segunda-feira, 17 de junho de 2013

O pensamento político de Armênio Guedes

2013 – Eu fazia política sempre olhando para a realidade. "Eu entrei no Partido Comunista em 1935. Foi um ano de grande agitação no Brasil. Foi quando também prestei vestibular na Faculdade de Direito da Bahia. E ai... já tinha os grupos políticos bem definidos: tinham os integralistas e nós os comunistas, de outro; e os democratas com os quais os comunistas procuravam se aliar contra a ameaça fascista que pairava sobre o Brasil naquela tempo.

Eu fazia política sempre olhando para a realidade e inspirado na utopia da transformação socialista. Mas essa utopia não impedia que... Eu digo isso: é uma virtude do Partido Comunista, sua militância sempre era em prol da questão nacional, pela democratização do país, pelas liberdades".

Cf. O programa do Jô, do dia 12/6/2013

1956 - O dogmatismo impediu-nos de refletir, no pensamento político, a realidade do país. “E sem este fator – conhecimento da realidade – era impossível ter uma tática elaborada. A tática foi rebaixada à condição de mera agitação; partir das denuncias e, através apenas da propaganda, ganhar as massas para as lutas decisivas, para a mudança de regime. Nunca se levou em conta a importância de participar do movimento real.

Por desconhecer a realidade, inspirada tão só pelos objetivos finais, o PCB realizou sempre (tomando-se para exame do problema um longo período) uma política voluntarista, com ignorância ou desprezo das leis objetivas.

Nossa política, normalmente, desconhece que a “missão fundamental da tática do proletariado” deve ser determinada em “rigorosa conexão com todas as premissas de sua concepção materialista e dialética do mundo”.

Na tática dos comunistas brasileiros, em geral, não encontramos esta conexão. Ela decorre de uma concepção falsa do movimento (idealista, metafísica), concepção que desconhece a relação (unidade) entre as duas formas de que ele se reveste, a evolutiva e a revolucionária.

A separação dessas duas formas do movimento conduz sempre, em política, a uma tática oportunista ou a uma tática radicalista. Para a primeira, existe apenas a evolutiva; para a segunda, apenas a revolucionária.

Se se parte das premissas materialistas para determinar a “missão fundamental da tática proletária”, tem-se que considerar o movimento em suas duas formas, a evolutiva e a revolucionária, considerar a relação entre elas, ou melhor, reconhecer que as modificações lentas, quantitativas, são completadas pelos saltos, constituindo as duas formas um processo único do desenvolvimento.

Partindo dessas premissas, Lênin chegou a uma conclusão geral sobre a tática:

“A tática do proletariado deve levar em conta, em cada grau do seu desenvolvimento, em cada momento, esta dialética objetivamente inevitável da história humana: de uma parte, aproveitando as épocas de estancamento político ou de desenvolvimento a passo de tartaruga, chamado “pacífico”, para desenvolver a consciência, a força e a capacidade combativa da classe de vanguarda e, de outra parte, orientando todo este trabalho de aproveitamento para a “meta final” do movimento da referida classe, capacitando-a para resolver praticamente as grandes tarefas nos grandes dias “em que se condensam vinte anos”. (V. I. Lênin, Marx, Engels y el Marxismo, pág. 43).

Por desconhecer a realidade e abstrair os caminhos peculiares, o Partido tirava sempre os seus elementos táticos dessa premissa – uma estratégia a curto prazo. Daí não dar importância às formas de aproximação, transitória (lei de todas as revoluções), não procurar investigar o específico de nossa revolução, a relação entre a luta democrática geral e a luta pelas transformações radicais. Não resolvendo esta questão, não podia solucionar uma outra, derivada: a luta pela mudança de governo como forma, caminho para a mudança de regime”.

Assim chegamos até o momento presente. Esses erros refletem-se agora na concepção de frente única, atualmente predominante no PCB, isto é, frente única em torno de pequenas reivindicações, tendo como fito ganhar as massas para a luta pela derrubada do regime. Faz-se frente única (ex.: nas últimas eleições em São Paulo) a fim de obter determinadas vantagens para o movimento (melhores condições para sua agitação e propaganda, etc.) com vistas a um objetivo remoto e não para mudar o tipo de governo. A idéia central dessa política é a da relação entre a frente única limitada e a frente democrática de libertação nacional.

Creio, no entanto, que é preciso encarar a questão através do seguinte ângulo: o objetivo não deve ser apenas a frente única por reivindicações parciais; deve visar à ação política pela criação de um governo de frente única antiimperialista (ou nacional-democrática ou antientreguista ou que nome tenha). (...).

* * *

Em face de tudo isso, coloca-se agora concretamente o problema da frente única em ligação com a atual situação política. Trata-se de alcançar um governo dessa frente única antiimperialista, mas como? Diante de nós bifurca-se o caminho: 1) existe a possibilidade de transformar o atual governo, alterando sua composição em favor das posições nacionalistas; 2) existe a possibilidade menos imediata, porém mais provável, de formar um governo desse tipo como resultante das eleições de 1958 e 1960.

Cf. Algumas ideias sobre a frente no no Brasil, in Revista Novos Tempos, set. de 1957.

1957 - A atual instabilidade do governo (JK) prolongar-se-á até que uma das forças em pugna imponha uma decisão que lhe seja favorável

“A luta entre as forças interessadas no desenvolvimento do país e os grupos entreguistas é uma constante da situação política atual do Brasil. Trata-se de uma luta que tende a se prolongar ainda por algum tempo. Como em todo embate desse tipo, teremos sempre, no curso do seu desenvolvimento, períodos de calmaria e momentos de tensão. Nos momentos de tensão, as forças em choque adquirem contornos mais definidos e, o que é mais importante, ampliam ou restringem suas fileiras. Não há dúvidas que historicamente as possibilidades de avanço são das forças nacionalistas. Mas tais possibilidades só se tornarão algo real pela ação consciente das forças sociais de vanguarda. Daí a necessidade de destacar, do conjunto da ação política concreta, aquilo que é positivo e que representa, muitas vezes, o ponto de partida para uma direção política acertada ou que, pelo menos, constitui um importante elemento de uma tal direção.

A situação atual, condicionada pelas dificuldades financeiras do país e pela pressão dos imperialistas norte-americanos para quebrar a resistência nacional aos seus planos da escravização, deu lugar a um novo período de tensão. Não sabemos se este período terminará com a recomposição ministerial em curso. E é difícil, por isso, dizer quem saiu ou sairá fortalecido do atual choque, se os grupos entreguistas ou o movimento nacionalista. (...)

É sob a pressão do movimento nacionalista que os novos ministros ocuparão os seus cargos. Certamente alguns deles são nomeados por imposição dos setores entreguistas. Mas isso não é o bastante para que mudem os rumos da política governamental, no sentido de liquidar os elementos nacionalistas que ela encerra e fazer preponderar e vencer o seu lado entreguista e reacionário.

Os últimos acontecimentos não levam à dedução de que uma das forças em choque já esteja em condições de impor uma decisão definitiva, isto é, empolgar o governo e imprimir sua fisionomia à política interna e externa do país. A atual instabilidade do governo — responsável pelos seus constantes vaivens — prolongar-se-á por algum tempo, até que uma das forças em pugna imponha uma decisão que lhe seja favorável.

O movimento nacionalista dispõe dos fatores essenciais para impor essa decisão, batendo os elementos entreguistas e reacionários. Já existem as premissas políticas essenciais para a formação de um governo nacionalista no Brasil. Mas é necessário vencer grandes e fortes obstáculos que se opõem a isso. Um dos primeiros passos a ser dado nesse sentido é terminar com a dispersão política e organizativa nas fileiras do movimento nacionalista. As forças nacionalistas, dispersas por vários partidos e organizações, não atingiram um grau de consciência e unidade de vistas que possibilite sua unificação no plano programático ou organizativo.

Deve haver um esforço permanente no sentido de coordenar as ações em plano local e nacional das diferentes correntes nacionalistas. Não se trata de impor formas rígidas de organização, o que seria impossível e estancaria o movimento, mas de elaborar idéias claras, ter soluções concretas para enfrentar as grandes e as pequenas questões da luta antiimperialista e, nessa base, ir estruturando a frente única em bases sólidas. Uma medida que impulsionaria esse esforço organizativo seria talvez a realização de reuniões de contato, em que seriam debatidos problemas do movimento nacionalista e estabelecidas as respectivas soluções.

Vencida a dispersão de suas forças, o movimento nacionalista cresceria rapidamente. Os comunistas, que já têm elaborado alguns pontos de vista sobre o movimento nacionalista, precisam colocar toda a sua experiência política a serviço da organização do movimento nacionalista. Esta é a linha mestra que deve orientar nossa atividade no decorrer da atual campanha eleitoral”.

Cf. Um ação positiva das forças nacionalistas, in Voz operária, 28, jun. 1958

1970 - O exame da situação induz a um otimismo realista

"As crises políticas que culminaram na indicação do General Garrastazu Médici para a Presidência da República ganharam intensidade na segunda metade de 1969. Essas crises foram geradas por conflitos de naturezas diversas e se deram em diferentes planos da vida política.

As soluções encontradas, quer com as medidas tomadas pela Junta Militar, quer com a eleição do novo presidente militar, apenas atenuaram (ou adiaram) os seus efeitos. E justamente porque persistem tais conflitos é que é importante examiná-los. Antes de tudo, assinalemos que as últimas crises, ao lado de suas especificidades, apresentaram pontos comuns com as demais crises sofridas pelo regime atual.

