segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Cida Damasco: Modo reeleição

- O Estado de S.Paulo

Temer abraça pauta de segurança e confia no efeito retomada

Com uma ruidosa intervenção na segurança do Rio, com a reforma da Previdência escapando do horizonte de 2018 e sem Luciano Huck na corrida presidencial, o governo Temer entra numa nova etapa. A visível guinada para a área de segurança, no entanto, não exclui a aposta na economia. Seja para melhorar seu legado no pós-2018 ou para amparar uma eventual candidatura do presidente à reeleição, caso outros personagens do chamado centro, especialmente o tucano Geraldo Alckmin, não se consolidem a curto prazo. Mesmo que essa candidatura vá na contramão dos índices de popularidade do governo e do próprio Temer.

A esperança é que, com o passar dos meses, o eleitorado finalmente reconheça os sinais firmes de retomada, tornando menos pedregoso o caminho até as eleições. Nesse novo quadro, o governo estaria combinando o ativismo na área da segurança, uma das mais sensíveis para a população – o que poderia esvaziar a repercussão do discurso do presidenciável Jair Bolsonaro em determinados setores – com uma estratégia tipo “mais do mesmo” na economia. A justificativa para essa estratégia é que a economia continua mostrando um desempenho razoável e os riscos de reversão dessa trajetória a curto prazo são reduzidos.

Marcus André Melo: Zuma, Lula e o mensalão

- Folha de S. Paulo

Lá e cá, governos sobreviveram devido ao seu controle sobre o parlamento

Entrevistei Andrew Feinstein —pivô do mega escândalo conhecido como Arms Deal (compra de armas)—, no aeroporto de Joanesburgo, quando ele retornava para Londres onde se exilara voluntariamente.

Acedeu ao encontro pelo seu interesse no mensalão. O ex-militante antiapartheid era "protegé" de Nelson Mandela e tornou-se membro do parlamento pelo CNA (Congresso Nacional Africano).

Presidente do Scopa (Comitê Parlamentar de Contas Públicas), Feinstein recebeu um relatório do AGSA (Auditor General), espécie de TCU sul-africano, com suspeitas sobre a compra de submarinos e caças no valor de US$ 5 bilhões. Feinstein recusou-se a fazer vista grossa —US$ 85 milhões teriam sido pago de propina ao CNA— e deu grande publicidade ao caso que se tornou o maior escândalo da história do país até então.

Uma força tarefa de magistrados conhecida como Skorpions foi criada e um juiz —Willem —Heath adquiriu protagonismo na investigação do caso: empresários ligados ao vice-presidente Jakob Zuma foram presos, levando à sua demissão pelo CNA.

Fernando Limongi: A ilusão da prepotência

- Valor Econômico

Preparava chegar ao Alvorada como quem vai à Ilha de Caras

Luciano Huck desistiu. Ainda bem. O apresentador decidiu nos livrar da ambição do aprendiz de político. Alguém teve bom senso. Os "aloprados" que investiam na sua candidatura choram a perda do candidato de ocasião.

O episódio pede reflexão. A candidatura natimorta resultou da combinação letal de altas doses de três ingredientes: oportunismo, ingenuidade e prepotência.

Oportunismo: recorre-se a um nome popular para vencer a eleição. Não importa quem seja, contam apenas as pesquisas de intenção de voto. Deste ponto de vista, nada distingue Tiririca de Huck. Um Tiririca de grife, vindo dos Jardins e com passagem em cursinhos de moral e cívica. Mas Huck não passa de uma celebridade com veleidades políticas. O apresentador se preparava para habitar o Alvorada como quem embarca para a Ilha de Caras.

Puro oportunismo eleitoral adornado com pílulas de renovação da política. Onde está a novidade? Onde está o combate à "velha política"? Huck já havia renunciado. Voltou a considerar abraçar o "projeto" depois que os três do TRF-4 inviabilizaram a candidatura Lula. Desistiu porque temia perder. Com a raia livre, veio o apelo ao sonhador.

*Denis Lerrer Rosenfield: E o Brasil?

- O Estado de S. Paulo

O Estado foi capturado por seus estamentos, prioritariamente na defesa dos privilégios

Engana-se quem pensa que o Brasil enfrenta apenas um problema do governo Temer ao defrontar-se com a reforma da Previdência. A questão é muito maior, por dizer respeito ao Brasil, acima de qualquer interesse corporativo e partidário-eleitoral. O atual governo não terá dificuldades em fechar suas contas no corrente ano, mas o próximo se debaterá com esse grave problema desde o início. Se a reforma da Previdência não for feita agora, terá necessariamente de ser realizada pelo próximo mandatário, queira ele ou não.

Qualquer partido ou governante deverá curvar-se à dureza dos fatos e das contas públicas. A ficção tem limites.

O que estamos presenciando são subterfúgios estamentais, ideológicos e eleitorais que procuram escamotear e velar a urgência de uma reforma necessária. O ruído é tanto que termina relegada a questão central do que é melhor para o Brasil, embora os contendores encham a boca com a suposta defesa que fazem da justiça social, quando, na verdade, pensam exclusivamente em seus privilégios. Partidos políticos e corporações do Estado perseguem os mesmos objetivos ao sabotarem a reforma da Previdência, cada personagem centrado em seus interesses próprios.

Marcus Pestana: 2018 saúda o povo e pede passagem

- O Tempo (MG)

Já virou lugar-comum dizer que a vida só começa depois do Carnaval. Parece um processo catártico coletivo que compreende a metabolização da herança do ano anterior e a explosão das expectativas para o ano que se inicia. Isso transborda no Carnaval, quando cada um pode ser o que não é, fantasiar a realidade e esculachar autoridades, pop stars e adversários eleitos como alvo. No sambódromo do Rio, poesia, lirismo, tradições e sátiras políticas levantam as arquibancadas. A sensação de orfandade da população nos dias atuais ganha uma tradução no belíssimo samba-enredo da Beija- Flor.

Mas, tiradas as fantasias na Quarta-Feira de Cinzas, não há como não encarar nossa complexa realidade. É evidente que é melhor viver de fantasia, sonho e poesia. Mas é preciso navegar.

Menos de oito meses nos separam da mais complicada e misteriosa eleição da história recente do Brasil. Será um divisor de águas. A Nova República encontrará seu fecho. Não aquele sonhado por seus fundadores, Tancredo Neves, Ulysses Guimarães e Franco Montoro. Mas aquele resultante de nossas mazelas e erros acumulados nas últimas décadas.

A Constituição Cidadã, como quis Ulysses, completa 30 anos. Nem por isso consolidamos o Brasil justo, democrático e próspero que sonhávamos.

Leandro Colon: Aposta de alto risco de Temer

- Folha de S. Paulo

No primeiro arrastão, Pezão já sabe o que dizer à população: procure o Planalto

O governo de Michel Temer passou dois meses anunciando que no dia 19 de fevereiro daria início à discussão da reforma da Previdência no plenário da Câmara.

Chega-se, enfim, ao tão esperado dia. Findada a folia carnavalesca, os deputados retornam a Brasília. O ano começa para valer, mas não para votar a mudança na aposentadoria. A prioridade é aprovar o decreto de intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro.

É vetado ao Congresso mudar trechos da Constituição enquanto a medida de intervenção federal estiver em vigor —no caso do Rio, até dezembro. Diante disso, a reforma da Previdência respira sob aparelhos.

Ao discursar na cerimônia de anúncio da ação federal no Rio, Temer não se intimidou em admitir a hipótese de dar um jeitinho para votá-la: suspenderia o decreto temporariamente para que o Congresso pudesse então apreciar a proposta.

Ricardo Noblat: O que importa com a intervenção no Rio

- Blog do Noblat

A tomar café frio e ver a grama crescer à sua porta, Temer preferiu arriscar-se

Estamos de acordo: uma vez que era iminente a derrota na Câmara dos Deputados da proposta da reforma da Previdência Social, o presidente Michel Temer precisava arranjar o que fazer até que seu mandato chegue ao fim em 31 de dezembro próximo.

