quarta-feira, 22 de julho de 2020

Opinião do dia – Antonio Gramsci (homens-massa ou homens-coletivos) III

Nota III. Se e verdade que toda linguagem contém os elementos de uma concepção do mundo e de uma cultura, será igualmente verdade que, a partir da linguagem de cada um, é possível julgar a maior ou menor complexidade da sua concepção do mundo. Quem fala somente o dialeto ou compreende a língua nacional em graus diversos participa necessariamente de uma intuição do mundo mais ou menos restrita e provinciana, fossilizada, anacrônica em relação as grandes correntes de pensamento que dominam a história mundial. Seus interesses serão restritos, mais ou menos corporativistas ou economicistas, não universais. Se nem sempre é possível aprender outras línguas estrangeiras a fim de colocar-se em contato com vidas culturais diversas, deve-se pelo menos conhecer bem a língua nacional. Uma grande cultura pode traduzir-se na língua de outra grande cultura, isto é, uma grande língua nacional historicamente rica e complexa pode traduzir qualquer outra grande cultura, ou seja, ser uma expressão mundial. Mas, com um dialeto, não é possível fazer a mesma coisa.

*Antonio Gramsci (1891-1937), Cadernos do Cárcere, volume 1, p. 95-6 Civilização Brasileira, 2006

Luiz Werneck Vianna* - A muralha e a sua porta

- Instituto Humanitas Unisinos - IHU

Aparentemente a atual conjuntura experimenta um tempo homogêneo e vazio em que se reitera o já vivido, como se a sociedade estivesse condenada a movimentos de repetição de suas experiências passadas sem lhe conceder a faculdade de descobrir suas alternativas de futuro. A aceitar esses termos viver-se-ia agora, no Brasil, nas mesmas condições dos idos de 1964 a 85, restando a nós reiterar as práticas bem-sucedidas naquele período. Mas, de fato, nosso tempo nem é homogêneo e nem vazio, pois forças surgidas das entranhas da sociedade capitalista contemporânea brasileira trazem consigo a heterogeneidade e fazem emergir novos sentidos na vida social, alargando a porta estreita de que falava Walter Benjamin pela qual podem entrar as forças da transformação.

Com efeito, se em boa parte novos processos benfazejos que transcorrem no mundo devem sua aparição à ação do domínio dos fatos como protagonista, outra parte se deve ao plano da consciência do ator que se anima e se inova ao vislumbrar as novas possibilidades que percebe na porta entreaberta que tem diante si. De fato, a intervenção sem freios que a expansão do capitalismo expôs o mundo, desencadeando exponencialmente suas forças produtivas, vem precipitando processos disfuncionais que põe sob ameaça sua própria reprodução, entre os quais os riscos ambientais, como a atual pandemia, que, se não controlados, podem, no pior dos cenários varrer do planeta a nossa espécie ou degradar a herança cultural que ela acumulou em sua jornada de séculos.

A onda neoliberal que tomou conta do mundo a partir dos anos 1970, em sua versão de um capitalismo vitoriano, deixou em sua esteira, como o demonstra incansavelmente o economista Thomas Piketty, um lastro de desigualdades que corrói por dentro a legitimidade do seu modo de produção. Ao lado disso, o legado do colonialismo com que o capitalismo iniciou sua trajetória de triunfos deu como um dos seus frutos amargos a questão do racismo, primeiro pela importação massiva, sob o estatuto da escravidão, de africanos com que se supriu as plantations de mão de obra com que as Américas realizaram sua inserção no mundo do capitalismo, e bem mais tarde, aí já em cenário europeu, com as migrações originárias das antigas colônias, também em grande escala, em busca de oportunidades de vida em sociedades carentes de força de trabalho barata em serviços subalternos.

Merval Pereira - Crônica de uma traição

- O Globo

‘PT traiu Ciro Gomes e, assim, permitiu a eleição de Jair Bolsonaro à Presidência da República’, diz Delfim Netto

A traição política do ex-presidente Lula a Ciro Gomes na campanha presidencial de 2018, que o pedetista sempre denunciou, foi confirmada pelo ex-ministro da Fazenda Delfim Netto, que revelou com naturalidade em entrevista ao programa "Conversa com Bial", na noite de segunda-feira, que chegou a haver uma chapa organizada com Fernando Haddad do PT como candidato a vice de Ciro Gomes, que era o candidato do PDT à presidência da República em 2018.

Revelada a negociação, na ocasião pelo jornalista Mario Sérgio Conti, foi negada por Haddad, e passou a ser entendida pelo meio político apenas como mais um boato eleitoral. Mas foi muito mais do que isso, segundo o depoimento a Bial de Delfim, para quem “o PT traiu Ciro Gomes e, assim, permitiu a eleição de Jair Bolsonaro à Presidência da República”.

Com Lula na cadeia pretendendo ser o candidato do PT, mesmo sabendo que não poderia participar da eleição por ser considerado ficha suja pela legislação eleitoral, pois fora condenado em segunda instância, as negociações de bastidores corriam soltas. Para se ter uma ideia de como as negociações avançaram, Ciro Gomes jantou com Haddad, a convite deste, na casa de Gabriel Chalita em Higienópolis, que havia sido secretário de educação na gestão de Fernando Haddad na Prefeitura de São Paulo.

Luiz Carlos Azedo - Política do novo normal

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“”Guedes propôs a unificação de PIS e Cofins, na Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota de 12%, para aumentar a base de arrecadação do governo em mais de 40%”

Quem acompanha os Três Poderes tem a impressão de que a política está voltando ao normal em plena pandemia. A Operação Lava-Jato aperta o cerco contra o senador José Serra (PSDB-SP), acusado de caixa 2 eleitoral, desmentindo as próprias previsões de que o envio de investigações para a primeira instância e a Justiça eleitoral sepultaria os inquéritos abertos pelas delações premiadas. A Câmara volta a negociar com o governo a aprovação de projetos, ambos foram obrigados a ceder no caso do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Depois de muitas idas e vindas, finalmente, o ministro da Economia, Paulo Guedes, apresentou a primeira de suas quatro propostas de reforma tributária. O presidente Jair Bolsonaro aposta no “milagre da cloroquina” e pretende viajar, ainda nesta semana, para o Piauí, de olho nos eleitores do Nordeste.

