarifas no comércio, entre outras punições.

As redes sociais e o crime organizado - Marcelo Godoy

O Estado de S. Paulo

O que está por trás da falta de controle dos meios digitais é saber quem paga a conta da fiscalização

O País precisou do vídeo do influenciador Felca para conhecer a realidade exibida no relatório Hiding in Plain Sigh, Instagram Violates the DSA by Serving as a Gateway for a Vast Network of Pedophiles (Escondido à vista de todos: Instagram viola o DSA ao servir como porta de entrada para uma vasta rede de pedófilos).

DSA é o Digital Services Act, a legislação da União Europeia para a internet. O relatório de 2024 é da Alliance Counter Digital Crime. A empresa que abriga tais publicações já teve tempo para tomar providências contra a exploração da pedofilia. Teria de gastar dinheiro em mecanismos de controle e para que seu algoritmo não favorecesse pedófilos ou promovesse anúncios pagos do crime organizado feitos com IA. A Meta diz não permitir e remover esse tipo de conteúdo.

O casamento chinês - Fábio Alves

O Estado de S. Paulo

A China já se aproxima da fronteira tecnológica da produtividade. Resta estimular o amor

Em meio a uma corrida demográfica contra a Índia, as autoridades da China devem ter achado que está faltando amor aos casais chineses ao decidir dar um empurrãozinho para elevar a taxa de natalidade: oferecer dinheiro para os gastos com cada filho que nascer. Isso porque não bastou revogar, em 2016, a lei que limitava as famílias chinesas a um único filho – em vigor a partir do fim da década de 1970 – para evitar a queda e o envelhecimento da população.

Pecadores ou sobre tempos amaldiçoados, por Vagner Gomes*

Em memória de Ney Latorraca, que atuou na novela “Vamp” (no “colorido” ano de 1991).

Depois de ser aclamado, particularmente entre os jovens, pelos filmes “Pantera Negra” e “Pantera Negra: Wakanda para sempre”, Ryan Coogler surpreende a muitos com um filme que resgata um pouco da matriz do pensamento social norte-americano que fundamentou o movimento negro. Sugerimos uma inspiração a partir de W. E. B. Du Bois (1868 – 1963) que nos legou o livro As almas do povo negro (1903), onde as “sedimentações do passado” podem revelar o significado do que é ser negro.

Assombrações em plena recessão da economia norte-americana, estamos no Delta do Mississipi em pleno ano de 1932. A segregação racial norte-americana, que muito marcou as observações de Gilberto Freyre quando lá esteve, tinha ainda o peso de um mundo que estava há poucos meses da ascensão de Hitler ao poder na Alemanha, em 30 de janeiro de 1933¹.

O filme tem essa padronização de terror que emergia na realidade; portanto, o branco dos latifúndios de algodão contrastava com os braços negros que colhiam em troca de “moedas de mentirinha” (cada proprietário negociava a produção colhida dos meeiros com moedas de sua fazenda, o que lhes deixavam ainda mais sob a dependência). Esses eram os verdadeiros vampiros, que moldaram seus herdeiros ressentidos após os anos das conquistas dos Direitos Civis.

Oba, agora sou meu patrão! Afinal, quem precisa de direitos? - Cláudio Carraly*

Uma das operações discursivas mais bem-sucedidas das últimas décadas foi a transformação semântica da precarização do trabalho no palatável e amplo termo de "empreendedorismo". O que antes era inequivocamente reconhecido como degradação das condições mínimas de qualidade laboral ganhou uma nova roupagem linguística e um verniz midiático que não apenas mascarou a realidade, mas a tornou desejável aos mais incautos.

O chamado “rebranding” que é o ato de ressignificar a imagem de uma empresa ou produto, ou seja, uma estratégia planejada, cujo objetivo é mudar a percepção do público com relação à marca. No caso da transformação de precarização do trabalho em empreendedorismo foi profundamente exitosa, a instabilidade virou "flexibilidade". A ausência total de direitos trabalhistas se tornou "liberdade". A transferência integral do risco econômico para o trabalhador foi rebatizada como "ser dono do próprio negócio". As jornadas sem limite se transformaram em "mentalidade empreendedora". A falta de proteção social passou a ser "autonomia profissional".

O vídeo de Felca e os golpistas – Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Adeptos da 'pauta moral' correram para legislar contra abuso de crianças nas redes

Quem tem crianças na escola e acompanha grupos de mães e pais de estudantes em WhatsApp lia pelo menos desde a sexta-feira passada uma inundação de alertas a respeito de um vídeo do influenciador digital Felipe Bressanim Pereira, 27, o Felca, que denunciava explorações variadas de crianças em mídias de plataformas sociais. Publicado na quarta passada, dia 6, o vídeo tinha quase 34 milhões de visualizações até o final da tarde desta terça, 12.

