sexta-feira, 28 de outubro de 2022

Entrevista | Maria Hermínia - Despolitização foi a marca da eleição

Professora critica falta de debate sobre proposta social, política econômica e papel do Estado

Por Daniela Chiaretti /Valor Econômico

SÃO PAULO - A campanha para presidente de 2022 teve como marca a despolitização extrema, na análise de Maria Hermínia Tavares de Almeida, professora titular aposentada de ciência política da Universidade de São Paulo. “Sem dúvida é a campanha mais despolitizada que já vi. Uma campanha onde não se discute proposta social, onde não se discute política econômica, onde não se discute o papel do Estado, onde não se discute nada. É um jogo pesado o tempo inteiro, dos dois lados”, critica. De pontos positivos ela enxerga o amadurecimento da sociedade na discussão do racismo e em permitir que o tema ambiental entre definitivamente na agenda.

Maria Hermínia, membro e uma das fundadoras da Comissão Arns, indicou uma grande mudança no espectro político da direita, que encontrou em Jair Bolsonaro um líder populista, e, portanto, forte eleitoralmente. A esquerda, por sua vez, protagonizou um grande avanço político com o apoio de muitos e diversos grupos em uma frente democrática em torno de Luiz Inácio Lula da Silva. “A grande revolução ocorreu no hemisfério da direita, não da esquerda”, constata. “O Brasil encontrou sua liderança de direita que não é de elite, é popularesca. Daí sua força”, diz. No polo oposto, ela enxerga na multiplicidade de apoios e na convergência de forças em volta de Lula, a conquista de um valioso patrimônio político: “As pessoas perceberam que era a hora da generosidade e de deixar para trás as mágoas porque o país está sob uma ameaça muito grande.”

A seguir os principais trechos da entrevista ao Valor:

Entrevista | Argelina Figueiredo - Governar depende de ter programa e partido

Especialista em governabilidade, professora do Iesp-Uerj considera que siglas precisarão se recompor

Por Caio Sartori e Paula Martini / Valor Econômico

RIO - Referência nos estudos de governabilidade, a cientista política Argelina Figueiredo refuta a ideia de que o perfil do Congresso eleito possa ser empecilho para um eventual governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Por defender bandeiras como o combate à fome, Lula teria mais facilidade que Jair Bolsonaro (PL) na relação com o Legislativo. “Políticas de combate à pobreza são bem mais fáceis de congregar, porque é difícil o Congresso se negar a votá-las.” O atual mandatário, avalia a professora do Iesp-Uerj, representa uma forma distinta de encarar a política, concentrada em temas fragmentados e sem apelo a convergências, o que causa divisões nas instâncias partidárias. Ao Valor, Argelina analisa ainda o processo eleitoral, a futura configuração partidária e a força do bolsonarismo. 

A seguir, os principais pontos da entrevista.

Entrevista | Marcus Melo - Brasil não tem problemas institucionais que possam favorecer o autoritarismo

Para cientista político, superestimação dos riscos à democracia é subproduto da polarização

Fernando Canzian / Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O Brasil não apresentaria "comorbidades institucionais" como outros países que sucumbiram ao avanço de presidentes autoritários que minaram o funcionamento de suas democracias.

Na opinião do cientista político e colunista da Folha, Marcus André Melo, é "descabido, para cenários à esquerda ou à direita", o risco de "venezuelização" do Brasil, em que as instituições perderiam espaço para o autoritarismo.

"A superestimação dos riscos à democracia é mais um subproduto da polarização. O fantasma da 'venezualização' interessa aos principais contendores, pois esvazia a discussão em torno de políticas econonômica e ambiental, entre outras", afirma em entrevista.

Fernando Gabeira - Um domingo em nossa vida

O Estado de S. Paulo

Assim como apenas um presidente não basta para o processo de pacificação do País, autoridades não bastam para conter o processo de ‘fake news’.

Domingo pode ser o fim da era Bolsonaro. Duas visões de Brasil muito diferentes se encontram. A possibilidade de mudança é alta.

Bolsonaro já foi derrotado no primeiro turno. Derrota inédita para um presidente em exercício.

Os fatos neste final de campanha parecem confirmar a tendência de derrota. O primeiro deles foi a frase de Bolsonaro confessando uma atração sexual por uma refugiada venezuelana de 14 anos: “pintou um clima”. Para um líder político que se diz defensor da família, dos bons costumes e da religião, a frase de Bolsonaro é escandalosamente contraditória. Seria o mesmo que um líder na luta contra a corrupção aparecer com milhares de dólares na cueca.

Mesmo sem pressão da mídia e da campanha opositora, o fato ganhou as redes e, num primeiro momento, produziu 1,5 milhão de postagens. Bolsonaro afirmou que as meninas venezuelanas estavam se preparando para se prostituir. Falso. Isso também causou revolta.

