quinta-feira, 4 de agosto de 2022

Luiz Carlos Azedo: Jair Bolsonaro está em rota de colisão com a Fiesp

Correio Braziliense

Fracassaram os esforços da cúpula da Fiesp, que articula o manifesto dos empresários em defesa da democracia e das urnas eletrônicas, para que todos os candidatos à Presidência assinassem o documento, numa espécie de pacto de respeito mútuo ao resultado das eleições. Ontem, o Palácio do Planalto anunciou que Jair Bolsonaro não subscreverá o documento, assinado por entidades empresariais e federações sindicais de trabalhadores, e cancelou a ida do presidente da República ao lançamento do documento, no dia 11 de agosto, na sede da Fiesp. Também foi cancelado o jantar com empresários que estava programado.

A ida de Bolsonaro à Fiesp fora antecipada para 11 de agosto a pedido do Palácio do Planalto. Para evitar mais constrangimentos, o recolhimento de assinaturas de apoio ao manifesto da federação ficou restrito às entidades empresariais e sindicatos de trabalhadores, para que as assinaturas dos candidatos dos presidentes fossem recolhidas antes de as pessoas físicas aderirem o documento. Ocorre que Bolsonaro não digeriu as manifestações em defesa da urna eletrônica, da Justiça Eleitoral e do Supremo Tribunal Federal (STF), e torpedeou as iniciativas.

Maria Cristina Fernandes - Baderna à beira-mar

Valor Econômico

Não é coincidência que ameaça bolsonarista convirja com palanque petista em colisão no Rio

No momento em que o presidente Jair Bolsonaro se organiza para uma exibição de baderna no Rio no 7 de setembro, o palanque eleitoral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Estado entra em rota de colisão. E nada disso é coincidência.

Em setembro de 2020 apareceram novos trechos da delação do ex-secretário Edmar Santos que levantavam suspeitas sobre a participação do então governador em exercício, Cláudio Castro, do PL, e do presidente da Assembleia Legislativa do Rio, André Ceciliano, do PT, num suposto esquema de propinas na Secretaria de Saúde do Rio.

Ambos negaram a acusação e, como o procurador-geral da República, Augusto Aras, atendeu ao pedido do presidente da República para não colocá-los no mesmo balaio de Wilson Witzel, removido do Palácio da Guanabara, ficou tudo por isso mesmo.

Daí conclui-se que Bolsonaro tem Castro e, consequentemente, sua polícia militar, na mão, circunstância inexistente no 7 de setembro do ano passado, quando a PM de São Paulo foi mantida sob rédea curta.

Se não se promove um golpe de Estado com um desfile militar na Avenida Atlântica, é, sim, possível, quando se tem controle da polícia, orquestrar atentados, ocultar mandantes e provocar um fato político a menos de um mês do primeiro turno. Foi isso que aconteceu em 2018 quando mataram Marielle Franco num Rio sob intervenção militar.

Cristiano Romero - Economia e democracia

Valor Econômico

Economias precisam de regime democrático para florescer

No domingo passado, o empresário Abílio Diniz sofreu a maior dor que pode se abater sobre um pai - a morte, causada por infarto fulminante, de seu filho João Paulo Diniz, aos 58 anos. Atleta como o pai, João Paulo sofria de doença congênita no coração. Pai de seis filhos, Abílio está devastado. A partida de um descendente é antinatural.

Quis o destino, este pregador de peças, que no mesmo domingo, 31 de julho, uma declaração infeliz do empresário fosse veiculada pelo jornalista Lauro Jardim, de “O Globo”. Na contramão de dezenas de seus pares, Abílio não assinar o manifesto em defesa da democracia - batizado de “Carta aos brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito” -, organizado pela Faculdade de Direito da USP e lançado no dia 26 de julho.

O documento recebeu mais de 500 mil assinaturas, entre elas, de lideranças dos trabalhadores e empresariais, de juristas, magistrados, acadêmicos, políticos, advogados, jornalistas, economistas, cientistas e personalidades do mundo cultural e social. No próximo dia 11, data em que se comemora anualmente o aniversário do Centro Acadêmico da tradicional faculdade de Direito da USP, a carta será lida em manifestação que tem tudo para expressar a preocupação, nada frívola, de grande parcela da sociedade brasileira com a interrupção da ordem constitucional.

Mario Mesquita - 2023 e 2022

Valor Econômico

Dados os riscos externos, a probabilidade do PIB brasileiro crescer menos de 0,4%, ou retroceder, em 2023 não é baixa

Na atualização mais recente do seu Panorama Econômico Mundial, o FMI reduziu a projeção para a taxa de crescimento da economia mundial de 3,6% em 2022 e 2023 para 3,2% no ano corrente e 2,9% no próximo - abaixo da taxa média de crescimento do PIB mundial nos últimos 20 anos, 3,6%. As revisões para 2023 foram particularmente intensas no que se refere a algumas economias avançadas: de 2,3% em 2022 para 1% nos EUA, com redução de 2,3%, no mesmo horizonte, para 1,2% na área do Euro.

