segunda-feira, 9 de junho de 2014

Ricardo Noblat: O legado de Dilma

“Nem na ditadura confundimos Copa com política”Dilma Rousseff

- O Globo

A modéstia, convenhamos, nunca foi o ponto forte de Lula. Mas em relação a Dilma, sua invenção para presidir o país, ele guardava um certo recato. De público, cuidava para não reforçar a impressão de que a tutelava.

Na semana passada, em Porto Alegre, Lula mandou às favas todos os escrúpulos e fez o impensável – criticou a política econômica do governo. E na frente de um dos seus responsáveis.

Pobre Arno Augustin, Secretário do Tesouro. Ouviu poucas e boas diante de um auditório inclinado a concordar com tudo o que Lula dissesse.

Por uma questão de estilo e temperamento, Lula e Dilma são famosos por tratarem com grosseria seus subordinados. Mas isso sempre ocorre em particular. E, no caso de Lula, quando ele reconhece que foi cruel, costuma pedir desculpas sem pedi-las diretamente.

Pois foi constrangedor. Depois de, na véspera, reunido com empresários, ter chamado a atenção do governo para o risco de perder o controle da inflação, Lula valeu-se do seu próprio exemplo para ensinar a Arno – e, por tabela, a Dilma – como esquentar a economia.

Defendeu a expansão do crédito, um meio de aumentar o consumo. E lamentou: “Se depender do pensamento de Arno você não faz nada”.

Voltou à carga: “Uma medida que tomamos foi aumentar a oferta de crédito. O Arno nem sempre gosta disso”, alfinetou. Arno sorriu meio sem graça.

“Eu acho, Arno, que um dia você vai ter que me explicar porque, se a gente não tem inflação de demanda, por que a gente está barrando o crédito? O crédito precisa chegar”, cobrou Lula. “Com crédito todo mundo vai à luta”. Depende.

No meio do segundo mandato de Lula, a receita soprada por Delfim Neto, ex-ministro da Fazenda da ditadura de 64, funcionou de fato.

O governo tinha dinheiro para ampliar o crédito via bancos oficiais. A taxa de juros havia baixado, tornando os empréstimos mais atraentes. Disparava a boa avaliação do governo. E a indústria tinha capacidade ociosa e podia aumentar a produção para atender o consumo.

Hoje é tudo o contrário. Agravado pelo fato de que o pessimismo do brasileiro está em alta - e a culpa não é da oposição, como sugere Dilma.

A culpa é de um governo medíocre, centralizado em excesso na figura da presidente, e que realizou pouco.

A herança maldita que deixará é a frustração dos que acreditaram na palavra de Lula de que Dilma como gestora era superior a ele. Isso se chama estelionato eleitoral.

O troco está vindo a galope.

Desmancha-se a confiança no governo e nas suas políticas. Pela primeira vez desde 2007, a maior parte dos eleitores (36%) acha que a situação econômica só tende a piorar, segundo a mais recente pesquisa de opinião do instituto Datafolha. Para 64% a inflação vai crescer – eram 58% há um mês. O desemprego, também, acreditam 48% - eram 42% há um mês.

João Santana, marqueteiro das campanhas de Lula e de Dilma em 2006 e 2010, terá pela frente três tarefas de grande porte: reverter a expectativa negativa dos brasileiros quanto à economia; tornar positiva a avaliação do governo, e convencer a maioria dos que pedem um presidente diferente do atual que a continuidade com Dilma é melhor. Ou de que a mudança pode ser feita com ela.

O ano começou com Dilma como favorita para se reeleger no Primeiro turno. Depois, as pesquisas indicaram que ela disputaria o segundo turno ainda na condição de favorita.

Agora, o favoritismo de Dilma está ameaçado. Chamem Lula... Para tentar salvá-la – e ao PT.

José Roberto de Toledo; Herdeiros da renovação

• A política hereditária é mais arraigada na Região Nordeste, mas não só lá

- O Estado de S. Paulo

Domínio de clãs, política de parentesco, oligarquia - mas pode chamar de Congresso Nacional. A Transparência Brasil contabilizou 228 deputados federais e 52 senadores cujos parentes foram ou são, como eles, políticos profissionais. Praticamente a metade dos parlamentares (48%) tem pais ou filhos, irmãos ou primos, avós ou netos, maridos ou esposas na política. O poder herdado é uma grande herança do Brasil.

Dos três principais candidatos a presidente, Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB) são filhos e netos de políticos. A presidente Dilma Rousseff (PT) não tem parentesco, mas era referida por eleitores na campanha de 2010 como a "mulher de Lula". Não foi por consanguinidade, mas herdou seus votos do ex-presidente. Aécio e Eduardo desenvolveram carreiras próprias, mas se iniciaram na política com a bênção dos avôs.

Não há como negar que um empurrão inicial é uma vantagem considerável para quem está tentando se eleger para qualquer cargo. É comum, principalmente no Nordeste, ouvir algum poderoso dizer que vai "pôr o filho de vereador". No caso, conjuga-se o verbo "pôr" como "eleger". Na Paraíba, todos os senadores e 92% dos deputados federais têm parentes políticos.

Não é exceção. A eleição para a Câmara federal em Estados do Nordeste é uma questão de família. No Rio Grande do Norte, 88% dos deputados - a começar pelo presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB) - têm outros eleitos na parentela. Em Alagoas, 78% dos deputados e os três senadores - inclusive o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB) - também são parentes de políticos. No Piauí, 70%. Em Pernambuco, 64%.

Seria injusto dizer que se trata de uma tradição só nordestina. A política hereditária é mais arraigada lá, mas não só lá. Segundo a Transparência Brasil, em nenhuma região brasileira há menos de um terço de deputados parentes de outros políticos. A proporção vai de 34% no Sul a 60% no Nordeste. É de 46% no Centro-Oeste, 43% no Norte e 36% no Sudeste.

Mesmo em Estados onde essa taxa não parece tão alta, como Rio de Janeiro (30%) e Distrito Federal (25%), já houve governadores que conseguiram, ou ao menos tentaram, legar a suas garotinhas - esposas e filhas - seu patrimônio eleitoral.

Proporcionalmente, nenhuma sigla bate o DEM em familiaridade com a política - ou política familiar, tanto faz: 67% de seus deputados são aparentados de outros políticos. O PMDB está chegando lá, com 64%. Em números absolutos, os peemedebistas já são campeões: 63 parlamentares-parentes. Com 43% e 47%, respectivamente, PSDB e PSB estão na média da hereditariedade.

Os 17% de deputados herdeiros ou herdados do PT configuram a menor taxa entre os grande partidos. Mas a lanterna talvez seja apenas uma questão de tempo, a julgar por Zeca Dirceu (filho de José Dirceu), José Guimarães (irmão de José Genoino) e pela prolífica e poderosa família Tatto em São Paulo.
Aécio e Eduardo pregam a renovação da política. Comungam a proposta de estender os mandatos dos eleitos para cinco anos e juntar todas as votações - de vereador a presidente - num pleito só. Em contrapartida, oferecem o fim da reeleição. Parece que, para eles, o problema é o excesso de eleições. A reforma seria, fundamentalmente, gregoriana: do calendário.

Difícil crer que seja tão simples assim renovar a política. São justamente os neófitos os principais beneficiários da política familiar: 2 de cada 3 deputados federais com menos de 40 anos pertencem a clãs de políticos. A taxa chega a 70% entre os de primeiro mandato. Mudam os prenomes, ficam os sobrenomes.

Com uma porta de entrada tão estreita, não é estranho que o Congresso seja mal visto pela sociedade. Sem reformas, a chance de chegar ao poder continuará a depender de laços sanguíneos. Sem renovação, mais e mais conselhos ditos populares tentarão se travestir de democracia direta.

Paulo Brossard: Encalhado

- Zero Hora (RS)

O Brasil atravessa momento impreciso, praticamente estacionado, tão mofino tem sido seu crescimento, coisa de 2% ao ano, dá a ideia de um navio encalhado. A perspectiva de melhoria significativa parece remota, enquanto a menos boa, lastimavelmente, é mais plausível, considerando a queda no crescimento do PIB e os dados internos e externos. Em ano anterior, o resultado não fora bom e o governo se limitou a projetar aumento espetacular, de um "pibinho" prometia um "pibão". O resultado, mais que pífio, foi deplorável. Nesse quadro, nenhum sinal promissor aparece, nem mesmo na linha do horizonte. Mas a senhora presidente é candidata à sua reeleição. Alvíssaras!

Quem pretende a reeleição sem nada dizer a respeito leva a supor que continuará as linhas da sua atual gestão. Afinal de contas, quem diz reeleição sem nada esclarecer faz crer a continuidade do que fez e do que deixou de fazer em quatro anos de governo.

Compreende-se que um grande governo possa motivar a reeleição do governante, mas ainda não se vira que chegue ao cabo o quadriênio menos feliz da gestão e alguém possa pensar em continuidade. Seria o paradoxo dos paradoxos.