Entre os fatores causadores de desgastes da ditadura, opondo-se a seus esforços para fazer avançar o processo de fascistização, encontramos sempre dois tipos de resistência: a do movimento nacionalista e a do movimento democrático. Certo, esses dois elementos do processo político brasileiro tendem, historicamente, à convergência: há entre eles um condicionamento mútuo muito estreito. Mas, em determinadas situações concretas, um deles pode assumir maior importância como acelerador do processo revolucionário brasileiro.

De qualquer forma, direta ou indiretamente, eles sempre estiveram no centro das crises que vêm abalando o regime. Ou se originando de um choque direto entre o governo e a oposição (AI-2, novembro de 1965), ou de um conflito no seio do sistema de forças do governo (afastamento de Costa e Silva, constituição da Junta Militar e indicação deMédici), os golpes sucessivos, a partir de 1964, foram sempre desencadeados para precaver o processo contra revolucionário contra o seu desgaste pela resistência nacionalista e democrática.

A maior ou menor instabilidade dos governos da ditadura (razão das crises) tem sido em função de sua maior ou menor permeabilidade às pressões oriundas daqueles dois movimentos. A contradição a que acabamos de nos referir dá origem a outras menores, secundárias e subordinadas, mas que nem por isso deixam de assumir importância decisiva em determinados momentos. É o caso, por exemplo, do conflito entre um poder de fato, constituído por um núcleo de oficiais superiores das Forças Armadas (ideologicamente afinados com as doutrinas político-militares da ESG, mas de difícil identificação física), e o governo do momento. Cabe esclarecer que os diferentes governos do regime de abril (Castelo, Costa, Junta e Garrastazu) surgiram sempre como frutos de acordos entre aquele Poder militar de fato e as velhas forças políticas integradas nos quadros da ditadura.

Produtos de tais acordos, sujeitos muitas vezes a pressões colidentes, vimos os vários governos do regime oscilar, pendularmente, entre as duas forças, até um momento em que o aumento das tensões desemboca em crises políticas, que geram novos pactos, já que as forças em choque não tiveram, até aqui, possibilidade de terminar com o impasse. Nesses pactos, os contendores disputam posições e vantagens que os coloquem em condições favoráveis para enfrentar a nova crise. É esse, precisamente, o panorama do governo do General Garrastazu Médici. Dele dizia recentemente o jornalista Carlos Castello Branco: 

“Chegamos aí a outra curiosidade da situação brasileira, que é o fato de não estar o Poder totalmente e, às vezes, substancialmente nas mãos dos seus titulares, que o representam, mas não o empolgam. A força invisível está por trás de tudo, definindo critérios, selecionando virtudes e impondo normas às quais devem obediência os que a representam ostensivamente”.

Já se desenha nitidamente a formação de focos de atrito no novo governo. Apesar das medidas que, em 1969, aumentaram ainda mais o autoritarismo e o arbítrio do regime, dos atos e leis que dificultaram em alto grau a atividade da oposição e a manifestação da vontade das massas, e talvez por tudo isso, a situação política do governo Garrastazu se apresenta instável. Ele se esforça para cobrir os claros deixados por certas forças afastadas do Poder, após a última crise, chamando técnicos para sua equipe, numa tentativa de dar ao seu governo uma imagem tecnocrática. Poderá, com isso, substituir uma parte da velha “classe política” alijada do poder, criando um novo elo de ligação com as classes dominantes, evitando o isolamento e prolongando o bonapartismo atual por mais tempo. O difícil é avaliar até onde irão as possibilidades desse bonapartismo sem um Bonaparte.

Ao lado das contradições já referidas, cabe, finalmente, assinalar mais uma. Em nível mais elevado que os seus antecessores, o governo de Garrastazu sofre as conseqüências da divisão do suporte militar da ditadura. À medida que passam os dias e que as Forças Armadas continuam como centro das decisões políticas importantes, maiores são os conflitos que as dilaceram. Grosso modo, a parte mais ativa da oficialidade, que participou do golpe de 1964, principalmente do Exército, divide-se hoje em dois grupos principais: um deles, englobando talvez a maioria, é formado pelos partidários de um nacionalismo autoritário, e o outro, que dispõe de maior parcela de poder, reúne os que se mantêm aferrados aos dogmas entreguistas e reacionários da ESG. O primeiro grupo tende a crescer e a romper, de dentro, a unidade do bloco militarista reacionário. Isto determinará, obviamente, uma convergência da ação dessa força com a do movimento nacionalista democrático da oposição. É necessário, no momento de uma apreciação mais concreta, não esquecer que, entre um grupo e outro, existem, nas Forças Armadas, correntes de várias nuances, além de uma enorme massa – possivelmente a maioria – de oficiais indecisos e indiferentes.

É dentro desse quadro que o General Garrastazu terá de enfrentar as próximas eleições de governadores, para o Congresso Nacional, Assembléias Estaduais e Câmaras Municipais. “A disputa eleitoral – diz o JB – não será evidentemente capaz, por si mesma, de aplainar as contradições; muito pelo contrário. Pode-se esperar que as dificuldades se criem”.

Em alguns dos Estados mais importantes – SP, GB, MG, BA – o partido oficial, a Arena, até agora não conseguiu unir suas forças, e o General-Presidente ameaça impor seus candidatos, vetando aqueles quenão lhe agradam, numa ação que já se convencionou chamar de “cassação branca”. O governo, que num arroubo demagógico prometeu fazer o “jogo da verdade”, age com cautela nesse terreno, a fim de não provocar desarranjos no precário sistema de forças políticas em que se apóia.

As correntes de oposição – e, claro, entre elas, o nosso Partido – têm, com as eleições, um grande campo para potencializar a resistência à ditadura. Nada nos leva a crer que as próximas eleições, cercadas como estão pelas medidas coercitivas da ditadura, possam ser decisivas para a liquidação do regime – é uma advertência que não podemos deixar de fazer.

Mas não tenhamos dúvidas de que elas vão concorrer, e muito, para a nova crise em gestação. Daí a sua importância para a oposição. Ninguém pode dizer, com segurança, o resultado de uma nova crise, se haverá alguma abertura (não entramos aqui na discussão sobre a extensão de tal abertura, mas consideramos apenas que o alargamento da faixa das liberdades, por menor que seja, ajuda a organizar a resistência ao avanço do fascismo), ou se serão ampliadas as medidas repressivas, com novas restrições às já quase inexistentes liberdades civis. O que não se pode é ficar à margem, acatar o desejo do General-Presidente. Isto é, participar das eleições sem contestar o regime. A oposição, particularmente as forças de esquerda e o nosso Partido, não pode, como quer o atual Presidente, permitir que a opinião pública, em hipótese alguma, seja confundida a ponto de admitir as medidas repressoras do regime como necessárias à defesa da democracia. O regime de abril, por sua essência de classe (serviçal das velhas classes dominantes, do imperialismo, etc.), por suas vinculações antinacionais e por sua ideologia reacionária, pode, tranqüilamente, ser classificado como de tipo fascista. (...)

É esse o quadro da oposição. Quadro que explica porque a ditadura, apesar de suas fraturas e instabilidade, ainda encontra meios e formas para avançar no processo de fascistização. Quadro que se modificará, com maior ou menor ritmo, a partir do momento em que o processo político, permitindo uma reflexão mais profunda da oposição sobre sua experiência, indique-lhe a maneira de usar sua imensa potencialidade para organizar os combates e a batalha final contra a ditadura. (....)

O exame até aqui feito sobre as forças presentes e em conflito na sociedade brasileira induz a um otimismo realista em relação à formação de uma frente antiditatorial”. (...)

CF. Resolução Política do CE da Guanabara do PCB (março de 1970), in O marxismo político de Armênio Guedes, Contraponto/Fundação Astrojildo Pereira, dez. 2012.

1980/81 - Talvez a superação do autoritarismo e a conquista de um regime democrático possam ocorrer sem mudanças bruscas e violentas. Resultarão antes de uma guerra de posições — no bom sentido da tese gramsciana

“Chegamos assim em 1981, tanto pelo que ocorre no campo do governo como pelo que se passa no lado das oposições, a uma situação complicada. Uma situação de impasse político ou, quando menos, próxima disso. Além de tudo, seriamente agravada pela crise econômica em que vive o país.

É dentro desse quadro complexo e carregado de tensões sociais que as oposições e as correntes democráticas terão que atuar no ano que agora começa.

Antes de tudo, para evitar qualquer passo em falso, é preciso analisar e avaliar com precisão o caráter opressivo do regime. A resistência das forças democráticas, quando bem orientada, tem, em muitas ocasiões, atrapalhado a estratégia do regime, ajudando a avançar o processo de abertura.

De qualquer forma, os dados de que se dispõe indicam que o período de transição, longe de ser linear, tende a continuar em ziguezague e pode se prolongar por um tempo mais longo do que seria desejável. As forças democráticas, para avançarem, precisam estar bem conscientes das possibilidades de recuo -- de fechamento e de volta aos tempos do AI-5 -- que o momento e as tensões atuais encerram. É uma situação que exige firmeza, habilidade e prudência. E em que as convergências e a unidade das oposições são indispensáveis. Mas esse esforço de unidade e convergência não deve, na conjuntura presente, limitar-se ao universo das oposições. Tem que ir mais longe e, num trabalho paciente e prolongado, abarcar correntes, grupos e pessoas que, apesar de ainda permanecerem no sistema de forças do governo, começam a questionar o autoritarismo do regime e a exigir a ampliação das liberdades públicas.