Não apenas o Fundo reduziu as projeções de crescimento, mas apresentou uma lista de riscos de baixa para a atividade, sem nenhum risco de alta. Vale repassar a lista, bem como possíveis implicações para a economia brasileira. Em linhas gerais nota-se que, segundo as contas dos economistas do Itaú, cada ponto percentual a menos no crescimento global ocasiona uma redução de 0,4 pontos percentuais no crescimento brasileiro.

O primeiro risco apontado pelos economistas de FMI viria de altas adicionais dos preços de energia ocasionados pela guerra na Ucrânia. O foco de preocupação é a potencial redução da transmissão de gás da Rússia para a Europa Central e Ocidental. Uma interrupção total das entregas poderia acarretar forte alta da inflação regional e global.

William Waack - Elites frustradas

O Estado de S. Paulo

O protesto da carta é mais amplo do que a defesa das eleições

Jair Bolsonaro não entendeu a natureza política mais abrangente da carta em defesa da democracia. Assim como não entendeu até hoje a natureza da onda disruptiva que o levou – para própria surpresa – ao Palácio do Planalto.

O PT também não havia entendido a natureza dos movimentos de protesto de 2013, e pagou por isso um preço alto em 2016. Em cada uma dessas ocasiões (2013, 2016 e 2018) o solavanco foi causado por movimentos de elites descontentes talvez consigo mesmas.

É o que está acontecendo agora. A sensação é a de que o Brasil está se desfazendo em pedaços, sem que as eleições sinalizem como juntar os cacos. Ao contrário: elas evidenciam o triunfo do regionalismo. Tanto Bolsonaro como Lula se apresentam como “líderes nacionais”, mas é só no nome.

Os dirigentes do PT, que no momento possuem uma visão mais abrangente do processo político (e seu horizonte está há tempos em 2023), entenderam que os milhares de assinaturas no texto não são endosso automático da candidatura Lula. Bolsonaro, preso à sua extraordinária limitação cognitiva, acha que se trata de evento apenas contra ele.

Adriana Fernandes - A conta já chegou

O Estado de S. Paulo

A redução do ICMS deve se transformar numa nova guerra nos tribunais como foi com a Lei Kandir

As liminares do Supremo Tribunal Federal para que Estados compensem a perda de arrecadação com a redução do ICMS, por meio do abatimento das parcelas de prestações mensais de suas dívidas com a União, colocam antecipadamente na mesa um dos maiores problemas para as contas públicas em 2023.

Os analistas estão mapeando o alcance desse impacto, e já se fala na necessidade de acionar um botão de restart na relação do Tesouro Nacional com os governos regionais.

Um dos pontos da discórdia ainda não veio à tona, mas já é tratado nas conversas de bastidores, segundo apurou a coluna.

Celso Ming - Juros podem ir a 14% em setembro

O Estado de S. Paulo.

Nesta quarta-feira, o Copom aumentou a Selic pela 12ª vez consecutiva, agora em 0,5 ponto porcentual, para 13,75% ao ano (veja o gráfico). E sugeriu que na próxima reunião agendada para setembro voltará a apertar o volume de dinheiro. Pretende subir os juros em mais 0,25 ponto porcentual, para 14,0% ao ano. Diante das múltiplas incertezas pela frente, avisou que agirá com muita cautela.

Não há clareza sobre o calibre da recessão a ser enfrentada pela economia global. Os fluxos de produção e distribuição continuam conturbados pela nova onda de covid na China e a guerra na Ucrânia. Isso vem aumentando as apostas na queda dos preços do petróleo e das matérias-primas. Mas a inflação atingiu, em junho, níveis inimagináveis, de 9,1% em 12 meses nos Estados Unidos e de 8,6% na zona do euro, situação que pode ter dinâmica própria e exigir mais aumento dos juros.

Maria Hermínia Tavares* - O voto dos pobres

Folha de S. Paulo

Lula e Bolsonaro sabem que não se chega ao Planalto sem apoio da maioria dos brasileiros de baixa renda

A dois meses das eleições, só quem gosta de brigar com os fatos pode duvidar que a disputa pelo Palácio do Planalto se dará entre Lula e Bolsonaro. Numa eleição dominada por temas socioeconômicos, eles sabem que não se chega lá sem apoio da maioria dos brasileiros mais pobres.

Hoje, o petista desfruta de robusta vantagem entre os milhões de eleitores de renda irrisória: o dobro das intenções de voto dos 70% da população na faixa de até dois salários mínimos, apurou o Datafolha.

Partidários otimistas do presidente —e analistas afoitos— acreditam na força do Auxílio Brasil, há pouco vitaminado, para apequenar tal diferença. Mas não é bem assim, diz quem entende do riscado.

Bruno Boghossian – Entre Janones e Freixo

Folha de S. Paulo

Acerto com nanicos para favorecer ex-presidente coincide com embate entre petistas e PSB no Rio

A campanha de Lula foi atrás de três conhecidas bancas do feirão partidário para fechar negócio na corrida presidencial. O petista costurou a desistência de Luciano Bivar (União Brasil), fechou uma aliança com a nova direção do Pros e está prestes a confirmar a saída de André Janones (Avante) da disputa.

Lula decidiu fazer um investimento pesado nesse trio de nanicos na reta final do período de definição das candidaturas deste ano. O plano do ex-presidente é tirar de campo nomes que poderiam ser a opção de 2% ou 3% dos eleitores e melhorar os cálculos para ampliar suas chances de vitória no primeiro turno.