Agora, por exemplo, a senhora presidente sem lei, por arbítrio seu, surpreendeu o seu mutismo com um decreto que literalmente desmancha a administração pública; esta é regida por lei e a senhora presidente, revogando a Constituição, abre as portas da administração a quem nela queira entrar e mexer como lhe aprouver. Seria o conúbio da legalidade administrativa com a licenciosidade do anonimato. Trata-se de uma fuga à realidade nunca vista, expediente com que a senhora presidente pretenderia superar a atrofia política e administrativa chegada ao descalabro do encalhe. Daí por que não seria surpresa se o resultado viesse a ser a retração do país, e esta tem sido a opinião de doutos.

Nenhum alvitre, ainda que mediocremente razoável. A reeleição seria o segredo do milagre, mas este é por demais escarninho. Com devaneios não se desencalha uma jangada, muito menos uma nação.

Jurista, ministro aposentado do STF

Painel - Bernardo Mello Franco (interino)

- Folha de S. Paulo

Café sem leite
O paulista Geraldo Alckmin ainda não ajudou o mineiro Aécio Neves a decolar no maior colégio eleitoral do país. Entre os eleitores do governador, o presidenciável do PSDB tem apenas 25% das intenções de voto. Está tecnicamente empatado com Dilma Rousseff (PT), favorita de 24% dos alckmistas. Se o quadro não mudar, os tucanos viverão uma revanche de 2006. Naquele ano, Alckmin tentou a Presidência e sofreu com o voto "Lulécio", que uniu Lula e Aécio em Minas Gerais.

À deriva Segundo o Datafolha, 23% dos alckmistas dizem não ter candidato a presidente. Outros 10% não sabem em quem votar. O governador tem aparecido pouco na pré-campanha de Aécio.

Doce vampiro Os serristas, quem diria, são mais generosos com o mineiro. Entre os que pretendem votar em José Serra (PSDB) para o Senado, Aécio tem 28%. Dilma aparece com 18%.

Dilmalckmin No eleitorado de Dilma, o governador tucano tem quase metade (48%) das intenções de voto. Paulo Skaf (PMDB) aparece com 20%, e o petista Alexandre Padilha, com apenas 8%.

Terceira via Alckmin só não venceria entre os apoiadores de Eduardo Campos (PSB). Quem lidera no grupo é Skaf, com 40%. O governador está colado, com 39%.

Então, tá Os tucanos tentam ver um ponto positivo no inquérito contra ex-secretários de Alckmin suspeitos de participar do cartel dos trens. O STF rejeitou pedidos de cooperação internacional, que tornariam a investigação mais longa.

Quanto pior... Aliados de Skaf comemoraram essa decisão, que pode constranger a campanha tucana. No front petista, Padilha já se esforçava para explicar citações na Operação Lava Jato da PF.

Na rebarba Skaf ainda sonha em se beneficiar com a disputa entre PSD e PSB pela vice de Alckmin. Michel Temer disse ao pessedista Gilberto Kassab que as portas do PMDB seguem abertas.

Esconde-esconde O governo vai retirar do ar propagandas que contenham marcas de programas federais. Quer evitar problemas com a Justiça Eleitoral.

Imprevisto Aécio Neves estará na convenção do PSDB de Minas, nesta terça. Vai retomar as conversas sobre seu vice. O tema seria discutido hoje, após reuniões no Recife, mas a viagem foi adiada com o nascimento prematuro de seus filhos gêmeos.

Apostas Em Minas, será debatida a opção do ex-senador Tasso Jereissati como vice. Mas os tucanos ainda sonham com Henrique Meirelles, ex-presidente do BC, caso o PSD abandone Dilma.

Quem não chora... Michel Temer prometeu a aliados do PMDB ser agressivo na cobrança de cargos caso Dilma seja reeleita. Disse que pedirá pastas poderosas, com direito a indicar os subordinados ao ministro.

... não mama O vice exigirá ainda presença de peemedebistas no núcleo da campanha. Para aprovar a aliança na convenção do partido, também quer que os ruralistas opinem na preparação do programa de governo.

Estranho no ninho O marqueteiro de Eduardo Campos (PSB), Diego Brandy, ganhou ingresso para Brasil x México em Fortaleza. Preocupado com a ida do argentino ao Castelão, um colega de campanha sugeriu que ele fique na torcida mexicana.

Preso caro A União pode pagar até R$ 290 mil para um escritório de advocacia italiano no processo de extradição de Henrique Pizzolato, condenado no mensalão.
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Tiroteio
"Esse decreto foi um erro e uma agressão ao parlamento. O assunto deveria ser tratado por lei. O Congresso vai acabar derrubando."
DO DEPUTADO EDUARDO CUNHA, líder do PMDB na Câmara, sobre o decreto presidencial que obriga realização de consultas públicas em órgãos do governo.
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Contraponto
Furto (nem tão) famélico

Na semana passada, a segunda turma do STF votou um pedido curioso de habeas corpus. Uma mulher foi presa em Minas Gerais por roubar cinco embalagens de lombo de bacalhau. O relator, Gilmar Mendes, defendeu que ela devia ser libertada por ter cometido o crime só para se alimentar. Foi vencido pelos colegas, que acharam o valor do roubo, R$ 360, alto demais.

--Além do bacalhau, vemos no processo que ela também levou uma lata de azeite. Estava tentando fazer uma bacalhoada? --questionou Ricardo Lewandowski, provocando risos dos colegas.

Diário do Poder – Cláudio Humberto

- Jornal do Commercio (PE)

• Esteves e Hamyltinho viram personagens da CPI
Além de André Esteves, amigo de figurões do PT e dono do banco BTG, deve virar personagem da CPI Mista da Petrobras o empresário Hamylton Padilha, vulgo “Hamyltinho”, uma das pessoas mais influentes e poderosas nos negócios da estatal. Como “investidor”, ele disponibilizou a Esteves um “negócio da China”, na África: US$ 1,5 bilhão por poços de petróleo da Petrobras avaliados em US$ 7 bilhões.

• Indagações
A oposição quer saber por que ofereceram a operação africana a André Esteves, amigo Lula, a preço de banana. E quanto Hamyltinho faturou.

• Compensação
Esteves e Hamyltinho entraram na lista que personagens a serem expostos na CPMI, para compensar a blindagem das empreiteiras.

• Pelo ralo
A Petrobras produzia e explora petróleo em Angola, Benin, Gabão, Líbia, Namíbia, Nigéria e Tanzânia, onde investiu US$ 4 bilhões.

• Profundezas
Hamylton Padilha é velho conhecido do setor. Passou por suas mãos o negócio da Petrobras com plataforma P-36, que afundou em 2001.

• Defesa de Vargas tenta manobras protelatórias
Operador do doleiro Alberto Youssef junto ao governo Dilma, o ex-vice-presidente da Câmara André Vargas (PR) agora acusa o presidente do Conselho de Ética, Ricardo Izar (PSD-SP), de ofender Código de Ética. Em carta enviada aos membros do Conselho, o advogado Michel Saliba alegou que era atribuição do relator, e não de Izar, negar a suspensão do processo de cassação do mandato do ex-petista.

• Embromation
A defesa de Vargas pediu sobrestamento do processo até a conclusão de sindicância na Corregedoria ou desfecho de investigações no STF.

• Homem-bomba
Com medo de Vargas abrir o bico, o PT trabalha no Conselho de Ética para blindar o ex-correligionário, que agora xinga Dilma e os petistas.

• Nada muda
Para evitar que Vargas recorra na Justiça, Izar combinou de passar ao relator Júlio Delgado (PSB-MG) a decisão sobre pedido de suspensão.

• Itaú na oposição
O herdeiro do Itaú Unibanco, Ricardo Marino, filho de Milu Villela, disse, em Londres, que cresceram as chances de Dilma Rousseff perder as eleições. A afirmação foi para uma plateia de banqueiros, financistas e investidores em evento do Instituto Internacional de Finanças.

• Euforia
Mais uma vez a Bolsa reagiu com entusiasmo à nova derrapada de Dilma nas pesquisas. Com a notícia da queda de 4%, o Ibovespa subiu 3,04%, sexta-feira. Ações da Petrobras dispararam mais de 8%.

• Fazendo água
O Ministério Público Federal prorrogou as investigações sobre suposta compra irregular de apê avaliado em R$ 5 milhões do comandante Moura Neto, à beira-mar no Rio. A Marinha estourou prazos.

• Troco goiano
O pessoal de Michel Temer desconfia que os convencionais do PMDB de Goiás, ligados a Íris Rezende, ficarão contra o apoio à reeleição de Dilma. Pelo sim, pelo não, Íris tem falado com Eduardo Campos (PSB).

• Falta cintura
Presidente do PPS, Roberto Freire não esconde a insatisfação com Romário (PSB), que cogita disputar o Senado na chapa de Lindbergh Farias: “Como articulador político, ele é um ótimo finalizador no futebol”

• Saiu na frente
O deputado Leonardo Picciani (PMDB) garante que “ninguém no Rio terá exército maior” que o presidenciável Aécio Neves (PSDB-MG), que participou de ato com a presença de 1,4 mil lideranças de 17 partidos.

• Tucanos se bicando
Aécio Neves é pressionado a intervir nas brigas do PSDB do Pará e Paraíba. As cúpulas tucanas querem impedir que os senadores Mário Couto (PA) e Cícero Lucena (PB) disputem a reeleição.