Vera Magalhães - Brasil: ontem, hoje e amanhã

O Globo

Eleição de domingo marca uma mudança de era, e está em jogo a vigência plena da democracia

A eleição de domingo será a última sob o signo da Nova República. Caso Luiz Inácio Lula da Silva seja eleito para um inédito terceiro mandato desde que foram restabelecidas as eleições presidenciais, em 1989, anunciou que fará seu último governo. Isso projeta para 2026 um cenário de disputa com novos nomes. Se Jair Bolsonaro vencer, a superação do ciclo pós-redemocratização, que sua primeira vitória prenunciava, se completará quatro anos antes.

Nessa mudança de era, o que está em jogo é a vigência plena da democracia. A Nova República teve início com a escolha de Tancredo Neves pelo Colégio Eleitoral, etapa final da superação da ditadura. Foi marcada por momentos de instabilidade econômica e política, inclusive com dois impeachments, mas não por ameaça real à independência dos Poderes ou às demais garantias constitucionais.

Foi esse risco, de uma vitória de Bolsonaro solapar a normalidade institucional, que levou forças tão distintas do espectro político, da esquerda à centro-direita, a se unir naquela que é a frente mais ampla desde as Diretas Já, que inaugurou o período histórico que caminha para o epílogo.

Luiz Carlos Azedo - Denúncia das rádios foi tiro no pé de Bolsonaro

Correio Braziliense

A ordem na campanha de Bolsonaro é esquecer a história das rádios e deixar o assunto morrer na Justiça, porque a denúncia foi uma Operação Tabajara, como diria o humorista Claudio Manoel, da antiga Casseta & Planeta. Não se sustentou 24 horas, porque revelou atraso na entrega dos programas às rádios, falhas no monitoramento das redes sociais e uma desconfiança, por parte da própria equipe de campanha, de que o ex-secretário de Comunicação da Presidência Fábio Wajngarten, autor da trapalhada, comprou gato por lebre, ao acreditar que o dossiê com a denúncia tivesse total veracidade e poder de provocar até o adiamento das eleições.

A tese foi comprada pelo ministro das Comunicações, Fábio Faria, que divulgou a denúncia em entrevista coletiva na segunda-feira, sem que o senador Fábio Bolsonaro (PL-RJ) e o marqueteiro da campanha, Duda Lima, fossem consultados. Como todo candidato que está perdendo a eleição acredita em qualquer coisa que possa mudar o rumo da história, Bolsonaro se empolgou e agarrou a denúncia com as duas mãos, mas foi demovido de um confronto mais sério com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, pela cúpula das Forças Armadas e os caciques do Centrão — o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e próprio presidente do PL, Valdemar Costa Neto — tão logo as rádios começaram a desmentir as informações.

Eliane Cantanhêde – Hollywood é aqui

O Estado de S. Paulo

Só num país imaginário, o presidente inventa uma farsa eleitoral e todos temem golpes

Num certo país imaginário, um líder político inteligente, experiente e praticamente dono de um partido chocou todo mundo ao atacar de forma vil uma ministra da Suprema Corte, mesmo sabendo que, em estando em prisão domiciliar, seria levado de volta à cadeia. Como foi.

Antes, porém, nesse país imaginário, esse político preso, armado e amalucado recebe agentes da Polícia Federal com 50 tiros e três granadas. E o que faz o presidente da República? Destaca o ministro da Justiça para negociar, a favor do aliado criminoso, com quem ele disse que nunca tirara uma foto. A internet foi inundada de fotos dos dois.

Bernardo Mello Franco - Pintou um clima

O Globo

Se presidente queria demonstrar força, pronunciamento desta quarta teve o efeito contrário

Pintou um clima de derrota na campanha de Jair Bolsonaro.

Às vésperas do segundo turno, aliados do presidente passaram a pedir o adiamento da votação. Alegam que ele teria sido prejudicado na distribuição da propaganda eleitoral em rádios no Nordeste.

A queixa foi apresentada por Fábio Faria, dublê de ministro e animador de palanque. Anunciada em tom de escândalo, baseava-se num relatório vazio e apócrifo. Instado a dizer quem teria participado do boicote, o comitê bolsonarista listou apenas oito emissoras. A maioria de municípios diminutos, como Várzea da Roça e Santo Antônio de Jesus.

O factoide governista não sensibilizou o TSE. O ministro Alexandre de Moraes arquivou a reclamação por ausência de “qualquer indício mínimo de prova”. Para completar, determinou que seus autores sejam investigados por tentativa de tumultuar o processo eleitoral.

Ainda que a história fosse verdadeira, não teria a menor influência numa disputa que envolve mais de 120 milhões de eleitores. Além disso, a responsabilidade de fiscalizar a veiculação de propaganda é dos partidos políticos, não do Judiciário.