Ruy Castro - Bolsonaro prepara a guerra civil

Folha de S. Paulo

Não é exagero; ele não tem mais nada a perder

Abra o olho, porque as coisas vão esquentar. Bolsonaro está a ponto de perpetrar um grande absurdo, maior do que tudo que cometeu até hoje --algo que porá contra ele até setores que ainda o apoiam no Congresso e nas Forças Armadas. Fará isto de caso pensado. A intenção é provocar uma medida, vinda não se sabe de onde, que o impeça de concorrer às eleições. Isso insuflará o seu discurso de que só assim conseguem derrotá-lo e convocará para a briga seus seguidores, que detêm hoje um poder de fogo maior que o dos quartéis.

Conrado Hübner Mendes* - Corrupção bolsonarista, capítulo 8

Folha de S. Paulo

O significado de 'legalização das milícias' e o 'valor' das armas

Sabe-se há 30 anos que não há proposta de Bolsonaro para o Brasil que não namore a morte. Desde "matar uns 30 mil" até autorizar polícia a chacinar pobre sem satisfação nem luto: seu repertório se bastava nisso. Deus e "kit gay" vieram depois, quando atinou virar presidente e abraçou comerciantes da religião. Encontrou um Deus com sanha arrecadatória.

Demos pouca atenção a outra ideia que se deixava ofuscar pelas propostas de morte: a "legalização das milícias". Se procurar texto do cérebro bolsonarista que explique a iniciativa, encontrará falas parlamentares de Jair e Flávio. E muito jornalismo declaratório que citava discursos, mas não indagava sobre o conceito.

Flávio resumiu: "As classes mais altas pagam segurança particular, e o pobre, como faz para ter segurança?" A Constituição promete direito à segurança pública. O bolsonarismo oferece arma e milícia. Se miliciano cobrar "tarifa", o bolsonarismo legaliza o pagamento isento de imposto. A vida miliciana está aberta a empreendedores. Dispensa concurso.

Malu Gaspar - enquadrando o Supremo

O Globo

Nos bastidores, há a expectativa de que ministros usem discussão sobre lei de improbidade para fazer um 'gesto de boa vontade' em relação a determinadas lideranças políticas

Quando o Congresso aprovou a nova Lei de Improbidade Administrativa, em outubro passado, esquerda, direita e Centrão comemoraram em uníssono. Tamanha união demonstrou que, quando se trata de salvar a própria pele, a famigerada polarização ideológica simplesmente desaparece.

Da mesma forma, desapareceram da lei boa parte das condutas antes consideradas ilícitas — do assédio sexual e moral à carteirada, da tortura nas prisões à interferência de governantes nas instituições de Estado. Nos casos que continuaram sendo punidos, como enriquecimento ilícito, tráfico de influência, desvio de recursos públicos, ficou bem mais difícil enquadrar os responsáveis e bem mais fácil a prescrição de casos.

Também passou a ser preciso provar que o acusado agiu com dolo ou má-fé. Agora, se o sujeito disser que “foi sem querer querendo” ou que não sabia das irregularidades, é bem provável que escape da condenação.

Já poderia ser considerado um ótimo negócio para os enrolados com esse tipo de acusação, mas uma característica marcante do político brasileiro é que nunca está satisfeito. A acachapante maioria obtida no Congresso para aprovação da lei deu aos caciques partidários ânimo para ousar mais, e com isso chegamos ao surreal julgamento iniciado ontem no Supremo Tribunal Federal (STF).

Míriam Leitão - Porta entreaberta para alta de juros

O Globo

Se os juros subirem na próxima reunião, será a 11 dias das eleições, mas as incertezas das contas públicas exigem atenção do Banco Central

Os juros subiram para 13,75%, e o recado mais importante foi o de que as taxas ainda podem ter um “aumento residual, de menor magnitude em sua próxima reunião”, segundo o Banco Central. Com isso, os juros talvez terminem esta temporada de altas em 14%. Havia dúvidas sobre se o BC encerraria o ciclo ou deixaria a porta aberta para nova alta. Deixou entreaberta. A próxima reunião será realizada em 20 e 21 de setembro, a onze dias das eleições e após duas deflações. Existem motivos para parar de subir as taxas, porém, há dúvidas sobre a economia global e a brasileira.

Se as dúvidas no Brasil fossem só econômicas, estaria bom. O grande temor que paira sobre o país neste fim de ano é político. Por causa dos ataques sem tréguas do presidente contra a ordem democrática, o país está vivendo uma eleição geral como se fosse um plebiscito terminal sobre a democracia. Um vida ou morte, um tudo ou nada. Nesse clima, olhar os comunicados do Banco Central e tentar achar sentido neles pode parecer uma tarefa fora de propósito. Mas a economia está sempre em diálogo com todo o resto. Por exemplo, para tentar ganhar a eleição, o governo baixou imposto e adotou medidas eleitoreiras. Resultado, os preços administrados terminarão o ano em queda de 1,3%, registra o BC. No ano seguinte, contudo, haverá o efeito rebote e esses preços podem subir 8,4%. Por dever de ofício o Banco Central tem que olhar além do horizonte político.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

Bolsonaro e Centrão arruínam as instituições

Valor Econômico

Bolsonaro exterminou as pastas da Saúde, Educação e Meio Ambiente e cooptou para a defesa de seus interesses órgãos da República, como a PGR

A degradação institucional promovida pelo presidente da República e pelos líderes do Centrão no Congresso é ampla e profunda. Não terminou ainda e está exclusivamente marcada por interesses eleitorais de Bolsonaro e dos partidos fisiológicos em aumentar suas bancadas para continuar parasitando o Orçamento no próximo governo, seja qual for.