• Dia de Cooperar
Cooperativas de todo o país realizam em 6 de setembro o “Dia C”, para valorizar o trabalho voluntário. Coordenadas pela Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), entidades oferecerão, por exemplo, atendimento médico gratuito, envolvendo mais de 200 mil voluntários.

• Profecia
Com Dilma caindo nas pesquisas e adversários parando, é grande a chance de o candidato Fuleco ganhar as eleições contra o Cacareco.

Teresa Cristina - Pura Semente

Paulo Mendes Campos: Sentimento do tempo

Os sapatos envelheceram depois de usados
Mas fui por mim mesmo aos mesmos descampados
E as borboletas pousavam nos dedos de meus pés.
As coisas estavam mortas, muito mortas,
Mas a vida tem outras portas, muitas portas.
Na terra, três ossos repousavam
Mas há imagens que não podia explicar: me ultrapassavam.
As lágrimas correndo podiam incomodar
Mas ninguém sabe dizer por que deve passar
Como um afogado entre as correntes do mar.
Ninguém sabe dizer por que o eco embrulha a voz
Quando somos crianças e ele corre atrás de nós.
Fizeram muitas vezes minha fotografia
Mas meus pais não souberam impedir
Que o sorriso se mudasse em zombaria
Sempre foi assim: vejo um quarto escuro
Onde só existe a cal de um muro.
Costumo ver nos guindastes do porto
O esqueleto funesto de outro mundo morto
Mas não sei ver coisas mais simples como a água.
Fugi e encontrei a cruz do assassinado
Mas quando voltei, como se não houvesse voltado,
Comecei a ler um livro e nunca mais tive descanso.
Meus pássaros caíam sem sentidos.
No olhar do gato passavam muitas horas
Mas não entendia o tempo àquele tempo como agora.
Não sabia que o tempo cava na face
Um caminho escuro, onde a formiga passe
Lutando com a folha.
O tempo é meu disfarce.

domingo, 8 de junho de 2014

Opinião do dia: Roberto Freire

Dilma será lembrada pela deterioração da economia e pelos "pibinhos" que acumulou nos quatro anos de mandato. Por mais que a máquina de propaganda do PT tente ludibriar a sociedade e o mercado, inclusive com manipulação de dados e controle artificial de preços, cada vez mais gente se dá conta da peça de ficção encenada com a desfaçatez que caracteriza os atuais ocupantes do poder. Mas eles vão passar. O país já não suporta um desempenho econômico tão medíocre, com o PIB lá embaixo e a inflação no alto. A mudança virá.

Roberto Freire, deputado federal (SP) e presidente nacional do PPS. “Dilma, a presidente do 'pibinho' e da inflação”, Brasil Econômico, 6 de junho de 2014

Decreto que institui conselhos populares abre debate sobre risco de poder paralelo

• Atacada por parlamentares e juristas e questionada pelo vice-presidente da República, a Política Nacional de Participação Social, estabelecida no fim do mês passado por Dilma Rousseff, chega à sua segunda semana de vida ameaçada de não vingar

Gabriel Manzano - O Estado de S. Paulo

Sob ataque das oposições e de juristas, que apontam nova tentativa do governo petista de implantar uma democracia direta no País, mas defendida com vigor pela presidente Dilma Rousseff, a recém-nascida Política Nacional de Participação Social, instituída via decreto 8.243, chega à sua segunda semana de vida ameaçada de não vingar.

O presidente da Câmara, deputado Henrique Alves (PMDB-RN), quer que o governo transforme o texto em projeto de lei a ser debatido pelos parlamentares. Um bloco de dez partidos luta para derrubar o decreto no Supremo Tribunal Federal. A Ordem dos Advogados do Brasil também avalia contestá-lo nos tribunais. Aliados do Planalto silenciam e o próprio vice-presidente da República, Michel Temer, lança dúvidas sobre a maneira monocrática como a medida foi instituída.

Divulgado no dia 26 de maio, o decreto se propõe, em seus 22 artigos, a instituir um complexo sistema de consultas no qual a “sociedade civil” tem papel central. São criados conselhos, comissões, conferências, ouvidorias, mesas de debate e fóruns, além de audiências e consultas públicas. Essas instâncias ajudariam na elaboração de políticas públicas e atuariam como fiscais, sob o argumento de “consolidar a participação social como método de governo”. Por fim, o decreto encarrega a Secretaria-Geral da Presidência de dar “suporte técnico e administrativo” ao sistema.

Não estão definidos ainda os critérios para escolha dos integrantes da sociedade civil que vão participar. Estão aptos “cidadãos”, ou seja, qualquer pessoa, “coletivos”, grupos organizados nos quais se incluem centros de pesquisa, e “movimentos sociais” – os sem-terra, sem teto, pelo passe livre, etc.

Não demorou para que o documento despertasse desconfianças. “É um decreto autoritário. Tem vagas declarações democráticas, mas sujeita ao puro arbítrio da cúpula a participação social em assuntos administrativos”, diz o jurista Carlos Ari Sundfeld, professor de Direito Administrativo na FGV-SP. O texto, diz ele, “adota o método do sindicalismo da era Vargas, para gerar uma sociedade civil chapa branca, que fale por meio de instâncias sob controle oficial”.

Na linha de frente contra os 22 artigos está também o jurista e ex-ministro Miguel Reale Jr., para quem o decreto “é genérico, nada especifica sobre os movimentos sociais, cria organismos que vão interferir no processo decisório da administração, cria um Estado paralelo. Enfim, exorbita absolutamente do âmbito da lei”. Ao assiná-lo, diz o ex-ministro, Dilma está apenas dizendo às multidões insatisfeitas das ruas: ‘Vejam, eu estou olhando por vocês’”.

A lista de críticos inclui o ministro do STF Gilmar Mendes, que chama o decreto de “autoritário”, e o ex-ministro da Corte Carlos Velloso, que vê na iniciativa “uma coisa bolivariana, com aparência de legalidade”.

Outro ex-ministro, Eros Grau, afirma que o País “tem uma Constituição que permite que o povo se manifeste e esse negócio de conselho popular e consultas talvez seja expediente para legitimar o que não é legítimo”. O ministro do Supremo Marco Aurélio Mello diz não ver “nada em contrário à Constituição”, mas se preocupa com um aspecto: a criação de um fundo destinado a gerir o sistema.

Atacada, a presidente Dilma reagiu rápido. O decreto, diz ela, permite a participação “de todos os segmentos” na estruturação das políticas de governo. “Muitas cabeças pensam mais que só a cabeça do Executivo”, afirmou na semana passada.

Estudioso do assunto há muitos anos, o cientista político Rudá Ricci considera as críticas “má-fé ou ignorância de quem não leu o projeto”. Em seu entender, o texto nada tem de eleitoreiro, não invade competências do Legislativo e o modo como funcionarão os conselhos populares “é apenas uma síntese de práticas já existentes no País”. A estrutura criada, diz ele, “antecipa qualquer confronto de rua, já que se torna uma escuta permanente, institucional”.

Incertezas. Como pano de fundo do debate estão antigas polêmicas sobre democracia direta e os chamados “conselhos populares” – temas que, no passado, desgastaram o PT e fizeram o governo recuar de iniciativas como a criação de um Conselho Federal de Jornalismo. Além disso, vem a público num momento marcado por greves de transporte, protestos de rua e uma Copa do Mundo.

Os críticos lembram que as possibilidades de democracia direta garantidas na Constituição se limitam a plebiscitos, referendos e leis de iniciativa popular, como a da Ficha Limpa. Os defensores do decreto argumentam que o Executivo consultar a sociedade para definir suas políticas é um procedimento natural, que já ocorre em áreas como a da saúde e da assistência à criança.

O professor de História Contemporânea da USP Lincoln Secco entende que o projeto “é, ainda, uma resposta aos protestos de junho passado”. Autor de A História do PT, Secco diz que o descontrole atual das ruas tem origem no governo Luiz Inácio Lula da Silva, que, em seu início, convocou sindicatos, movimentos e pastorais para compor as áreas sociais dos ministérios.

“Isso afastou esses grupos da rua e das carências imediatas dos pobres”, diz. Nesse vazio surgiram “esses novíssimos movimentos que escapam ao controle do PT e colocam pautas que o governo tem dificuldades de resolver”. O anunciado Sistema Nacional de Participação Social teria a função, afirma, “de canalizar essas reivindicações”.

Gaudêncio Torquato: Um parlatório para o Executivo

• O curinga escondido no baralho do PNPS bate nos vãos centrais do nosso Parlamento

- O Estado de S. Paulo

Que tal aperfeiçoar a democracia com mais arquivos, toneladas de papéis, verborragia tonitruante em palanques montados ao redor de uma gigantesca Torre de Babel? Fosse essa a hipótese para a comunidade política expressar sua opinião, a resposta seria um vigoroso "Não!". Pois esse é o pacote que o governo federal acaba de embalar ao instituir, por decreto, a Política Nacional de Participação Social (PNPS), mais uma sigla no dicionário de coisas perfunctórias, figuras mirabolantes, balões de ensaio e experimentos que incham a paquidérmica máquina do Estado.