No seu melhor estilo, a Lava-Jato fez, ontem, mais uma operação de busca e apreensão contra o tucano José Serra. O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar para suspender as buscas e apreensões determinadas pela primeira instância no gabinete do senador, em Brasília. A operação Paralelo 23, da Polícia Federal, investiga suposto caixa 2 na campanha de José Serra ao Senado em 2014. É uma nova fase da Lava-Jato, que apura crimes eleitorais. Nas residências do parlamentar, a operação foi feita. “Defiro a liminar para suspender a ordem judicial de busca e apreensão proferida em 21 de julho de 2020 pelo Juiz Marcelo Antonio Martin Vargas, da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo, nas dependências do Senado Federal, mais especificamente no gabinete do Senador José Serra”, decidiu o presidente do STF. Como o ex-governador Geraldo Alckmin é outro envolvido na Lava-Jato, o desgaste do PSDB em São Paulo é enorme, embora ambos aleguem inocência. Dor de cabeça para o prefeito de São Paulo, o tucano Bruno Covas, que luta contra um câncer e pela reeleição

Ricardo Noblat - Alcolumbre agrada Bolsonaro com o Congresso mantido à distância

- Blog do Noblat | Veja

O pesadelo da CPMI das fake news

Se dependesse só de Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, começaria em breve a contagem regressiva para a volta do Congresso à normalidade com a retomada das sessões de corpo presente. Mas se depender de Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado, isso tão cedo acontecerá.

Alcolumbre argumenta que a média de idade dos senadores é muito mais alta do que a média de idade dos deputados, e que por isso muitos deles enfrentam problemas de saúde. A pandemia ainda está aí e autoridades médicas advertem para a hipótese de ela recuperar força em regiões onde, hoje, está mais fraca.

O que Alcolumbre esconde é que há outro motivo para retardar a volta dos senadores e deputados a Brasília: quanto mais tempo ficarem em seus Estados, melhor para o governo. O retorno significaria também o prosseguimento dos trabalhos da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das fake news.

A CPMI é um pesadelo para Jair Bolsonaro, seus filhos, e parte do rebanho que os apoia. Da mesma forma que o inquérito conduzido no Supremo Tribunal Federal pelo ministro Alexandre de Moraes que investiga a distribuição de notícias falsas nas redes sociais e o financiamento de manifestações antidemocráticas.

Bernardo Mello Franco - Carteirada no Senado

- O Globo

O pronto-socorro do doutor Dias Toffoli voltou a fazer milagres no recesso. Ontem o presidente do Supremo impediu uma operação que mirava o senador José Serra. A Polícia Federal tentou recolher documentos no gabinete do tucano, mas foi barrada na portaria.

Toffoli atendeu a uma reclamação do presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Eleito com a promessa de renovar a Casa, ele se empenhou na blindagem do colega. Antes de recorrer ao Supremo, ligou para um delegado da PF e pediu que o mandado de busca e apreensão não fosse cumprido. A carteirada funcionou.

Alcolumbre não falou francês, mas seu telefonema lembra a atitude do desembargador que se recusava a usar máscara em Santos. Irritado com a multa, o magistrado ofendeu os guardas que faziam seu trabalho. O presidente do Senado não precisou humilhar ninguém. Apenas usou o poder para evitar o cumprimento de uma ordem da Justiça Eleitoral.

Bruno Boghossian – Prioridade mudou

- Folha de S. Paulo

Guedes conhece limitações de um governo que só está preocupado em blindar o chefe

O governo ainda se sentia poderoso, em meados do ano passado, quando Paulo Guedes decidiu trombar com o Congresso. Irritado com as mudanças feitas em sua proposta de reforma da Previdência, o ministro criticou os deputados e disse que eles não tinham “compromisso com as futuras gerações”.

O czar da economia chegou a Brasília com a impressão de que ganharia suas batalhas no grito. Acreditava que a vitória de Jair Bolsonaro pavimentaria a implantação de uma agenda liberal, ignorando o fato de que nem o presidente havia comprado aquelas ideias com convicção.

O ministro finalmente conheceu as limitações do governo. Ao apresentar a primeira fatia de sua reforma tributária, ele reconheceu que as propostas do Executivo devem “ser trabalhadas” pelos parlamentares e acrescentou que “é a política que dita o ritmo” dessas mudanças.

Ruy Castro* - Ele não deixou o Flamengo

- Folha de S. Paulo

Jorge Jesus deixou um país perigoso, irresponsável e em decomposição, governado por celerados

Jorge Jesus disse adeus e deixou órfãos muitos torcedores do Flamengo —uns 40 milhões, entre os quais me incluo. Ficará na história como dois outros treinadores estrangeiros que marcaram o Flamengo e o futebol brasileiro, o húngaro Dori Kruschner e o paraguaio Fleitas Solich, e como vários que o próprio Flamengo promoveu à glória: Flavio Costa, Coutinho, Carpeggiani, Carlinhos.

Com toda a euforia que as conquistas de Jorge Jesus despertavam —goleadas inesquecíveis, estilo de jogo revolucionário, cinco títulos importantes e mesmo a derrota por 1 a 0 para o Liverpool no Mundial de Clubes—, sempre duvidei de que ele tivesse vindo para ficar.

Hélio Schwartsman - Um bicho igualitário

- Folha de S. Paulo

Sociedades em que nossa espécie foi forjada nunca toleraram bem a tirania

Todos nos revoltamos com a cena do desembargador prepotente tentando humilhar o guarda civil santista que cumpria seu dever. Por quê?

A cultura do você-sabe-com-quem-está-falando ofende nossos pendores igualitários, particularmente a noção de que a lei vale para todos. Sim, apesar da grande dispersão nos índices de distribuição de riqueza, o ser humano é um bicho igualitário, muito mais do que os rígidos chimpanzés e até do que os mais relaxados bonobos.

Autores como Christopher Boehm e Richard Wrangham mostram de forma convincente que um dos processos fundadores da humanidade foi a autodomesticação. As sociedades de caçadores-coletores em que nossa espécie foi forjada nunca toleraram bem a tirania. Seus membros não hesitavam em formar alianças para destronar qualquer macho alfa que pretendesse virar dono do pedaço.

Míriam Leitão - Minirreforma pode aumentar a carga

- O Globo

Depois de um ano e meio, o governo manda uma reforma que só une dois impostos. Projeto simplifica, mas pode elevar a carga tributária

O governo chegou atrasado com a sua proposta, e ela inclui apenas uma parcela dos impostos sobre consumo. Aliás, só dois tributos. Não incluiu sequer o IPI para não ter que encarar os vespeiros da Zona Franca de Manaus e de outros subsídios. A despeito disso, o passo foi na direção certa. A Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) moderniza e simplifica os velhos PIS e Cofins e começa a formatar um IVA. A proposta da Câmara dos Deputados incide sobre impostos que recolhem 12% do PIB, a do governo federal, em 4% do PIB.

A grande dúvida em relação à minirreforma que o governo apresentou ontem foi por que fazer uma proposta tão pouco abrangente se agora já há interesse do Congresso e dos estados de fazer algo mais amplo? Por que ela é intencionalmente restrita? Os secretários de Fazenda dos estados já se manifestaram em conjunto a favor de que a reforma, como tem sido estudada na Câmara e no Senado, incluísse o ICMS. Há divergência em relação ao ISS das grandes cidades, mas nada que não possa ser negociado.