A barreira para impedir o impeachment de Bolsonaro foi erguida ao preço de entregar a PP, PL, Republicanos e outras legendas fisiológicas o controle orçamentário. O resultado foi a criação das emendas do relator, cuja falta de transparência foi condição essencial para a distribuição de dinheiro público a currais eleitorais demarcados pelos caciques dos partidos governistas. Há rastros fortes de corrupção nas obras que financiaram e a Polícia Federal está no encalço de um dos ninhos de propulsão de obras irregulares, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, enquanto que os repasses de grande parte das emendas secretas para a Codevasf aguarda investigações sérias. Ambos são dirigidos por pessoas indicadas pelo PP, do presidente da Câmara, Arthur Lira, e do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira.

Poesia | Adélia Prado - Terra de Santa Cruz

 

Música | Flavia Dantas - Samba da Legalidade (Zé Keti)

 

quarta-feira, 3 de agosto de 2022

Vera Magalhães - Bolsonaro insiste em riscar o fósforo

O Globo

Organizadores do ato em prol da democracia temem encontro com apoiadores do presidente

O presidente Jair Bolsonaro parece ter feito um estoque ilimitado de caixas de fósforo para riscar de forma indiscriminada até as eleições. Isso não costuma resultar em nada produtivo, como se viu há um ano, no 7 de Setembro.

Não basta ao presidente da República ofender, com adjetivos a cada dia mais pesados, os signatários da nova Carta aos Brasileiros e do manifesto das entidades patronais e de trabalhadores, ambos em defesa da democracia.

Na lógica de fomentar o caos, Bolsonaro achou por bem antecipar sua participação no ciclo de sabatinas da Fiesp, não por acaso a idealizadora do manifesto, para 11 de agosto, dia do ato da leitura dos dois documentos na Faculdade de Direito da USP.

O caldo de cultura para a primeira confusão está fermentando. Organizadores do ato em prol da democracia temem o encontro com apoiadores do presidente que podem se concentrar na Avenida Paulista, símbolo de manifestações políticas nos últimos anos, ainda que os eventos tenham horários distintos.

Qual a necessidade desse tipo de provocação? É difícil, à luz da lógica que costuma reger as estratégias de uma campanha eleitoral, entender o que Bolsonaro julga ter a ganhar confrontando mais de 660 mil cidadãos brasileiros e algumas das principais organizações do país que pedem apenas respeito ao Estado Democrático de Direito.

Nicolau da Rocha Cavalcanti* - As luzes do Largo de São Francisco

O Estado de S. Paulo

Sempre, mas especialmente em tempos de incivilidade e afronta à democracia, é oportuno ouvir as histórias das Arcadas.

Primeira faculdade instalada no Brasil – suas atividades iniciaram-se no dia 1.º de março de 1828 –, a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco foi objeto de vários estudos históricos e sociológicos. Recentemente, sua bibliografia ganhou mais uma obra: Fatos e Fitas. Crônicas sobre o Largo de São Francisco (Ed. Migalhas, 2022), de Antonio Cláudio Mariz de Oliveira. Trata-se de um livro afetivo, em que o autor, formado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, reverencia a faculdade onde estudou seu pai, Waldemar Mariz de Oliveira Júnior. “Quando vim à Terra, meu pai cursava o terceiro ano. Estive presente à sua missa de formatura”, conta Mariz.

Além de trazer histórias da vida acadêmica no século 19 – como as desavenças entre o primeiro diretor das Arcadas, José Arouche de Toledo Rendon, e o primeiro professor, José Maria de Avellar Brotero –, Fatos e Fitas representa um singular reconhecimento do profundo impacto que o Largo de São Francisco produziu sobre São Paulo e todo o País. É o olhar de quem, sem ter sido aluno das Arcadas, acompanhou de perto sua história: seus fatos e suas fitas. Nutrindo grande admiração pela faculdade cuja inauguração considera o “marco inicial de nossa independência cultural”, Mariz deseja contribuir para preservar o espírito acadêmico e as tradições do Largo de São Francisco; entre elas, “a boêmia, a irreverência, a permanente alegria de viver, a dedicação à poesia e à música, as disputas ideológicas, a adoção das causas libertárias, a solidariedade”.

Marcelo Godoy - Os generais e a carta democrática

O Estado de S. Paulo

A República sempre foi sacudida por manifestos militares; Bolsonaro parece querer revivê-los

Ao escrever Sobre o Conceito de História, Walter Benjamin concluiu que a verdadeira imagem do passado escapa rápido. E viu no anjo da tela Angelus Novus, de Paul Klee, a história, que avança para o futuro com o rosto para trás, sem se poder deter para despertar os mortos e reunir o despedaçado, pois uma tempestade a impulsiona para frente.