Fica patente a intenção do Executivo de canalizar as aspirações sociais, as reivindicações setoriais e as demandas de categorias profissionais, enfim, os ecos das ruas, que desde meados do ano passado tentam abrir as veias congestionadas de nossa democracia representativa e dar vazão ao poder centrípeto, que corre das margens para o centro em todos os espaços do território. O governo, de maneira unilateral, cria um conjunto de instâncias - conselhos, conferências de políticas públicas, ouvidorias públicas, mesas de diálogo, fóruns interconselhos, audiências públicas, consultas públicas, interfaces e ambientes virtuais - que, ao fim e ao cabo, nada mais são do que eixos paralelos da democracia participativa.

A ideia de fortalecer a democracia direta é boa? Sem dúvida. A metodologia é que parece enviesada. O governo deixa claro que os mecanismos propostos integrarão o que designa Sistema Nacional de Participação Social, sob a égide do Poder Executivo. Essa é a polêmica que se abre. Fazer brotar um conjunto de novas espécies na floresta de nossa democracia participativa sem espiar o que dispõe a Carta Magna é atropelar o Poder que tem funções legislativas, o mesmo que abriga os canais de nossa democracia direta - o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular, conforme reza o artigo 14, que trata da soberania popular. Pelo primeiro instrumento, o povo adquire o poder de sancionar as leis; o segundo abre a possibilidade ao povo de aprovar fatos, situações, temáticas concernentes à estrutura do Estado ou do governo; e o terceiro permite que a sociedade, por meio de suas organizações, proponha projetos de lei ou alterações na norma constitucional, condição que exige determinado número de assinaturas.

Imaginem, agora, uma torrente de audiências públicas, consultas, fóruns de debates, ouvidorias, reuniões periódicas de conselhos populares sob o império do Poder Executivo. O risco é de que essa composição possa transformar-se em instrumento para rearranjar não apenas os modelos de gestão pública, mas interferir no próprio escopo legislativo. Sob a aparente boa intenção de alargar os canais da comunicação ascendente - da sociedade para o governo -, o que efetivamente se deixa ver é um acervo expressivo, de índole utilitarista, com evidente interferência no campo funcional sob responsabilidade do Parlamento. Urge lembrar que os órgãos do Poder Executivo já se obrigam, por estatuto, a instituir critérios que se voltem para a transparência, a melhoria de produtividade, o zelo, a racionalidade, enfim, a maximização de resultados.

A estratégia de abrir os pulmões do governo e, mais, de "viabilizar a participação da sociedade civil no processo decisório e na gestão de políticas públicas" seria razoável se não tivéssemos uma máquina pública usada como extensão partidária. O aparelhamento dos mecanismos estatais chegou ao ápice no ciclo petista, o que tem contribuído para o desmonte de sistemas de alta referência, até mesmo aos olhos internacionais, como a Embrapa, hoje pálida imagem dos tempos em que era ícone de padrões de qualidade em pesquisa agropecuária. Daí a suspeição de que a multiplicação de órgãos de participação social integre a estratégia de adensamento de grupos e castas na administração federal, mesmo que as regras para composição das instâncias abriguem "representantes eleitos ou indicados pela sociedade civil", garantindo-se "a diversidade dos sujeitos participantes". As intenções explícitas nessa envolvente promessa não evitarão os dribles na direção do aparelhamento do Estado.

Portanto, o viés politiqueiro transparece no pacote das instâncias propostas, a par da constatação de que o governo vem perdendo força (e credibilidade) entre as organizações sociais. Como é sabido, nos últimos anos o governo cooptou e acolheu em parcelas importantes da administração pública grupos que, até então, assumiam posições de vanguarda nas frentes de mobilizações sociais, como a CUT. O largo espaço das relações trabalhistas, dominado por ela e, em menor escala, pela Força Sindical (em razão de posições trocadas no campo político), não tem propiciado condições para modernização legislativa na área, bastando anotar a barreira imposta à legislação sobre terceirização de serviços, em tramitação na Câmara dos Deputados. Pois bem, um dos gargalos que atravancam o sistema trabalhista é a posição obsoleta de centrais sindicais quanto às relações do trabalho, a partir de sua luta contra os serviços terceirizados, sob o olhar complacente de uma Justiça trabalhista que teima em enxergar o País na era da Revolução Industrial.

Daí se chegar à inferência: a cooptação de entidades ligadas ao universo do trabalho arrefeceu o ambiente reivindicatório e as paralisações paredistas. Milhões de trabalhadores viram suas entidades caírem no "berço esplêndido" estatal. O vazio criado pelo amortecimento das grandes organizações tradicionais abriu lugar a novos polos de poder, esses que estão nas ruas abrindo o ciclo do "queremos mais e melhor". Sentindo-se empurrado por ondas sociais em pleno curso, o governo vê uma luz no fim do túnel: a locução social por meio de uma bateria de novas instâncias. Esse é o curinga escondido no baralho. A ideia tem fundamento. Bate, porém, nos vãos centrais do Parlamento, catedral de nossa democracia representativa.

*Jornalista, professor titular da USP

Por 20 centavos e muito mais: manifestações completam um ano

• Protestos se fragmentam, alternam pautas e sobrevivem sem diálogo com os governos

Tatiana Farah – O Globo

SÃO PAULO - No princípio eram os 20 centavos. Em poucos dias, chegaram a "educação e saúde padrão Fifa", o "contra a militarização das polícias", o "sem violência", o "sem partido" e uma infinidade de motes que arrastaram cerca de dois milhões de pessoas às ruas do país. As manifestações de junho de 2013 deixaram no Brasil um clima de insatisfação que não se reverteu mesmo um ano depois e que, por enquanto, tem apontado para uma alta abstenção nas eleições. Além disso, deram força para que movimentos tradicionais, como os de sem teto e as greves por melhores salários, ganhassem força para impor sua agenda e pressionar governos e patrões às vésperas da Copa.

Os efeitos das manifestações de junho na política ainda são visíveis. Que o diga a presidente Dilma Rousseff. Em março de 2013, três meses antes de o movimento tomar as ruas do país, sua popularidade batia recorde, com 65% dos entrevistados pelo Datafolha avaliando o governo como ótimo ou bom. Ao final de junho, o recorde virou negativo: apenas 30% de aprovação. A presidente até ensaiou uma recuperação parcial e chegou a ter 41% de aprovação em fevereiro. Mas voltou a cair e chegou, neste mês, ao patamar de 33% eleitores avaliando seu governo como ótimo ou bom. O efeito das manifestações sobre as eleições é incerto. Na época, governadores também sofreram queda nos índices.

- Há um clima de insatisfação, mas não há nomes dentro da oposição, nem forças políticas, que consigam capitanear isso - avalia o cientista político Marco Aurélio Nogueira, da Unesp, autor de "As ruas e a democracia", sobre a onda de protestos, que complementa: -Se as manifestações prosseguirem ajudando a criar um clima de insatisfação no país, as eleições serão vencidas por quem conseguir estabelecer uma comunicação positiva.

A análise se confirma com o estancamento e mesmo queda das candidaturas dos opositores do governo segundo o último Datafolha. O que cresceu na pesquisa foi a insatisfação. O número de indecisos e pessoas que tendem a votar em branco ou nulo subiu de 24 para 30% dos eleitores.

-Deve haver uma abstenção forte, o que mostra um desencantamento dos brasileiros em relação à política. O processo vai caminhar bem, vai ter eleição, mas há 30% de insatisfeitos- aponta o sociólogo Marcelo Ridenti, da Unicamp.

Ridenti concorda com Nogueira que nenhuma liderança do país conseguiu representar o desejo de mudança dos eleitores.

-As manifestações de junho e as manifestações de hoje são diferentes, mas as duas são expressão de um certo desejo de mudança. E nenhum candidato está conseguindo canalizar esse desejo- diz Ridenti.

Integrante do Movimento Passe Livre (MPL), que protagonizou os protestos em junho, Lucas Oliveira sabe de cor a escalada das manifestações. O primeiro em 6 de junho; outro maior, com 5 mil pessoas, no dia 7. A crescente segue pelos dias 11 e 13, quando houve uma severa repressão policial. A resposta da sociedade veio no dia 17 de junho, com uma grande adesão ao movimento que pedia a suspensão do aumento de 20 centavos no preço das passagens de ônibus não só de São Paulo, mas de outras cidades, como Rio, Belo Horizonte, Recife. As manifestações prosseguem no dia 18, com mais força policial e cenas de violência. No dia 19, com o anúncio da revogação do aumento em São Paulo, os manifestantes capitaneados pelo MPL lotaram a avenida Paulista para celebrar a vitória.

Mas, àquela altura, o protesto não era mais deles. Diversos grupos foram às ruas e acabaram expulsando os partidos da passeata assim como o próprio MPL, que deixou as manifestações naquele dia para cumprir outras agendas na periferia da cidade, como os protestos de sem teto.

-A gente parou porque o nosso chamado era contra o aumento das passagens. A gente venceu- diz Lucas, afirmando que, desde junho, o MPL cresceu e está articulado com seus pares nos estados:- Antes, a gente estava em 5, 6 cidades. Hoje, tem coletivos do movimento em 18 cidades em São Paulo.