Há uma outra observação que pode ser feita a partir da peculiaridade do momento político que atravessamos. É que, talvez no caso brasileiro, a superação do autoritarismo e a conquista de um regime democrático possam ocorrer sem mudanças bruscas e violentas. Resultarão antes de uma guerra de posições -- no bom sentido da tese gramsciana. Mas haverá, necessariamente, um momento de ruptura das instituições autoritárias e repressivas, que se dará pela pressão conjugada da opinião pública e de um amplo movimento de massas.

É com tal visão que hoje devemos trabalhar. E é por ela não estar presente, até aqui, no pensamento e na prática das forças democráticas e do movimento operário que os diferentes segmentos da oposição se perdem ou em propostas muito gerais, a médio e longo prazo, ou em reivindicações que se esgotam em questões particulares e corporativas.

Toda a reflexão até aqui desenvolvida induz a afirmar que os grandes problemas do país situam-se hoje nos termos concretos de um período de transição, ainda que ambíguo e pouco definido. E é neste contexto, portanto, que terão de ser resolvidos. Não seria fora de propósito que as forças democráticas — que não têm interesse nem na continuação do impasse nem no confronto — comecem a pensar na oportunidade ou não de se trabalhar com a idéia de um governo de transição, integrado pelas mais amplas forças e capaz, por isso mesmo, de dar começo à reorganização política do país”.

Cf. O impasse política e a saída democrática, in Voz da Unidade, 31 dez. de 1980.

1987 - Sempre considerei um pouco forçada a designação do PMDB como partido-frente

“Grosso modo pode-se dizer que a esquerda, mais do que qualquer outro grupo político no país, tem na sua memória, e como parte da sua herança, a crença na importância do funcionamento permanente dos partidos políticos. Isto se aplica, evidentemente, à esquerda do PMDB, que deve se esforçar para levar, ao conjunto da militância peemedebista, aquilo que ela (a esquerda) tem como memória histórica. Sua atuação será tão mais facilitada quanto mais claro estiver que esse esforço deve-se traduzir numa luta pela hegemonia dentro do partido, sem grandes rupturas ou radicalizações contra a ala direitista, até que o PMDB deixe de se reproduzir como uma frente e possa aprofundar as características de um partido auto-centrado que já se encontram presentes no seu interior.

Aliás essa caracterização do PMDB como um partido-frente é bastante problemática e me faz lembrar de uma das minhas divergências em relação à análise corrente no PCB, quando eu fazia parte de seus quadros. Porque o PMDB não foi formado numa reunião de partidos que se sentaram numa mesa e acordaram quanto à necessidade de constituição de uma frente, tal como ocorre no esquema clássico. Ao contrário, o PMDB foi uma convergência natural das forças políticas que não tinham outra maneira de se posicionar contra a ditadura. Por isso sempre considerei um pouco forçada a designação do PMDB como partido-frente,principalmente numa conjuntura em que já se havia dado a divisão orgânica dos partidos. Ao PCB faltou a percepção de que o PMDB tinha, como ainda tem, a possibilidade de ser um partido real, o mais importante partido da transição. Esgotada a transição, ou seja, uma vez estabelecida uma institucionalidade democrática no país, poderá haver uma decantação partidária no Brasil, mas ainda assim não estão claros, por ora, os limites da existência e atuação do PMDB. Considero, portanto, plenamente possível a sobrevivência do PMDB, ainda que concluído o processo da transição, dependendo da forma como ele encaminhar a luta pelas mudanças reclamadas pela sociedade brasileira e dependendo da forma como ele resolver suas divergências internas. Sem dúvida a hegemonia da esquerda no interior do partido representa o caminho mais seguro para a organização de um PMDB moderno, democrático e de massas. Só que a conquista da hegemonia, insisto, não significa uma luta de foices no interior do partido. (....)

É certo que a saída dos comunistas foi uma perda para o PMDB, tanto do ponto de vista da sua relação com os movimentos sociais, quanto do ponto de vista da sua reconhecida capacidade de organização da militância de base. Mas o importante, nesse momento, é discutir a forma como a esquerda que permaneceu no PMDB poderá contribuir para a organização do Partido em bases permanentes. Será que é através de uma explicitação programática daquele grupo dentro do partido? Mas de que esquerda estamos falando? Queiramos ou não o Fernando Henrique, o Serra, o Almino Afonso representam a esquerda do PMDB...

Por isso acredito que militantes como nós, que não temos um projeto pessoal de participação no poder, devemos levar o PMDB a ter uma visão crítica as sua política em relação às demais forças políticas do país, forçando-o a esboçar uma política de alianças que inclua o PT, o PDT e todos os que puderem ser agregados nessa tarefa de implantação de um regime democrático e antiautoritário no país. Acho que talvez seja a hora da esquerda peemedebista, olhar menos para o interior do partido e retornar à sua aspiração original, retomar o seu programa peemedebista forçando o partido a buscar a formação desse grande ajuntamento nacional para sustentar a democratização do país”.

Entrevista com Armênio Guedes, revista Presença, n. 9, fev. de 1987.

2000 - O papel desempenhado pela militância comunista no Brasil (1950-1970)

“O livro de memória de Marco Antônio Coelho é a história mais concisa e bem escrita que conheço sobre a militância comunista no Brasil. Pode-se agora avaliar com maior clareza o papel desempenhado por ela na educação e formação de uma boa parte dos quadros que estão hoje ocupando postos de direção na vida política do país. Por isso, e por sua qualidade literária, é uma leitura fascinante”.

Contra capa do livro Herança de um sonho – memória de um comunista. Marco Antônio Tavares Coelho. Editora Record, Rio de Janeiro, 2000,

A página esquecida da cultura brasileira - Elio Gaspari

Jacob Gorender, no presídio, traduzia filósofos alemães para um maluco chamado Victor Civita

Morreu Jacob Gorender, tendo deixado seu magnífico "Combate nas Trevas", em que conta as ilusões armadas da esquerda brasileira nos anos 70. Com ele foi-se um pedaço da memória da usina de livros e fascículos da editora Abril, produto da visão empresarial de Victor Civita.

"Seu" Victor achava que a história segundo a qual brasileiro não lê era uma lenda e decidiu lançar uma coleção intitulada "Gênios da Literatura Universal". A cada semana, punha nas bancas de jornais um grande romance, acompanhado por um fascículo com a vida do autor. Começou com Irmãos Karamazov, anunciando que a série teria 50 volumes. Deram-no por doido, pois se o primeiro livro vendesse menos de 50 mil exemplares a coleção iria a pique. Ele informou: "Vocês são contra, mas eu tenho 51% das ações e isso será feito". Dostoiévski vendeu 270 mil exemplares. Seguiram-se os "Gênios da Literatura Brasileira", os "Economistas" e os "Pensadores". Platão vendeu 250 mil exemplares. As coleções da Abril levaram para as bancas de jornais cerca de 12 milhões de livros e ela tornou-se a maior editora de livros de filosofia do mundo.

Nesse empreendimento estiveram o diretor da operação, Pedro Paulo Poppovic, e a rede de intelectuais por ele mobilizada. Nela havia 300 professores que a ditadura deixara sem trabalho. Jacob Gorender traduzia filósofos alemães numa cela do presídio Tiradentes e Pedro Paulo publicava seu trabalho com o nome da mulher, Idealina. Libertado, tornou-se funcionário da Abril Cultural, trabalhando ao lado de uma jovem que gostava de teatro, chamada Maria Adelaide Amaral. A coleção dos pensadores foi dirigida pelos filósofos José Américo Motta Pessanha (posto para fora da UFRJ), com o apoio de José Arthur Giannotti (cassado pela USP). A redação dos fascículos era dirigida por Ari Coelho, professor de química expulso da Universidade de Brasília.

Poppovic calcula que a polícia visitou a Abril Cultural em pelo menos quinze ocasiões. Em alguns casos os redatores valiam-se de uma rota de fuga. Ele lembra que em nenhum momento Civita perguntou-lhe quem trabalhava lá, nem o que a polícia queria.

Um dia alguém resgatará a história do maior empreendimento cultural ocorrido durante a ditadura, com o mais absoluto sucesso.

Fonte: O Globo,16/6/2013

Mussorgsky · Baba Yaga · Dudamel

Sugestão – Thiago de Mello

Antes que venham ventos e te levem
do peito o amor — este tão belo amor,
que deu grandeza e graça à tua vida —,
faze dele, agora, enquanto é tempo,
uma cidade eterna — e nela habita.

Uma cidade, sim. Edificada
nas nuvens, não — no chão por onde vais,
e alicerçada, fundo, nos teus dias,
de jeito assim que dentro dela caiba
o mundo inteiro: as árvores, as crianças,
o mar e o sol, a noite e os passarinhos,
e sobretudo caibas tu, inteiro:
o que te suja, o que te transfigura,
teus pecados mortais, tuas bravuras,
tudo afinal o que te faz viver
e mais o tudo que, vivendo, fazes.