Ou arranjava ou começaria pagar o preço sempre cobrado ao político às vésperas de despedir-se do poder: tomaria café frio e, à falta de visitas, assistiria ao crescimento da grama à porta dos palácios onde dá expediente ou mora com a família. É sempre assim.

Foi assim, por exemplo, com José Sarney, o presidente empossado pela junta médica que cuidou – e cuidou mal – do presidente eleito Tancredo Neves. No último ano do seu governo, Sarney tornou-se uma figura irrelevante, da qual quase todos os políticos queriam distância.

A intervenção na insegurança pública do Rio foi a maneira esperta, talvez a única, para que Temer avisasse aos interessados: estou vivo e não pretendo morrer antes do tempo. Se o resultado for apenas sofrível, ele sairá no lucro. Se for um desastre, dirá que tentou e não fugiu à luta.

Bobagem a história de que os militares, treinados para matar, não saibam o que fazer para contornar o colapso das forças policiais de um Estado. Esse é um dos papéis que lhes cabem de acordo com a Constituição. São treinados para isso também. Têm planos para tudo.

Angela Bittencourt: Temer poderá ampliar legado e lustrar biografia

- Valor Econômico

Em 2018, renda disponível poderá crescer R$ 198 bi

O presidente quer defender o legado do seu governo na eleição de outubro e essa intenção deverá filtrar o candidato de centro-direita que receberá apoio do Planalto na urna. Michel Temer, que conduz à sucessão o mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, afastada por crime de responsabilidade, também poderá tentar a reeleição. Contudo, com a intervenção na segurança do Rio e incentivo ao consumo ele poderá ampliar seu legado e lustrar sua biografia. Com bônus.
Enquanto a reeleição soa tarefa solitária, proporcionar mais bem-estar aos brasileiros tende a uma mobilização capaz de integrar outras áreas do governo até agora condenadas a angariar votos para a reforma da Previdência e sem muito sucesso. Também por esse motivo, na sexta-feira a chance de aprovação dessa reforma era tida como página virada pela intervenção na segurança pública do Rio de Janeiro.

Expectativas estão sendo escoadas para a intervenção. E se a ação do Exército Brasileiro não decepcionar, uma melhora de humor sobretudo nos grandes centros urbanos poderá impulsionar um pouco mais de atividade. Chegar a esse estágio em seis meses, até às vésperas da eleição, está longe de fácil ou simples, mas se montam condições favoráveis ao mesmo tempo em que defensores da reforma previdenciária reconhecem que ela terá tratamento mais adequado no próximo governo.

O Brasil saiu da recessão que produziu um contingente de desempregados, mas também derrubou inflação e juro, além de impulsionar uma redução inédita de endividamento. Neste início de 2018, apenas 21% do orçamento das famílias estão comprometidos com o pagamento de dívidas, excluindo da conta despesas com crédito imobiliário. E a perspectiva de aumento da renda disponível em R$ 198 bilhões neste ano é o resultado mais eloquente dessa desalavancagem. Esse montante equivale a 2,2% do PIB.

A recuperação vai se consolidando: Editorial/O Estado de S. Paulo

O quadro de recuperação da economia nacional fica mais claro, e quase completo, com a reação do setor de serviços, ainda lenta e restrita. No Brasil, a evolução dos serviços normalmente reflete, com algum atraso, o avanço da indústria, da agropecuária e do comércio de bens. O setor tem grande peso na composição do Produto Interno Bruto (PIB), mas seu vigor depende do dinamismo dos demais. Em outros países, segmentos como turismo, finanças, call centers e transportes, para citar alguns exemplos bem conhecidos, têm vida própria e são geradores importantes de receita em moeda estrangeira. Podem prosperar mesmo quando outras áreas de atividade vão mal. Não é, pelo menos até agora, o caso do Brasil, onde a produção material se mantém como a principal fonte de movimento e vigor para todo o sistema.

Essa dependência foi confirmada com muita clareza no ano passado. Só o segmento de transportes fechou o ano com desempenho melhor que o do ano anterior – crescimento de 2,3% em relação ao resultado de 2016. Esse resultado foi uma clara consequência do aumento da produção da indústria e da agropecuária, da expansão do comércio interno e do avanço das exportações.

Os demais segmentos tiveram desempenho mais fraco, embora com tendência de melhora, especialmente nos meses finais de 2017. Em dezembro, a produção do setor de serviços foi 1,3% maior que a de novembro e 0,5% superior à de dezembro do ano anterior. Em 12 meses, no entanto, a produção acumulada foi 2,8% menor que a de 2016. Mesmo esse resultado, no entanto, foi o mais animador depois de 2014, quando o volume produzido cresceu 2,5%. Em 2015, a perda foi de 3,6%. Em 2016, de 5%.

Por mais avanços: Editorial/O Globo

A reforma que já vigora é um passo na direção certa, mas, além de avanços, é preciso evitar retrocessos

A reforma política sancionada no ano passado é um avanço em relação às regras que estavam em vigor, mas um passo pequeno diante do necessário. O que não significa desmerecer a importância das mudanças. As regras eleitorais, de que tantos se beneficiaram para compor alianças artificiais, sem qualquer conteúdo programático, chegaram ao limite. A lassidão das normas para criação de partidos, por exemplo, permitiu tamanho desregramento na geração artificial de legendas que as grandes e médias perceberam que o custo dessa indústria era alto e crescente. Mais ainda com o fim do financiamento empresarial de campanha. Mesmo que viesse a ser ampliado o financiado público — como foi, contra o interesse do contribuinte —, o crescimento de aspirantes a este dinheiro ameaçava reduzir a cota de cada um.

Interesses bem varejistas como este voltaram a viabilizar a instituição de uma cláusula de desempenho, para estabelecer o mínimo de votos de que cada partido precisa para constituir bancada no Legislativo, com as prerrogativas desta representatividade, incluindo participação no horário de propaganda eleitoral. Em 1995, o Congresso aprovou uma cláusula que barraria a entrada nas Casas legislativas de legendas nanicas, muitas das quais de aluguel, balcões de negócio. Como são. Entraria em vigor dez anos depois. Em 2016, infelizmente, o Supremo suspendeu a cláusula, em nome do direito de expressão das minorias. Um erro. Ora, o partido que não tem votos suficientes não desaparece, apenas não é tratado com as mesmas prerrogativas cedidas às legendas mais votadas. Assim é a democracia representativa.

Desgoverno: Editorial/Folha de S. Paulo

Embora seja inquestionável o caos no Rio, intervenção suscita dúvidas a respeito de sua motivação e eficácia

O governador Luiz Fernando Pezão (MDB) reconheceu, para todos os efeitos, sua incapacidade de gerir a crise de segurança pública no Rio de Janeiro, embora na prática a falência orçamentária e um ensaio de anomia há muito sejam o padrão geral do Estado.

A intervenção federal determinada naquele setor da administração fluminense preenche os requisitos formais, devendo ainda passar pelo crivo do Congresso. Nem por isso suas motivações e suas chances de eficácia deixam de suscitar dúvidas, reservas e temores.

Trata-se, sem dúvida, de um lance de risco. Se é inquestionável a gravidade da situação no Rio, a medida abre precedentes para ações similares em outras regiões do país —em Pernambuco, por exemplo, a criminalidade também tem avançado de modo alarmante, com indicadores até piores.

O governo federal se sujeita a um teste crítico: se falha a intervenção, recurso extremo, as opções restantes perdem credibilidade.

Dividido, Copom faz o ajuste fino da política monetária: Editorial/Valor Econômico

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central chega dividido ao fim de mais um ciclo de distensão monetária, mas não se deve exagerar as divergências. O que está em jogo é um ajuste fino em março, de 0,25 ponto percentual, depois de os juros básicos da economia caírem de 14,25% ao ano para 6,75% ao ano. A discussão relevante será, em breve, quanto tempo a Selic ficará no terreno estimulativo.