Para Marco Aurélio Nogueira, os protestos de junho foram importantes para que o Brasil incorporasse as manifestações ao seu cotidiano, mas produziram pouco resultado político. Não emergiu dos protestos nenhuma nova liderança e faltou uma articulação capaz de transformar essa mobilização em uma força política, analisa Nogueira.

-Os protestos foram uma hidra, com muitos tentáculos, muitas cabeças, muitas agendas e nenhuma articulação. A classe média participou de forma espasmódica, como uma corrente elétrica, e não se pode dizer que haverá outro espasmo como aquele- diz o especialista da Unesp.

Na opinião de Ridenti, em junho passado "a panela de pressão apitou":

- Foi uma explosão de insatisfações. Qualquer explosão desse tipo dificilmente se mantém por muito tempo. Até se manteve bastante, por quase um mês. Esses movimentos foram importantes para mostrar uma certa crise de representatividade do Brasil, tanto dos poderes como dos canais tradicionais, como partidos e sindicatos - diz Ridenti, para quem o poder público não tomou medidas para dialogar com esses movimentos nem para mudar suas práticas, ensaiando uma proposta de reforma política que não foi levada a cabo:

-Os poderes constituídos fizeram muito pouco e continuam blindados dessa pressão da sociedade.

Em meio a protestos violentos, a assiduidade dos brasileiros foi diminuindo nas ruas. Se no começo de junho o protagonismo dos atos era do MPL, aos poucos foi ganhando espaço a tática internacional Black Bloc, que cultua a estética da violência e o ataque a símbolos do governo, como prédios públicos, e capitalistas, como agências bancárias e de automóveis importados. Do outro lado, a repressão policial, que no início de junho gerou uma forte reação da sociedade, ficou ainda maior. Um balanço lançado na semana passada pelo Artigo 19, organização de defesa da liberdade de expressão, apontou que, em 2013, houve 696 protestos em todo o país, com 2.608 pessoas detidas, oito casos de morte relacionados às manifestações e 117 jornalistas feridos, além de inúmeros casos de agressão policial.

- Ainda é muito cedo para avaliar o impacto desses protestos. Eles ainda não acabaram. No curto prazo, o que tivemos foi uma retranca por parte dos governos, que lidaram mal com as manifestações. Há um retrocesso na democracia por parte dos governos, que se prepararam, mas de modo errado, com uma visão de ditadura, de repressão, uma visão militarizada. Já aquelas manifestações acabaram se dissolvendo em pequenas manifestações. Você tinha, antes, um envolvimento maior da classe média. A violência em geral tirou gente dos protestos e ela veio de vários focos- avalia a diretora do Artigo 19, a advogada Paula Martins.

Hoje, a classe média saiu das ruas e ganharam força movimentos como o MTST, dos sem teto, e as mobilizações de classe. Quanto a isso, os protestos de junho deram força à revolta das bases contra os próprios sindicatos. No mês passado, a base rebelde dos rodoviários descumpriu o acordo firmado pelo sindicato e rejeitou o reajuste de 10% para a categoria. A revolta atingiu outras categorias, como os funcionários de limpeza urbana do Rio.

- Junho deu força, com certeza, a esses movimentos. Há uma pressão da base para seus dirigentes terem uma atitude mais combativa. Há uma inédita e surpreendente reação da base como no caso dos rodoviários- diz Ridenti.

Marcos Nobre: ‘Ficou claro que o poder está na rua, não no palácio’

• Autor, professor e filósofo aposta nos protestos de junho como estopim do ciclo de democratização do país

Leticia Fernandes – O Globo

RIO - Autor do livro ‘Choque de democracia — Razões da revolta’, sobre os protestos de 2013, o filósofo e professor da Unicamp Marcos Nobre vê as manifestações de junho como a abertura de um ciclo de democratização do país. No livro escrito em apenas dez dias, ainda durante a ebulição de junho do ano passado, Marcos Nobre procurou explicar a alta temperatura que surpreendeu as ruas de todo o país. O filósofo acredita que o principal legado das manifestações daquele mês foi a retomada do poder do Estado pela sociedade. Passado um ano, os efeitos chegaram até aos espaços institucionais mais tradicionais: os sindicatos.

As manifestações desse ano terão a mesma força?
A ideia de que vai se repetir a situação de junho de 2013 em termos de quantidade e alcance tem probabilidade muito baixa. Junho abriu um ciclo de democratização do país, e os efeitos serão sentidos durante muitos anos na forma de protesto. Junho liberou uma enorme energia democrática, que vai se espalhando.

O que mudou com relação a junho do ano passado?
Uma das diferenças importantes é que vemos as bases sindicais se rebelarem contra a direção dos sindicatos. Aconteceu nas greves dos garis, dos motoristas e cobradores de ônibus, dos professores. Tem um discurso de junho que passa até para setores institucionais, como os sindicatos. A outra diferença é que existe articulação entre os movimentos, se faz uma espécie de coalizão nas ruas. Com diferentes focos e reivindicações, os movimentos sociais não são iguais aos da redemocratização, que se articulavam para tomar o poder. Esses novos não querem tomar o poder, são movimentos que falam da sociedade para a sociedade, e isso é muito novo. É a descoberta de que as instituições políticas não pairam no ar, o Estado não paira no ar.

Essa articulação entre grupos distintos pode deixar os atos sem foco?
Esse tipo de protesto tem foco, mas não está querendo tomar o poder. Há a descoberta de que as polícias dependem da legitimidade da base da sociedade para funcionar, e essa polícia não está à altura da democracia. Essa mudança de visão de que a democracia não está dirigida só para o Estado, mas para as pessoas, abriu uma enorme avenida de aprofundamento da democracia. Antes, não havia esse horizonte, e ele inclui a articulação de focos diferentes. No Rio, o grau de articulação ficou muito mais alto porque tem essa sequência Copa-Olimpíadas, que dá à cidade uma característica de emblema de junho. Agora, você tem um monte de brasas espalhadas, e essas brasas fazem um foguinho.

O que fez as pessoas saírem às ruas?
Não tinha unidade nas jornadas de junho, que é o bacana. Antes, na redemocratização, tinha essa unidade, objetivos comuns, e você não podia atrapalhar essa ideia: derrubar o Collor, Diretas Já... Isso mudou. Se não tem unidade, o que une as pessoas? O hífen. Se não tem o traço de união entre as pautas e os grupos, se põe um hífen entre eles. E esse traço de união é a rejeição do sistema político da forma como está funcionando e uma exigência de reforma radical. Olhando a diversidade de reivindicações, esse é o traço de união. Não é unidade, mas união. A violência policial foi um estopim importante para o alargamento das manifestações, porque ela simbolizava o último braço de blindagem contra a sociedade, representava um sistema político inalcançável. Houve um novo empoderamento das pessoas, e ficou claro em junho que o poder está na rua e, não, no palácio.

Elas vão voltar?
Acho que nunca deixaram de estar ali. O fato de a sociedade tolerar tantas manifestações é sinal de que ainda existe um colchão de junho sustentando esses protestos. O importante é que eles aconteçam, porque a energia ficou represada durante tempo demais.

Ainda há um descolamento muito grande entre a política e a sociedade?
Esse descompasso foi encenado nas ruas e mostra que quem está atrasado é o sistema político, não a sociedade. E ele vai ter que ser resolvido. A organização anterior do sistema político era das grandes maiorias. Essa maneira de funcionar blindou o sistema político contra a sociedade, e isso foi colocado em xeque nas ruas. E o resultado foi uma desorganização da política.

Os candidatos estarão atentos às ruas?
Não tem jeito de não estarem atentos. Junho significou uma coisa elementar do ponto de vista do sistema político: nós não vamos deixar o governo em paz, o sistema político não vai poder dormir tranquilamente. A sociedade nem sempre tem noção do poder que tem. Mas como fazer esse poder se transformar em algo palpável? Esse é outro aprendizado democrático que está em curso. No Rio, de um lado, o Estado está passando um trator em cima de pessoas e organizações; de outro, a sociedade tenta resistir. O Rio é onde as coisas se acirram mais e onde haverá uma das sucessões estaduais mais confusas. Aconteceu algo muito novo e leva-se um tempo para que a novidade se torne poder institucional. Junho foi uma coisa galopante, mas aquele entusiasmo e as transformações que ocorreram como resultado, como a suspensão do reajuste da tarifa naquele momento, são situações que não acontecem todo dia. E, agora que abrimos uma janela, queremos tudo para amanhã.

Essa revolta vai ter impacto nas urnas? Ou o brasileiro tem memória curta?
É possível que a insatisfação do protesto se traduza na forma de votos nulos ou em branco. Aí será uma rejeição ao sistema político, que não vem respondendo de forma positiva, organizada. Do outro lado, talvez se houver esse aumento de brancos e nulos, você não consiga uma alteração do sistema político. Estamos nessa situação: de um lado, uma enorme energia democrática liberada, um anseio por um ritmo mais rápido de democratização; do outro, um sistema político que não conseguiu se organizar. É um descompasso muito grande. As eleições são importantes, mas não são tudo. Se esse aprendizado acontecer, terá sido um enorme ganho.