Maria Cristina Fernandes - O teste de estresse imposto à democracia

Valor Econômico

Segundo turno que começou pela votação surpreendente de Bolsonaro termina com investida contra TSE

Em quatro semanas, um segundo turno que começou pelo surpreendente percentual de votos obtido pelo presidente da República em 2 de outubro terminou sob o impacto de uma investida de sua campanha para desacreditar o processo eleitoral. As pesquisas de intenção de voto mostram um cenário apertado.

Marcada pelo recorde em denúncias de “fake news” pedidos de direitos de resposta no horário eleitoral e pelo inédito poder de polícia do TSE, a campanha estava marcada para terminar na noite desta sexta-feira, com o debate presidencial. Terá porém, manifestações em todo o país, no sábado, convocadas pela campanha de Jair Bolsonaro sob o mote “eleições limpas”.

No lugar das urnas eletrônicas, cujo relatório de fiscalização ainda não foi apresentado pelas Forças Armadas, entrou a denúncia de supressão de inserções publicitárias da campanha bolsonarista já rejeitado pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes.

A guinada da campanha presidencial deu-se à medida que a arrancada do primeiro turno, que deixou Jair Bolsonaro a apenas cinco pontos percentuais do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (48,4% x 43,2%), o equivalente a 6 milhões de votos, perdeu fôlego.

César Felício - O método na loucura

Valor Econômico

Golpismo de Bolsonaro sempre volta quando se perde a narrativa

“Embora seja loucura, há um certo método nela”, comentou Polônio, depois de ouvir um desvario de Hamlet, o príncipe que fingia ser louco na peça de Shakespeare para orquestrar sua vingança. O auxiliar do rei da Dinamarca desconfiou de que a loucura de Hamlet era uma fraude momentos antes de ser assassinado por ele.

A retórica do complô à qual o presidente Jair Bolsonaro desde sempre recorre para alimentar o golpismo segue um padrão: ela volta à tona quando, por um motivo ou outro, o bolsonarismo perde o controle da narrativa. É uma retórica assentada em bases frágeis, mas cuja possível letalidade não pode ser subestimada.

De certa maneira era esperada no meio político a volta com força do discurso anti-institucional, caso aumentasse a dúvida sobre as chances do presidente em se reeleger. Como sempre faz nestas ocasiões, Bolsonaro vai até um certo limite do qual não ultrapassa. A porta para o recuo está sempre aberta. O presidente acusou a Justiça Eleitoral de fazer vista grossa a um boicote generalizado por parte de emissoras de rádio, principalmente do Norte e Nordeste, a inserções suas no horário eleitoral do segundo turno. O presidente do TSE arquivou a denúncia. Assustando a República, Bolsonaro convocou uma coletiva no Palácio do Alvorada para dizer que vai recorrer e fazer discurso de campanha. Ponto.

Bruno Boghossian - O que muda com o último debate

Folha de S. Paulo

Encontro terá peso sobre decisão de voto do eleitor menos convicto e vontade de ir às urnas

debate na TV Globo não mexe na ampla base fiel de Lula e Jair Bolsonaro, mas as mensagens finais de cada candidato ainda podem ter influência sobre dois fatores importantes: a decisão de voto do eleitor menos convicto e sua vontade de ir às urnas.

Lula tem o privilégio de jogar pelo empate na sexta-feira (28). Ele não precisa tomar riscos, mas tem que evitar erros. Isso envolve calibrar o discurso para segurar eleitores que estão dispostos a derrotar Bolsonaro, ainda que não sejam fãs do PT.

O desafio do ex-presidente será corrigir pontos fracos do debate anterior, quando deu respostas vacilantes sobre corrupção e entregou o palco para uma pregação conservadora do rival. Bolsonaro deve insistir nesses temas, o que faz com que uma das prioridades de Lula seja impedir que o presidente surfe na rejeição à esquerda para capturar eleitores indecisos ou hesitantes.

Hélio Schwartsman – O que quer Bolsonaro?

Folha de S. Paulo

Não dá para descartar um cenário em que o atual mandatário tente algo na linha de um golpe

Uma coisa com a qual não precisávamos nos preocupar antes da extremização do país era a reação dos candidatos derrotados nas urnas. Quando a democracia funciona em seu ritmo normal, os perdedores se conformam em passar um tempo na oposição, aguardando uma chance de retorno. O cálculo político é o de que sai mais em conta entregar pacificamente o poder e passar um período sem acesso direto a suas benesses do que tentar impor-se pela força. Perdas momentâneas são preferíveis à possibilidade de eliminação definitiva.

Nosso problema, hoje, é que Jair Bolsonaro não faz essa conta. E ele não está de todo errado. Em seu caso, a perda da Presidência pode significar mais do que apenas uma temporada longe do poder, pois há uma chance não desprezível de que ele vá para a cadeia —e isso abre as portas da incerteza. A única coisa de que estamos razoavelmente seguros é que, em caso de derrota no domingo, Bolsonaro não vai telefonar para Lula parabenizando-o pela vitória.