A ata da reunião de fevereiro do Copom, divulgada na última quinta-feira, informa que alguns membros do colegiado queriam comunicar mais fortemente que o ciclo de baixa de juros terminou. Outros pretendiam enfatizar as chances de uma nova baixa de juros, caso o cenário inflacionário se mostre ainda mais favorável que o esperado. Por fim, decidiu-se por uma mensagem salomônica, indicando que o ciclo de distensão monetária chegou ao fim, a menos que haja surpresas positivas nos próximos meses.

O Copom destaca no documento alguns fatores que vai acompanhar com especial atenção para decidir o que vai fazer em março. De um lado, o BC poderá cortar os juros a 6,5% ao ano se os núcleos de inflação seguirem muito baixos e se houver alguma notícia positiva que retire riscos da economia. Do lado negativo, que poderia fazer o Copom manter a Selic em 6,75% ao ano, está uma eventual piora no cenário internacional ou uma recuperação mais consistente da economia brasileira.

Em 2017, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou em 2,95%, abaixo tanto do centro da meta (4,5%) quanto do piso (3%). Em boa parte, isso se deveu a uma queda de 5% nos preços de alimentos. O Banco Central prefere acompanhar os núcleos, que descartam os preços mais voláteis, para identificar a tendência da inflação. Esses indicadores, porém, têm emitido sinais ambíguos.

O Copom destacou que em novembro alguns dos núcleos ficaram muito baixos, indicando que a inflação poderia se perpetuar próximo do piso da meta. Em dezembro, os núcleos subiram a um patamar descrito pelo Banco Central como confortável, consistente com a convergência da inflação para o centro da meta. Mas, em janeiro, os núcleos caíram de novo. Se seguirem tão baixos, o Copom provavelmente cortará os juros, para evitar que a inflação fure de novo o piso da meta. Se subirem para níveis mais confortáveis, a tendência é a Selic ficar onde está.

'Alienação eleitoral é alta no Brasil mesmo com voto obrigatório'

Para o professor da UFRN Homero de Oliveira Costa, número de votos brancos, nulos e abstenções deve aumentar este ano no País

Julia Lindner / O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O cientista político Homero de Oliveira Costa, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), considera que o número de votos brancos, nulos e abstenções deve aumentar este ano no Brasil. Em entrevista ao Estado, Costa afirma que o comportamento chamado de “alienação eleitoral” ocorre desde a década de 1990 no mundo todo principalmente por causa da crise de representatividade dos partidos. E diferentemente de outros países, destaca o professor, o Brasil chama a atenção por apresentar altos índices desse fenômeno, mesmo possuindo voto obrigatório.

Homero, que é mestre em Ciência Política pela Unicamp e doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP, realizou um estudo sobre o tema. O trabalho resultou no livro Democracia e representação política no Brasil: uma análise das eleições presidenciais (1989-2002).

Veja os principais trechos da entrevista.

• Pesquisas recentes apontam a tendência de que haja um grande número de votos brancos, nulos e abstenções nas eleições deste ano. Por que isso ocorre?

Esse é um problema complexo que vem desde os anos 1990 e, variando de país para país, há um aumento, principalmente, nas abstenções e especialmente nos países que não têm voto obrigatório. Não tem uma resposta única, mas uma das teorias é sobre a descrença nos partidos. Nas eleições recentes do Chile e da França, o número de abstenções foi muito expressivo. Os partidos não representam o eleitorado, há uma crise de representação que eu acho que é a coisa mais geral. A particularidade do Brasil é que esses índices são altos mesmo com o voto obrigatório.

• Por que há a descrença nos partidos no Brasil?

Os partidos em geral são apenas veículos para viabilizar eleições. Muitos são legendas de aluguel que se organizam para ter acesso ao fundo partidário, como está ocorrendo agora nas articulações para as eleições. Não têm militância. As formas como se organizam são de cima para baixo. Não têm, além de raras exceções, partidos de base.

• Mas é um fenômeno atual?

Não é específico de hoje. Em 1998, há 20 anos, o somatório dos votos brancos, nulos e abstenções foi quase igual aos votos dados ao presidente eleito em primeiro turno, Fernando Henrique Cardoso – somando-se a abstenções com os votos brancos e nulos (38.351.547), a alienação eleitoral foi maior do que os votos dados a FHC (35.936.540). O mesmo aconteceu com a maioria dos governadores eleitos naquela época. Então é um problema que já vem há muito tempo.

• Há como coibir a alienação eleitoral?

Há campanhas do próprio Tribunal Superior Eleitoral mostrando a importância do voto exatamente por saber também isso. Agora, uma coisa importante é saber que não são a mesma coisa os votos brancos, nulos e abstenções. Votos nulos são mais politizados. Só que a urna eletrônica torna muito mais difícil votar nulo. Votar em branco é mais fácil porque você não aperta lá um número, mas votar nulo é mais complicado (porque é preciso digitar um número de candidato inexistente). Tornou mais difícil se votar nulo com a urna eletrônica.

• A não obrigatoriedade do voto deixaria ainda mais evidente essa alienação eleitoral?

Se o voto não fosse obrigatório no Brasil, certamente esses índices de abstenções seriam bem maiores. As pessoas vão forçadas muitas vezes a votar pelo fato de ser obrigatório, embora a multa seja irrisória. Muitos defendem a permanência do voto obrigatório porque seria uma forma de participar, mas é uma participação extremamente limitada. Numa democracia, a participação não pode se restringir ao ato de votar apenas, mas a gente não tem mecanismos no Brasil que possam estimular as pessoas a participar efetivamente. Por isso defendo o voto facultativo como direito que o eleitor tem de não votar porque não acredita nos partidos e em seus representantes. Eles têm todo direito, como ocorre na imensa maioria do mundo.

• O que ocorreria com o voto facultativo?

Nos países que não têm voto obrigatório o índice de votos brancos e nulos é pequeno. Se é facultativo, vou expressar minha indignação votando nulo, então, não tem sentido eu sair de casa para votar em branco. Mas acho que o número maior seria de abstenções, vamos dizer, as pessoas nem sequer iriam votar, como ocorre na maioria das democracias representativas sem voto obrigatório.

Intervenção é popular e de alto risco

Por Raymundo Costa | Valor Econômico

BRASÍLIA - O governo Michel Temer decidiu ser protagonista na eleição e dentre as medidas que vem adotando a mais popular - e a de mais alto risco - é a intervenção na segurança pública do Rio. Enquetes feitas na internet mostram que, pelo menos no primeiro momento, a população aplaudiu. A reforma da Previdência foi sacrificada.

Na realidade, a intervenção foi conveniente. Com o descontrole da segurança no Rio, o próprio governador do Estado lavou as mãos. O governo só precisou coragem para implementar uma medida que, se tiver sucesso, vai beneficiá-lo. Ele assume a bandeira da segurança que hoje tem um dono - o deputado Jair Bolsonaro, segundo colocado nas pesquisas. Não foi por outro motivo que Bolsonaro foi um dos primeiros a condenar acidamente a decisão.

A solução para a segurança do Rio não se dará do dia para a noite, mas a situação é tão dramática que até uma mudança cosmética pode ter efeito. Pode não beneficiar eleitoralmente Temer, mas um candidato da situação. Na aliança sonhada no Planalto, liderada pelo MDB, cabem DEM, PP, PR, PTB, PRB e semelhantes.

Reforma perde para chances de reeleição
No tabuleiro da sucessão, o presidente Michel Temer sacrificou a reforma da Previdência por uma possível candidatura à reeleição. Não está nos planos do governo suspender a intervenção federal no Rio de Janeiro para votar a proposta. A menos que o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, em algum momento diga o contrário do que até agora tem afirmado: 'Há votos suficientes para aprovar'.