A explicação do ministro Paulo Guedes de que queria respeitar a autonomia dos estados e municípios não faz muito sentido, porque uma reforma tributária tem que ser coordenada pela União. O fato é que há um ano e meio a Câmara discute na PEC 45 a proposta de união de cinco a seis impostos — se incluir a Cide — o Senado fala em unir sete impostos, e o governo ontem, depois de um ano de promessas, apresentou a unificação de dois apenas.

Vinicius Torres Freire - Quem paga a conta da reforma tributária?

- Folha de S. Paulo

Falta um projeto básico crível e estimativas de quem perde, ganha e da carga tributária

Quem vai pagar a conta da reforma tributária? Não temos nem estimativa, pois não há um projeto coerente e crível, se por mais não fosse porque o governo federal diz que vai enviar suas propostas de modo “fatiado”, ao que parece até o final do ano. Se a reforma andar, será uma mistura de projetos de mudança “ampla” que circulam um na Câmara, outro no Senado, que podem incorporar ou não ideias do Ministério da Economia.

Um objetivo maior de Paulo Guedes é reduzir o quanto puder dos impostos sobre a folha de pagamentos, como se sabe, perda de receita que seria financiada por um imposto qualquer sobre transações ou “pagamentos digitais”, não se sabe bem do que se trata.

Essa CPMF fantasiada, ideia fixa de Guedes, seria a última fatia do salame tributário do governo a ir ao Congresso, até para não atrapalhar a discussão do restante das mudanças, pois esse imposto pega mal.

Hum.

Não é possível fazer uma conta do tamanho da carga tributária, de como os tributos vão pesar sobre cada tipo de empresa ou sobre pessoas físicas e das distorções econômicas decorrentes, sem saber dessa CPMF, com a qual o governo quer arrecadar pelo menos o equivalente a 1% do PIB.

Fernando Exman - Um passaporte para a reeleição de Bolsonaro

- Valor Econômico

Cenário para aprovação de nova CPMF é desafiador

Está se consolidando um cenário desafiador para o governo discutir com o Congresso a criação de um novo imposto sobre pagamentos. A equipe econômica e os articuladores políticos do Palácio do Planalto terão dificuldades para convencer os parlamentares de que a ideia de reforçar o caixa do governo com uma espécie de nova CPMF, somada a investidas contra o teto de gastos, não tem relação alguma com o projeto do presidente Jair Bolsonaro de se reeleger em 2022.

Hoje o diálogo entre os chefes dos Poderes é muito mais fluente do que se via poucas semanas atrás. Há exceções, claro, como a recente desavença entre as Forças Armadas e o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, em razão da declaração do magistrado sobre a gestão do Ministério da Saúde por militares durante a pandemia. A tentativa da Polícia Federal de entrar no Congresso para vasculhar o gabinete do senador José Serra (PSDB-SP), impedida pelo presidente Davi Alcolumbre (DEM-AP) com o apoio do STF, tampouco contribui para desanuviar ainda mais as relações entre Executivo, Legislativo e Judiciário. Mas é evidente que o ambiente institucional serenou.

No Congresso, agora o Palácio do Planalto tem uma base de pelo menos 200 integrantes e pode ampliar esse número dependendo do projeto que estiver em discussão. A atual legislatura tem um perfil mais reformista. A falta de credibilidade, contudo, pode ser um obstáculo crescente para o governo conseguir emplacar sua agenda.

Cristiano Romero - O retorno à década perdida

- Valor Econômico

País demorou a debelar a inflação por não aceitar o fracasso do passado

A economia brasileira demorou para livrar-se da inflação alta porque se recusou a mudar o modelo de desenvolvimento que prevalecera nas décadas anteriores. A chamada “crise da dívida”, em 1982, deixou claro que o setor público não teria mais como continuar financiando investimentos, a exemplo do que vinha fazendo desde a década de 1970. A fonte externa de recursos esgotara e a capacidade de endividamento chegara ao limite.

No fim da década de 1970, o país passou a conviver com taxas de inflação muito altas. Inflação crônica, elevada, realidade que os brasileiros com menos de 30 anos desconhece, é uma espécie de nevoeiro forte, que impede empresários e consumidores de enxergar adiante. Isso provoca duas consequências negativas que, combinadas, solapam a atividade econômica ao longo do tempo: por causa da rápida corrosão do seu poder de compra, o consumidor modera as compras e o empresário, por perder a capacidade de planejar o futuro imediato, passa a investir cada vez menos.

Ao seguir convivendo com as fontes inflacionárias criadas pelo modelo de desenvolvimento superado pela crise de 1982, o país experimentou várias tentativas fracassadas de estabilizar os preços. Em 1986, o Plano Cruzado trouxe muita esperança aos brasileiros porque, na largada, derrubou os preços, desinflou as taxas de juros embutidas nos contratos firmados antes do lançamento do plano e deu ganho real de renda aos trabalhadores.

Monica De Bolle* - A frente é ampla

- O Estado de S.Paulo

Que venha a renda básica e que todos saibam quem participou e quem escolheu se abster

Ontem, foi lançada a Frente Ampla pela Renda Básica do Congresso Nacional, presidida pelo deputado João Campos. Seu presidente emérito é o ex-senador Eduardo Suplicy, que luta há décadas pela adoção da renda básica no Brasil e foi o autor da lei que estabeleceu a renda básica cidadã, promulgada em 2004. Constam da Frente todos os partidos com representação parlamentar, exceto um: o Partido Novo. Antes de prosseguir, esclareço: adesão ampla não é sinônimo de adesão total. 

Aqueles que escolheram ficar de fora exercem sua prerrogativa. Seus eleitores que os questionem, ou não. O que não lhes é permitido? Interpelar aqueles que apontam a sua ausência em um esforço cujos frutos podem vir a ser o grande legado positivo de um período de resto marcado pela enorme tragédia em que se transformou o Brasil de Bolsonaro.

Não foram poucos os artigos que escrevi nesse espaço sobre a importância da renda básica desde que a pandemia chegou ao Brasil. Mesmo antes dela, já havia escrito sobre programas de renda mínima, como funcionam em tese e como foram implantados em algumas partes do planeta – inclusive em algumas partes do Brasil. Entendo a renda básica como algo fundamental para reduzir os alarmantes níveis de pobreza e de desigualdade, que foi agravada pela crise humanitária decorrente da pandemia. 

Rosângela Bittar - O boiadeiro de Chicago

- O Estado de S.Paulo

Imposto, contribuição ou sigla terão a carga negativa da velha CPMF

Então, eis que o polivalente Paulo Guedes, anunciado como Posto Ipiranga por suas mil e uma competências, adere à tática oportunista do colega ministro e aproveita a porteira aberta da mortal pandemia para fazer passar sua boiada.

A primeira e mais vistosa delas transforma a extinta CPMF em imposto sobre transações financeiras, agora renomeado como CP, sem perder a imagem odiosa.