Mariliz Pereira Jorge - O lado certo na história

Folha de S. Paulo

Terei paz ao olhar para trás e ver que engrossei nas ruas o coro de 'fora, Bolsonaro'

Não há mais nada a ser dito sobre Jair Bolsonaro. Nos últimos quatro anos gastamos todo o vocabulário, importamos palavras, incorporamos outras ao nosso repertório para descrever a tragédia que vivemos.

Eu poderia usar mais 1.900 caracteres para reafirmar que Bolsonaro é um golpista, corrupto, autoritário, insensível, preconceituoso, obtuso. Poderia gastar este espaço inteiro novamente para desqualificar o sujeito mais repulsivo da nossa história mais recente. Mas prefiro deixar aqui uma provocação inspirada no manifesto "Domingo a gente faz um país".De que lado você estará na história? Assim como Antonio Prata, que assina o texto distribuído pelo grupo Derrubando Muros, daqui a dez, trinta anos, se ainda estiver viva, poderei contar com orgulho que naquele 30 de outubro de 2022 eu estava do lado certo. Assim como Alckmin e Lula, Boulos e Tebet, Armínio e Emicida, João Amoêdo e Mano Brown, escolhi abraçar a democracia.

Vinicius Torres Freire - Lula 3 fala do ‘Brasil do Amanhã’

Folha de S. Paulo

Plano econômico imita objetivos de governos petistas, sem mostrar como fazer melhor e não estourar dívida

Um governo Lula 3 seria muito parecido com Lula 2. Talvez até com Dilma 1. É o que fica da leitura da "Carta para o Brasil do Amanhã", um programa sintético de governo divulgado nesta quinta-feira (27) pela candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Por fora, pelos nomes e intenções genéricas descritas na "Carta", os programas são quase idênticos aos dos governos petistas —"por fora, bela viola". Por dentro, não se sabe se é o caso de pão bolorento.

Vários desses programas deram errado ou são agora (ainda mais) insustentáveis. Os casos mais graves foram os subsídios para empresas, de criação de indústrias nacionais que produziriam bens para substituir importações e a atuação de BNDES e Petrobras. Vários deles terminaram em desastre.

Sim, é possível estabelecer os mesmos objetivos da "Carta" de Lula mudando métodos e a depender de tamanho e do prazo em que se quer atingir o resultado. Não é possível saber se será assim. A "Carta" de Lula não dá pistas do que seria novo. Apenas sugere o velho

Reinaldo Azevedo - Entre a frente ampla e a autocracia

Folha de S. Paulo

A frente do 'não' também é a do 'sim' à civilização

Estaríamos, como país, dando um passo civilizatório a mais se uma frente ampla tivesse se formado, de caráter duradouro, tentando levar adiante um programa de, vá lá, "modernização" do Brasil. Essa palavra escrita entre aspas é sempre complicada, e eu não ignoro os sortilégios que traz, assim, embrulhada em papel de presente. "Modernos" à moda Paulo Guedes —esses reacionários que se vestem de liberais em festinhas, mas praticam canibalismo social em festins— acham "moderna", por exemplo, a não obrigatoriedade de corrigir o salário mínimo pela inflação.

Entendem que tal imposição legal seria uma forma de tabelamento da mão-de-obra, o que inibiria os investimentos. Sei. Num país em que pelo menos 34% dos trabalhadores ganham até dois mínimos —a depender da métrica, esse índice passa dos 50%— e em que 51,2% dos adultos (69,5 milhões) não concluíram o segundo grau, fazer pregação contra a correção é conversa de nababos que concentram renda enquanto os pobres flutuam só ao sabor do mercado.

Flávia Oliveira – A eleição dos identitários

O Globo

Grupos que presidente tentou subordinar darão resposta a ele domingo

Quando o domingo de segundo turno chegar ao fim, o líder que assentou discursos e atos na supremacia de uns contra outros terá recebido dos grupos que tentou subordinar, no mínimo, um recado robusto; se as pesquisas se confirmarem, uma derrota retumbante. Jair Bolsonaro passou carreira política e mandato presidencial subvertendo o fundamento constitucional da igualdade ao declarar, e repetir, que “as leis existem para proteger as maiorias; as minorias têm de se adequar” — esse exemplo é de julho passado, em ato da campanha à reeleição, em Imperatriz (MA). A Carta de 1988 consagra o direito à diferença; proíbe discriminação por sexo, raça, etnia, religião. A corrida eleitoral de 2022 foi também sobre isso. Minorias feridas, quando juntas marcham, maiorias se tornam.

Pedro Doria - Musk e Twitter e Lula e Bolsonaro

O Globo

Os algoritmos incentivam a desinformação e os cancelamentos. Os atores políticos sem pudores de usar esses recursos crescem

Na quarta-feira de manhã, Elon Musk entrou na sede do Twitter carregando uma pia de louça nas mãos.