Quem vive no mundo real, muito digital e formatado culturalmente pelas más influências algorítmicas e conspirações da desrazão, sabe disso tudo e muito mais. Pelo bem ou pelo mal, deputados federais resolveram tomar uma atitude ou, pelo menos, tirar uma casquinha da repercussão do que disse Felca.

Candidato danifica o presidente - Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Excesso no uso político do tarifaço pode levar população a julgar Lula sob a ótica do oportunismo eleitoral

O Brasil sob a investida hostil da maior potência mundial desvela situação de gravidade ímpar que pode ainda se aprofundar, dado o horizonte de incertezas.

Tal circunstância exigiria de lideranças responsáveis tino estratégico, senso de risco, capacidade de contornar obstáculos decorrentes do desequilíbrio de forças, sobriedade nas falas e atenção aos protocolos institucionais.

Um elenco básico de fatores, cujo observador e condutor principal em sistema presidencialista, por óbvio, deveria ser o chefe da nação.

A crença na 'ditadura de toga', arma política do Bolsonarismo - Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

Narrativa contra STF organiza frustrações, reforça laços e justifica ações antidemocráticas

Conheço ao menos uma pessoa que considera um "ato de justiça" ver Alexandre de Moraes enforcado em praça pública. Quem estava ao redor, quando ela fez a declaração em alto e bom som, descontou o exagero retórico, mas concordou com a essência.

Não se trata apenas de Moraes, mas, no limite, de todo o Poder Judiciário e até do Ministério Público. Alexandre funciona, nesse enredo, como síntese e personificação —útil para fins narrativos e para organizar o ódio coletivo— da convicção de que certas pessoas e instituições existem para destruir "o nosso lado", a direita bolsonarista.

Também conheço muitos que defendem o impeachment do magistrado. Alguns apenas afirmam que, cedo ou tarde, isso ocorrerá; outros sustentam que a medida deveria ser tomada já, no auge da convulsão política. Estes últimos estão convencidos de que a entrega da cabeça de Moraes seria o único sacrifício capaz de aplacar a suposta "justa fúria" de Trump contra o Brasil.

Mulheres devem ter direito a voto? - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Secretário de Defesa dos EUA elogia vídeo de pastores conservadores que se dizem contrários ao voto feminino

Pete Hegseth, o secretário de Defesa dos EUA, parece achar que não. Ele repostou em suas redes sociais e elogiou segmento de um programa da CNN no qual pastores de uma igreja cristã conservadora afirmam que mulheres não deveriam votar.

Para esse grupo de religiosos, liderados pelo pastor Doug Wilson, o direito a voto deveria ser familiar e não individual. Ele seria exercido pelos maridos, mas eles deveriam antes discutir o assunto com suas esposas.

E é aí que se decide o futuro - Paulo Baía

A história das sociedades humanas é também a história das batalhas invisíveis por símbolos e significados; por séculos, reis, impérios e religiões compreenderam que a força mais duradoura não se exerce apenas pela espada ou pelo decreto, mas pela capacidade de impregnar o imaginário coletivo com imagens, narrativas e crenças que parecem naturais, inevitáveis e eternas. Hoje, a extrema-direita compreendeu com uma nitidez impressionante que o verdadeiro poder se consolida quando se controla não apenas o que as pessoas pensam, mas como elas sentem diante das palavras, das bandeiras, das cores e dos gestos; que um símbolo carregado de emoção pode mover mais do que uma biblioteca inteira de argumentos.

Se, como ensinou Walter Benjamin, todo ato de transmissão cultural é também um ato político, então é preciso reconhecer que a guerra do nosso tempo não se trava apenas no parlamento ou nas urnas, mas nas ruas e nas redes, nos slogans e nas canções, nas metáforas que traduzem e distorcem a realidade. A extrema-direita compreendeu que cada hashtag é uma trincheira, que cada meme é uma flecha, que cada mito fabricado pode se infiltrar como verdade indiscutível nos recantos mais íntimos da consciência coletiva; e nós, tantas vezes, ficamos aprisionados na ingenuidade de repetir, corrigir, refutar, sem perceber que, ao fazê-lo, reforçamos os mesmos marcos simbólicos que nos aprisionam.

Poesia | E então que quereis, de Vladimir Maiakovski

 

Música | Milton Nascimento - Club da Esquina 2 (Lô Borges e Márcio Borges)