A intervenção no Rio de Janeiro também reduz as possibilidades da candidatura presidencial do ministro Henrique Meirelles (Fazenda). Não há espaço para duas candidaturas no campo governista em disputa. O governo, evidentemente, não assume o caráter eleitoral da medida. "É uma decisão de política pública", diz o ministro Moreira Franco, da Secretária-Geral da Presidência, um dos principais articuladores da intervenção no Palácio do Planalto.

Ibope mostrou que preocupação com violência dobrou em um ano

Por Ricardo Mendonça | Valor Econômico

SÃO PAULO - Pesquisas realizadas nos últimos meses pelo Datafolha e pelo Ibope ajudam a dimensionar a crescente preocupação dos brasileiros com a segurança, a insatisfação com políticas públicas do setor e o apelo popular que o tema desperta. Na sexta, em ato inédito desde a redemocratização, o presidente Michel Temer decretou intervenção federal na área de segurança do Rio. Um general foi designado interventor. Os resultados dos levantamentos mais recentes sugerem que ações excepcionais desse tipo - em especial as que envolvem as Forças Armadas - podem ter relevante impacto eleitoral.

Conforme o Ibope, a preocupação dos brasileiros com violência e segurança dobrou no intervalo de um ano. A constatação foi feita pela pesquisa Retratos da Sociedade Brasileira, realizada sempre em dezembro por encomenda da Confederação Nacional da Indústria. No fim de 2016, 19% dos brasileiros citavam a área no rol das mais problemáticas do país. Foi o quarto tema do ranking, atrás de desemprego, corrupção e saúde. Na pesquisa mais recente, violência e segurança continua em quarto lugar, mas as citações saltaram para 38%. Nos dois casos, foram ouvidas 2 mil pessoas, com margem de erro de dois pontos.

Na primeira pesquisa, o Ibope perguntou a cada entrevistado se ele ou alguém da família havia sido vítima de furto, assalto ou agressão nos 12 meses anteriores. Quase metade dos moradores das regiões Norte e Centro-Oeste responderam que sim (46%). No Nordeste, o sim alcançou 44%. Sudeste e Sul registraram 37% e 31%, respectivamente.

Com outra abordagem, um estudo nacional do Datafolha com 2.087 entrevistas em março de 2017 encomendado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública confirmou como a questão está presente no dia a dia da maioria.

Decisão afeta eleições e disputa interna do MDB do Rio

Por Cristian Klein | Valor Econômico

RIO - A crise de segurança no Rio, com o decreto de intervenção federal, pode mexer com algumas peças no ainda confuso tabuleiro político-eleitoral fluminense. O MDB, cujos governos Pezão e do antecessor Cabral são responsáveis pela anomia em que o Estado se encontra, terá que repensar o plano de lançar ao Palácio Guanabara o jovem secretário estadual de Assistência Social, Pedro Fernandes, de 34 anos de idade. Ele é a alternativa ao ex-prefeito Eduardo Paes, cuja saída do partido é dada como certa, para evitar o desgaste da imagem do MDB.

A intervenção federal imprime o carimbo de fracasso total da política de segurança de Pezão, que culminou com a onda de violência no Carnaval. Qualquer candidato do MDB sairá em desvantagem, ainda que tente se vender como algo novo. O secretário e deputado estadual licenciado é filho da vereadora Rosa Fernandes, uma chefe política tradicional com reduto no Irajá. Tem o mesmo nome do avô, que exerceu dez mandatos na Assembleia Legislativa.

Junta-se aos outros filhos de caciques emedebistas, Leonardo Picciani e Marco Antônio Cabral, que passaram a comandar o partido depois que os pais, o ex-presidente da Assembleia Jorge Picciani e o ex-governador Sérgio Cabral, foram presos por corrupção. A nova geração tem o DNA da velha. Pertencer ao MDB será tóxico para qualquer candidato a governador. Ou a deputado.

E é por isso que a intervenção federal também pode ser compreendida como uma jogada política e partidária. Trata-se da oportunidade de o MDB nacional, sob o ponto de vista eleitoral, separar sua imagem - que não é nada boa - da imagem do MDB do Rio, que é péssima. Se for bem-sucedida, a decisão de Temer, aponta um político fluminense, atenderia dois supostos objetivos do homem de confiança do presidente, o ex-governador do Rio e ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco.

'Há espaço para duas candidaturas de Alckmin em SP', diz Aníbal

Entrevista com José Aníbal, ex-senador e presidente do Instituto Teotônio Vilela

Pré-candidato ao governo, José Aníbal elogia lealdade do atual vice Márcio França, do PSB, e critica João Doria

Pedro Venceslau | O Estado de S. Paulo

O ex-senador José Aníbal, presidente do Instituto Teotônio Vilela, centro de estudos e formulação política do PSDB, sugeriu, em entrevista ao Estado, que o prefeito João Doria desista de disputar a vaga ao governo do Estado e fique no cargo. Aníbal, que é um dos pré-candidatos ao Palácio dos Bandeirantes, também considera que há espaço em São Paulo para duas candidaturas da base de Geraldo Alckmin. Veja os principais trechos da entrevista.

• O sr. admite a possibilidade de o PSDB apoiar o vice-governador Márcio França, do PSB, na disputa pelo governo paulista?

Pensou-se na ideia de trazer o Márcio França para o PSDB. Estive com ele recentemente. Márcio, porém, acha difícil essa ideia progredir. Quanto à ideia do PSDB não ter candidato, já vimos que a maioria do partido deseja que tenha.

• Então, estão descartadas essas possibilidades?

Em princípio acho que sim. O partido quer ter candidato, mas deve haver uma construção. Não temos nenhuma candidatura óbvia e inquestionável. A pressa, se prevalecer, vai prejudicar a construção da candidatura.

• O sr. defende prévias em maio para definir o candidato ao governo. A ideia é para forçar o prefeito João Doria a deixar o cargo caso queira ser o candidato?

Se o nosso prefeito está tão determinado a sair da Prefeitura, ele fará isso com ou sem prévias. Eu pessoalmente acho que ele deveria ficar e ter um desempenho em sintonia com o que pregou durante a campanha: uma gestão eficiente. João Doria deve ajudar quem o ajudou. O Geraldo foi muito presente na campanha dele. Mobilizou o partido. O prefeito já ficou namorando no ano passado a hipótese de uma candidatura presidencial, mas as coisas não andaram por ali. Agora ele tem essa coisa de candidatura a governador. Se você fizer uma pesquisa, ele está na frente de todos. É prefeito e tem um trabalho de comunicação intenso e permanente, mas esses climas que vão sendo criados em geral são sucedidos por um anticlímax.

• Em 2008, a candidatura de Alckmin à Prefeitura de São Paulo foi ‘cristianizada’ e ele não teve apoio de muitos tucanos, que apoiaram Gilberto Kassab (PSD). Isso pode se repetir caso se formem dois palanques da base na disputa pelo governo?

Em 2008, o processo foi muito infeliz. Faltou diálogo. Teve gente do PSDB que não fez a nossa campanha. Mas eu acho que não será assim agora. Há um espaço enorme no eleitorado de São Paulo para duas candidaturas da base do governador. Na última eleição, o Alckmin teve 57% dos votos. São 12 ou 13 milhões de votos. A candidatura do PSDB não nos obriga a hostilizar o Márcio França. Pelo contrário. Márcio tem sido um leal companheiro do Geraldo Alckmin.

• Se o PSB nacional não apoiar o Alckmin à Presidência, esse cenário em São Paulo pode mudar?

Não sei se será possível um apoio integral do PSB. Mas certamente ele vai ter algum apoio no partido. O apoio do PSB ao Alckmin não está vinculado ao fato do PSDB ter candidato em São Paulo. Está mais vinculado ao desejo de manter uma relação amistosa com Márcio França. Vamos disputar o mesmo universo de eleitores, com ele podendo agregar mais porque tem composições à esquerda.