Em nossos dias, o anjo de Klee olha para o governo Bolsonaro e os militares. E nos pergunta: por que nenhum general assinou o manifesto Estado de Direito Sempre!, reedição da Carta aos Brasileiros de 1977? Só um entre dez deles da reserva indagados pela coluna disse ter sido consultado. O general esteve no governo Bolsonaro, de quem hoje é crítico. Mas se negou a assinar o texto, apesar de concordar com o movimento. E o fez por duas razões: expressa opiniões publicamente e as considera alinhadas à carta. Acredita que o documento traz um ranço pretérito, quando seria necessário olhar para o futuro. Defensor para as Forças Armadas da obediência ao poder civil, ele disse que este, em nosso País, ainda falha muito nesse campo.

Luiz Carlos Azedo - Dobradinha de mulheres na terceira via

Correio Braziliense

A escolha de Gabrilli para vice agrega à candidatura de Simone Tebet mais força em São Paulo, o maior colégio eleitoral do Brasil, o que dificulta a sua cristianização pelo PSDB paulista

A chapa Simone Tebet, candidata do MDB à Presidência da República, com Mara Gabrilli (PSDB-SP) como sua vice, é alvissareira. Abre espaço para mais mulheres na política, agora com possibilidades financeiras, porque 30% do fundo eleitoral serão destinados a candidaturas de mulheres pelos partidos, que podem ser punidos se não o fizerem. Entretanto, Simone nem de longe tem as mesmas condições oferecidas à ex-presidente Dilma Rousseff, que se elegeu com apoio do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2010, no auge de sua popularidade, e se reelegeu em 2014, embora com dificuldades e uma oposição que viria apeá-la do poder, com o impeachment.

Mesmo assim, a sobrevivência da candidatura de Simone Tebet no MDB, um partido dominado por velhos caciques políticos regionais, e a indicação de Gabrilli para vice, pelo PSDB, uma senadora de grande prestígio em São Paulo, são obras de grande engenharia política. Nessa construção, destacaram-se a própria candidata, que não esmoreceu diante dos desafios; o presidente do MDB, deputado Baleia Rossi, que bancou sua candidatura até o fim; o presidente do PSDB, Bruno Araújo, que retirou do caminho o ex-governador de São Paulo João Doria, abdicando da candidatura própria; e o presidente do Cidadania, o veterano Roberto Freire, que apostou na aliança MDB-PSDB-Cidadania, inclusive removendo a candidatura própria do senador Alessandro Vieira (SE), então no Cidadania, quando a aliança com o MDB parecia impensável.

Bruno Boghossian - O capitão sentiu o golpe

Folha de S. Paulo

Presidente recicla figurino antissistema para atacar poderosos, mas fantasia envelheceu mal

Às vésperas do comício golpista do 7 de Setembro do ano passado, Jair Bolsonaro soube que a Fiesp preparava um manifesto pedindo "harmonia entre os Poderes". Conhecendo o próprio comportamento belicoso, o presidente não gostou do movimento e trabalhou para esvaziar a ideia. Deu certo: o texto só saiu dias depois do feriado, numa versão que parecia mais amena para o governo.

Bolsonaro não conseguiu desarmar a bomba pela segunda vez. Sem força nos bastidores para derrubar o manifesto pró-democracia que a indústria paulista lança na próxima semana, o presidente decidiu enfrentar publicamente aquela turma. Na semana passada, ele reclamou que o documento era uma "nota política" contra si e a favor de Lula.

A reação de Bolsonaro é o reflexo de um presidente que vê o próprio poder em xeque. Os empresários enxergam a mesma figura que ele observa quando se olha no espelho: um político mais frágil, com alguma dificuldade para sobreviver no cargo e disposto a manobras perigosas.

Fernando Exman - Visões sobre a disputa tributária no STF

Valor Econômico

Caso levanta debate sobre estratégia ideal para fazer reforma

Autoridades do governo federal acreditam que está aberta uma segunda frente na disputa de forças com o Poder Judiciário. Agora, somando-se aos embates no campo político, estaria ocorrendo uma batalha econômica.

Elas se referem às recentes decisões tomadas, no Supremo Tribunal Federal (STF), sobre a cobrança de ICMS e IPI.

É um ponto de vista. E ele está longe de ser unânime. Entre ministros do Supremo, a avaliação é que foi necessário agir em defesa dos princípios federativos, uma vez que o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços é fonte importante de receitas dos entes subnacionais, e na proteção dos dispositivos constitucionais que tratam da Zona Franca de Manaus.

Em relação às questões criminais e eleitorais existentes entre o Executivo e o Judiciário, front aberto há mais tempo devido aos ataques do presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores a ministros do STF e às urnas eletrônicas, o enredo já é conhecido. Mas existe a possibilidade de haver desdobramentos importantes nestes campos nos próximos dias.