A nova CPMF já vingou como projeto, adiado apenas provisoriamente pelo desgaste histórico, revivido a partir do seu relançamento. Seguirá numa segunda etapa da reforma tributária iniciada ontem. E que os responsáveis por sua negociação não se prendam à semântica, como costuma fazer este governo quando lhe faltam argumentos. Imposto, contribuição ou sigla terão a carga negativa da velha CPMF, que, há muito, migrou da economia para a política.

Seja tributando transações eletrônicas ou transações digitais, operações de consumo ou contribuição de pagamentos, a nova CPMF renderá mais que seu antigo modelo. Terá incidência universal, já que as operações não digitais estão em extinção. Não haverá condescendência com pobres e remediados, em nome de quem, ironicamente, será cobrada. Além da vantagem (para o governo) de ter a alíquota facilmente majorável, conforme a demanda do momento.

Vera Magalhães - Cidadão, não! Militar!

- O Estado de S.Paulo

Bolsonaro transforma militares em casta (ainda mais) privilegiada

“É proibido militar estar na política? Não!” Jair Bolsonaro tem incontáveis defeitos, mas a dissimulação não é um deles. Poucos políticos são tão transparentes em suas intenções, seus propósitos e suas cismas. Não vou falar aqui em ideias, porque é uma categoria mais difícil de discernir na “obra” do presidente.

Bolsonaro não faz questão de disfarçar que quer pisar no acelerador do processo de militarização do seu governo. Começou a mover o barco nessa direção já no ano passado, e enfunou as velas de vez em 2020.

Levantamento do Tribunal de Contas da União apontou o espantoso contingente de 6.157 militares, da ativa e da reserva, em cargos civis no governo, sendo 2.643 em cargos comissionados. Trata-se de um aumento de 108,22% de 2016 para cá.

Diante dessa evidência incontestável não adianta os militares engrossarem a voz e baterem o coturno no chão quando são chamados a assumir responsabilidades pelas políticas de Estado determinadas pelo “capitão”.

A militarização do governo é um movimento combinado com outros que o bolsonarismo vem empreendendo nos últimos meses, como o aumento da influência política sobre as polícias militares – a ponto de, hoje, haver em muitos Estados comando paralelo ao dos governadores.

Também está em linha com a ideia do presidente, gritada em alto e bom som na dantesca reunião ministerial de 22 de abril, de “escancarar” a questão do armamento para a população, afrouxando limites, regras e fiscalização sobre a posse e o porte de armas e o acesso à munição.

Entrevista |'Armar a população é desqualificar as Forças Armadas', diz Jungmann

Ex-ministro critica medidas armamentistas e cobra debate sobre Política de Defesa, que deve ser entregue nesta quarta, 22, ao Congresso

Ricardo Brandt | O Estado de S.Paulo

Ministro da Defesa em 2016, quando o governo federal elaborou a mais recente Política Nacional de Defesa (PND), Raul Jungmann diz que o presidente Jair Bolsonaro promove um contrassenso com sua política armamentista: “Propor o armamento da população é desqualificar o papel das Forças Armadas”.

Ao avaliar a PND que o governo deve entregar nesta quarta-feira, 22, ao Congresso, Jungmann afirma que o poder político tem se esquivado desse debate e lembra que o texto elaborado no governo Michel Temer nunca foi sancionado - o projeto passou dois anos praticamente parado na Câmara e no Senado, foi aprovadas em dezembro de 2018, mas nunca sancionado. “É a demonstração conclusiva e cabal de que o Poder Político se aliena das suas responsabilidades de definir os rumos, ou seja, as políticas para a Defesa e as Forças Armadas.”

Além da PND, o governo deve entregar nesta quarta-feira a Estratégia Nacional de Defesa (END) e o Livro Branco de Defesa, que traçam diretrizes para a Defesa e o papel das Forças Armadas. Por lei, tem que ser revisados a cada quatro anos.

No documento, o governo Bolsonaro aponta que a América do Sul não é mais considerada “área livre” de conflitos, como revelou o Estadão, no dia 16.

Leia, abaixo, os principais trechos da entrevista:

• Qual a importância da Política Nacional de Defesa e a Estratégia Nacional de Defesa?

Dentre as decisões mais cruciais e de mais alto nível que cabem ao poder político de uma nação está definir a sua estratégia de defesa e o papel das Forças Armadas nessa política, que está sendo enviada agora. O grande problema é que o Congresso se aliena dessa responsabilidade, porque não tem dado a atenção, não tem debatido, não tem dialogado com os militares e trazido a sociedade para essa discussão que é vital para a soberania e para a sobrevivência de uma nação e do próprio Brasil. A expectativa é de que essa alienação seja revertida. Estive com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, conversando para que tenhamos um envolvimento do Congresso diferenciado.

• O que o senhor destaca da atual PND?

Em política de Estado não se pode dar cavalo de pau. Aproximadamente 90% do que ali está é continuidade e manutenção do plano em curso, áreas estratégicas, os eixos, os objetivos nacionais de Defesa, as ações estratégicas que são mais de 100, elas têm mudanças, mas têm muito mais continuidade. O que chamou atenção foi exatamente a percepção de maior tensão na América do Sul. É verdade que o Brasil não se envolve há mais de um século e meio em conflitos interestatais. Temos que ter Forças Armadas preparadas, balanceadas e modernizadas.

O governo tropeça na reforma – Editorial | O Estado de S. Paulo

O governo continua devendo seu projeto de reforma tributária, repete promessas e emperra a tramitação de propostas no Congresso

O governo continua devendo seu projeto de reforma tributária, repetindo promessas e emperrando a tramitação de propostas já em discussão no Congresso. Há consenso, no Brasil, sobre a urgência de uma grande revisão do sistema de impostos e contribuições. A mudança é apontada como essencial para aliviar a produção e permitir o retorno a um crescimento seguro. Aí termina o consenso. O presidente da Câmara e o ministro da Economia divergem sobre a criação de um tributo parecido com a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Bandeiras diferentes são defendidas por líderes da indústria, do comércio, dos serviços e da agropecuária.

Ao entregar ao Congresso a primeira fase de sua proposta, o ministro da Economia, Paulo Guedes, começou a cumprir a promessa, feita no ano passado, de encaminhar uma reforma fatiada. Com esse passo o ministro propõe unificar o PIS e a Cofins numa Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), o chamado IVA federal, com alíquota de 12%. É uma iniciativa notavelmente modesta. O ministro, afinal, é conhecido por sua retórica em defesa da simplificação do sistema. Quem esperava algo compatível com esse discurso deve ter-se decepcionado.

