quarta-feira, 20 de agosto de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Não faltam obstáculos para a paz na Ucrânia

O Globo

Europeus fazem bem em se mostrar unidos com Zelensky. Mas demandas de Putin mostram que ele quer guerra

Os principais líderes europeus fizeram bem em interromper as férias para participar na Casa Branca — em conjunto, com mensagem firme e clara — do encontro entre os presidentes americano, Donald Trump, e ucraniano, Volodymyr Zelensky. Afinados, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, o chanceler alemão, Friedrich Merz, o presidente francês, Emmanuel Macron, o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, e a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, demostraram uma união imprescindível em defesa da Ucrânia. Obtiveram de Trump a promessa de uma reunião futura de Zelensky com o russo Vladimir Putin, seguida de um insólito encontro trilateral, com o próprio Trump, para firmar um acordo de paz que encerre a guerra de mais de três anos.

Moraes não é o único alvo, por Vera Magalhães

O Globo

Consequências de aquiescer com o emprego extensivo de sanções podem atingir até os que hoje celebram castigos impostos a Alexandre de Moraes

Mesmo aqueles que fazem severos reparos às decisões de Alexandre de Moraes nos processos por ele relatados deveriam se preocupar com as consequências da aplicação da Lei Magnitsky contra o ministro, ainda mais se prevalecer a extensão que alguns querem dar às sanções.

Para além do inaceitável precedente de uma nação pressionando outra a rever decisões de Poder Judiciário autônomo e independente deturpando o escopo de uma lei, os demais reflexos do tipo de submissão que pode ser exigido das instituições financeiras são um risco gravíssimo à soberania nacional e à segurança de todo o sistema bancário. Isso não diz respeito apenas a Moraes, mas a todas as autoridades e empresas e a cada cidadão brasileiro. Uma vez que se ceda sem resistência, qualquer um pode ser alvo.

Centrão com esteroides, por Bernardo Mello Franco

O Globo

Supermáquina partidária nasce com discurso de oposição, mas não entrega cargos no governo

União Brasil e PP lançaram ontem uma supermáquina partidária. A federação nasceu com discurso oposicionista, mas já avisou que não vai entregar os cargos no governo. Continuará a comandar quatro ministérios, além da Caixa Econômica Federal e da Codevasf.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, descreveu a aliança como um “movimento político grandioso”. Por enquanto, trata-se de um grande negócio para seus dirigentes. Juntos, eles devem abocanhar quase R$ 1 bilhão do fundo eleitoral em 2026.

A União Progressista vai controlar as maiores bancadas da Câmara e do Senado, com 109 deputados e 15 senadores. Apesar do gigantismo, não deve lançar candidato próprio ao Planalto. “Temos grandes nomes, mas talvez não seja a hora de sermos a cabeça”, disse o presidente do PP, Ciro Nogueira.

Diplomacia americana faz presepada, por Elio Gaspari

O Globo

Os EUA já tiveram política externa, hoje têm eventos

O secretário do Tesouro dos Estados Unidos posou ao lado de Eduardo Bolsonaro no dia em que deveria ter mantido uma reunião virtual com o ministro Fernando Haddad. Não foi uma simples descortesia, foi uma presepada. Scott Bessent ocupa uma cadeira onde estiveram titãs das finanças americanas. Não há registro de episódios semelhantes.

Deve-se mandar ao arquivo qualquer ideia de negociação pública com o governo Donald Trump. Seu Salão Oval e seus ministros tornaram-se radioativos. O melhor a fazer é seguir o exemplo da China: poucas palavras e muita conversa reservada.

No caso do Brasil, Trump conseguiu um inimigo ideal. Lula fala dele dia sim, dia não. Ministros maravilhavam-se com a ideia de conduzir negociações até que Bessent fritou Haddad. Com o gosto trumpista pelo teatro, tiveram o reforço de Eduardo Bolsonaro, oferecendo-se para fotos e para o papel de irradiador de ameaças.

O vento começa favorável para o governo na CPMI do INSS, por Fernando Exman

Valor Econômico

Discurso de que já assegurou o pagamento de 99,35% das vítimas é um trunfo a ser utilizado, mas nem de longe garante que Lula sairá ileso no fim

A CPMI do INSS, que tem instalação marcada para esta quarta-feira (20), começa em um cenário relativamente favorável para o governo Lula. Sim, é verdade: quando se trata de comissões parlamentares de inquérito, sempre se deve lembrar da célebre frase do ex-presidente da Câmara dos Deputados Ulysses Guimarães, segundo a qual “CPI a gente sabe como começa, mas não sabe como termina”. Pode-se dizer, contudo, que até agora o roteiro traçado no Palácio do Planalto foi bem-sucedido.