Ventos do mundo sopram; quando sopram,
ai, vão varrendo, vão, vão carregando
e desfazendo tudo o que de humano
existe erguido e porventura grande,
mas frágil, mas finito como as dores,
porque ainda não ficando — qual bandeira
feita de sangue, sonho, barro e cântico —
no próprio coração da eternidade.
Pois de cântico e barro, sonho e sangue,
faze de teu amor uma cidade,
agora, enquanto é tempo.

Uma cidade
onde possas cantar quando o teu peito
parecer, a ti mesmo, ermo de cânticos;
onde posssas brincar sempre que as praças
que percorrias, dono de inocências,
já se mostrarem murchas, de gangorras
recobertas de musgo, ou quando as relvas
da vida, outrora suaves a teus pés,
brandas e verdes já não se vergarem
à brisa das manhãs.

Uma cidade
onde possas achar, rútila e doce,
a aurora que na treva dissipaste;
onde possas andar como uma criança
indiferente a rumos: os caminhos,
gêmeos todos ali, te levarão
a uma aventura só — macia, mansa —
e hás de ser sempre um homem caminhando
ao encontro da amada, a já bem-vinda
mas, porque amada, segue a cada instante
chegando — como noiva para as bodas.

Dono do amor, és servo. Pois é dele
que o teu destino flui, doce de mando:
A menos que este amor, conquanto grande,
seja incompleto. Falte-lhe talvez
um espaço, em teu chão, para cravar
os fundos alicerces da cidade.

Ai de um amor assim, vergado ao vínculo
de tão amargo fado: o de albatroz
nascido para inaugurar caminhos
no campo azul do céu e que, entretanto,
no momento de alçar-se para a viagem,
descobre, com terror, que não tem asas.

Ai de um pássaro assim, tão malfadado
a dissipar no campo exíguo e escuro
onde residem répteis: o que trouxe
no bico e na alma — para dar ao céu.

É tempo. Faze
tua cidade eterna, e nela habita:
antes que venham ventos, e te levem
do peito o amor — este tão belo amor
que dá grandeza e graça à tua vida.

domingo, 16 de junho de 2013

OPINIÃO DO DIA – Ferreira Gullar: A biografia de Armênio, hoje com 95 anos

A biografia de Armênio, hoje com 95 anos, vale "como retrato de um cidadão brasileiro do século XX que concebe a ação política como um meio de chegar à sociedade justa, fraterna, igualitária."

Cf. Prefacio do poeta Ferreira Gullar. Armênio Guedes - Sereno guerreiro da liberdade Editora Barcarolla, São Paulo, 2013.

Manchetes de alguns dos principais jornais

O GLOBO
Torneio começa com vaias a Dilma e vitória da seleção
Retratos do Rio - Favelas cariocas têm o maior aumento de renda
Relatório do TSE contesta aprovação de contas do PT
Tensão urbana: Conselho quer norma para arma não letal

FOLHA DE S. PAULO
Estreia do Brasil tem vaia a Dilma, feridos e presos
Centrista vence eleição no Irã e celebra 'triunfo da moderação'
Morre a escritora Tatiana Belinky aos 94 anos em SP
A semana em que São Paulo ardeu

O ESTADO DE S. PAULO
Ideli vê 'chantagem' do Congresso
Estresse do câmbio pressiona taxa de juros
Protesto antecede partida

ESTADO DE MINAS
Leis que ficam no papel
Joseph Blatter, da Fifa, e Dilma são vaiados minutos antes do jogo

O TEMPO (MG)
Dilma e Joseph Blatter são vaiados na abertura da Copa das Confederações
O mundo está mais moderno, mas o ‘fiado’ continua o mesmo
Rede alcança meta de 550 mil nomes, mas quer 800 mil
Já começa a movimentação para o troca-troca de partidos
Primeiro dia de Copa já reúne reclamações sobre falhas no acesso à internet e telefonia

CORREIO BRAZILIENSE
Protesto e vaias

GAZETA DO POVO (PR)
Não existe privacidade na internet
Estreia sem frio na barriga
Moderado vence eleição no Irã no primeiro turno
EUA mostram retomada econômica

ZERO HORA (RS)
"Temos de sair desse currículo enciclopédico"
Protestos: O que motiva os jovens que saem às ruas

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Vitória com convicção
Eduardo, Dilma e as especulações

O Que pensa a mídia - editoriais de alguns dos principais jornais

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Protesto e vaias

Em contraponto à festa, do lado de fora, a polícia reprimiu com violência a manifestação contra os gastos com a Copa do Mundo. No confronto, 24 pessoas ficaram feridas e outras 30 foram detidas. Militantes acusaram a PM de abuso de força.

Brasília festeja, mas também protesta

A capital se vestiu de verde e amarelo para receber o primeiro jogo da competição, pontapé inicial para o Mundial 2014. A cidade passou no teste, mas 2,5 mil pessoas se manifestaram contra a realização do evento

Helena Mader

O Eixo Monumental se coloriu de verde, amarelo, azul e branco. Torcedores foram para o estádio em clima de festa e paz, mas um grupo de manifestantes também aproveitou para protestar e acabou se envolvendo em conflito com a PM

Antes do jogo, manifestantes chegaram muito perto do Estádio Nacional Mané Garrincha: do lado de fora, bombas durante a cerimônia de abertura

Vestidos de verde e amarelo ou com roupas de protesto, gritando gol ou bradando palavras de ordem. No estádio, nos bares, nas ruas, presos no trânsito, ou em meio a manifestações. Nenhum brasiliense ficou alheio ao maior evento esportivo já realizado na capital federal. Seis anos após o anúncio de que o país sediaria a grande festa do futebol, a cidade saiu da rotina para receber a Seleção Brasileira. O clima, entretanto, não foi só de torcida e comemoração. Manifestantes se mobilizaram desde cedo para protestar contra o evento e, em vários momentos, entraram em confronto com a polícia. O saldo foi de oito feridos, 30 detidos e centenas de pessoas amedrontadas pela confusão. Até o início da partida entre Japão e Brasil, a tropa de choque da PM e a Força Nacional controlaram os manifestantes e evitaram invasões no local da partida — muitas vezes com violência.

Dentro do estádio, o ambiente era só de alegria. Crianças, grávidas, jovens, idosos, famílias inteira, estrangeiros, muitos assistindo a uma partida da Seleção pela primeira vez, comemoraram juntos a goleada do Brasil em clima de paz. Ao todo, mais de 67 mil pessoas encheram as arquibancadas da arena. O acesso ao Estádio Nacional Mané Garrincha foi tranquilo e os torcedores conseguiram chegar ao local sem percalços. Com a divulgação prévia do esquema de trânsito, os brasilienses já sabiam com antecedência onde estacionar e como funcionariam o transporte público. Muitos motoristas pararam os carros no Parque da Cidade, de onde ônibus gratuitos levavam e traziam os torcedores. O tráfego ficou complicado em toda a área central da cidade por conta do fechamento de vias. Quem insistiu em driblar o esquema de segurança acabou a pé ou saiu no prejuízo: o Detran guinchou 31 carros e multou outros 40.

O acupunturista José Elias Falchione, 53 anos, estacionou na Rodoviária e, de lá, caminhou até o estádio. O morador do Riacho Fundo elogiou o esquema organizado para o jogo. "Não tive problemas para chegar. Vim comemorando com pessoas de outras cidades, o clima pré-jogo estava muito animado", afirmou Falchione. Moradores de outros estados também ficaram satisfeitos com a organização do evento. O estudante carioca Venâncio Loureiro, 33 anos, veio do Rio de Janeiro para Brasília com um grupo de amigos. "Gostamos tanto que planejamos voltar para ver os jogos da Copa do Mundo no ano que vem."

O governador Agnelo Queiroz, que assistiu à partida no camarote das autoridades, ao lado da presidente Dilma Rousseff, comemorou o resultado da partida e desabafou: "O Mané Garrincha não deixa a desejar a nenhum estádio do mundo. É uma vitória contra os pessimistas que torciam para não dar certo". Para Agnelo, nem as manifestações e os episódios de confrontos tiraram o brilho da festa. "Tudo deu certo. Até as manifestações fazem parte. Todo grande evento mundial atrai manifestações, mesmo como essas que ocorreram, sem uma bandeira específica, apenas para tumultuar e tentar atrapalhar. O importante é que a polícia soube reprimir os excessos, proteger os torcedores de forma altiva e correta."

Tumulto

Os protestos começaram muito antes de a bola rolar. Às 9h, já havia grupos organizados na Rodoviária. No início da tarde, 2,5 mil brasilienses estavam reunidos para reclamar da realização da Copa na cidade. Em uníssono, pediam para que os manifestantes não agissem com violência. Mas a dispersão deles foi feita de forma dura pelo Batalhão de Choque da Polícia Militar. Além de balas de borracha, os PMs recorreram a bombas de gás lacrimogêneo. Comandantes da operação negaram as acusações de que a ação foi violenta e alegaram apenas terem respondido de forma enérgica aos protestos porque teria havido tentativas de invasão no estádio. "Foi preciso usar a força. Nós prendemos alguns manifestantes por desacato, outros por resistência", explicou o capitão Alessandro Arantes, da PM.