• O sr. acredita que a aproximação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso com o apresentador Luciano Huck constrangeu o PSDB?

Valeu muito uma conversa que eles tiveram há uma semana. Huck é um excelente comunicador e tem muita sensibilidade, mas não é fácil governar o Brasil. Acho que o presidente sugeriu a ele não aceitar. A decisão do Huck foi correta.

• Huck teria uma predileção natural a apoiar o Geraldo Alckmin?

Não posso falar por ele. Mas vejo ele próximo, além do Fernando Henrique, do Andrea Calabi (padrasto de Huck, ex-ministro de FHC e ex-secretário de Alckmin) e do (ex-presidente do Banco Central) Armínio Fraga, que têm a sensibilidade do PSDB. Isso me faz imaginar que, se ele vier a manifestar sua intenção de voto ou apoio, o mais natural é que seja no PSDB, ao Geraldo Alckmin.

• Doria tem sido um dos interlocutores do PSDB mais próximos de Temer. Que leitura faz da distância entre Alckmin e o presidente?

Eu não divulgo isso, mas converso com o presidente Temer com frequência. Almocei com ele na semana passada no Palácio do Planalto. Ele me disse que quer ter uma conversa com o Geraldo. Acha que é um bom momento para isso. O presidente Temer conversa com várias pessoas do PSDB, como o (José) Serra e o Aloysio Nunes. Eu tenho uma amizade com ele há muito tempo.

• O prefeito de Manaus, Arthur Virgilio, fez críticas duras a Alckmin, que é pré-candidato à Presidência. Ele passou dos limites?

Eu acho que sim. Nós tivemos uma reunião com ele em Brasília, há duas semanas, na qual participaram cinco ex-presidentes do PSDB: Tasso Jereissati, Pimenta (da Veiga), Teotônio Vilela, Alberto Goldman e eu. Dissemos que não faz sentido ficar atacando. A disputa interna deve servir para construir convergência. Nós até brincamos: passamos nossos números de celular e dissemos que, se houver qualquer problema, é só ligar.

Cecília Meireles: Leveza

Leve é o pássaro:
e a sua sombra voante,
mais leve.

E a cascata aérea
de sua garganta,
mais leve.
E o que lembra, ouvindo-se
deslizar seu canto,
mais leve.
E o desejo rápido
desse mais antigo instante,
mais leve.
E a fuga invisível
do amargo passante,
mais leve.
-----------------
– Cecília Meireles, em “Obra poética”. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994.

Gal Costa - Se todos fossem iguais a você (Tom Jobim/Vinicius de Moraes)

domingo, 18 de fevereiro de 2018

Luiz Sérgio Henriques: A crise latino-americana no espelho da Europa

- O Estado de S. Paulo.

Pouca ou nenhuma compreensão merecem aduladores de tiranetes terceiro-mundistas

Este tem sido um tempo de manifestos de intelectuais, no Brasil e fora daqui, a respeito dos problemas que nos acometem num ritmo quase de tirar o fôlego. Fácil demais, mas inútil, ironizar esse tipo de “literatura”, caracterizando-a como manifestação superficial de intelectuais sartrianamente engajados, para usar terminologia anacrônica, a respeito de caóticas situações de um Ocidente distante, posto na periferia do mundo e submetido, em passado não tão remoto assim, a golpes sangrentos e regimes de exceção.

Não se trata só de cálculo pragmático. Todo e qualquer democrata, seja de que tendência for, conhece o peso e a dimensão de um Jürgen Habermas ou de um Charles Taylor – para só mencionar dois nomes que, avalizadores da hipótese de golpe contra a democracia brasileira com o impeachment de Dilma Rousseff e os problemas judiciais de Luiz Inácio Lula da Silva, carregam consigo a capacidade de influenciar pessoas de bem nas mais diferentes latitudes. Não são “companheiros de viagem”, como se dizia outrora daqueles cujo apoio uma esquerda muitas vezes sectária aceitava transitoriamente, enquanto lhe serviam de um ponto de vista puramente tático. Na verdade, mais além do pragmatismo, o que dizem de certo ou errado, de profundo ou superficial, faz pensar nas relações entre cultura e política, nos meios e modos de recíproca influência entre duas esferas ligadas, mas irredutíveis uma à outra.

Se Habermas é um intelectual que estimula e inspira respeito, há, evidentemente, outros nomes cuja atitude diante não só do Brasil, como também da América Latina, dá margem a preocupação e a pessimismo. A virada à esquerda que marcou a política do subcontinente sulamericano na primeira década do novo século nem sempre foi acompanhada com sobriedade e mesmo seriedade. Tendências que se afiguravam desde o início autoritárias e potencialmente destrutivas foram saudadas por figuras públicas maiores ou menores como indícios de insurgência anti-imperialista, rebeliões populares contra o neoliberalismo, como se conviesse à esquerda reeditar, com sinal trocado, o doloroso passado de caudilhos e ditaduras de nuestra América.

*Celso Lafer: Política externa, sua relevância

- O Estado de S. Paulo.

É preciso saber caminhar na complexidade atual para o País não perder o controle de seu destino

A política externa é uma política pública. Pode ser retratada como um processo de tradução qualitativa e quantitativa de necessidades internas em possibilidades externas. Esse processo tem suas dificuldades e seus desafios analíticos, pois é preciso identificar quais são, em determinada conjuntura de um país, as suas necessidades prioritárias e quais são as possibilidades externas de torná-las efetivas. A experiência diplomática também aconselha avaliar qual é o impacto externo da afirmação de necessidades internas. É o que cabe lembrar a propósito do America First de Trump e da política nuclear da Coreia do Norte.

Na análise das necessidades internas, vale a pena destacar que a área das relações internacionais não é como um campo de futebol, onde o claro objetivo dos dois times em confronto é, dentro de regras estabelecidas, ganhar o jogo num tempo e num espaço definido. Não é também, num grau muito maior de dificuldade, como a área da economia, no âmbito da qual o tema central é a escassez e a discussão transita pelos meios de superá-la. Os objetivos das relações internacionais, definidores das necessidades internas, não são unívocos. São plurívocos e frequentemente esquivos, podendo resultar da maior ou menor atribuição de peso à segurança, ao desenvolvimento, ao prestígio, à propagação de ideias, à cooperação internacional, à agenda normativa da ordem internacional, aos desafios da sustentabilidade do meio ambiente.

A segurança é sempre um objetivo relevante de política externa, pois está voltada para, no limite, assegurar a manutenção de um Estado como um ator independente num sistema internacional que vive à sombra da guerra. Esta, como se sabe, é um camaleão que assume sempre novas formas. É compreensível que a Coreia do Sul e o Japão, diante do aumento dos riscos de um conflito nuclear na região, atribuam à segurança a dimensão de uma imperativa necessidade interna muito superior, por exemplo, à relevância do tema para a política externa da Suíça. As circunstâncias da inserção internacional de um país são, por isso mesmo, um dos dados dos distintos pesos atribuídos aos objetivos da política externa.

A avaliação de como traduzir necessidades internas em possibilidades externas passa por uma adequada compreensão das características de funcionamento do sistema internacional e de suas mudanças, e nesse contexto, para recorrer a uma formulação de Hélio Jaguaribe, da latitude de suas condições de permissibilidade, vale dizer, do juízo diplomático do que está ou não está, em distintas conjunturas, ao alcance dos alvos da política externa de um ator internacional. Mudar a geografia econômica do mundo, por exemplo, foi uma das aspirações da política externa do presidente Lula, que não estava ao alcance do Brasil. Era um objetivo inconsequente a serviço da sôfrega busca de prestígio internacional do lulopetismo.