Falta espaço fiscal para exercer a soberania, por Lu Aiko Otta

Valor Econômico

Orçamento deixa pouca margem de manobra para responder a emergências

Medida das mais aguardadas pelas indústrias atingidas pelo tarifaço, o aumento da alíquota do Reintegra de 0,1% para 3,1% entrou e saiu do Plano Brasil Soberano várias vezes na reta final de fechamento do pacote. “No fim, foi reintegrado”, brincou um membro do governo.

Mas, para isso, foi preciso pedir ao Congresso Nacional uma dispensa em relação às regras fiscais, o que mostra o difícil convívio do governo com um Orçamento que deixa pouca margem de manobra para responder a emergências.

O Reintegra dá um crédito tributário às empresas exportadoras, para compensar resíduos de impostos que ficam no preço da mercadoria. Era de 0,1%.

Tordesilhas no Alasca? Por Roberto DaMatta

O Estado de S. Paulo

É o que temos porque ninguém escapa da condição humana cuja história – como revela a grande anistilândia brasileira, os bíblicos tarifaços americanos e o projeto putinesco de reunir a União Soviética – repetimos vivendo seus episódios como novidades – ou “avanços”.

Na história humana, o denominador comum não é a serenidade, mas o angustiante desconcerto diante da divergência nas concepções de vida e morte, da rotina e do inesperado, do dado e do fabricado – essas dimensões que permeiam todos os sistemas culturais conhecidos.

O denominador comum para lidar com as diferenças sempre foi o confronto, jamais a compreensão que, nos sistemas religiosos, surge com perdão e amor.

Virada no emprego ainda não está à vista, por Fábio Alves

O Estado de S. Paulo

Pelos dados fechados até o mês passado, o mercado de trabalho não mostra qualquer sinal de inflexão

A cada recorde registrado nos dados do mercado de trabalho nos últimos meses, com sucessivas surpresas em relação às estimativas de analistas, parece cada vez mais esquivo o objetivo do Banco Central de esfriar a demanda e reduzir a pressão sobre os preços de serviços, ainda muito acima da meta de inflação de 3%. Por tabela, os sinais de desaceleração da economia brasileira são incipientes demais para dar respaldo ao início de um ciclo de cortes de juros mais cedo do que tarde.

Mesmo com a taxa Selic a 15%, a crua realidade é de que o mercado de trabalho não mostra qualquer sinal de inflexão. No trimestre encerrado em junho, a taxa de desemprego, de 5,8%, foi a menor da série histórica do IBGE. A população ocupada estimada (102,3 milhões de pessoas) é a maior desde que a estatística foi iniciada, em 2012.

Museu do Trincheira tropical, por Cristovam Buarque

Correio Braziliense

Em Trincheira tropical, Ruy Castro deslumbra o leitor levando-o pelas ruas do Rio de Janeiro nos anos da Segunda Guerra Mundial. Nos conduz entre os personagens que participaram da vida política, militar e cultural daquele período

Muitos historiadores assumem a função de astrônomos do passado, observam, analisam, explicam, mas não guiam os leitores pelos caminhos da história. Ruy Castro não se limita a essa astronomia: ele nos conduz como um guia caminhando pelo passado, mostrando como era a sociedade no tempo que estuda. Em Trincheira tropical, deslumbra o leitor levando-o pelas ruas do Rio de Janeiro nos anos da Segunda Guerra Mundial. Mostra a cidade e o país no cenário naquele tempo, desvenda e conta os bastidores dos debates políticos e seus movimentos consequentes, ao mesmo tempo em que narra a vida que seguia. Ruy nos conduz entre os personagens que participaram da vida política, militar e cultural daquele período, por um fascinante passeio pelo passado. Não se arvora em astrônomo, mas em guia de museu vivo. Os livros de história nos trazem o passado, Trincheira tropical nos leva ao passado. Graças ao olhar do historiador e sua imensa bagagem de informações, assistimos como testemunhas aos fatos daqueles anos. Trincheira tropical é um ponto de observação a partir do qual podemos perceber e caminhar pelo passado em um momento decisivo da história mundial e nacional.

Livro clássico mostrou que o fascismo pode brotar na democracia, por Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

'A Personalidade Autoritária', de 1950, inaugurou uma agenda de pesquisa sobre as bases psicológicas do autoritarismo  

Este ano completa-se o 75º aniversário de "A Personalidade Autoritária", obra monumental publicada em 1950 por Adorno, Frenkel-Brunswik, Levinson e Sanford, que inaugurou uma agenda de pesquisa ainda atual sobre intolerância política e as bases psicológicas do autoritarismo.

Pela primeira vez, psicanálisepsicologia sociologia foram mobilizadas de modo integrado para enfrentar uma questão que, tanto no pós-guerra quanto hoje, se impõe com urgência: como sociedades democráticas podem gerar cidadãos predispostos a aderir a ideologias autoritárias.