Entre os feridos, o caso que mais chamou a atenção foi o da estudante Isadora Cristina Riberio de Alencar, 18 anos. A jovem levou nove pontos na nuca após ser atingida por uma bala de borracha. "Depois do que aconteceu em São Paulo, não imaginei que a polícia reagiria com tanta violência", disse. Até o fechamento desta edição, às 21h, o clima ainda era tenso em frente à 5ª DP. Manifestantes ocupavam as ruas próximas.

Fonte: Correio Braziliense

Estreia do Brasil tem vaia a Dilma, feridos e presos

Protesto serve de alerta ao governo, que tenta minimizar dificuldade econômica

Valdo Cruz

BRASÍLIA - As vaias de ontem, recebidas por uma presidente Dilma com o semblante carregado, talvez sirvam para que sua equipe reflita um pouco mais sobre o que está ocorrendo no país e pare de simplesmente acusar a oposição de criar uma "situação irreal" da economia brasileira.

Vaiada três vezes na abertura da Copa das Confederações, Dilma encerrou uma semana na qual não escondeu sua irritação com as críticas de que o Brasil passa por um momento ruim, com inflação alta, dólar pressionado e crescimento fraco.

Em público e reservadamente, ela e sua equipe acusavam seus opositores de "vendedores do caos" e de "velhos do Restelo", personagem do poeta português Luís de Camões que simboliza o pessimismo.

Na visão do governo, o país é outro. A inflação vai cair, o desemprego continuará baixo e o crescimento será maior neste ano. O tom de irritação chegou a tal ponto que não há espaço para autocrítica, só para ataques ao "terrorismo informativo".

As vaias de ontem, porém, só reforçam os sinais de insatisfação em alguns setores do país emitidos e captados ao longo de toda a semana, mas que o governo se recusava a admitir ou procurava diminuir sua importância.

O Datafolha mostrou no domingo, por exemplo, queda de oito pontos na popularidade presidencial. Recuo generalizado diante do pessimismo do brasileiro em relação ao futuro da economia.

Durante a semana, manifestações em São Paulo e no Rio tornaram-se cenário de depredação e de confronto entre policiais e manifestantes, revelando um sentimento difuso nas principais cidades do país, propício para novos protestos.

Ontem, antes mesmo das vaias, o clima ruim já reinava fora do estádio. Jovens e militantes de grupos como sem teto, indígenas e defesa dos direitos das mulheres entravam em confronto com a polícia do Distrito Federal.

É fato que o país não está uma tragédia. Se a inflação não sair do controle e continuar recuando, Dilma seguirá favorita na eleição presidencial do ano que vem.

Mas o clima no país já indica que a campanha de 2014 não será um passeio como imaginavam os petistas. E que parte dos eleitores estão, sim, insatisfeitos com os rumos do governo Dilma.

Sem falar que o cenário mundial pode jogar contra, pressionar ainda mais o dólar, gerar inflação e azedar o humor de mais brasileiros.

Fonte: Folha de S. Paulo

Charge do dia - Vaia

Fonte: Jornal O Tempo (MG)

Público vaia Dilma no Mané Garrincha

Dirigente da Fifa parte para o contra-ataque e sai em defesa da presidente: ‘Onde está o respeito?’, perguntou o suíço

Brasília- Exatamente uma semana após a divulgação de pesquisa mostrando a queda de sua popularidade, a presidente Dilma Rousseff foi vaiada por longos dois minutos, durante a cerimônia de abertura da Copa das Confederações. A torcida que lotava o estádio Mané Garrincha entoou a vaia logo que a presidente foi anunciada. O presidente da Fifa, Joseph Blatter, ainda tentou intervir em defesa da presidente, mas não adiantou.

— Amigos de futbol brasileiro, adonde está el respeto, el fair play, por favor? — perguntou o suíço, misturando português e espanhol.

Em seguida, Dilma pegou o microfone para fazer o pronunciamento sob vaias:

— Declaro oficialmente aberta a Copa das Confederações Fifa-2013.

Neste momento, palmas pela inauguração do evento se misturaram com as vaias que ainda persistiam. Pouco abaixo do local onde Dilma estava, na tribuna de honra, os convidados da Fifa e do governo a aplaudiam.

Governo não fala sobre o assunto

Entre as autoridades estavam o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, e os ministros Aldo Rebelo (Esporte), Paulo Bernardo (Comunicações), Marta Suplicy (Turismo), Aguinaldo Ribeiro (Cidades), Celso Amorim (Defesa) e Jorge Hage (Controladoria-Geral da União), além do assessor para Assuntos Internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, e do subchefe de assuntos jurídicos da Casa Civil, Ivo Corrêa.

O governo não quis se pronunciar sobre o ocorrido. Esta não foi a primeira vez que o PT sofreu com vaias na abertura de um grande evento esportivo. Em 2007, quando o Rio sediou a 15^ edição dos Jogos Pan-Americanos, o então presidente Lula também foi vaiado. Na época, o governo culpou o então prefeito Cesar Maia pelo protesto.

As vaias foram o principal assunto nas galerias paralelas aos assentos, onde ficam os estandes de alimentação.

— Ela não está acertando na economia. A vaia vai um pouco para o partido, que tem esse histórico de corrupção, e para a Dilma. A população está insatisfeita e, aqui no estádio, teve a oportunidade de protestar — disse o advogado Marcello de Paula, que assistia ao jogo.

Pesquisa do Instituto Datafolha, divulgada terça-feira, mostra que a popularidade da presidente caiu de de 65%, em março, para 57%, em junho.

Fonte: O Globo

Espionagem no Porto

Disfarçados de portuários, quatro agentes da Abin — o serviço secreto do governo — foram presos sob suspeita de bisbilhotar a vida do governador Eduardo Campos, pré-candidato à Presidência da República

Hugo Marques e Rodrigo Rangel

É colossal o esforço do governo para impedir que decolem as candidaturas presidenciais do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), e da ex-senadora Marina Silva (sem partido). Nos últimos meses, a presidente Dilma Rousseff reacomodou no ministério caciques partidários que ela havia demitido após denúncias de corrupção, loteou cargos de peso entre legendas desgarradas da base aliada e pressionou governadores do próprio PSB a minar os planos de Campos. Sob a orientação do ex-presidente Lula, Dilma trabalha para montar a maior coligação eleitoral da história e, assim, impedir que eventuais rivais tenham com quem se aliar. A maior parte dessa estratégia é posta em prática à luz do dia. como a volta dos "faxinados" PR e PDT à Esplanada, mas há também uma face clandestina na ofensiva governista, com direito a espionagem perpetrada por agentes do estado. Um dos alvos dessa ação foi justamente Eduardo Campos, considerado pelo PT um estorvo à reeleição de Dilma pela capacidade de dividir com ela os votos dos eleitores do Nordeste, região que foi fundamental para assegurar a vitória da presidente em 2010.

O Porto de Suape, no Recife, carro-chefe do processo de industrialização de Pernambuco, serviu de arena para o até agora mais arrojado movimento envolvendo essa disputa pré-eleitoral. No dia 11 de abril, a Polícia Militar deteve quatro espiões da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) que fingiam trabalhar no local, mas há semanas se dedicavam a colher informações que pudessem ser usadas contra Campos. A Secretaria de Segurança Pública estadual já monitorava os agentes travestidos de portuários fazia algum tempo. Disfarçados, eles estavam no estacionamento do porto quando foram abordados por seguranças. Apresentaram documentos de identidade falsos e se disseram operários. Acionada logo depois, a PM entrou em cena. Diante dos policiais, os espiões admitiram que eram agentes da Abin. que estavam cumprindo uma missão sigilosa e pediram que não fossem feitos registros oficiais da detenção. O incidente foi documentado em um relatório de uma página, numa folha de papel sem timbre, arquivada no Gabinete Militar do governador. Contrariado com a espionagem, Eduardo Campos ligou para o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República, general José Elito Siqueira, a quem o serviço secreto do governo está subordinado.

Em uma reunião com aliados do PPS, o governador contou que o general garantiu que não houve espionagem de cunho político, ou de viés eleitoral, mas apenas um trabalho rotineiro. "Nós fazemos apenas monitoramento de cenários para a presidenta", ponderou o chefe do GSI. Apesar da gravidade do incidente, o caso foi dado como encerrado pelos dois lados. Poucas pessoas souberam da história. A elas, Campos explicou que não queria tornar público o episódio para não "atritar" ainda mais a relação com o Palácio do Planalto nem causar um rompimento entre as partes. Mas houve desdobramentos. "Tive de prender quatro agentes da Abin que estavam me monitorando", revelou Eduardo Campos. E ainda desabafou: "Isso é coisa de quem não gosta de democracia, de um governo policialesco". Pediu aos aliados que o assunto fosse mantido em segredo. "Não tenho nada a dizer sobre isso", desculpou-se na semana passada o deputado Roberto Freire, presidente da legenda, que estava presente à reunião.

Os agentes detidos no Porto de Suape trabalham na superintendência da Abin em Pernambuco. São eles: Mário Ricardo Dias de Santana, Nilton de Oliveira Cunha Junior.