Let that sink in — escreveu.

Literalmente, “deixe esta pia entrar” — embora, em inglês, a frase também possa ser lida como “deixa essa ficha cair”. Enquanto publicava o vídeo na própria plataforma, modificou sua autodescrição: Chief Twit. Mais ou menos ao mesmo tempo, os funcionários da empresa receberam um e-mail geral.

— Elon Musk está circulando pelo prédio, aproveitem para dizer “oi”.

Pela cabeça de muita gente certamente passava outro recado — que, se Musk fosse comprar mesmo a companhia, cortaria 75% da mão de obra. (Ele nega.)

Pois é: domingo temos a eleição mais importante da História brasileira desde que Tancredo Neves foi escolhido pelo Colégio Eleitoral, lá se vão quase 40 anos. E cá o colunista está falando de Elon Musk comprando o Twitter. Ocorre que o foco habitual deste espaço é o encontro de tecnologia, sociedade e política. Ocorre que a maneira como a informação que circula entre nós foi corrompida pelas redes sociais é diretamente responsável pela eleição de tipos como Donald Trump e Jair Bolsonaro. O assunto é inevitável e está no centro do drama que continuaremos a enfrentar, mesmo que o único candidato democrata confirme sua vitória no domingo.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Risco agora é o de tumulto na votação e na apuração das urnas

Valor Econômico

As instituições precisam continuar firmes para enfrentar os instintos antidemocráticos de Bolsonaro

A nona eleição presidencial desde a redemocratização do país, que termina domingo, será, ao que tudo indica, a mais disputada de todas, com pequena distância entre o eleito e seu rival. Marcada por paradoxos, ela é a primeira a ser travada com força total com o uso generalizado das redes sociais, um dos fatores para o baixo nível das campanhas e pela mirrada discussão de propostas para o futuro. É de longe a mais polarizada desse período republicano - já antes do primeiro turno, mais de 80% dos eleitores já tinham decidido em quem votar.

Pela primeira vez um presidente enfrenta um ex-presidente e, também pela primeira vez, o detentor do cargo, Jair Bolsonaro, não lidera as pesquisas e permaneceu em segundo lugar após o primeiro turno. Há mais peculiaridades. Não é a primeira vez que se denuncia eventuais roubalheiras nas urnas, mas é inédito que as denúncias partam do vencedor do pleito, como ocorreu de 2018 até agora. Ademais, a máquina do Estado, principalmente na República Velha, jogava todo seu peso a favor do candidato do partido do governo. É curioso, agora, que o presidente da República preveja que será roubado nas urnas (que nunca falharam nos quesitos exatidão e lisura) por quem não detém o poder nem tem condições de fazê-lo.

Desde que as pesquisas para as eleições deste ano começaram a ser feitas, o ex-presidente Lula mantém o favoritismo, tendo recebido 6,5 milhões de votos a mais que os dados a Bolsonaro no primeiro turno. Até a semana passada, a diferença entre eles havia se estreitado, indicando, ainda que em câmera lenta, uma ascensão do presidente na reta final da campanha, sinal de uma virada possível após a contagem dos votos.

As pesquisas mais recentes parecem indicar que o momento favorável a Bolsonaro já foi maior. A semana derradeira do período eleitoral começou com um inacreditável tiroteio e lançamento de granadas de um aliado de Bolsonaro, e ex-aliado de Lula, Roberto Jefferson, líder do PTB, contra a Polícia Federal que fora até seu domicílio para conduzi-lo a prisão fechada.

Poesia | Geir Campos - Viola de bolso

 

Música | Cristovão Bastos e Mauro Senise - Sarau pra Radamés

 

quinta-feira, 27 de outubro de 2022

Merval Pereira - O futuro que nos espera

O Globo

Seja quem for o vencedor no domingo, enfrentará um pais dividido. É preciso encontrar novas lideranças políticas

Com a aproximação do segundo turno da eleição presidencial e a perspectiva de que, seja qual for, o vencedor enfrentará forte oposição que reflete um país dividido, já é hora de analisar as alternativas que se oferecerão ao eleitorado diante da realidade de que, como disse Antonio Gramsci, “o velho está morrendo, e o novo ainda não pode nascer”.

Vencendo Lula, o PT estará diante do fim de uma era sem que esteja claro se haverá algum líder para levar adiante o partido ou se ele se transformará em mais um que vive do passado, às vezes renegando-o, como o PTB de Roberto Jefferson, outras o emulando sem inspiração, como o PDT de Leonel Brizola. Fernando Haddad é a aposta mais forte num futuro petista mais aberto a novas tendências, principalmente se vencer a eleição para governador de São Paulo.