Resposta do Congresso Nacional às reivindicações foi tímida

• Boa parte dos pleitos não foi atendida, mas pressão das ruas gerou alguns avanços

André de Souza e Evandro Éboli – O Globo

BRASÍLIA - Um ano depois dos protestos de rua que sacudiram o país em junho de 2013, a resposta do Congresso Nacional às reivindicações não atendeu a boa parte dos pleitos. Os manifestantes queriam melhorias no serviço público em geral, mas poucas propostas andaram na Câmara e Senado e viraram lei. No calor da pressão, os congressistas chegaram a criar uma agenda positiva, mas ficaram na intenção.

Com os estudantes à frente, a garantia do passe livre foi uma das principais bandeiras dos atos no ano passado. Foram várias reuniões entre os representantes dos alunos com lideranças políticas. A proposta do passe livre estudantil foi apresentada em 25 de junho, dias após os protestos, por um grupo de senadores, tendo à frente o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL). Nada menos que 52 senadores são os autores desse projeto. Ainda assim, o texto está encalhado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. "Essa circunstância é especialmente dramática no caso dos estudantes, que, em geral, não têm fonte de renda própria e, com isso, restam prejudicados em seus deslocamentos casa-escola, com alguma frequência, tendo até que deixar de frequentar aulas por não ter como custear seu transporte", afirmam os 52 senadores na justificativa do projeto.

Tornar a corrupção um crime hediondo foi outra proposta que não vingou. Apesar de o projeto, do senador Pedro Taques (PDT-MT), ter sido apresentado em 2011, somente em julho de 2013, por conta das manifestações, a iniciativa foi aprovada pelos senadores e encaminhada à Câmara. Os deputados, porém, não deram celeridade ao tema. O projeto, hoje, aguarda entrar na pauta de votação no plenário.

Uma proposta que altera a Constituição previa a diminuição do número de suplentes de senadores e a proibição de que parente possa ocupar a suplência. Vários senadores hoje em exercício são suplentes, não receberam um voto sequer. A proposta, de 2011 e resgatada com os atos de rua, está parada.

Outro assunto da agenda positiva é o fim do foro privilegiado para autoridades em caso de cometerem crimes comuns. Se aprovado, os políticos com mandato responderiam pelo crime em instâncias inferiores. A partir do mensalão, porém, condenados e seus advogados, diante da dura punição do Supremo Tribunal Federal (STF), passaram a entender que direito a foro privilegiado pode ser um dissabor, já que não há outra instância para recorrer.

O fim do voto secreto em sessões de cassação de mandato de senadores e deputados acusados da quebra de decoro parlamentar, outro item das reivindicações dos manifestantes de 2013, foi um dos poucos que avançaram. O projeto foi aprovado, ainda que meses depois dos atos de junho. E também só andou após decisão da Câmara de não cassar o mandato de Natan Donadon (sem partido-RO), em agosto, quando já estava preso na Papuda. Nessa votação, com voto fechado, ele teve seu mandato preservado com 131 colegas a seu favor. Depois de aprovado o voto aberto, com o nome aparecendo no painel do plenário, em fevereiro deste ano, o apoio mingou. Em nova votação, Donadon não teve um voto a seu favor.

Em julho de 2013, o Congresso aprovou a Lei Anticorrupção, que pune empresas privadas acusadas dessa prática contra a administração pública. Pela nova legislação, são punidas empresas que oferecem vantagens indevidas, fraudam licitações e financiam atos ilícitos. Antes, só pessoas físicas podiam ser punidas.

Também foram aprovados mais recursos para a educação, com destinação de 75% dos royalties do petróleo para o setor e 25% para a saúde, além do fim de alguns impostos que incidem sobre o transporte público. Uma das principais bandeiras dos atos, a derrubada da PEC 37 - que limitava os poderes de investigação do Ministério Público em ações criminais - foi alcançada. Pressionados pelas ruas, alguns deputados chegaram a mudar de opinião sobre o tema.

A reforma política, que hiberna no Congresso, entra governo, sai governo, continua parada. A presidente Dilma Rousseff, após as manifestações, defendeu plebiscito sobre uma Constituinte exclusiva para a reforma política. Para a oposição, Dilma queria desviar a atenção de outros problemas. Assim, a reforma não saiu.

Uma questão polêmica que envolve governo e Congresso é a criação de uma lei para reprimir o radicalismo nas manifestações. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, chegou a dizer, em abril, que o governo apoiaria uma proposta relatada pelo senador Pedro Taques (PDT-MT) que aumenta as penas de crimes quando ocorrem em protestos. Na época, ficou acertado que o Executivo encaminharia a Taques sugestões para aprimorar o projeto, a tempo de aprová-lo antes da Copa do Mundo.

O Ministério da Justiça informou que já mandou contribuições a Taques, o que foi negado pelo senador.

- O governo não deu mais as contribuições e retirou apoio ao projeto - disse Taques, acrescentando: - Estou há um ano e meio trabalhando para a aprovação do projeto e não consigo colocar na pauta da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).

Dentro do governo, não há consenso quanto à proposta. Enquanto Cardozo dizia apoiá-la, o ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, interlocutor do governo com os movimentos sociais, falou o contrário. Em 15 de maio, Carvalho negou que haja apoio do governo e afirmou que a legislação atual dá conta de punir eventuais abusos.

Depois das ruas
Projetos aprovados no Congresso
Voto secreto: Palavra de ordem nas manifestações, o fim do voto secreto foi aprovado cinco meses depois no Congresso, em 28 de novembro. No caso de cassação de mandato, a medida ganhou força após decisão da Câmara de não cassar o mandato de Natan Donadon (sem partido-RO), em agosto. Naquele momento, o deputado já estava preso na Papuda.

Empresas corruptas: Em outra tentativa de responder às demandas das ruas, em julho de 2013, o Congresso aprovou a Lei Anticorrupção, que responsabiliza administrativa e civilmente empresas pela prática de atos contra a administração pública. Foi sancionada em agosto pela presidente Dilma Rousseff. A lei pune empresas que oferecem vantagens indevidas, fraudam licitações e financiam atos ilícitos. Antes, só pessoas físicas podiam ser punidas.

Dinheiro para educação: Também na pauta dos manifestantes, a educação foi contemplada com mais recursos. Foi aprovado projeto destinando 75% dos royalties do petróleo para educação e 25% para a saúde.

Imposto de transporte: O Congresso aprovou, em agosto de 2013, projeto que zera as alíquotas de alguns impostos sobre as receitas da atividade de transporte municipal. Foi sancionado por Dilma Rousseff em setembro.

Rejeitados ou parados

PEC 37: A derrota da PEC 37, que limitava os poderes de investigação do Ministério Público em ações criminais, também foi uma vitória dos manifestantes. Os parlamentares votaram de olho nas ruas. Na comissão especial, na Câmara, a proposta chegou a ser aprovada, em 2012, por 14 a 2. Mas, quando se deu a votação no plenário, oito destes mudaram de opinião. No total, apenas 9 votaram a favor. E 430 contra.

Reforma política. Após manifestações, a presidente Dilma defendeu a reforma política como uma saída para as mazelas políticas. Ela defendeu plebiscito sobre uma Constituinte exclusiva para a reforma política. A oposição acusou a presidente de usar a reforma política para desviar a atenção dos problemas reais do país. Sem empenho de parlamentares da base e da oposição, a reforma nunca andou.

‘Eleitor quer ganhos, sem perder o que conquistou’

Entrevista. Marcia Cavallari, CEO do Ibope Inteligência

• Especialista avalia que voto do brasileiro está mais pragmático e menos ideologizado

Lourival Sant'anna- O Estado de S. Paulo

CEO do Ibope Inteligência, Marcia Cavallari explica, em entrevista ao Estado, qual é a mudança que o eleitor deseja, por que isso é fundamental para a eleição e como o instituto chegou aos perfis de eleitores que foram entrevistados para este caderno.

Para a análise da corrida eleitoral, por que é importante medir o desejo de continuidade ou de mudança do eleitorado?
Essa pergunta é fundamental para medir o clima no qual a eleição será realizada. Se o desejo de continuidade é grande, significa que o atual governante está bem e tem chances de se reeleger ou de fazer o seu sucessor. Por outro lado, se há um forte desejo de mudança, não se pode dizer que o governante não terá chances de vencer, pois outras variáveis estarão em jogo.

Essa divisão entre quem quer continuidade ou mudança no governo pode prever o resultado de uma eleição?
Não, não se pode fazer projeções a partir dos resultados de uma única pergunta. Sempre há um conjunto de fatores que interferem no resultado de uma eleição e, que se forem corretamente observados e analisados, ajudarão no entendimento dos movimentos das curvas de tendência. O objetivo de uma pesquisa não é projetar os resultados de uma eleição, mas sim levantar elementos para se entender a evolução das opiniões.

Essa correlação entre voto e desejo de mudança é um fenômeno que só acontece no Brasil ou é universal?
Tendo em vista a quantidade de manifestações contra os governos que vêm ocorrendo em vários países do mundo, pode-se dizer que é um fenômeno universal. As pessoas estão discutindo questões que atualmente têm gerado muita insatisfação, sejam elas relativas à transparência dos governos, à qualidade dos serviços prestados nas áreas da saúde, educação, segurança, transporte, etc.