Daniel Rittner - Mudança gradual na infraestrutura

Valor Econômico

Nos próximos cinco anos, 83% da nova capacidade de geração elétrica virá das usinas contratadas no mercado livre

Ex-secretário especial de Desestatização do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord acaba de assumir o cargo de sócio-líder de infraestrutura e mercados regulados na consultoria EY (antiga Ernst & Young). Depois de três anos e meio no governo, onde teve papel-chave no novo marco legal do saneamento e na privatização da Eletrobras, ele volta para o setor privado e observa que há uma mudança importante em andamento.

Até a década de 1990, era basicamente o investimento público que guiava a expansão da infraestrutura. A partir daí, houve uma guinada: concessões se espalharam em rodovias, em ferrovias, portos, energia elétrica, telefonia. Nos últimos anos, um movimento que vai ganhando corpo é o de investimentos por meio do regime de autorizações.

Tiago Cavalcanti* - Consequências da libertação

Valor Econômico

O direito das mulheres é fundamental para uma sociedade justa e eficiente

Uma das principais transformações observadas nos mais variados países nas últimas décadas, com consequências profundas na renda, cultura e na formação das famílias, foi o aumento de participação feminina no mercado de trabalho.

Essa transformação não aconteceu de um dia para o outro e sem esforços de pessoas e mobilizações sociais que se dedicaram à questão. O movimento para os direitos das mulheres foi fundamental para elas terem voz e alcançarem conquistas importantes.

No país, 36% dos ganhos de produtividade entre 1970 e 2010 podem ser atribuídos à maior participação feminina

Em seu livro Sapiens, o historiador Yuval Noah Harari descreve como em algumas sociedades as mulheres eram propriedades dos homens (pai ou marido). O estupro de uma mulher nessas sociedades era uma violação de propriedade e a vítima era o homem que tinha o direito sobre a mulher. Em inúmeros lugares, ainda hoje em dia, o marido não pode ser preso por violentar sexualmente sua esposa.

Bernardo Mello Franco – A cartinha e o capitão

O Globo

Presidente ataca signatários de manifesto pró-democracia; após rasgar cartilha liberal, resta-lhe apelar ao fantasma do comunismo

Jair Bolsonaro está invocado. O capitão não gostou da nova Carta aos Brasileiros, que condena o golpismo e defende o sistema eleitoral. “O pessoal que assina esse manifesto é cara de pau, sem caráter. Não vou falar outros adjetivos porque sou uma pessoa bastante educada”, esbravejou ontem, em entrevista à Rádio Guaíba.

Nos últimos dias, o presidente passou vários recibos de sua irritação. “Não precisamos de nenhuma cartinha para dizer que defendemos a democracia”, disse. Em outro momento, ele atacou os banqueiros que subscreveram o documento. Sugeriu que todos teriam perdido dinheiro com a criação do Pix. “Eu dei uma paulada neles”, vangloriou-se.

Bolsonaro não se sensibilizou com mais de 670 mil mortes na pandemia. Seria ingenuidade imaginar que ele está preocupado com o número de assinaturas numa petição online. O motivo da ira presidencial é a adesão de porta-vozes da elite econômica e de entidades como Fiesp e Febraban, que lançarão um segundo manifesto na semana que vem. O capitão é tosco, mas sabe o que isso significa.

Elio Gaspari - De Eduardo Gomes para Bolsonaro

O Globo

A indisciplina militar produz ditadura e anarquia

Capitão Bolsonaro,

Por duas vezes fui candidato à Presidência da República, em 1945 contra o general Dutra e em 1950 contra Getúlio Vargas. Por duas vezes, perdi. Nunca duvidei antecipadamente dos resultados nem estimulei confronto com as apurações. Tenho visto vossas manifestações contra as urnas eletrônicas. Confio mais nelas do que naquelas que coletavam cédulas. É o progresso, gastei anos defendendo a aviação.

Vi todas as desordens militares do século XX. Revoltei-me em 1922, 1924, 1930, 1932, 1945 e em 1954. Ajudei a derrubar três governos (1930, 1954 e 1964) e fui derrubado num (1955). O senhor teve uma breve carreira militar e, como capitão, tomou uma cadeia. Eu tomei três, todas longas. Pelos objetivos que perseguia, tornei-me patrono da Força Aérea.

Acabo de saber que o senhor resolveu comemorar o 7 de Setembro do Bicentenário da Independência com um desfile militar na Avenida Atlântica, em Copacabana. Em julho de 1922 foi por lá que marchei, insurreto contra o governo do Epitácio Pessoa. Essa caminhada ficou conhecida como a Revolta dos 18 do Forte. Nunca fomos 18. Na minha conta, éramos 13, mas dizem que fomos entre 11 e 23. O centenário desse episódio foi esquecido.

Eu era um tenente de 25 anos. Éramos revoltosos e fomos metralhados na altura da rua que hoje tem o nome do meu companheiro Siqueira Campos. Levei um tiro na altura da virilha. (Esse ferimento está na origem deselegante do nome de brigadeiro dado àquele doce de chocolate.)

Em 1950 eu disse que não queria o voto daquela malta de desocupados que apoiavam Getúlio Vargas. Inventaram que eu não queria o voto dos “marmiteiros”. Eu nem conhecia a palavra. Como sou católico, perseguiria os evangélicos. Como sou solteiro, perseguiria as mulheres. Proibiria os negros de ir à praia. Besteiras, enfim.

Nunca contestei a legitimidade das minhas derrotas.