Sendo a simplificação um dos objetivos da reforma, a proposta agora apresentada pelo ministro da Economia nem vale uma discussão preliminar. O Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) previsto na PEC 45, da Câmara dos Deputados, e na PEC 110, do Senado, substitui cinco tributos, cobrados pela União, pelos Estados e pelos municípios: PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. Além disso, como lembra o especialista Bernard Appy, citando trabalho do economista Bráulio Borges, o IBS pode elevar o Produto Interno Bruto (PIB) potencial em até 20 pontos porcentuais em 15 anos. Uma reforma limitada ao PIS/Cofins produziria no máximo um décimo desse efeito.

Passo tributário – Editorial | Folha de S. Paulo

Projeto para unificar PIS e Cofins é correto, mas alíquota merece exame rigoroso

Por si só, o projeto apresentado nesta terça (21) para a unificação de duas contribuições sociais nem mereceria o nome de reforma tributária. Entretanto o texto levado ao Congresso pelo ministro Paulo Guedes, da Economia, já serve como indicativo das dificuldades envolvidas em um redesenho mais amplo do sistema de impostos.

Fundir PIS e Cofins, à primeira vista, pode parecer uma banalidade, dado que se trata de dois tributos federais com a mesma base de incidência —o faturamento das empresas ou, vale dizer, as vendas de bens e serviços— e não raro tratados como uma coisa só.

Fosse tão simples, a proposta não estaria em gestação no Executivo desde o primeiro governo da petista Dilma Rousseff (2011-14). Antes mesmo de vir à tona, o projeto já despertava resistências ferozes.

A tarefa árdua consiste em fixar uma alíquota —o governo propõe 12%, exceção feita a instituições financeiras (5,8%)— para o novo tributo, batizado de Contribuição sobre Bens e Serviços. Hoje, a depender do ramo de atividade, empresas pagam 3,65% ou 9,25% em PIS e Confins combinados, fora incontáveis exceções e regimes especiais.

Brasil e EUA se unem na OMC contra a China – Editorial | Valor Econômico

O peso do Brasil na disputa entre os dois gigantes é desprezível e pode sair bem mais machucado que ambos de um conflito que não é seu

O Brasil se aliou aos Estados Unidos para estender sua ofensiva contra a China à Organização Mundial do Comércio, que vive a maior crise desde sua criação, em 1994. Sob o cerco do presidente Donald Trump, a OMC perdeu a capacidade de manter-se como tribunal de disputas comerciais desde que os EUA vetaram um a um os substitutos de seu Órgão de Apelação. Os EUA moveram uma campanha de descrédito da instituição. O Brasil, em declaração conjunta com os EUA, emitiu declaração sobre os danos que as economias que não são de mercado trazem ao sistema de comércio internacional.

A declaração conjunta não menciona a China, nem precisava. “Expressamos nossas sérias preocupações por políticas e práticas que não são orientadas pelo mercado”, que “levam a severo excesso de capacidade, criam condições de competição desleal, impedem o desenvolvimento e uso de tecnologias inovadoras e minam o funcionamento do comércio internacional”. A disputa não é nova, mas o contexto é: a guerra aberta dos Estados Unidos contra a China pela dianteira tecnológica global.

É preciso fazer uma aposta firme nas vacinas – Editorial | O Globo

Além da parceria com as empresas que testam no Brasil, o país deve apoiar a iniciativa global da OMS

A situação dramática da pandemia de Covid-19 entre os brasileiros tem um efeito indireto que, paradoxalmente, poderá ser vantajoso: em virtude do avanço veloz do novo coronavírus, o Brasil se tornou atraente para o teste de novas vacinas. Duas candidatas já usam o país como campo de provas na última fase de testes antes da aprovação pelas autoridades. A primeira, desenvolvida pela Universidade de Oxford em consórcio com a anglo-sueca AstraZeneca. A segunda, pela chinesa Sinovac, que anunciou ontem testes em profissionais da saúde.

A equipe de Oxford publicou nesta semana resultados promissores das duas primeiras fases de testes clínicos. Outras também têm avançado nas pesquisas de segurança e eficácia. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 24 das mais de 160 candidatas a vacinas no mundo já são testadas em seres humanos.

Tal multiplicidade torna provável que alguma forma de imunização contra a doença esteja aprovada e disponível já em 2021. Se isso ocorrer, o prazo de desenvolvimento de vacinas terá caído de algo como dez anos para pouco mais de um. Seria um feito científico comparável ao pouso da Apollo 11 na Lua ou ao sequenciamento do genoma humano. Tal conquista virá, contudo, acompanhada de questões espinhosas. Quem terá acesso primeiro à vacina? Dada a capacidade limitada de produção, como as doses serão distribuídas pelo planeta? A que custo? Quem pagará?

Fez bem o Brasil em firmar acordos com as iniciativas que têm usado o país como campo de testes. A AstraZeneca se comprometeu, em caso de sucesso, a transferir sua tecnologia para que a Fundação Oswaldo Cruz também possa produzir doses. A Sinovac firmou acordo semelhante com o Instituto Butantan, em São Paulo.

Música | Paulinho da Viola - Eu canto samba / Quando bate uma saudade

Poesia | João Cabral de Melo Neto - Os três mal-amados

O amor comeu meu nome, minha identidade,
meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade,
minha genealogia, meu endereço. O amor
comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos
os papéis onde eu escrevera meu nome.

O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas
camisas. O amor comeu metros e metros de
gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o
número de meus sapatos, o tamanho de meus
chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a
cor de meus olhos e de meus cabelos.

O amor comeu meus remédios, minhas receitas
médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas,

minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus
testes mentais, meus exames de urina.

O amor comeu na estante todos os meus livros de
poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações
em verso. Comeu no dicionário as palavras que
poderiam se juntar em versos.

Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso:
pente, navalha, escovas, tesouras de unhas,
canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de
meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada
no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto
mas que parecia uma usina.

O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu
a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de
propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos
que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.

O amor voltou para comer os papéis onde
irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.

O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta,
cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas.
O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos,
e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua
chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba
de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam
sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas
de automóvel.

O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a
água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os
mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde
ácido das plantas de cana cobrindo os morros
regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo
trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de
cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas
coisas de que eu desesperava por não saber falar
delas em verso.

O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas
folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de
meu relógio, os anos que as linhas de minha mão
asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro
grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da
terra, as futuras estantes em volta da sala.

O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e
minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu
silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.

terça-feira, 21 de julho de 2020

Opinião do dia – Antonio Gramsci (homens-massa ou homens-coletivos) II

Nota II. Não se pode separar a filosofia da história da filosofia, nem a cultura da história da cultura. No sentido mais imediato e determinado, não se pode ser filosofo — isto é, ter uma concepção do mundo criticamente coerente — sem a consciência da própria historicidade, da fase de desenvolvimento por ela representada e do fato de que ela está em contradição com outras concepções ou com elementos de outras concepções. A própria concepção do mundo responde a determinados problemas colocados pela realidade, que são bem determinados e “originais” em sua atualidade. Como é possível pensar o presente, e um presente bem determinado, com um pensamento elaborado em face de problemas de um passado frequentemente bastante remoto e superado? Se isto ocorre, significa que somos “anacrônicos” em face da época em que vivemos, que somos fósseis e não seres que vivem de modo moderno. Ou, pelo menos, que somos bizarramente “compósitos”. E ocorre, de fato, que grupos sociais que, em determinados aspectos, exprimem a mais desenvolvida modernidade, em outros manifestam-se atrasados com relação a sua posição social, sendo, portanto, incapazes de completa autonomia histórica.