Em comparação às eleições presidenciais anteriores, a de 2014 se assemelha mais a qual? À de 1998 ou à de 2002?
Nas eleições de 1998, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso se reelegeu no primeiro turno. Já em 2002, havia um desejo grande de mudança e Lula se elegeu pela primeira vez para um cargo executivo. Do ponto de vista do desejo de mudança, as eleições de 2014 se assemelham às de 2002.

Esse desejo majoritário por mudança significa que a oposição vai necessariamente ganhar a eleição?
Não, as pesquisas que temos realizado mostram que há um desejo de mudança do Estado brasileiro. O eleitor deseja mudanças na forma de se fazer as coisas, ele espera que a economia esteja controlada, que haja avanços na saúde, educação, segurança, etc. Anseia por um país mais justo, mais humano e um governo que o respeite como cidadão. Nada impede que a situação também possa responder a essas demandas.

É uma questão apenas de o eleitor mudancista descobrir quem são os candidatos de oposição ou é mais complicado do que isso?
É mais complicado, pois não se trata somente de ser de oposição ou situação. O desejo por mudança vai beneficiar o candidato que conseguir demonstrar que é o mais alinhado com as mudanças que devem ser feitas e também o que tem mais condições de implementá-las. Até o momento, as pesquisas mostram uma liderança da presidente Dilma, apesar de a maioria absoluta desejar mudanças no atual governo.

Como o Ibope identificou esses grupos de eleitores mudancistas e continuístas que viraram objeto das reportagens deste caderno?
Por meio de uma análise estatística, chamada de árvore de decisão. Essa técnica permite criar hipóteses baseadas em instâncias particulares para que se chegue a conclusões gerais. É uma estrutura muito usada em problemas de classificação. As árvores vão se ramificando, levando a segmentos específicos do eleitorado que compartilham com mais força aquela opinião. Essa análise gerou seis grupos, onde o desejo de mudança está mais presente. O maior deles, representando 21%, é composto por eleitores de classe C, da Região Sudeste, residentes em municípios médios e grandes. O segundo maior, com 14%, são os eleitores de classes A e B com nível médio ou superior residentes no Sudeste.

O desejo de mudança ou continuidade é estável ou ele pode mudar ao longo da campanha? O que pode interferir nisso? A Copa, a economia?
Pode mudar, e muda continuamente, não somente em função da Copa ou da economia. Os fatores estão todos interligados.

O que é mais eficiente para o governante que disputa a reeleição quando o eleitorado quer mudança? Sinalizar que vai mudar seu governo ou apostar no discurso do medo, de que a mudança pode implicar perder o que o eleitor já conseguiu?
O eleitor está cobrando cada vez mais consistência dos candidatos e decidindo o seu voto de forma mais pragmática e menos ideologizada. Ele avalia quais benefícios concretos cada candidato pode lhe trazer. Ele quer ganhos tangíveis a curto prazo, mas também não quer perder o que já conquistou. Cada candidato vai procurar valorizar perante o eleitor as condições que possui para trazer um impacto positivo para sua vida. Resta saber qual deles vai convencer o eleitor. Além disso, não podemos esquecer que as pessoas, quando falam em mudanças, querem dizer melhorias, avanços, enfim, querem as coisas em movimento.

Marina diz que aliança com Alckmin em eleição em SP é 'equívoco'

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Em nota divulgada neste sábado (7), Marina Silva, candidata à vice-presidência na chapa de Eduardo Campos, do PSB, criticou a decisão do partido de apoiar a reeleição do governador Geraldo Alckmin (PSDB) em São Paulo.

"Para nós, isso é um equívoco. Consideramos necessário manter independência e lançar uma candidatura própria, que dê suporte ao projeto de mudança para o Brasil liderado por Eduardo Campos, e que dê ao povo de São Paulo a chance de fazer essa mudança também no âmbito estadual", disse ela.

Na véspera, o diretório do PSB paulista aprovou por unanimidade o apoio ao PSDB no Estado.

A ex-senadora afirma esperar que o PSB paulista reverta a decisão. Mas deixa claro que, do contrário, a Rede "seguirá caminho próprio e independente" no Estado.

"Em todo o país, estamos debatendo o assunto e apoiando nossos companheiros de São Paulo na busca de uma alternativa que supere a velha polarização PT-PSDB."

Caciques
Marina sempre foi contra o apoio a Alckmin sob o argumento de que ele contradiz o discurso nacional da sigla, que prega a "nova política" em detrimento das alianças com " caciques".

Mas, nas últimas semanas, o PSB voltou a pressionar pela aproximação com o governador. O partido defende o nome de Márcio França como o candidato a vice-governador na chapa de Alckmin ou como candidato ao Senado. Gilberto Kassab, do PSD, também é cotado para a vice.

Campos aparece em terceiro lugar nas pesquisas, atrás de Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB).

Marina: 'Rede não seguirá indicação' do PSB em aliança com Alckmin

• Candidata à vice na chapa de Eduardo Campos fala em independência de seus aliados em São Paulo

Sérgio Roxo – O Globo

SÃO PAULO - A ex-senadora Marina Silva e candidata a vice na chapa de Eduardo Campos divulgou nota neste sábado contra a decisão do diretório de São Paulo do PSB de aprovar a aliança com a candidatura à reeleição do governador Geraldo Alckmin (PSDB). No Facebook, Marina disse que a "Rede Sustentabilidade não seguirá essa indicação". Marina afirmou ainda que seus aliados dentro do PSB "seguirão caminho próprio e independente" em São Paulo, caso a estratégia não seja mudada.

Marina publica nota com críticas à aliança em SP - Facebook

Na sexta-feira, aliados já diziam que a decisão do diretório de São Paulo do PSB de aprovar a aliança com a candidatura à reeleição do governador Geraldo Alckmin (PSDB) poderia fazer a candidata a vice da chapa, a ex-senadora Marina Silva, a se afastar das atividades da campanha presidencial de Eduardo Campos no estado.

A crise é mais um problema para a candidatura de Campos, que caiu quatro pontos na pesquisa Datafolha divulgada ontem. O ex-governador de Pernambuco conta com a popularidade de sua vice para se tornar conhecido.

O indicativo de apoio a Alckmin foi aprovado por unanimidade pelo diretório de São Paulo, na manhã de ontem. À tarde, Campos e Marina, que exige uma candidatura própria no estado, reuniram-se reservadamente para discutir o tema. Os dois decidiram na conversa que não jogarão a toalha e ainda vão trabalhar para tentar viabilizar um nome do PSB para a eleição paulista. O ex-governador de Pernambuco se comprometeu a chamar o presidente do partido no estado, Márcio França, para uma conversa.

— Nós lamentamos a decisão. Foi um erro histórico na nossa avaliação — afirmou João Paulo Capobianco, que coordenou a campanha presidencial de Marina, em 2010.

A decisão aprovada pelo diretório estadual terá que ser levada à convenção marcada para o dia 21, mas o placar da votação de ontem indica que a chance de reversão do quadro é muito baixa. Estavam presentes 132 dos 156 integrantes do diretório, e todos se manifestaram a favor do apoio aos tucanos.

Porta-voz nacional da Rede, o ex-deputado federal Walter Feldman foi o único aliado de Marina que discursou no evento de ontem.

— É uma contradição com o plano nacional. Alckmin está desgastado — afirmou Feldman.

Nos discursos, França foi aclamado como vice da chapa de Alckmin, mas a questão ainda não está definida. O PSB pode ficar com a vaga ao Senado, se o governador paulista conseguir também o apoio do PSD, de Gilberto Kassab. A única condição aprovada para fechar a aliança é que o PSDB aceite incorporar ao seu programa de governo quatro pontos definidos pelo partido, entre eles um que trata de sustentabilidade.

Os líderes do PSB que discursaram ontem também destacaram a possibilidade de Alckmin ficar constrangido em negar apoio a Campos na disputa presidencial tendo um vice da legenda do ex-governador de Pernambuco.

França afirmou que a candidatura própria não pôde se realizar porque a Rede não apresentou um nome viável. O presidente estadual do PSB havia se lançado como candidato, mas foi vetado pelos aliados de Marina.

— A gente ajuda o Eduardo e a Marina se tiver em São Paulo um palanque consistente. O Geraldo, com a força dele no interior, permite que o Eduardo se sinta mais seguro — disse França.

Marina diz que aliança do PSB com Alckmin é equívoco

José Roberto Castro - Agência Estado

A provável vice na chapa do PSB à Presidência da República, Marina Silva (PSB), divulgou nota neste sábado discordando do apoio de seu partido à candidatura de Geraldo Alckmin ao governo de São Paulo (PSDB). Marina afirma que a aliança é um "equívoco" e que a Rede Sustentabilidade "não seguirá essa indicação". "Consideramos necessário manter independência e lançar uma candidatura própria, que dê suporte ao projeto de mudança para o Brasil liderado por Eduardo Campos, e que dê ao povo de São Paulo a chance de fazer essa mudança também no âmbito estadual", escreveu a ex-senadora.