Alvaro Gribel - As contas no azul, e os juros em alta

O Globo

Governo diz que pode fechar o ano com superávit primário, mas a verdade é que as taxas de juros estão em alta pela falta de confiança nas contas públicas

O Banco Central vai anunciar hoje um novo aumento nos juros, e o Tesouro vem pagando taxas ao mercado tão altas quanto as do pior momento do governo Dilma. Apesar disso, o ministro Paulo Guedes e sua equipe têm dito ao país que as contas públicas estão em ordem. A prova seria a chance de o governo federal ter superávit primário este ano, ou seja, fechar no azul, ainda que com antecipação de dividendos das estatais, que deveriam compor o orçamento do ano que vem, e de uma superarrecadação que tem inflado os cofres do Tesouro, dos estados e municípios.

Se as contas estivessem mesmo no azul, com o país voltando ao equilíbrio depois de sete anos de déficit, seria um fato extraordinário. E isso, naturalmente, levaria à queda dos juros. Mas a melhora é pontual, e as taxas estão em alta justamente pela falta de confiança nas contas públicas.

Roberto DaMatta* - Brasileiros desconfiam de ascensão social

O Globo

Ninguém acredita que não exista algo por trás de um sucesso que ameaça o ideal reacionário de imobilidade

Um amigo ganhou um prêmio de uma sociedade literária. O prêmio inclui uma quantia em dinheiro.

Seus amigos e colegas viram como um reconhecimento, pois o premiado tem uma longa vida profissional como especialista em “ciências ocultas e letras apagadas”, como diz, citando o Millôr, quando se refere às disciplinas humanas.

Alguns mencionaram “a graninha boa”, reduzindo o prêmio ao dinheiro, e não ao reconhecimento de uma obra. Um parvo falou que ele recebia o prêmio porque escreveu sobre temas populares, esquecendo um detalhe capital: nas ciências humanas, o que conta não é bem do que se fala, mas como se fala. Pois o trivial é assumir o senso comum, e o extraordinário é lançar sobre o familiar um olhar que equilibra familiaridade e estranhamento. Falar de futebol como um jogo é uma coisa. Falar dele como um ritual competitivo promotor de uma experiência de igualdade — de respeito a normas impessoais de todos conhecidas — é tentar entendê-lo por meio de uma visão não rotineira.

Um conhecido lembrou a frase atribuída a Tom Jobim:

— No Brasil, o sucesso é uma ofensa pessoal...

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

Confusão federativa

Folha de S. Paulo

Interferência da Justiça no imbróglio do ICMS causa incerteza ao transferir perdas para a União

Ao determinar compensação imediata de perdas sofridas por quatro estados com o corte do ICMS cobrado sobre combustíveis e outros itens, o Supremo Tribunal Federal abriu mais um capítulo de incerteza nas relações federativas.

As decisões do ministro Alexandre de Moraes, de caráter provisório, permitem que Alagoas, Maranhão, Piauí e São Paulo suspendam o pagamento de suas dívidas com a União pelo menos até que o plenário da corte julgue a questão.

Os estados se insurgiram contra duas leis complementares aprovadas pelo Congresso, que mudaram normas do ICMS e limitaram a 17% a alíquota para combustíveis, gás natural, energia elétrica, telecomunicações e transporte coletivo.

É certo que a medida causará redução da arrecadação dos estados, já que a maioria cobrava taxas acima de 20%. Os governadores alegam que a perda de recursos limita o provimento de serviços essenciais.

Poesia | Bertolt Brecht - Expulso por bom motivo

 

Música | Ney Matogrosso - Trenzinho do Caipira (Heitor Villa-Lobos e Ferreira Gullar)

 

terça-feira, 2 de agosto de 2022

Paulo Fábio Dantas Neto* - Dobrando o cabo das tormentas: a dupla via da redescoberta do Brasil

Esse silêncio todo me atordoa
Atordoado eu permaneço atento
Na arquibancada pra a qualquer momento
Ver emergir o monstro da lagoa

(Gilberto Gil e Chico Buarque de Holanda) 

No espaço de tempo equivalente ao de uma quaresma, entre os meses de junho e julho desse 2022 inesquecível, a mobilização da sociedade civil brasileira em defesa da democracia mudou de patamar. À delicada e por vezes enervante esgrima das instituições contra o perigo que as ronda desde a eleição de Jair Bolsonaro, somou-se, há meses, o intrincado xadrez pré-eleitoral, necessário, mas não bastante. Agora a cidadania desce da arquibancada e dá início a um jogo coletivo para garantir sua ida às urnas.

Convém destacar o ponto a partir do qual a fermentação de uma indignação contida começa a adquirir contornos de um basta. Na bacia do Amazonas, na internacionalmente simbólica data de 5 de junho, Dia do Meio ambiente; e em Foz do Iguaçu, no dia 9 de julho, assassinatos políticos (no sentido socialmente mais relevante que pode ter esse adjetivo) provocaram, simultaneamente, um coro de protestos na sociedade política e um ato público cívico e interreligioso na Catedral da Sé da capital de São Paulo, estado que tivera seu feriado constitucionalista histórico impactado pelo segundo crime.