*Antonio Gramsci (1891-1937), Cadernos do Cárcere, volume 1, p. 94-5 Civilização Brasileira, 2006

Merval Pereira - Desmascarado

- O Globo

Desembargador que tentou humilhar o guarda civil cometeu de uma vez só todos os abusos que demonstram sua postura patética, típica do ‘sabe com que está falando?’

A pandemia da Covid-19 está deixando exposta a enorme desigualdade que perpassa a sociedade brasileira, e estimulando comportamentos execráveis como o do desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo de sobrenome quatrocentão Eduardo Almeida Prado Rocha Siqueira, que humilhou um agente da Guarda Civil de Santos por se recusar a usar máscara.

Vários casos como esse têm acontecido nos últimos dias, revelando que a época anacrônica do “você sabe com quem está falando? ” continua prevalecendo na triste pós-modernidade brasileira. Devemos ao sociólogo Roberto Da Matta em seu livro “Carnavais, malandros e heróis” a dissecação dessa frase emblemática, que define nossa sociedade até hoje.

Diante dos casos recentes, como o daquela senhora que respondeu a um fiscal que seu marido não era cidadão, mas “engenheiro civil, melhor que você”, Roberto da Matta confirma sinais de que a cultura brasileira “tem alergia à igualdade, e a máscara iguala as pessoas”.

Uma pessoa que considera ofensivo ser chamada de “cidadão” mostra bem em que ponto estamos no nosso desenvolvimento como sociedade. A senhora em questão disse que sentiu um tom de ironia na voz do guarda, quando a intenção era mostrar respeito mas, ao mesmo tempo, definir a limitação do indivíduo no convívio social.

No Brasil, analisa Roberto da Matta, você vive como pessoa pública mesmo quando está na fila do banco. Ou você se considera merecedor de furar a fila, ou o gerente, reconhecendo-o, lhe chama. O anonimato da rua, que deveria reger nossas relações sociais, é superado pelo “sabe com quem está falando ?”, e a máscara dá uma sensação de igualdade que incomoda os acostumados a uma relação de subordinação, hierarquizada.

Eliane Cantanhêde - Salles e Araújo, peixes miúdos

- O Estado de S.Paulo

Sem culpa na pandemia, militares têm tudo a ver com políticas para Amazônia e China

A pressão dos fundos de investimento contra o desmatamento e as ameaças às comunidades indígenas e quilombolas pôs o foco na política, na visão catastrófica e nos erros de execução para o meio ambiente, mas também jogou luzes numa outra ferida aberta no Brasil: a política externa do governo Jair Bolsonaro, que é pautada pela beligerância e oscila entre o incompreensível e o pernicioso.

A culpa, mais uma vez, é do mordomo, ops!, do ministro de plantão. Assim como o mundo desabou na cabeça do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, está desabando também na do chanceler Ernesto Araújo. Não que eles sejam santos nessa história, mas nenhum dos dois caiu de paraquedas no cargo e ambos executam a política que vem de cima, de Bolsonaro. Como o próprio general Eduardo Pazuello, da Saúde.

Salles nunca tinha pisado na Amazônia, Pazuello nunca tinha sido apresentado pessoalmente a uma curva epidemiológica e Ernesto Araújo, um embaixador júnior, jamais havia comandado uma embaixada antes de assumir o Itamaraty. Logo, a ascensão dos três tem algo em comum: eles não foram colocados lá por terem grande experiência e expertise nessas áreas, mas para fazer tudo o que seu mestre mandar.

Luiz Carlos Azedo - Quem salva é o professor

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“O governo queria tungar o novo Fundeb. Diante da reação de prefeitos e governadores, os deputados do Centrão, com quem o governo contava, refugaram a proposta de reduzir o Fundeb”

Antes de se tornar romancista, o escritor Daniel Pennac foi professor de francês no ensino fundamental e médio de escolas públicas. Quando criança e adolescente, porém, foi o que os franceses chamam de “cancre”: um aluno lerdo, com dificuldades de aprendizagem e desempenho sofrível. No best-seller Diário de escola (Rocco), vencedor do Prêmio Renaudot — uma de suas 30 obras, para todas as idades —, ele conta como o mau aluno virou professor, pedagogo e escritor. A raiz de seu problema não era a falta de escola nem de professores na França, como acontece em muitos lugares aqui no Brasil. Era o medo. “A reação dos adultos é sempre a mesma: eles também têm medo. Têm medo de que seus filhos nunca tenham sucesso. Os professores também têm medo. Têm medo de serem maus professores. Tudo isso tem a ver com a solidão. Solidão da criança, do professor, dos pais. O que é preciso fazer é acabar com essa solidão. Pedagogicamente, como se acaba com a solidão? Criando projetos em comum, onde todos estão envolvidos.”

Pennac conta que foi salvo pelo professor de Francês, para quem mentia muito, porque nunca fazia os deveres. “Ele me disse: ‘muito bem, vejo que você tem muita imaginação. Então, em vez de utilizar sua imaginação para fabricar mentiras, escreva um romance. Você vai me entregar 10 páginas por semana. Não vou mais te dar redações para fazer ou lições para aprender. Você vai apenas fazer esse romance para mim: 10 páginas por semana.’ Isso me salvou. Esse professor foi capaz de transformar um aluno passivo em um aluno ativo, um aluno que escreve um romance”.

Ricardo Noblat - Às vésperas de nova derrota, o governo reforça a aposta no fisiologismo

- Blog do Noblat | Veja

Dinheiro do vírus para deputados amigos

Está marcado para logo mais o início da votação pela Câmara dos Deputados da prorrogação do Fundeb, o fundo que financia a educação básica no país. Ali, o assunto vem sendo discutido há pelo menos cinco anos e, finalmente, chegou-se a um acordo.

Mas apenas no último sábado, transcorrido um ano e quase 7 meses da tumultuada gestão de Jair Bolsonaro, e quatro ministros da Educação depois, foi o que o governo acordou e disse que amadureceu algumas ideias a respeito. Resultado?

Perdeu. Suas ideias, quase todas, foram rejeitadas pelos líderes dos partidos, e mais a relatora do projeto, e mais o presidente da Câmara. Para evitar, porém, que o governo arroste com uma derrota acachapante, pequenas concessões lhe serão feitas.

Educação nunca foi tema do agrado do presidente da República, basta ver os ministros escolhidos por ele para cuidar da área. O primeiro, o professor Ricardo Vélez, falava português com sotaque. O segundo, Abraham Weintraub, escrevia português errado.