Desde que a Rede Sustentabilidade se uniu ao PSB, em outubro de 2013, há divergências entre os grupos, sempre minimizadas pelo presidente do partido, Eduardo Campos. A aliança com o PSDB em São Paulo, desejo do presidente estadual do PSB, Márcio França, é uma das disputas internas mais importantes. Na última sexta-feira (6), uma reunião do diretório paulista do PSB aprovou por unanimidade um indicativo de apoio a Alckmin.

Na nota, Marina ressalta que a Rede busca criar uma alternativa "que supere a velha polarização PT-PSDB, e que proporcione apoio efetivo à candidatura de Eduardo Campos". Em seguida, a ex-senadora diz que espera que os "companheiros do PSB" não levem adiante essa indicação.

"Desde já, deixamos clara nossa posição de que, caso essa indicação não seja revertida, seguiremos caminho próprio e independente em São Paulo", escreveu.

Leia abaixo a íntegra da nota:

"Nota sobre a decisão do diretório do PSB de SP de apoiar o projeto político do PSDB no estado
Juntamente com todos os integrantes da Rede Sustentabilidade, discordo da indicação aprovada ontem na reunião do diretório estadual do PSB de São Paulo de apoiar o projeto político do PSDB. Para nós, isso é um equívoco. Consideramos necessário manter independência e lançar uma candidatura própria, que dê suporte ao projeto de mudança para o Brasil liderado por Eduardo Campos, e que dê ao povo de São Paulo a chance de fazer essa mudança também no âmbito estadual.

A Rede Sustentabilidade não seguirá essa indicação. Em todo o país, estamos debatendo o assunto e apoiando nossos companheiros de São Paulo na busca de uma alternativa que supere a velha polarização PT-PSDB, e que proporcione apoio efetivo à candidatura de Eduardo Campos, que demonstre uma nova forma de fazer política e, principalmente, que represente os ideais de democracia e sustentabilidade expressos no programa de nossa Aliança.

Esperamos que os companheiros do PSB, em sua convenção estadual, não levem adiante essa proposta. Nesse sentido, manteremos o diálogo aberto e respeitoso. Mas, desde já, deixamos clara nossa posição de que, caso essa indicação não seja revertida, seguiremos caminho próprio e independente em São Paulo.
A nova força política que emerge no Brasil, interpretando o desejo de mudança tantas vezes manifestado por milhões de pessoas, encontrará também em São Paulo sua legítima expressão.

Marina Silva"

Planalto tenta evitar que Garotinho apoie Eduardo Campos

• A ideia é levar Pros para ex-governador

Eugênia Lopes - O Dia

RIO - O Palácio do Planalto decidiu atuar para evitar que o candidato ao governo do Rio Anthony Garotinho, do PR, formalize apoio à candidatura de Eduardo Campos (PSB) à Presidência da República. Sem apoios para alavancar sua candidatura, Garotinho ameaça levar o PR para Campos, o que daria palanque eleitoralmente forte no estado para o ex-governador de Pernambuco.

Coube ao ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, telefonar para Garotinho e tentar demovê-lo da ideia de se aliar ao candidato do PSB. Segundo interlocutores do deputado e ex-governador, a presidenta Dilma Rousseff teria acenado com a possibilidade de trabalhar pela retirada da candidatura de Miro Teixeira, do Pros, ao governo do estado.

Com isso, o tempo do Pros poderia ir para Garotinho. Miro é apoiado pelo PSB, mas teria dificuldades de se aliar a Garotinho. Sem Miro, a tendência é que ele fique com o petista Lindbergh Farias, que também visa o Palácio Guanabara. Para Garotinho, a aliança com a chapa Campos/Marina Silva é essencial para dar sustentação a sua candidatura na capital. O ex-governador é forte no interior, mas enfrenta resistência na cidade do Rio, onde Marina Silva é bem avaliada.

Mas tanto Campos quanto Marina não veem com bons olhos a aliança com o deputado do PR. Interlocutores do presidenciável do PSB apostam que Garotinho só tem chances com a dupla caso o PR faça coligação formal com o PSB e, com isso, aumente o tempo de TV de Campos. Isso depende, no entanto, do ex-deputado Valdemar Costa Neto, preso na penitenciária da Papuda, em Brasília, por envolvimento com o mensalão.

Pros: a menina dos olhos
A três dias do início das convenções partidárias, o quadro de alianças no Estado do Rio para as eleições de outubro está embolado. Líderes nas pesquisas de intenção de voto, o ex-governador Anthony Garotinho (PR) e o senador Marcelo Crivella disputam apoios na reta final de formalização das coligações partidárias.

O alvo é o Pros, que tem como candidato ao governo o deputado Miro Teixeira. Sem alianças e, portanto, sem tempo de TV, os dois assediam o Pros. Lindbergh Farias, do PT, é outro que sonha com Miro. Candidato à reeleição com o apoio de 15 partidos, Luiz Fernando Pezão é o único com um amplo leque de alianças.

Briga por alianças no Rio deixa disputa incerta para o Senado

• Candidaturas de Cabral, Romário e Jandira não estão consolidadas

Cássio Bruno e Alexandre Rodrigues – O Globo

RIO - Enquanto a disputa pelo governo estadual se acirra, a corrida para a única vaga ao Senado ainda está indefinida no Rio. Até agora, três pré-candidatos já se apresentaram: o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB) e os deputados federais Romário (PSB) e Jandira Feghali (PCdoB). No entanto, a confirmação desses nomes ainda depende das negociações para as alianças dos candidatos que vão concorrer ao Palácio Guanabara.

Apesar de ter desistido para dar lugar ao PSD na campanha de reeleição do atual governador, Luiz Fernando Pezão (PMDB), Cabral voltou atrás. Com a decisão, o ex-governador vai para a sua eleição mais arriscada — a primeira em que não inicia como favorito. Na avaliação do PMDB, a popularidade de Romário pode pôr em risco os planos de Cabral, que tem o desafio de reabilitar sua imagem desgastada após as manifestações do ano passado.

Por outro lado, peemedebistas apostam que a falta de experiência em uma eleição majoritária e de estrutura do PSB pode fragilizar Romário. Cabral, por sua vez, foi convencido pelos caciques do PMDB do Rio de que, na falta de um nome mais competitivo, sua candidatura ao Senado pode ajudar Pezão a defender seu governo.

— O PMDB tem um governo a defender, não pode se acovardar na hora de fazer o debate. As melhores pessoas para fazer isso são Pezão e Cabral. O ex-governador é um grande ator político, precisa estar no jogo — disse o deputado federal Pedro Paulo (PMDB-RJ).

Cabral sabe que pode perder o Senado, mas sua prioridade é eleger o sucessor para manter a máquina estadual e reabilitar seu governo. Por isso, ele será o coordenador da campanha de Pezão. Manterá no discurso o apoio à aliança nacional com o PT da presidente Dilma Rousseff, candidata à reeleição, mas fechará os olhos para a dissidência “Aezão”, liderada pelo presidente regional do PMDB, Jorge Picciani, em favor do presidenciável Aécio Neves (PSDB).

Cabral não tem motivos para impedir que os correligionários façam campanha para Aécio, seu amigo pessoal, se o ex-presidente Lula apoia a campanha de Lindbergh Farias (PT) ao Palácio Guanabara, que atrapalha Pezão.

— Quando o PMDB do Rio foi se queixar à Dilma sobre Lindbergh, ela respondeu que era coisa do Lula. Agora, quando reclamam do Aezão, Cabral diz que é coisa do Picciani — confidenciou um dos dissidentes.

No PSB, a novela em relação a Romário não terminou. O ex-craque aguarda uma decisão do presidente nacional da legenda, Eduardo Campos, outro pré-candidato à Presidência. Campos já declarou apoio ao deputado Miro Teixeira (PROS) para o governo do Rio, com o baixinho na chapa. Mas o martelo não foi batido. Romário terá pouco tempo de propaganda na TV, mas já fala como pré-candidato ao Senado:

— Sei que será uma disputa difícil. Financeiramente, desleal — diz o tetracampeão, que gosta de polêmica. — É claro que eles (Cabral e o PMDB) são mais experientes. Mas na parte negativa. Eles roubaram o estado.

Procurado pelo GLOBO, Cabral não quis comentar.

Na chapa de Lindbergh, a indicação ao Senado até o momento é a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB). A parlamentar, no entanto, só decidirá se aceita a missão na próxima semana, na reunião do diretório estadual da sigla. Com dois concorrentes fortes (Cabral e Romário), Jandira poderia ficar sem um mandato, como ocorreu em 2006, quando perdeu a vaga para Francisco Dornelles (PP). Ela minimiza:

— A concorrência não assusta. As pesquisas são boas. A pré-candidatura do Cabral é que ainda é duvidosa.

Já o senador Marcelo Crivella (PRB) e o deputado federal Anthony Garotinho (PR), ambos pré-candidatos ao governo do Rio, ainda não sabem como vão formar a chapa para o Senado. Até agora, sem aliados, Crivella sonha em ter Romário, mesmo sabendo que as chances são remotas. Com a adesão apenas do PTdoB, Garotinho tem usado a vaga no Senado como moeda de troca para atrair mais partidos para a aliança. Ele flerta com o PSB, que o rejeitou.