Mesmo que Lula seja derrotado, Haddad, governando São Paulo, será o incontestável novo líder petista. Ainda que perca, porém, será um ministro importante num eventual governo Lula, especula-se talvez mesmo sendo escolhido para o Ministério da Fazenda. O ex-presidente já disse que quer dar a pasta a um político, e não há no partido político melhor do que ele para ajudar a fazer um governo que vá além do PT. A outra possibilidade, o ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha, esbarra na falta de influência na máquina petista.

Míriam Leitão - A crise inventada, ou como diria Shakespeare, muito barulho por nada

O Globo

O que se viu nesse episódio da inserções é a mesma forma de atuar de Donald Trump: o método de tumultuar o processo eleitoral

A crise das inserções é inventada. Ela não existe. Ontem, o governo passou o dia criando fumaça e espuma, mas quando se busca saber o que mesmo existe, encontra-se o nada.

O governo anunciou com ares de escândalo que faltavam inserções em rádios do Norte e Nordeste. Mas o fez de uma forma a parecer que a culpa era do TSE.

Como é esta rotina: as candidaturas preparam suas inserções e mandam para as emissoras e fiscalizam. Se há problemas eles recorrem à Procuradoria-Geral Eleitoral e ao TSE. Mas o tribunal não distribui conteúdo, não fiscaliza.

Malu Gaspar - Um olho no golpe e outro na urna

O Globo

Eleição de 2022 inaugura nova versão do ditado: de onde só se espera golpismo, não sai nada além de golpismo mesmo

Não era o barão de Itararé quem dizia que, de onde não se espera nada, daí é que não sai nada mesmo? Pois a eleição de 2022 está inaugurando outra versão do ditado: de onde só se espera golpismo, não sai nada além de golpismo mesmo.

Ninguém duvidava que Jair Bolsonaro não aceitaria outro desfecho para esta eleição além da própria vitória. Mas, depois do fiasco produzido pela auditoria dos militares sobre as urnas eletrônicas — aquela que ninguém viu, mas que todo mundo sabe ter atestado a segurança do sistema eleitoral —, parecia que o presidente havia finalmente aceitado o que seus estrategistas não se cansavam de repetir, com base no que viam nas pesquisas: o brasileiro médio não quer saber de confusão.

Sempre que percebe que alguma ação do chefe do Executivo pode causar instabilidade e tumulto, esse eleitor se afasta dele.

Numa disputa apertada como a que vivemos, qualquer voto conta. Até o “Jefferson Day”, quando o bolsonarista Roberto Jefferson lançou granadas e tiros de fuzil contra uma viatura da Polícia Federal, Bolsonaro parecia endossar o esforço na campanha para repaginar seu comportamento.

Luiz Carlos Azedo - Bolsonaro dobra a aposta contra o TSE e recorre ao Supremo

Correio Braziliense

Criou-se um fato jurídico cujos desdobramentos dirão se foi um tiro no pé da campanha de Bolsonaro ou é um pretexto para não aceitar o resultado do pleito, escalando o conflito com a Justiça Eleitoral

O presidente Jair Bolsonaro decidiu recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) da decisão do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, que negou na noite de ontem o pedido para investigar irregularidades em inserções eleitorais por emissoras de rádios, principalmente do Nordeste. O presidente da República voava para o Rio de Janeiro quando soube da decisão do magistrado e mandou o avião voltar para Brasília, onde realizou uma reunião ministerial de emergência no Palácio do Alvorada, após a qual fez um pronunciamento contestando-a e anunciando que recorreria ao Supremo.

Segundo a decisão de Moraes, os dados apresentados pela campanha sobre supostas irregularidades nas inserções de rádio são inconsistentes. O presidente do TSE também determinou que o procurador-geral eleitoral, Augusto Aras, apure “possível cometimento de crime eleitoral com a finalidade de tumultuar o segundo turno do pleito” por parte da campanha de Bolsonaro. Acionou ainda a Corregedoria-Geral Eleitoral para apurar eventual desvio de finalidade no uso do Fundo Partidário para a contratação de uma auditoria que embasou as denúncias. O caso foi encaminhado para o STF, no âmbito do inquérito que apura a atuação de uma milícia digital que atenta contra a democracia, do qual Moraes é o relator.

Vinicius Torres Freire – Bolsonaro e o reajuste do mínimo

Folha de S. Paulo

Plano era acabar com indexação; benefícios sociais são a despesa maior e são indexadas

A ideia de mudar o reajuste do salário mínimo estava mesmo em estudo no governo de Jair Bolsonaro (PL). Apenas videntes poderiam dizer se o estudo viria a ser um projeto. Mas acabar com reajustes automáticos de despesa social, embora não do mínimo, sempre foi um plano de Paulo Guedes.

Desde o início do governo, o ministro da Economia dizia que seu projeto maior para o Orçamento era também desindexar as despesas. Isto é, acabar com o reajuste automático, obrigatório, segundo um indicador qualquer, tal como a inflação passada, por exemplo.