Renato Carvalho Raposo de Melo e Edmilson Monteiro da Silva. No dia da detenção, usavam um Pálio (JCG-1781) e um Peugeot (KH1-1941). A placa do Pálio é fria, não existe. Já a do Peugeot é registrada em nome da própria Abin. Na semana passada, o agente sênior Mário Santana se aposentou. Nilton Junior e Renato de Melo davam expedieníe normalmente 11a superintendência. Já Edmilson Silva, na quinta-feira, estava escalado para 0 plantão noturno. Nada mais natural. Edmilson Silva tem uma dupla jornada de trabalho. Além de espião, é vereador, eleito pelo PV, no município de Jaboatão dos Guararapes. Vive. portanto, uma situação curiosa. Durante 0 dia, como vereador, é um defensor das liberdades. As escuras, como araponga. une-se aos colegas de repartição para violá-las. "Fui ao Porto de Suape algumas vezes apenas para visitar amigos", disse a VEJA 0 agente-vereador. "Mas nunca fui detido ou preso, nunca usei documentos falsos, não há nenhum registro sobre isso." Funcionário da Abin há trinta anos. Edmilson garante que hoje não existe mais nenhum tipo de ação de monitoramento contra cidadãos ou governantes.

As declarações do agente não encontram sintonia nem com as manifestações dos próprios superiores. No dia 4 de abril, uma semana antes das detenções realizadas pela polícia, 0 jornal O Estado de S. Paulo revelou que, a mando do GSI, a Abin montara uma operação para monitorar a movimentação sindical no Porto de Suape. Àquela altura, a presidente Dilma e 0 governador de Pernambuco estavam em lados opostos na discussão sobre a MP dos Portos. Campos fazia ressalvas públicas ao texto e recebia em audiências setores do sindicalismo que também eram contrários a posições defendidas pelo Planalto. A operação de monitoramento no porto foi classificada pelo GSI como "gerenciamento de risco" e tinha como objetivo medir a possibilidade de realização de uma greve em Suape e nos demais portos do país. Flagrado em plena ação, 0 GSI primeiro negou o monitoramento. O general José Elito chegou a tachar de mentirosa a reportagem. O jornal, então, publicou um documento sigiloso que confirmava 0 monitoramento da Abin sobre os portuários e os sindicatos contrários à MP dos Portos. Restou ao general reconhecer a própria mentira e admitir 0 óbvio: "A gente monitora tudo. assuntos que possam ser de interesse do país. Tudo 0 que a gente faz é para assessorar a senhora presidenta e os órgãos de governo para decisões oportunas".

Desmentido pelos fatos, o general acrescentou que a ação foi amparada pela lei que criou 0 Sistema Brasileiro de Inteligência e refletia a preocupação do governo com possíveis greves de portuários. "Não foi um monitoramento de movimento A ou B, mas de cenário." As declarações de Elito foram dadas seis dias depois da detenção dos quatro agentes da Abin. Nas conversas com auxiliares e políticos, Campos deixou claro que tinha sido vítima de uma bisbilhotagem política. Ele seria o alvo. A escolha de Suape não foi à toa. Antes da construção do porto, a economia pernambucana era meramente sucroalcooleira. Com o novo polo, fruto dos investimentos e da ajuda federal decorrentes da ótima relação que o governador mantinha com o então presidente Lula, Pernambuco se modernizou. Diferentes indústrias saíram do papel, como a naval, e uma rede de infraestrutura foi montada. "Tudo em Pernambuco é feito em função de Suape. Viadutos, ferrovias, tudo. A vocação industrial do estado apareceu graças ao porto", diz um ex-ministro do governo Lula. Os grandes investimentos, portanto, passam por lá — assim como as grandes empresas e os financiadores de campanha.

Mais que portuários insurgentes, os agentes da Abin pretendiam mapear eventuais relações espúrias entre Campos e o setor privado. Os agentes detidos faziam perguntas específicas sobre o governador. "No porto, atuam grandes financiadores de campanha e. mais importante, grandes corretores de contribuições eleitorais", diz um parlamentar de Pernambuco. Não se sabe se esse era exatamente o objetivo dos espiões. Campos já havia manifestado contrariedade à força desproporcional usada pelo PT para inviabilizar sua candidatura, mas ainda considerava tais gestos parte do jogo. A entrada em cena da Abin, que já foi usada em outras ocasiões com objetivos meramente políticos, mudou um pouco o ânimo do governador. Procurado na semana passada, Eduardo Campos não quis comentar o caso. "Perguntem ao GSI". limitou-se a dizer. O Gabinete de Segurança Institucional informou que "todos os esclarecimentos" sobre a ação dos agentes em Pernambuco já foram dados e que eles não "realizaram nenhuma operação para monitorar o movimento sindical". Sobre a prisão dos espiões, o GSI silenciou. A Abin é um órgão de assessoramento exclusivo do presidente da República. A assessoria de Dilma Rousseff, porém, afirmou que a presidente não foi informada nem da missão portuária dos espiões nem das prisões que se sucederam. Até a última sexta-feira, o general José Elito continuava firme no cargo.

Os escândalos da Abin

A Agência Brasileira de Inteligência deveria assessorar o presidente da República com informações sobre assuntos estratégicos e de interesse do estado. O órgão já se envolveu em casos rumorosos de espionagem clandestina e investigação ilegal.

Em 1999, um agente da Abin foi apontado pela Polícia Federal como responsável pela instalação de um grampo telefônico na sede do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Totalmente ilegal, a ação captou conversas do então presidente da República Fernando Henrique Cardoso.

Em 2000, uma espiã a serviço da agência foi escalada para seduzir e espionar o procurador da República Luiz Francisco de Souza, na época um implacável perseguidor de corruptos no governo. A agente simulou ter sido vítima de agressão para constranger o procurador.

Em 2008, a Abin destacou um grupo de agentes para trabalhar na chamada Operação Satiagraha -que investigou clandestinamente um rol de autoridades, entre elas a então ministra Dilma Rousseff e o ministro Gilmar Mendes, do STF.

Fonte: Revista Veja

Marina faz apelo para criar Rede até agosto

Em discurso otimista, ex-senadora ignora derrota no Supremo, comemora a marca de 500 mil assinaturas e pede empenho à militância. Objetivo é chegar a 800 mil apoios

Diego Abreu

A marca de 500 mil assinaturas coletadas para a criação do partido Rede Sustentabilidade foi celebrada ontem pela ex-senadora Marina Silva (sem partido), que participou de um evento simbólico, em São Paulo, com militantes e fundadores da legenda. Ela ignorou a iminente derrota no Supremo Tribunal Federal (STF) — que deve liberar nesta semana a retomada da tramitação do projeto de lei que dificulta a viabilidade da Rede — e fez um discurso otimista, para motivar os simpatizantes a conseguirem alcançar a marca de 800 mil assinaturas.

O objetivo de Marina é obter o registro da sigla no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em agosto, a tempo de registrar seu nome para disputar as eleições presidenciais do ano que vem. Para estar apta a concorrer no pleito de 2014, a legenda precisa ser oficialmente criada até o começo de outubro. Em 2010, a ex-senadora, filiada ao Partido Verde (PV), obteve uma expressiva votação no primeiro turno. Ela ficou em terceiro lugar, atrás de Dilma Rousseff e de José Serra, com expressivos 19,6 milhões de votos (19,33% do total apurado).

Durante o evento, transmitido ao vivo pela internet, participantes da mobilização alertaram para a necessidade de os militantes intensificarem a coleta de assinaturas e terem atenção ao preenchimento das fichas de cadastro para não haver erros. Marina quer o apoio de mais 300 mil pessoas até 7 de julho, que permita atingir uma margem segura para o registro do partido, já que até 30% dos apoios devem ser descartados por erros de preenchimento. É necessária a homologação de cerca de 500 mil assinaturas distribuídas por nove unidades da Federação. "Temos que sair daqui animados, mobilizados, comprometidos em criar essa margem de segurança para que a gente possa, em agosto, registrar o partido. O céu é o limite para que possamos criar a Rede", discursou Marina.

"O que pode nos impedir de manter o que já conquistamos e alcançar outras conquistas é o atraso na política. A Rede Sustentabilidade se coloca na perspectiva de ser um movimento horizontal. O partido é uma ferramenta a serviço do movimento", acrescentou a ex-senadora, que não citou uma única vez o projeto de lei que dificulta suas pretensões eleitorais. O evento foi prestigiado por políticos, como os deputados federais Domingos Dutra (PT-MA) e Walter Feldman (PSDB-SP), que devem se filiar à Rede.

Paralelamente ao registro do partido, Marina acompanha a tentativa da base aliada do governo Dilma de aprovar o projeto de lei que proíbe parlamentares que trocarem de partido de levar para a nova legenda tempo de televisão e fatias do fundo partidário.

Na prática, Marina argumenta que a eventual aprovação do projeto reduzirá em 35 segundos o tempo do programa eleitoral gratuito da Rede, que passaria a contar com apenas 20 segundos de exposição. O texto foi aprovado na Câmara e depende de apreciação pelo Senado. Desde de 24 de abril, no entanto, a matéria teve sua tramitação suspensa por liminar do ministro do STF Gilmar Mendes.

A liminar deve ser derrubada na próxima quarta-feira, quando o plenário do Supremo retoma o julgamento do mandado de segurança proposto pelo senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), que pede a paralisação definitiva da tramitação do projeto. Por enquanto, o placar está em 5 votos a 2 pela derrubada da liminar. O presidente do STF, Joaquim Barbosa, que ainda não votou, já adiantou que também é contrário à interferência do Supremo sobre projetos em andamento no Legislativo. Com o voto dele, garante-se a maioria para que o Congresso possa voltar a apreciar a proposta.