O terceiro, Carlos Alberto Decotelli, que falava e escrevia português muito bem, não era pós-doutor, como apregoava em seu currículo, nem mesmo doutor. Sequer oficial da Marinha, como se dizia. O quarto, Milton Ribeiro, pastor, pegou o Covid-19.

Carlos Andreazza - A eucaristia bolsonarista

- O Globo

‘Tomai, todos, e comei. Isto é o vosso corpo’. O corpo de milhares de mortos

A cena: Bolsonaro ergue a caixa de um medicamento; assim como se, capitão que é, igualmente ovacionado pelos espectadores, fosse Carlos Alberto levantando a Copa do Mundo. A embalagem de cloroquina então transformada na Jules Rimet — cujo destino de derretimento não deve ser possibilidade excluída ao porvir de um remédio apregoado como panaceia pelo presidente-milagreiro.

Derretem as vidas. No presente. Um fato.

Houve também quem comparasse o episódio a uma passagem do filme “Rei Leão”, em que o primata Rafiki ergue o recém-nascido Simba, filho do rei Mufasa. Um gesto para noticiar à comunidade que o reino tinha herdeiro — um ritual, pois, para informar sobre o futuro. Um movimento de segurança e esperança. De vida; para a vida.

A comparação com a liturgia de Bolsonaro é, portanto, descabida. Sim, o ato do presidente teve linguagem religiosa. Não me surpreenderia se alguém ali, diante daquela missa campal, esperasse o Messias andar sobre o espelho d’água. Bolsonaro emulava a comunhão. Na prática, porém, anticomunhão; porque aquela congregação esmagava, atraídos pelo egoísmo do pregador, vítimas potenciais do vírus traiçoeiro. Um gesto-ritual para noticiar à comunidade de crentes que o pastor, pura versão, negava-se aos fatos — um gesto, pois, para informar sobre o passado permanente. Um movimento de negação e temeridade. De doente; para a doença.

O presidente celebrava a eucaristia bolsonarista — a própria ação de graças, essencialmente personalista, do autocrata. Uma distorção do sacrifício. A terceirização do sacrifício por meio do culto ao negacionismo e à desinformação; um ritual de pretensão sagrada em cuja irresponsabilidade publicitária só havia morte — e nenhuma ressurreição.

Andrea Jubé - A esquerda tromba, Bolsonaro avança

- Valor Econômico

Governador do Maranhão diz que o debate sobre fusões deve ficar para 2021

O presidente do PSB, Carlos Siqueira, nega o debate sobre a fusão da legenda com o PCdoB. Igualmente, a presidente do PCdoB e vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos, refuta qualquer discussão sobre fusão ou incorporação de seu partido ao PSB.
Uma eventual fusão entre PSB e PCdoB, ventilada em entrevistas pelo governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), gerou constrangimento nas cúpulas partidárias e azedou o clima em setores da esquerda, aprofundando um quadro de fragmentação que fortalece a direita bolsonarista.

“Ninguém está participando de conversa sobre fusão com partido nenhum no PSB, nós estamos tratando de eleições municipais”, afirmou um Carlos Siqueira francamente contrariado à coluna. “Se essa discussão existisse, seria um debate interno; fazê-la pelos jornais é o começo do fracasso”.

Siqueira aborreceu-se ontem de manhã com a notícia trazida pelo jornal “O Globo” de que, nos bastidores, Dino estaria se referindo à possível nova legenda como o “MDB da esquerda”. “Ora, o MDB é uma sigla com uma bela história, mas se deteriorou ao longo do tempo e nem é bom tê-la como referência para nada”, diz o pessebista.

Logo cedo, o celular do presidente do PSB começou a tocar com ligações de dirigentes regionais e militantes atordoados com a notícia da possível fusão, avisando que se fosse verdade, deixariam a legenda. “Somos muito diferentes, nós somos esquerda democrática, eles [PCdoB] são esquerda tradicional”, explicou.

Bernardo Mello Franco - A festa da farda

- O Globo

Em troca de apoio, Bolsonaro promove a festa da farda. No governo do capitão, o número de militares em cargos civis mais que dobrou. Agora também há vagas para filha de general

No “Almanaque do Exército”, ele era o coronel Jonas Madureira da Silva Filho. Na intimidade matrimonial, apenas Madu. O personagem do livro de Marques Rebelo passava os dias de pijama, no conforto da reserva remunerada. Depois do golpe, foi convocado para uma tarefa patriótica: assumir um cargo de chefia no Segal, o Serviço Geral de Abastecimento e Lubrificantes.

“O simples coronel Madureira” se passa no início da ditadura de 1964, quando os militares se apinharam na burocracia federal. Junto com os postos, veio uma penca de diárias, gratificações e mordomias. A mulher de Madu ficou eufórica: sobraria dinheiro para comprar o sonhado faqueiro de prata.

A festa da farda se repete no governo de Jair Bolsonaro. Desde a posse do capitão, o número de militares em cargos civis mais que dobrou. Saltou de 2.765 para 6.157, segundo dados do Tribunal de Contas da União.

José Casado - Um oceano de cloroquina

- O Globo

Há suficiente para abastecer por 38 anos o mercado nacional

Já são mais de 80 mil mortos. É como se desaparecesse toda a população de uma cidade do tamanho de Três Rios (RJ), Ibiúna (SP), Viçosa (MG) ou Camboriú (SC).

Sem rumo na pandemia, o governo passou a pressionar estados e municípios. Quer impor cloroquina como tratamento do vírus. Sem base científica, não consegue justificar a transformação desse medicamento no motor de suas ações contra o vírus.

Expõe-se na coação de agentes públicos sob motivação política, em decisão moldada à campanha de reeleição de Bolsonaro. Enquanto isso, ele posa para fotografias levantando uma caixa do remédio como troféu. Fez isso no fim de semana nos jardins do Palácio da Alvorada.

Com a encenação tenta ocultar a inépcia administrativa que deve acabar na Justiça. Nela, Bolsonaro envolveu seus generais-ministros Fernando Azevedo (Defesa) e Eduardo Pazuello (interino na Saúde).

Joel Pinheiro da Fonseca* - Fé e religião no governo Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Ministro Milton Ribeiro deve saber separar melhor igreja e Estado; oremos

A religião de um ministro não deveria importar para sua avaliação. A partir do momento, contudo, em que a religião é um dos critérios pelos quais foi escolhido, ela se torna relevante, para o bem ou para o mal.

Ainda em novembro de 2018, a equipe do presidente eleito Jair Bolsonaro sondava Mozart Neves Ramos, na época diretor do Instituto Ayrton Senna, para o Ministério da Educação.

Assim que a informação veio a público, contudo, gerou reação imediata da bancada da Bíblia, que vetou o nome. Bolsonaro acatou. Depois de um ano e meio perdidos, Bolsonaro finalmente nomeia um ministro da Educação evangélico.