Fernando Gabeira: Rios da indiferença

- O Globo

Um governador que não se prepara para o carnaval é uma figura inútil

Durante o carnaval, consegui tempo para ler o último livro de Oliver Sachs, o brilhante psiquiatra que morreu em 2015. Tinha uma doença terminal e enfrentou a morte com coragem e bom humor, escrevendo e revendo ensaios, no leito, com a ajuda de amigos. O livro se chama “Rio da consciência”, mas o ensaio que me chamou atenção, de início, foi o “Uma sensação generalizada de desordem”. O título, na verdade, é a descrição que um paciente faz da enxaqueca, doença que Sachs muitas vezes, como psiquiatra, enfrentou. A enxaqueca não me fascinou tanto quanto a descrição do sistema nervoso autônomo, um conjunto — células, hormônios, redes neurais — que monitora o equilíbrio de nosso organismo. Diferente do sistema nervoso central, o autônomo não coordena o que fazemos, mas é uma indicação de como estamos.

Escrevo a caminho de Pacaraima, na fronteira do Brasil com a Venezuela. Saí diretamente do Rio para cá. Suponho que a sociedade também tenha essa tendência ao equilíbrio, uma espécie de sistema nervoso autônomo. Se é assim, creio que já deu sinais de que algo vai mal tanto no organismo nacional como no sul-americano.

O Rio foi tomado por inúmeros casos de violência e assalto. Apesar de tantos avisos, o governador Pezão confessou que o estado não se preparou para o carnaval. Como se uma festa tão antiga e previsível fosse um raio em céu azul. O prefeito do Rio, Marcelo Crivella, disse que iria aproveitar a folga do carnaval e viajar para a Europa, em busca de experiências “inovativas”. Folga, como assim? Trabalhei no carnaval por escolha, se quisesse poderia estar fantasiado em qualquer esquina. Mas um prefeito não tem folga no carnaval. É precisamente o período em que tem de cuidar de tudo, para evitar o pior. Pezão ainda não conseguiu ler o plano de segurança. Crivella se elegeu dizendo que iria cuidar das pessoas. Será que foliões, fantasiados, seminus e alegres, não são pessoas?

Essas coisas nos colocam próximos de uma desordem generalizada. As principais autoridades parecem não entender o que está se passando. A tarefa do equilíbrio, a homeostase, torna-se cada vez mais complicada.

Elio Gaspari: Pezão precisa sair do governo do Rio

- O Globo

A ideia da intervenção do governo federal na Segurança do Rio veio tarde e é curta. O governador Luiz Fernando Pezão precisa ir embora. Não tem saúde, passado, nem futuro para permanecer no cargo num estado falido, capturado por uma organização criminosa cujos chefes estão na cadeia. Como? Ele desce do gabinete, entra no carro e vai para casa.

Na quinta-feira, quando esteve no Planalto, Pezão disse a Temer que a situação da Segurança Pública do Rio saíra do seu controle. Ao deputado Rodrigo Maia, mencionou a “calamidade” e acrescentou: “Não podemos adiar nem mais um dia.” Há duas semanas, o mesmo Pezão se orgulhava da qualidade e da eficiência de suas polícias, reclamando do que seria uma “cobertura cruel.”

Desorientado (há tempo), o governador construiu um caso clássico para demandar uma intervenção ampla, geral e irrestrita no Rio. Nada a ver com o que se armou no Planalto.

Sérgio Cabral (patrono de Pezão) e Jorge Picciani (“capo” do PMDB) não estão na cadeia pelo que fizeram na Segurança. Ambos comandaram a máquina corrupta que arruinou as finanças, o sistema de ensino e a saúde pública do estado. A corrupção e a inépcia policial são apenas o pior aspecto da ruína.

Vinicius Torres Freire: A guerra de Temer e o Exército no Rio

- Folha de S. Paulo

O Rio de Janeiro não tem governo. Melhor do que estar sob o controle dos presidiários Sérgio Cabral (MDB) e Jorge Picciani (MDB), decerto.

Mas a máquina pública ainda está tomada pelo vírus do MDB. Há conluio entre comandantes da PM e o crime organizado, já disse Torquato Jardim, ministro da Justiça de Michel Temer (MDB). A chefia do Tribunal de Contas foi para a cadeia. Falido, o Rio vive de favor federal e em guerra civil molecular.

Por que não houve intervenção no governo inteiro?

Porque seria um desvio da ofensiva política do governo federal. Desde que a reforma da Previdência estrebuchava, fins de 2017, Temer e turma previam uma "agenda positiva" para 2018, baseada em segurança pública. Seria um mote eleitoral do governismo, de Rodrigo Maia (DEM) inclusive. Mas isso era um plano agora menor e pretérito.

O colapso de Luiz Fernando Pezão (MDB) juntou a fome com a vontade de comer. No Planalto, se diz que de fato não havia mais alternativa a uma baderna criminosa geral. Sim, Temer e turma vão tentar fazer propaganda da intervenção militar na segurança do Rio até outubro. Cuidar do desastre do governo inteiro tiraria o foco da campanha, prejudicaria a tentativa de capitalizar efeitos provisórios da intervenção ou da paz temporária do cemitério.

Míriam Leitão: Os dois atos

- O Globo

A criação do Ministério da Segurança não representa coisa alguma, a não ser a transferência de órgãos de um lado para outro da Esplanada, já muito abarrotada de ministérios, e mais cargos para nomeação. Dependendo de quem for escolhido para comandá-lo, pode ser ainda pior do que já está. Por que a Polícia Federal ou a Polícia Rodoviária Federal ficariam melhores saindo da Justiça?

Ao anunciar ontem que vai criar o novo órgão, o presidente Temer reduz a força de sua própria decisão de sexta-feira de decretar a intervenção na segurança do Rio. No primeiro ato, é a tentativa de encontrar uma saída para problema agudo. O segundo é inútil e demonstra falta de foco. A ameaça principal vem do narcotráfico. Ele ficou muito poderoso nos últimos anos. Antes o país tinha uma soma de facções locais, agora mudou. “O crime organizado virou um empreendimento multinacional”, diz uma autoridade. Contra ele, os braços do Estado precisam se unir, com soma de esforços e troca de informações.

A intervenção só terá resultados se houver muito planejamento, inteligência e uso intensivo da tecnologia. Nunca funcionou, e não funcionará agora, o “prender e arrebentar”, apesar de ainda hoje existir quem defenda esse caminho, com aplausos de plateias desavisadas. O crime sofisticou-se e há a complicação territorial. Os moradores das favelas são seus escudos e primeiras vítimas. Uma das muitas dificuldades do novo comando da segurança será saber com que parte da Polícia pode contar e que parte já trabalha para o narcotráfico.

Vera Magalhães: O novo nunca vem

- O Estado de S. Paulo.

‘Mas é você que ama o passado e que não vê que o novo sempre vem’

O hino de Belchior, que embalou estudantes que se opunham à ditadura nos anos 1970, ecoa ainda atual em 2018. Mas a afirmação otimista e contestadora do final poderia ser trocada por um ponto de interrogação no Brasil de hoje: será que o tal novo vem?

Não é a primeira vez que escrevo sobre o tema neste espaço. Cada eleição tem uma ideia-força a conduzi-la. Em 1989, era a volta do sufrágio direto, em 1994, o Plano Real. Em 1998 foi a primeira eleição com reeleição. Em 2002, Lula conseguiu vender esperança como mote, e embalou o peixe tão bem que, mesmo diante de mensalões e afins, fez de 2006, 2010 e 2014 eleições pautadas pela ideia de que havia promovido maior igualdade social – uma ideia-guia poderosa, mas que depois se mostrou falsa.

Neste ano, a renovação parece ser o desejo da maioria dos brasileiros, ainda que manifestada de diferentes maneiras. O problema é que é uma ideia que não casa com a realidade que se apresenta no tabuleiro da política. E não encontra alguém que a personifique.