Fonte: Correio Braziliense

Eduardo, Dilma e as especulações

Eduardo: cautela com Abin

Carolina Albuquerque

Sem agenda pública ontem, o governador Eduardo Campos (PSB) elegeu um blog para abordar reportagem da revista Veja desta semana, em que é noticiada a prisão de quatro agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) pela Polícia Militar estadual, após semanas disfarçados no Porto de Suape na missão de colher informações que pudessem ser usadas politicamente contra o socialista. "Espiões da Abin também fazem serviços particulares. O governo (federal) pode não ter nenhuma ingerência sobre isso", disse ao blog de Magno Martins. Apesar da cautela, o governador teria admitido a prisão dos agentes e se mostrado indignado com a suposta espionagem por parte do governo federal em encontro com o presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), ferrenho adversário do PT. Quem confirma o diálogo entre os dois é o vereador Raul Jungmann (PPS-PE). "Houve, de fato, esta conversa", disse.

Segundo Jungmann, Eduardo e Freire tiveram três encontros reservados num período de pouco mais de um mês. O último aconteceu na quarta-feira (5), em Brasília. Jungmann informou ao JC que Freire passou por uma cirurgia nas cordas vocais e está impossibilitado, por recomendação médica, de falar por sete dias. De acordo com a revista, Eduardo pediu a aliados que o assunto fosse mantido em segredo para não "atritar" ainda mais a sua relação com o Planalto.

As prisões teriam ocorrido em 11 de abril, uma semana depois de o jornal O Estado de S. Paulo mostrar que, sob o comando do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República, a Abin espionava sindicalistas em Suape. O chefe do GSI, general José Elito Carvalho Siqueira, negou o monitoramento em Suape, mas, após o jornal publicar, dias depois, documento sigiloso da Abin que comprova a operação, se desdisse e admitiu missão para vigiar o movimento sindical.

De acordo com Veja, os quatro agentes trabalhavam travestidos de portuários, com documentos falsos, e levantavam informações que pudessem ser usadas contra Campos, como "relações espúrias entre o governador e o setor privado" que investe no Porto. Ao serem presos pela PM, identificaram-se como agentes e pediram que não fosse registrada ocorrência. A reportagem alega que o episódio é relatado num documento sem timbre, arquivado no Gabinete Militar do governo estadual. Os agentes seriam Mário Ricardo Dias de Santana, Nilton de Oliveira Cunha Júnior, Renato Carvalho Raposo de Melo e Edmilson Monteiro da Silva, este último vereador do PV em Jaboatão.

Fonte: Jornal do Commercio (PE)

Aliado minimiza vaia a Dilma e opositor vê insatisfação

Eduardo Bresciani, Débora Álvares e Ricardo Della Coletta

A presidente Dilma Rousseff foi vaiada duas vezes na cerimônia de abertura da Copa das Confederações hoje, no estádio Mané Garrincha, em Brasília. O presidente da Fifa, Joseph Blatter, também alvo da manifestação, chegou a reclamar do público pelo microfone, pedindo "fair play". Para aliados da petista, houve erro da assessoria em expô-la diante de um público de classe média alta. Na oposição, o entendimento é de que o descontentamento com a presidente é crescente.

A vaia, alta e ouvida em todo o estádio, começou no momento em que os nomes de Blatter e Dilma foram anunciados para dar início ao torneio. O presidente da Fifa iniciou sua fala, em português, afirmando que havia ali uma reunião para uma "verdadeira festa do futebol no país pentacampeão". Agradeceu as autoridades brasileiras e citou Dilma, momento em que o público vaiou novamente. Blatter, então, reclamou do comportamento: "Amigos do futebol brasileiro, onde está o respeito e o fair play?".

Dilma ficou com o semblante fechado ao lado do presidente da Fifa e apenas cumpriu o protocolo, sem discursar. "Declaro oficialmente aberta a Copa das Confederações Fifa 2013", disse, visivelmente constrangida. Do outro lado dela estava também o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e do Comitê Organizador Local, José Maria Marin, com quem Dilma evitou manter qualquer contato público até então.

Aliados da presidente acreditam que a vaia se deveu às características do público. "Vaia de playboy não vale", disse o deputado Dr. Rosinha (PT-PR) por meio do Twitter. O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) afirmou que a situação deveria ter sido evitada pela assessoria de Dilma. "Faltou avaliação política. Era um evento com ingresso caro, com classe média alta, classe A, não é essa a turma da Dilma e do Lula", afirmou Lindbergh. Presente no estádio, o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) minimizou o fato. "Político no estádio é sempre vaiado, porque o povo ali quer ver futebol", disse. Os petistas lembram ainda que na abertura dos Jogos Pan-americanos de 2007, no Rio de Janeiro, o então presidente Lula foi vaiado, mas isso não impediu a eleição de sua sucessora.

Na oposição, a manifestação do público foi "comemorada". "Essa vaia é um sentimento do País. A gente vê nas ruas que a situação é diferente de três anos atrás. Ali estava a classe média, mas as outras classes também estão sofrendo os efeitos da má administração do PT", afirmou Nilson Leitão (PSDB-MT), líder da minoria na Câmara. "A presidente conseguiu uma antipatia suprapartidária. Os fatores vão se acumulando, como a inflação, e isso pode levá-la a uma derrota", disse o líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado (GO).

Festa e protesto

A vaia para a presidente aconteceu depois de o público ter demonstrado empolgação com o evento, distribuindo aplausos para voluntários e até para o hino japonês. A cerimônia de abertura da competição, dirigida pelo carnavalesco Paulo Barros, procurou vender a principal festa popular do País. Voluntários realizaram mosaicos no gramado, houve espaço para homenagem às oito seleções participantes e a conclusão com bonecos similares aos do Carnaval de Olinda disputando uma partida de futebol sob um campo formado em mosaico.

Do lado de fora, porém, o público que acessou o estádio presenciou um protesto reprimido com força pela Polícia Militar do Distrito Federal, estado governado pelo petista Agnelo Queiroz. Os manifestantes foram dispersados com bombas de efeito moral e disparos de bala de borracha. A PM usou também gás lacrimogêneo. Ao todo, 3 mil homens participaram da segurança do jogo.

O primeiro confronto ocorreu quando um grupo tentou acessar a área onde o protesto estava concentrado, em frente ao estádio. Houve tumulto e a PM soltou bombas de gás lacrimogêneo. Um jovem foi ferido na perna. Até as 15h30 já haviam sido presos 17 adultos e apreendidos 10 menores, de acordo com o advogado dos manifestantes, Gilson dos Santos.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Armênio Guedes é um daqueles que brechtianamente podem ser considerados “imprescindiveis”. Francisco Inácio Almeida

Neste combate comum pelo socialismo, isto é, por uma sociedade livre, justa e solidária, torna-se cada vez mais consensual que o caminho a seguir é o que valoriza, ao mesmo tempo, a democratização societal e as formas da democracia política.

Quanto ao mais, ao lado de tantas outras forças e personalidades que também lutam, de outros modos, por níveis mais altos de civilização, deveremos considerar essenciais duas indicações que nos foram legadas por autores muito diversos. Especificamente da tradição comunista, devemos nos lembrar que cabe sempre estar à altura de fazer “a análise concreta de cada situação concreta”. Do âmbito da poesia, recordar-nos-emos invariavelmente desta poderosa sugestão: “Caminhante, não há caminho; o caminho se faz ao caminhar”.

Apesar de não estar presente de forma direta nesta coletânea, Armênio Guedes, presidente de honra da Fundação Astrojildo Pereira, foi o grande inspirador desse nosso projeto. Principal redator da histórica Declaração de Março de 1958, a qual apontava para a necessidade de superar o capitalismo no terreno da democracia, ele costuma lembrar que “o conceito de esquerda não é fixo”, ou seja, aquilo que era esquerda lá atrás pode não ser mais atualmente.

Por isso, esta coletânea é, também, uma forma de render homenagem a este velho combatente da democracia, do pensamento livre e da causa socialista entre nós. E porque sempre esteve na boa trincheira, Armênio Guedes é um daqueles que brechtianamente podem ser considerados “imprescindiveis”.

Francisco Inácio Almeida. Cf. Apresentação doa coletânea, Que é ser de esquerda hoje?, editoras Contraponto e FAP, Rio de Janeiro/Brasilia, 2013.

O comunista cujo 'dogma' é a liberdade

Livro conta vida de Armênio Guedes, assessor 'rebelde' de Prestes e do PCB durante 4 décadas

Gabriel Manzano

Era comum entre comunistas, no século passado, debater o "caminho democrático para o socialismo". Armênio Guedes, que militou no Partido Comunista Brasileiro de 1938 a 1983, propunha outro plano: o do "caminho democrático para a democracia".

A diferença entre as duas ideias é o eixo central do livro Armênio Guedes - Sereno Guerreiro da Liberdade, que o jornalista Sandro Vaia, ex-diretor de Redação do Estado, lança amanhã à noite na unidade da Livraria da Vila na Alameda Lorena, em São Paulo.

"A democracia é um valor permanente, e não é o fim da História", justifica o baiano Armênio, hoje com 95 anos, apreciador de vinhos, jazz e música erudita, em seu apartamento na região central de São Paulo. Mas, como revelam as 252 páginas do livro, essa não é a única discordância entre o militante de quatro décadas do Partidão e seus camaradas. Armênio passou a vida criticando a rigidez do stalinismo, o personalismo do líder Luiz Carlos Prestes, a Intentona de 1935, a adesão ao golpismo de João Goulart em 1964, mas principalmente a falta de diálogo no PC.