Aposentadorias, pensões e outros benefícios do INSS, seguro-desemprego e abono salarial levam 51,3% da despesa do governo federal. Todos são reajustados pelo menos pela inflação passada, pelo INPC, direta ou indiretamente. A despesa obrigatória com saúde e educação leva pelo menos 6% e é corrigida pelo IPCA. Apenas aí foram 57,3% do Orçamento.

Bruno Boghossian - Em busca de mais um pretexto

Folha de S. Paulo

Campanha do presidente usa suspeitas a conta-gotas para estimular tumulto eleitoral

Para que não restassem dúvidas, Jair Bolsonaro deixou clara a prioridade de sua campanha nos dias finais do segundo turno. Num comício em Minas Gerais, o presidente alertou os eleitores para o que seria "o assunto do momento" e sentenciou: "Sou vítima mais uma vez".

O comitê da reeleição trabalha há três dias para espalhar a ideia de que Bolsonaro é alvo de uma sabotagem na transmissão da propaganda de rádio. O plano vem sendo executado de forma meticulosa para lançar suspeitas a conta-gotas, tumultuar o ambiente eleitoral, desviar atenções e vitimizar o candidato.

Thiago Amparo - Jefferson é o Bolsonaro amanhã

Folha de S. Paulo

Ex-deputado é a expressão literal do que o presidente prega

O grande Ruy Castro nos lembrou certa vez neste mesmo espaço uma frase de Oscar Wilde, na peça "Um Marido Ideal" (1893): "Quando os deuses querem nos punir atendem as nossas preces". Engenhosa e deliciosamente irônica, como toda a obra do irlandês, a frase nos faz rir pelo que não diz: o perigo está no que já esperávamos. Quando o escritor deste roteiro surrealista chamado "Brasil, 2019-2022" quer nos punir, atende as preces de Bolsonaro.

O dia de fúria psicótica de Roberto Jefferson no último domingo (23) não foi um fato isolado: é a reza já feita por Bolsonaro desde o dia 1. Separemos indignação de espanto, aqui cabe a primeira e não o segundo: Roberto Jefferson disparando fuzil e granada em policiais federais é cena revoltante, mas esperada do penúltimo capítulo do roteiro que começou quando normalizamos símbolo de arma fuzilando oponentes e homenagem a torturadores. A granada é a beira do precipício que nos aproxima um passo a mais do fim deste roteiro.

Maria Cristina Fernandes - O bolsonarismo desistiu do eleitor

Valor Econômico

Frente ampla de poderes ergue-se contra o golpismo

A escalada golpista da reta final da campanha mostra que o presidente parece já ter desistido do eleitor e não quer aguardar para conferir se o inverso é verdadeiro.

Os tiros de Roberto Jefferson atravessaram a Mantiqueira e, como previsto, acertaram o eleitor paulista. Se este eleitor, em defesa da polícia, estava disposto até mesmo a votar em quem quer tirar as câmeras dos uniformes, não aceitaria aliados dessa gente que atira em policial. Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Haddad crescem em São Paulo, a reboque de Jefferson.

Ainda está por ser explicado por que seis agentes, sem colete à prova de bala ou equipamento adequado, se dirigiram à casa de um apenado em regime domiciliar que acumulava armas e munições.

Mas o fato é que, depois de tanto explorar os votos de presidiários em seu adversário, eis que o presidente Jair Bolsonaro chegou à reta final da eleição atingido por um deles.

O fracasso da armação levou a esta cartada final do “radiolão”. A engenharia das inserções pode até demonstrar que falta fiscalização na divulgação, principalmente nas rádios. É uma lacuna que prejudica a todos e não apenas ao reclamante a quem, mais do que propaganda, falta credibilidade.

Cristiano Romero - A última chance de Lula

Valor Econômico

Lula quer novo mandato para salvar sua imagem histórica

Quando afirmou que, se eleito, montará um governo “além do PT”, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mandou recados às correntes mais à esquerda do partido e, claro, ao mercado. Não se deve esperar, de fato, que Lula, reinstalado no Palácio do Planalto, abra espaço na administração para petistas que provoquem a mínima dúvida sobre o rumo da política econômica num possível terceiro mandato.

Em junho de 2002, quando Lula, líder das pesquisas, lançou a famosa “Carta aos Brasileiros”, em que assumiu compromissos com a disciplina fiscal e o cumprimento dos contratos, muitos viram aquilo como sinalização ao mercado. Ora, este ignorou a carta e seguiu apostando que, uma vez eleito, o petista mudaria radicalmente a política econômica herdada do governo Fernando Henrique Cardoso.

Nas semanas e meses seguintes e até pouco depois da eleição de 20 anos atrás, as condições financeiras do país - taxa de câmbio, juro futuro e mercado acionário - pioraram de forma significativa. A desconfiança de investidores locais e estrangeiros em relação a um governo do PT era tanta que, no espaço de poucos meses o Brasil perdeu divisas em dólar num volume que tornou real o risco de calote no pagamento de seus compromissos com o exterior.