A primeira grande inovação foi a virada copernicana que deslocou o centro da análise. Em vez de estudar a ideologia fascista —seus movimentos sociais, discursos, partidos e programas—, os autores voltaram-se aos indivíduos e às suas atitudes, isto é, às disposições subjetivas que estruturam o modo como as pessoas percebem o mundo social.

As atitudes autoritárias, sustentam, correlacionam-se de forma estável em um conjunto recorrente de sintomas psicológicos e sociais: conformismo, submissão à autoridade, intolerância à ambiguidade, agressividade contra grupos minoritários, rigidez moral e preconceito. Não é preciso militância aberta: basta que essas disposições, formadas desde a infância, estejam latentes.

Virar a chave é preciso, por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Nessa toada de atritos, a eleição de 2026 encontrará o país ainda preso na armadilha do fanatismo

Enquanto se discutem os efeitos da crise com os Estados Unidos e da possível condenação de Jair Bolsonaro (PL) no Supremo Tribunal Federal, o país segue a reboque da queda de braço permanente entre os agrupamentos liderados por Luiz Inácio da Silva (PT) e seu antecessor.

A nenhum dos dois interessa a distensão do ambiente radicalizado no qual ambos alimentam suas performances e se mantêm relevantes na cena.

Essa dinâmica é paralisante e ficou ainda mais solidificada agora quando a ofensiva de Donald Trump acrescentou a ela o fator externo, mostrando do que o imperialismo é capaz.

Efeito da conspiração Bolsonaro piora, por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

No caso extremo de sanções contra bancos, haveria danos sérios para empresas e investimento no Brasil

Enfim, apareceu o efeito do risco de que a economia brasileira possa apanhar por causa de sanções financeiras americanas, risco até aqui ignorado "no mercado" e pela maioria das autoridades brasileiras. Donald Trump pode fazer estrago profundo, pior do que impostos de importação mais altos.

As sanções financeiras americanas contra (até agora) Alexandre de Moraes podem, no limite, tornar impossíveis transações internacionais mediadas por bancos brasileiros com sede nos EUA ou relacionados a instituições financeiras, empresas e pessoas sujeitos à jurisdição americana. Uma desgraça econômica.

Legislação instagramável, por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Redes sociais afetaram comportamento de parlamentares, que parecem mais interessados em likes do que em fazer boas leis

Até uns 15 anos atrás, parlamentares em busca de visibilidade precisavam cavar um espacinho em "A Voz do Brasil". As redes sociais subverteram essa lógica. Hoje, cada congressista pode ser o editor de si mesmo, registrando sua atividade na Câmara ou no Senado e disponibilizando o vídeo diretamente a seu público.

A mudança não veio sem efeitos colaterais. A performance, que em algum grau já competia com o conteúdo, se tornou muito mais importante do que ele. As propostas apresentadas pelos parlamentares não precisam ser boas, factíveis e nem mesmo ser aprovadas em plenário. Basta que o deputado ou senador passe a mensagem que seu eleitor quer ouvir, que ela se traduzirá em likes e talvez também votos no próximo pleito.

A grande substituição, por João Pereira Coutinho

Folha de S. Paulo

Na Itália, o número de animais de estimação aumenta enquanto a taxa de natalidade afunda, afirma o jornal Financial Times

"Quanto mais conheço os homens, mais estimo os cachorros", teria dito Lord Byron.

Os italianos concordam. Leio no Financial Times que o aeroporto de Roma tem um hotel de luxo, com salão de massagens e jardim comunitário, para que os viajantes possam deixar seus cachorros antes de embarcar.

O fenômeno se explica com números: 40% das casas italianas já têm um animal de estimação. É muito? Para a Itália, talvez. Não para o Reino Unido (60%) ou para os Estados Unidos (66%).

Atrás desses números existe uma economia gigantesca —comida gourmet, vestuário, clínicas, creches, serviços funerários et cetera— que movimenta bilhões de euros por ano e só confirma a crescente humanização dos bichos.

Eu próprio, confesso, já assisti ao funeral de um cachorro por ser amigo dos donos. Teve direito a discurso emotivo e vídeo com os melhores momentos do defunto.

Era inevitável. A "modernidade líquida", como ensinava um sociólogo célebre, dissolveu as estruturas tradicionais (e sólidas) que enquadravam a vida dos indivíduos. Família? Comunidade? Religião?

Poesia | Manuel Bandeira - Profundamente

 

Música | Olívia Byington & João Carlos Assis Brasil - SERTÃO DO CAICÓ - BACCHIANA Nº 5 - MELODIA SENTIMENTAL