Marighella era para ele uma figura fascinante, "mas politicamente um desastre". João Amazonas, um "dromedário do comunismo". Em Moscou, nos anos 50, vendo a adoração por Stalin, ele achava "meio chata aquela história de pai dos pobres". Botafoguense fanático, era um raro comunista que, num jogo Brasil e URSS, torcia pelo Brasil.

Era previsível, assim, sua saída do partido em 1983, de um modo banal: pegou o salário, saiu sem dizer nada e foi ao cine ma. Não voltou. "Ele tinha uma visão absolutamente antitotalitária dentro do partido. Ficou porque não tinha alternativa", resume, no livro, seu colega de exílio José Serra.

Armênio levou consigo sua marca de homem "manso, sereno", mas "firme, irremovível", como o descreve Ferreira Gullar. Ao fim de longas conversas com seu biografado, Vaia faz de sua história um fio condutor para expor o grande conflito vivido pela esquerda desde sempre, entre autoritarismo e liberdade.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Direitos e deveres - Merval Pereira

O país vive nos últimos dias situações de tensão de diversas origens que, misturadas à percepção crescente de pessimismo em relação ao futuro captada por pesquisas de opinião, podem levar a uma crise institucional de grave repercussão.

Não há ainda uma ligação direta entre os problemas econômicos que se avolumam e as manifestações nas ruas das principais cidades do país, como apressadamente alguns analistas estrangeiros registram.

Mas a insatisfação difusa que se revela pelas redes sociais e desemboca nas manifestações a pretexto de protestar contra o aumento das tarifas de ônibus, sem dúvida, serve à manipulação de atividades políticas de grupos radicais e anárquicos que não se sentem representados pelos partidos políticos do mainstream.

Existem diversos grupos de ativistas em ação pelas ruas, alguns ligados a partidos políticos, que escolhem temas variados para protestar "contra tudo isso que está aí". Engana-se o governo Dilma se acha que pode tirar proveito político de um eventual desgaste do governador tucano de São Paulo Geraldo Alckmin na repressão aos manifestantes.

O teor de cartazes afirmando que "Nenhum partido nos representa" mostra que a intenção dos grupos mais organizados é minar a representatividade política tradicional, inclusive a do PT que, agora no governo, prova do veneno que utilizava contra seus adversários.

Se a polícia paulista certamente se excedeu nos confrontos de quinta-feira, como diversas imagens registraram, há também imagens suficientes para mostrar que entre os manifestantes havia os que foram às ruas para provocar o confronto.

Independentemente dos objetivos ainda não totalmente revelados dessas manifestações, uma coisa é certa: nos últimos dias o país está vivendo situações que mostram que é preciso definir os limites da atuação de cada um para que a balança dos direitos fique mais equilibrada com a dos deveres.

Afinal, que país queremos ser? A censura do politicamente correto, utilizada como instrumento de constrangimento político, acabou criando uma situação em que qualquer atitude de repressão oficial se transforma em autoritarismo.

Essa leniência com as ações marginais se reflete na violência urbana e transborda para os conflitos rurais em que fazendas são invadidas a pretexto da defesa de pretensos direitos indígenas ou em ações do MST, que não têm a rejeição de quem é pago para garantir a prevalência da lei. Pois não se soube recentemente de um comentário da presidente censurando o cumprimento de ordem judicial de reintegração de posse, em episódio que resultou na morte de um índio?

A presidente pelo menos desmentiu que houvesse feito tal comentário, indevidamente revelado por um assessor seu, mas não é de hoje que governadores e prefeitos recusam-se a cumprir mandatos judiciais mesmo diante de flagrantes ilegalidades cometidas. A destruição das plantações da Cutrale ainda está para ser punida, e já foi repetida pelo MST. E já houve tentativa do PT de aprovar legislação que previa uma negociação com o invasor para que o proprietário pudesse entrar na Justiça para reaver o que era seu.

No Brasil, os menores com 16 anos podem votar para escolher seus representantes, mas não podem ser condenados mesmo quando praticam crimes hediondos. E, previsivelmente, tornam-se "laranjas" de criminosos até a véspera de completar 18 anos para a execução de atos que ficarão impunes.Os indígenas são inimputáveis, e por isso podem invadir o plenário do Congresso ou caçar carpas nos lagos de Brasília com arco e flecha, mas também quer em todos os direitos do "homem branco". E os protestos contra o aumento de 20 centavos na passagem dos ônibus são feitos com a incoerência dos anarquistas, a depredação de pontos de ônibus e queima de veículos que em teoria eles defendem.

O direito de cada um termina quando começa o do outro, a frase simplificadora das relações humanas define que as individualidades devem se submeter à coletividade. Precisamos no país, acima das divergências políticas e ideológicas, impor limites à ação de cada um para que a sociedade não fique com a sensação de insegurança que hoje já predomina.

Os pontos-cliave

(...) a insatisfação difusa que se revela pelas redes sociais e desemboca nas manifestações a pretexto de protestar contra o aumento das tarifes de ônibus sem dúvida serve à manipulação de atividades políticas de grupos radicais e anárquicos que não se sentem representados pelos partidos políticos do mainstream.

0 teor de cartazes afirmando que "Nenhum partido nos representa" mostra que a intenção dos grupos mais organizados é minar a representatividade política tradicional.

Independentemente dos objetivos ainda não totalmente revelados dessas manifestações, uma coisa é certa: nos úítimos dias o país está vivendo situações que mostram que é preciso definir os limites da atuação de cada um.

Fonte: O Globo

Curto-circuito - Dora Kramer

Os protestos de rua ocorridos a partir do aumento das tarifas de ônibus em São Paulo e no Rio de Janeiro podem prosperar ou se esvaziar como algumas outras iniciativas desprovidas de agenda, organização, lideranças e objetivos nítidos.

O exemplo mais recente e vistoso: o movimento Ocupe Wall Street. Como veio foi, sem que tenha sido possível perceber de onde veio nem para onde foi.

Insatisfações dispersas costumam mesmo ser voláteis. Mas não convém por isso desprezá-las, pois sempre querem dizer alguma coisa. Essa agora evidentemente não diz respeito apenas ao aumento de 20 centavos de real no preço das passagens de ônibus.

As passeatas de estudantes ao fim dos anos 70 começaram como forma de protesto contra os preços cobrados no restaurante da Universidade de São Paulo. Falavam disto, queriam falar de muito mais e acabaram abrindo passagem aos movimentos contra a carestia, às greves dos metalúrgicos do ABC, à campanha pela anistia, à mobilização por eleições diretas, à retomada da democracia.

No espaço da liberdade reconquistada, fez-se longo silêncio quebrado por um breve tempo pela juventude que foi às ruas de caras-pintadas para abrir alas à interrupção do mandato de Fernando Collor.

O que há agora? Ainda imperceptível a olho nu. A primeira impressão foi a de arruaça, desrespeito à ordem pública, baderna a requerer posição firme do Estado.

Os modos assustaram e justificaram as críticas ao vandalismo na ação e a violência na reação da polícia, notadamente a paulista. Uma hipótese para tal desacerto pode ser a falta de prática. Da população, em pôr a boca no trombone nas ruas; do Estado, em assegurar a ordem pública e em ferir direitos individuais - dos que protestam e dos que querem ir e vir - e de ambos na construção de um entendimento.

Mas não se pode ignorar o fato de que as manifestações falam de um descontentamento generalizado em cujo balaio cabe de tudo um pouco: corrupção, inflação, gastos exorbitantes com a construção de estádios, conduta dos políticos, indiferença do poder para com os serviços devidos ao público, vontade de se fazer ouvir, de reclamar, de dizer chega a uma espécie difusa de mal que não tem um nome.

Antes de se tomar a parte pelo todo, no entanto, é de se conferir o rumo que tomarão as coisas. Novas manifestações estão convocadas para esta semana, cujas adesões podem se robustecer como também podem se esvair.

De saudável há a demonstração de que existe uma chama por trás da apatia diante de vários exemplos de descuido - quando não desmandos - do poder público em todos os níveis e matizes partidários.

De condenável há a presença dos costumeiros adeptos da baderna à deriva. De preocupante há a ausência de uma condução (note-se, não de tutela) para organizar as demandas. Na forma e no conteúdo. Espontaneidade é bom, mas quando desprovida de propósito e organização a tendência é resultar no vazio, caldo de cultura para o descrédito e a frustração.

Não se trata de defender a captura dessa energia por essa ou aquela força política. Nesse aspecto é até bom que não estejamos em ano eleitoral a fim de que os governantes alvos dos protestos não possam atribuir os movimentos aos adversários.

Desses curtos-circuitos às vezes nascem rupturas benéficas. Crises que resultam em soluções. Imprescindível, porém, que os demandantes saibam o que querem e que se organizem de maneira adequada para chegar lá.

Outros quinhentos. A presidente Dilma Rousseff repete o padrão do antecessor ao querer enfrentar os problemas na base da palavra veemente. Mas, não tem o talento de Lula. Ainda que tivesse, não conta com terreno fértil para semear o dom de iludir.

Fonte: O Estado de S. Paulo