Luciano Huck: Estou dentro

- Folha de S. Paulo

Escrevo para dizer, mais uma vez, que não sou candidato a presidente. Mas se alguém imaginou que estou saindo de cena, errou na mosca

Não existe vento bom para uma nau sem rumo. Mas desta vez não vou evocar Ulisses para ilustrar minhas reflexões.

Escrevo aqui, mais uma vez, para dizer que não sou candidato a presidente do Brasil.

Mas, se fosse somente esta a minha motivação, pouparia a todos de um terceiro artigo para defender a mesma tese, o que seria redundante e sem sentido.

Escrevo para organizar e cadenciar as ideias e, mais do que tudo, para compartilhar com quem se interessa pelo que penso minhas crenças, meus sentimentos e aprendizados.

Em novembro deixei claro aqui neste espaço que não seria candidato a nada. O ano começou e meu nome seguiu sendo ventilado no noticiário político e nas pesquisas eleitorais. Gente de todos os lugares, idades e crenças me procurou para depositar em mim suas esperanças, diga-se, já no fim.
E, por mais coerente que eu tente ser, não posso esconder que o coração se encheu de força, a cabeça de ideias e que todas as intempéries e adversidades que os amigos mais queridos apontavam incessantemente, encolheram e ficaram minúsculas por alguns instantes.

A recorrência desta hipótese em torno do meu nome fez ressurgir uma espiral positiva de tamanha força que foi humanamente impossível não me deixar tocar.

Assim, a cabeça e a alma começaram a operar novamente seus ciclos de altos e baixos, trazendo de volta ao meu radar uma decisão avassaladora.

Enquanto isso, a tal espiral novamente atraiu de forma ainda mais potente para perto de mim inteligências brilhantes, cabeças encantadoras, das mais experimentadas às mais novas e cheias de disposição. Gente que me fez voltar a acreditar na palavra servir no tempo e significados corretos. Um encontro de pessoas muito especiais com intenção genuína de sair da letargia e de se unir pelo que é comum.

Luiz Carlos Azedo: Não morreram em vão

- Correio Braziliense

O comandante militar do Leste, general Braga Netto, é o novo xerife do Rio. Tem a tarefa de restabelecer a paz e a ordem. É a primeira intervenção federal depois da Constituição de 1988

Quando a Itália entrou na I Guerra Mundial, em 1915, ao lado da “Entente” (aliança entre França, Inglaterra e Rússia), os políticos italianos acreditavam que aquela seria uma oportunidade de libertar Trento e Trieste do jugo estrangeiro e declararam guerra ao Império Austro-Húngaro. Centenas de milhares de jovens foram recrutados e lançados à batalha. No primeiro confronto, porém, o exército inimigo manteve as suas linhas de defesa de Izonso e o ataque foi contido. Morreram 15 mil italianos.

Na segunda batalha, foram 40 mil mortos; na terceira, 60 mil. Os italianos lutaram “por Trento e por Trieste” em mais oito batalhas, até que, em Caporreto, na décima-segunda, foram derrotados fragorosamente e empurrados pelas forças austro-húngaras às portas de Veneza. O episódio, citado no livro Homo Deus, de Yuval Noah Harari (Companhia das Letras), ficou conhecido como a síndrome “Nossos rapazes não morreram em vão”, porque foram contabilizados 700 mil italianos mortos e mais de 1 milhão de feridos ao final da guerra.

Depois de perder a primeira batalha de Izonzo, os políticos italianos tinham duas opções. A primeira era admitir o erro e assinar um tratado de paz, que seria aceito pelo Império Austro-Húngaro, que enfrentava outros três exércitos poderosos. Prevaleceu a segunda, porque a primeira tinha o ônus de ter que explicar para os pais, as viúvas e os filhos dos 15 mil mortos de Izonso por que eles morreram em vão. Era mais fácil exacerbar o nacionalismo e continuar a guerra.

Entretanto, Harari adverte que não se pode culpar apenas os políticos. O povo também continuou apoiando o envio de tropas para o front. E quando a guerra terminou e os territórios não foram recuperados, mesmo com o fim do Império Austro-Húngaro, os políticos e o povo entregaram o poder a Mussolini e seus fascistas, que prometerem conseguir para a Itália uma compensação compatível com os sacrifícios feitos.

Nem de longe Trento e Trieste se parecem com a Rocinha e o Complexo do Alemão, muito menos as Forças Armadas tiveram baixas até agora no Rio de Janeiro, mas já dá para perceber aonde é que podemos chegar com a decretação da intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro. É a repetição de uma solução que não teve resultados satisfatórios: o emprego das Forças Armadas para combater o tráfico de drogas e fazer o patrulhamento ostensivo nos logradouros importantes da cidade.

Há um pacto entre o governo federal e o governo estadual nessa questão da segurança e outras políticas públicas que entraram em colapso no estado. Porque estão sob controle de correligionários, o presidente Michel Temer e o governador Luiz Fernando Pezão, que ontem tirou por menos a situação e disse que pretende deixar como legado de seu governo a presença do Exército, Marinha e Aeronáutica na segurança do estado. Ambos são do MDB. E, agora, empunham a bandeira da ordem.

Ascânio Seleme: Temer, o reformista

- O Globo

Bom articulador, mas dono de histórias mal contadas, o presidente teve coragem para aprovar medidas importantes

Pode-se acusar o presidente Michel Temer de tudo, menos de não ter coragem. Fez uma carreira que muitos outros percorreram. Bom articulador, mas dono de histórias mal contadas, que alcançaria o ápice quando presidiu a Câmara. Seria apenas um Henrique Alves com mais estatura se não acabasse virando presidente. A má fama do PMDB ajudou a consolidar sua péssima imagem, que foi potencializada quando sucedeu a Dilma Rousseff. E que desmilinguiu-se depois daquela conversa estranha, para não dizer criminosa, com o empresário Joesley Batista no subsolo do Jaburu.

Temer tem o maior índice de rejeição de um presidente na História da República. E não foi poupado sequer pelo carnaval. No caso da crítica da Paraíso do Tuiuti às reformas, a escola acertou em cheio, Temer é mesmo o principal responsável por elas. Em pouco mais de um ano e meio de mandato, o presidente fez aprovar no Congresso inúmeras leis reformistas encaminhadas por ele ou elaboradas no Parlamento, mas com o seu aval. Pode-se gostar ou não das reformas, mas elas foram feitas. E por Temer. A ver.

Samuel Pessôa: Legal igual a moral?

- Folha de S. Paulo

Benefício é pago independentemente de o magistrado ter imóvel próprio

Há algum tempo a categoria de juízes vem sendo exposta em razão do auxílio-moradia. O benefício é pago independentemente de o magistrado ter imóvel próprio na cidade em que trabalha.

Os juízes argumentam que a concessão do benefício é legal e, portanto, não há problema moral em requerê-lo. O juiz Sergio Moro argumentou que o benefício compensa os salários congelados há três anos. Faltou lembrar que os impostos também não crescem há três anos.

Apesar da legalidade, a percepção é que o benefício é imoral.

O colunista Eugênio Bucci, na edição de quinta (15) do jornal "O Estado de S. Paulo", afirmou que o governo estereotipava os servidores públicos como privilegiados. Os servidores públicos somente "acreditaram na promessa do Estado de que, se topassem trabalhar recebendo proventos limitados, (...) teriam, no final da vida, uma aposentadoria digna".

Recente estudo do Banco Mundial mostrou que o Estado brasileiro remunera trabalhadores com as mesmas características de qualificação com salários 70% maiores do que o setor privado. A prática mundial é que esse "excesso" de remuneração do setor público seja de 15%. Não parece que os proventos sejam "limitados".

Bucci esqueceu que a reforma da Previdência em tramitação no Congresso Nacional não elimina os princípios de integralidade e paridade do benefício previdenciário dos servidores, mas apenas determina que serão garantidos para os que se aposentarem com 65 anos para homens e 62 anos para mulheres. Parece que são idades razoáveis para caracterizar "no final da vida".