No ato da Sé predominou a atitude de resistência e de defesa de direitos humanos, não faltando, desse modo, analogias com o momento histórico de lutas democráticas que estão a completar cinquenta anos. Compreensível, pois vinha sendo farejado, cada vez mais vividamente, pela nossa memória comum, nesses quase quatro anos de tensão e agressão, o monstro autocrático que parecia pronto a perpetrar seu mister de inverter a roda do tempo para mergulhar o país numa tragédia da qual a unidade cívica e política contra a ditadura e pela democracia o libertara há quatro décadas. Duas semanas após aaquele ato, a sociedade civil continua evocando seu bom combate do passado, mas eis que o monstro de chumbo atualíssimo emerge inteiro, escancarando o veneno de seus planos para embaixadores de todo o mundo dois dias após o ato da Sé e provoca descida mais efetiva da arquibancada ao campo aberto da participação cívica. Agora protestam contra o espetáculo grotesco não apenas a galera da geral e a parte da plateia comprometida com os sem-ingresso de sempre. As vaias partem até de cadeiras cativas.

Thomas Traumann* - Não há neutralidade sobre a democracia

O Globo

Colocar suspeição sobre as urnas eletrônicas não é ponto de vista. É golpismo

O Brasil se tornou os Estados Unidos com dois anos de atraso. Em 2016, Donald Trump se elegeu presidente nos EUA com uma combinação de nacionalismo tosco (“Faça a América grande de novo”), antipolítica (“Vamos drenar o pântano da corrupção em Washington”) e mentiras (denúncias forjadas de um esquema de pedofilia envolvendo a cúpula do Partido Democrata). Em 2018, Jair Bolsonaro venceu mimetizando a fórmula do bufão americano. Em 2020, Trump perdeu a reeleição e instigou seus seguidores a tentar tomar o poder à força. Dois anos depois, Bolsonaro ameaça um golpe preventivo cuja justificativa é o medo de ter menos votos que o adversário. À diferença de Trump, no entanto, Bolsonaro tem o apoio do Exército.

Saber o que o futuro reserva permite que as pessoas se preparem. Se for uma inundação, os moradores das regiões de risco devem deixar suas casas. Se for uma tempestade, os motoristas são avisados a evitar as ruas que alagam. Mas como uma sociedade se prepara contra a ameaça de contestação da vontade da maioria dos eleitores?

Carlos Andreazza - Acordos e chantagens

O Globo

Os acordos de Brasília. A gente escuta sobre o que tratariam e parece difícil de acreditar. Mas todo o “difícil de acreditar” deve ser relativizado ante a existência — foi notícia — de ministros do STF em peleja pública para que suas influências políticas prevaleçam. No caso, para que o indicado de Jair Bolsonaro ao STJ fosse o afilhado de um em detrimento do de outro.

Fala-se mesmo que um teria ameaçado retirar o apoio ao presidente da República. Refiro-me a um ministro do Supremo; que ameaçava não mais apoiar o chefe de Estado caso o escolhido fosse o desafeto apadrinhado por outro ministro do STF. Temos: ministro de Corte constitucional que apoia presidente da República; e ameaça lhe retirar apoio.

Afinal, levou o que queria.

Não deixa de ser façanha, ainda que alcançada via chantagem. Bolsonaro é um traidor contumaz. Mas precisava — precisa — daquele supremo apoio. Precisa muito mais de confrontos.

Escrevo isso a propósito de uma ideia de acordo ventilada nos últimos dias. A plantação segundo a qual os civis do Planalto, os supostos moderados, trabalhariam para convencer o TSE, a partir da futura presidência de Alexandre de Moraes, a aceitar conjunto de propostas do Ministério da Defesa para as urnas eletrônicas.

Míriam Leitão - A urgente agenda ambiental perdida

O Globo

País precisará resgatar a agenda ambiental para desfazer retrocessos e conter a alta dos crimes e do desmatamento na Amazônia

O Brasil está numa situação tão dramática nas ameaças ao meio ambiente e aos povos indígenas que o novo governo — em caso de derrota de Bolsonaro — precisará de um amplo plano de reconstrução. A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva tem falado, nos seus discursos, em “buscar e atualizar a agenda ambiental perdida”, num paralelo com a agenda perdida na economia que foi defendida por economistas em 2002. Ontem se soube que cresceram em 8% os alertas de incêndio na Amazônia em julho. O primeiro semestre foi o pior em sete anos em alertas de desmatamento.

Edu Lyra - Pobreza até quando?

O Globo

Temos pressa para encontrar uma solução para um problema que vem assolando o Brasil há séculos

Regra básica de qualquer manual de administração: para atingir um objetivo, é preciso estabelecer prazos. A ausência de um deadline significa que a tarefa em questão não é prioritária e que, portanto, pode esperar. Não há empresa no mundo que ignore a importância de um bom cronograma, com data de início e fim dos trabalhos, para o sucesso de uma ação.

Qualquer um pode intuir esse princípio elementar, que se aplica também à vida pessoal. Quando planejamos uma viagem, uma reforma em casa ou a compra de um bem mais valioso, como um carro, um dos primeiros passos é decidir quando pretendemos atingir nossa meta. Sem um prazo, é mais difícil se organizar financeira e até psicologicamente.