William Waack - Não haverá ‘concertación’

O Estado de S. Paulo

A divisão do País em bolhas herméticas não permite consenso sequer sobre o que são fatos

É difícil imaginar a quatro dias da decisão de domingo que o resultado das urnas “resolva” a disputa política. Ao contrário: a vitória de um lado vai apenas confirmar os piores temores e “certezas” do outro.

Se confirmado o favoritismo de Lula nas pesquisas, triunfa a interpretação da realidade de “trapaça” urdida por tribunais superiores focados em destruir Bolsonaro. E confirma-se a existência de uma “ditadura judicial” tal como percebida por 42% do eleitorado, segundo pesquisa da Atlas Intel.

Para substancial parcela do eleitorado, o combate às fake news com poderes ampliados do TSE não passa de imposição de censura. E seria apenas mais uma ferramenta no arsenal técnico-jurídico com que tribunais superiores atuam em favor de uma candidatura – a de Lula.

José Serra* - Eleição: data sagrada para nossa democracia

O Estado de S. Paulo

Comparecer às urnas não significa aprovar os candidatos em disputa, mas legitimar a instituição do voto popular

Faltam três dias para a eleição, uma data sagrada para nossa democracia. É o momento decisivo para o exercício da soberania popular, pois o poder democrático está em jogo nas mãos dos cidadãos. A gravidade do ato de confirmar seu voto na urna eletrônica significa que o eleitor confere ao seu representante, e especialmente ao chefe do Executivo federal, o arbítrio para tomar decisões que afetam não somente a vida de cada um, mas, sobretudo, a sobrevivência do País enquanto nação livre e soberana.

A crise da democracia representativa, que se manifesta na perda da confiança dos cidadãos em seus representantes, provocou um profundo ressentimento em várias partes do mundo. O sentimento de desamparo, diante de uma representação política vista como cega e surda a suas demandas mais urgentes, propicia comportamentos incompatíveis com a expressão de um voto livre e consciente.

Um deles é o voto de protesto, deliberadamente conferindo algum símbolo de menosprezo pelas instituições democráticas, como animais e palhaços que infestaram eleições no Brasil e em países europeus de democracia consolidada. Esse gesto manifesta a ideia de que “este homem é louco, e só um louco é capaz de resolver todos os problemas do país”, e grassou em grande número de votantes nas eleições de 2018.

Sergio Amaral* - Comércio exterior e desmatamento

O Estado de S. Paulo

Novo regulamento deverá ter considerável impacto no acesso de produtos que não sejam ‘deforestation free’ ao mercado europeu. Brasil será um alvo

O cenário da economia mundial, após a pandemia e as crises econômicas que se seguiram, aponta na direção de menos globalização e de mais protecionismo. No caso do Brasil, dois fatores adicionais poderão afetar as exportações: a proliferação das normas privadas e as sanções impostas pelo descumprimento de compromissos ambientais. A demora na ratificação do acordo entre o Mercosul e a União Europeia, por sua vez, impedirá o Brasil de se beneficiar da ampla desgravação tarifária prevista no acordo.

É preciso ter presente que a questão ambiental e o combate às mudanças climáticas mobilizam a opinião pública, sobretudo a sua parcela mais jovem, nos principais mercados consumidores, especialmente os EUA e a Europa.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Constituição de 1988, caminho de paz

O Estado de S. Paulo

É urgente a tarefa de pacificação nacional, que inclui respeitar as liberdades fundamentais e prover uma mais madura compreensão da independência e harmonia entre os Poderes

Se há uma necessidade consensual para 2023, seja quem for o presidente eleito no domingo, é a pacificação nacional. Para este jornal, não há desenvolvimento social e econômico possível com tanto conflito, com tanta agressividade, com tanto atrito entre os Poderes. O que ocorreu nos últimos quatro anos no País foi absolutamente disfuncional. Por isso, consideramos que o Brasil precisa urgentemente de paz – e isso é uma tarefa de todos; muito especialmente, de quem exerce autoridade no Executivo, no Legislativo e no Judiciário.

A dimensão da tarefa pacificadora pode causar certa perplexidade. Pode-se ter a impressão de ser uma empreitada difícil demais, em que as pontes de diálogo, racionalidade e equilíbrio teriam sido há muito implodidas. Já não teríamos disponíveis as ferramentas necessárias para a reconstrução da paz.

Diante desse panorama desafiador, é preciso lembrar que, apesar de todos os pesares – apesar da crise cívica, social e política em que o País se encontra –, continuamos contando com a Constituição de 1988. Ela tem inúmeros defeitos, tantas vezes criticados neste espaço. Mas dois aspectos muito positivos se sobressaem nesse texto que, resultado de um impressionante trabalho da Assembleia Constituinte, é expressão central das aspirações da sociedade brasileira.