O Estado laico é daquelas conquistas sociais que, quanto mais de perto examinamos, mais fica difícil de definir. Afinal de contas, o que difere um valor "religioso" de um valor "laico"? Todos nós partimos de certos pressupostos normativos —os fins que desejamos para nós e para a sociedade— que não têm embasamento racional.

Quando deixamos as sutilezas filosóficas de lado, contudo, e olhamos para o todo, é um avanço inestimável de nossa civilização ter não só separado a autoridade religiosa da autoridade secular (separação que, pode-se dizer, está já na origem do cristianismo) como também ter desobrigado esta de qualquer tipo de subordinação àquela.

Hélio Schwartsman - E se não tomarem a vacina?

- Folha de S. Paulo

Numa conta básica, imunizar 60% da população asseguraria a proteção coletiva contra a Covid-19

Você pode levar o cavalo para a beira do rio, mas não forçá-lo a beber água. O brocardo da sabedoria popular se aplica à pandemia.

Estão em curso mais de cem programas de desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19, dos quais 21 já se encontram em alguma das fases de testes com humanos. É provável que, até meados do próximo ano, já tenhamos mais de um produto disponível. Uma vacina eficaz é nossa melhor chance de retorno à normalidade. Não é por outra razão que governos de vários países estão investindo bilhões nessas iniciativas.

É claro que, para a vacina fazer sua mágica, é preciso que as pessoas a tomem, especialmente se quisermos obter a famosa imunidade de rebanho. Na conta mais básica, supondo um R0 de 2,5 e uma vacina 100% eficaz, seria preciso imunizar 60% da população para assegurar a proteção coletiva. É aí que entra o problema dos movimentos antivacinas, que não perderam fôlego na pandemia.

Armando Castelar Pinheiro* - As eleições americanas

- Valor Econômico

Se Trump perder, as chances de reeleição de Bolsonaro minguarão e o presidente se tornará um “pato manco”

A crise do coronavírus e a euforia com a alta das ações têm desviado a atenção de um acontecimento da maior relevância: as eleições nos Estados Unidos, cujo resultado será decisivo para onde vão as bolsas, a geopolítica global e o quadro político brasileiro. Faltando três meses e meio para os americanos irem às urnas, e com um quadro eleitoral ainda indefinido, o tema vai ganhar destaque daqui para a frente.

Até o início do ano, a reeleição de Trump era vista como bem provável. Em parte, porque presidentes americanos em geral são reeleitos. Segundo, e mais importante, porque a economia americana mostrava um desempenho excelente, experimentando o mais longo ciclo de expansão da sua história documentada, com o desemprego em valores historicamente muito baixos e com as bolsas de valores batendo recordes sucessivos.

A pandemia mudou totalmente esse quadro. Por um lado, porque jogou a economia em recessão e o desemprego nas alturas. Por outro, pelo drama humanitário: já são 3,8 milhões casos de coronavírus nos EUA, com mais de 140 mil mortes, nos dois casos recordes mundiais. A postura de Trump, de minimizar a letalidade da covid-19, como ocorreu com Bolsonaro no Brasil, contrariou muitos dos que votaram nele em 2016. A segunda onda da pandemia, que agora afeta Estados como Texas, Flórida, Arizona, que ajudaram a eleger Trump em 2016, pode ter impacto decisivo no resultado eleitoral.

Esses fatores fazem com que o governo Trump seja desaprovado por 56% dos americanos, contra 42% que o aprovam. Além disso, 69% veem o país indo na direção errada, contra 24% que o veem no rumo certo.

As pesquisas colocam Joe Biden na frente, com 49,3% das preferências dos eleitores, contra 40,7% de Trump. Nas casas de apostas, a vitória de Biden também aparece como o resultado mais provável. Em relação à Câmara dos Deputados, os democratas são os preferidos dos eleitores. No Senado, a disputa segue indefinida.

Pablo Ortellado* - Soma zero

- Folha de S. Paulo

Reforma não altera distribuição do ônus fiscal entre ricos e pobres

O governo deve enviar ao Congresso nesta terça-feira (21) a primeira parte de uma ampla proposta de reforma tributária.

Ela busca simplificar e racionalizar a cobrança de impostos, mantendo a carga tributária global no nível atual. Além de não mexer com a carga total, não altera a distribuição do ônus tributário entre ricos e pobres, deixando o peso do Estado ainda apoiado sobre o ombro dos trabalhadores.

A primeira parte do projeto pretende unificar impostos federais como o PIS e a Cofins, uma abordagem muito menos ambiciosa que duas propostas que estão há mais tempo em discussão na Câmara e no Senado e que pretendem unificar até nove tributos (proposta do Senado).

A ideia de unificar tributos, desonerando a produção e simplificando a taxação, é antiga e, enquanto conceito, quase consensual. Mas uma possível elevação da tributação sobre o setor de serviços e disputas sobre a repartição do novo imposto com estados e municípios tornam a negociação difícil e demorada. A proposta minimalista do governo tenta escapar dessas dificuldades.

A segunda parte do projeto consiste em taxar lucros e dividendos, antiga reivindicação da esquerda, mas tendo como contrapartida uma redução do imposto de renda de pessoas jurídicas, de maneira a estimular investimentos.

Míriam Leitão - A educação no meio do conflito

- O Globo

Depois de um dia de intensa negociação, o governo teve que ceder da proposta do Ministério da Economia. O novo Fundeb de ser votado hoje

O dia de ontem foi de fortes emoções para quem acompanha o debate da educação brasileira. Na reunião de líderes, pela manhã, o deputado Arthur Lira (PP-AL) levou recado do governo, queria adiar a votação da PEC do novo Fundeb. O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) recusou e manteve o início da discussão com votação marcada para hoje. De tarde, no meio do debate em plenário, veio o pedido do Planalto para uma conversa. Suspensa a discussão. O ministro Luiz Eduardo Ramos, às 17h, estava na sala de Rodrigo Maia e a relatora, deputada Professora Dorinha (DEM-TO), foi chamada. Pouco depois das 18h, o governo cedeu e finalmente houve acordo. Mas por que toda essa aflição? Porque o executivo chegou na última hora na conversa e com uma proposta inaceitável.

A primeira ideia apresentada pelo Ministério da Economia, no fim da semana passada, era estranha pelo conteúdo, pela forma e pela hora. Era a reta final da negociação que começou em 2015. O Congresso quis discutir com tempo para evitar exatamente o atropelo, porque no final de 2020 o fundo expira. E ele é importante demais para a educação em milhares de municípios.

O Congresso passou o dia de ontem negociando. No acordo, os parlamentares aceitaram fazer pequenos ajustes e, no texto final, dar destaque à importância da educação infantil, o que já seria mesmo feito. De noite, a torcida era para que não houvesse novos sustos.