José Roberto Mendonça de Barros*: A recuperação está aí. A sustentabilidade, não

- O Estado de S.Paulo

A parte ruim do cenário é que tudo indica que a reforma da Previdência não será votada

Em nosso País vivemos uma contradição: em 2018, o rumo da economia é cada vez mais claro, na exata medida em que o rumo da política é cada vez mais incerto. Isso não quer dizer que exista um descolamento das duas partes, mas, sim, que elas se encontrarão mais adiante e só aí saberemos se a retomada atual será transformada em sustentada ou se viveremos, mais uma vez, um “voo da galinha”.

Voltemos à economia. Estamos cada vez mais seguros de que o crescimento será bem robusto. Os dados disponíveis mostram que o último trimestre deve ter apresentado um crescimento positivo e, nesse caso, o mais provável é que a expansão do PIB tenha sido de 1,1% ou mais em 2017. No ano em curso, nossa projeção é de 3,5%.

Todos os setores deverão crescer, inclusive construção e indústria. Do lado da demanda, o consumo das famílias seguirá se ampliando, cada vez mais embalado pela recuperação do emprego e pela queda das taxas de juro. Ao mesmo tempo, e como o último trimestre do ano passado já mostrou, veremos um crescimento relevante na formação de capital (7,7%).

Mary Zaidan: Viva a ditadura

- Blog do Noblat

Partidos ditos de esquerda do Brasil se negam a enxergar a desgraça que se abateu sobre os venezuelanos

Abaixo a ditadura. A causa que uniu as esquerdas latino-americanas na segunda metade do século passado já havia se perdido quando o encantamento por Cuba cegou os que escolheram aplaudir os desmandos de Fidel Castro. Agora, diante da tirania venezuelana, foi enterrada de vez. Pior: substituída por “vivas”.

Em defesa do regime insano de Nicolás Maduro, partidos ditos de esquerda do Brasil e no que resta dos governos bolivarianos – Bolívia e Nicarágua – se negam a enxergar a desgraça que se abateu sobre os venezuelanos. Gente sem comida, sem remédios, sem qualquer saída que não seja a fronteira mais próxima.

Mais de um milhão já emigraram, a maior parte para a Colômbia e o Brasil.

Cerca de 80% dos 30 milhões de venezuelanos vivem na pobreza, metade deles na miséria. Com inflação superando a casa dos 2.500%, o salário de um mês do sortudo que ainda está empregado mal dá para uma pasta de dentes.

Mario Vargas Llosa: A derrota de Correa

- O Estado de S.Paulo

Mais cedo que tarde, como o Equador de hoje, a Venezuela também sairá do pesadelo

No plebiscito realizado no Equador, dia 4, não foi derrotado apenas o ex-presidente Rafael Correa, que não poderá se candidatar novamente à primeira magistratura do país, mas também o chavismo e sua criação ideológica, o “socialismo do século 21”, da qual Correa foi um promotor entusiasta.

Durante os dez anos em que esteve no governo, o exuberante demagogo que alardeava seu “socialismo cristão” foi, como o comandante Daniel Ortega, na Nicarágua, Evo Morales, na Bolívia, e Fidel e Raúl Castro, em Cuba, um propagandista tenaz das políticas que destruíram a democracia venezuelana e a transformaram numa ditadura devastada pela ruína econômica, a violência repressora e a inflação.

Por sorte dos equatorianos ingênuos que o levaram ao poder, Correa não imitou todas as políticas chavistas de nacionalização de empresas, redução drástica do setor privado, inchaço do setor estatal, corroído por incompetência e roubo, e perseguição sistemática à imprensa livre e aos críticos - embora tenha golpeado de várias maneiras os empresários privados e, entre outras ações antidemocráticas, tenha criado, em 2013, uma vergonhosa Lei Orgânica da Comunicação, condenada por todas as associações internacionais de imprensa, que equivalia a uma forma de censura ao dissidente e ao crítico e deixava suspensa uma espada de Dâmocles sobre os meios de comunicação independentes. Apesar de essa lei não ser mais aplicada, ela ainda não foi revogada.

Diretório Nacional e PPS-RJ manifestam apoio ao decreto de intervenção na segurança pública do Rio

O presidente nacional do PPS, deputado federal Roberto Freire (SP) e o presidente do Diretório Estadual do Rio de Janeiro, deputado estadual Comte Bittencourt, divulgaram nota pública (veja abaixo) manifestando apoio ao decreto de intervenção federal na segurança pública do estado do Rio de Janeiro.

“A intervenção determinada pelo governo federal é uma medida drástica e extrema, mas necessária neste momento”, diz o documento.

“NOTA OFICIAL
O Diretório Nacional do Partido Popular Socialista (PPS) e o Diretório Estadual do PPS do Rio de Janeiro manifestam o seu apoio ao decreto de intervenção federal nas áreas de segurança pública e inteligência, assinado nesta sexta-feira (16) pelo presidente Michel Temer.

O estágio de violência e insegurança pública no Estado do Rio de Janeiro atingiu as raias da calamidade, com um verdadeiro caos instalado, gerando intranquilidade para a família carioca e fluminense. A intervenção determinada pelo governo federal é uma medida drástica e extrema, mas necessária neste momento.

A decisão foi tomada com base na Constituição (Art. 36, § 1º), indicando a amplitude, o prazo limitado e as condições de execução, além da nomeação de um interventor, no caso um general do Exército Brasileiro.

Tudo de acordo com a Constituição e a Democracia.

Roberto Freire
Presidente Nacional do PPS
Comte Bittencourt
Presidente do Diretório Estadual do PPS-RJ”

Crise humanitária venezuelana já afeta o continente: Editorial/O Globo

Fluxo de refugiados do regime de Maduro na América Latina exige ação urgente de instituições multilaterais para ajudar os países que acolhem estes imigrantes

Enquanto a Venezuela mergulha vertiginosamente no mais grave desmantelo político, econômico e social de sua história, cidadãos de todas as classes, asfixiados pela crise da ditadura de Nicolás Maduro, abandonam o país num êxodo de proporções épicas. Este fluxo instaura na América Latina, sobretudo em Brasil e Colômbia, grave problema humanitário, comparável aos dramas de refugiados no Oriente Médio e na Ásia.

Segundo o “Wall Street Journal”, desde que os efeitos da crise global chegaram ao país bolivariano, três milhões de venezuelanos (um décimo da população) abandonaram o país; 1,2 milhão só nos últimos dois anos. No fim de 2017, a Colômbia havia abrigado 550 mil cidadãos do país vizinho, um aumento de 62% em relação a 2016. Desde janeiro deste ano, mais 50 mil refugiados entraram na Colômbia. São números que se comparam aos 600 mil sírios que pediram asilo à Alemanha, e aos 700 mil rohingyas que fugiram de Mianmar para Bangladesh.

No Brasil, números da Superintendência da Polícia Federal de Boa Vista, principal porta de entrada dos refugiados, mostram que só nos primeiros 45 dias de 2018, 18 mil venezuelanos pediram formalmente abrigo na capital de Roraima, ante 17,8 mil em todo o ano passado. A PF de Boa Vista estima uma média diária de 600 pedidos de refúgio. São pessoas desesperadas, em fuga da escassez de alimentos e remédios, do desemprego, da repressão, entre outros infortúnios. Calcula-se que 40 mil refugiados entraram no Brasil pela fronteira com Roraima em 2017. Neste ano, já são dez mil.

O venezuelano que chega ao Brasil pertence à faixa mais pobre da população. Já um estudo da PF mostra que dos 17,8 mil venezuelanos que solicitaram abrigo em 2017, 1,9 mil (6,2%) são engenheiros e 862 (4,8%), médicos, mesmo percentual de economistas.