domingo, 30 de outubro de 2022

Luiz Inácio Lula da Silva* - Unir o país para mudar o Brasil

Folha de S. Paulo

Povo deve voltar a ser o centro das atenções

Neste domingo (30), o Brasil vai decidir seu futuro. Vamos escolher entre o caminho da prosperidade ou o da fome, dos livros ou das armas, da paz ou do ódio, da democracia ou do autoritarismo. Por isso é tão importante que cada cidadão e cidadã exerça o direito de votar. E votar com consciência, pensando no amanhã, no país que vamos deixar para nossos filhos e nossos netos.

Ao longo desta campanha, tive a oportunidade de reencontrar nosso povo nas ruas e praças do país. E o que eu vi nos olhos das pessoas foi o brilho da esperança e a vontade de mudar a vida para melhor. Este é o sentido da nossa candidatura: resgatar milhões de brasileiros e brasileiras da fome, da pobreza e da exclusão, por meio do crescimento sustentável e com distribuição mais justa da riqueza.

Vinicius Torres Freire - Bolsonaro, a era das trevas de 2018-2022 e depois

Folha de S. Paulo

Refazimento do país não depende só de coalizão ampla, mas de invenção de novos atores políticos

Aos trancos e barrancos, formou-se uma frente de apoio a Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Não era a "frente ampla". É uma frentinha, até porque não havia como fazer mais. Não há partidos ou movimentos sociais e políticos grandes e organizados que pudessem se aliar a Lula, mesmo que Lula e o PT tivessem feito um esforço mais intenso de firmar alianças.

Seja qual for o resultado da eleição, a situação política depois dos anos de catástrofe e trevas (2018-2022) será um problema grave, tanto para um governo prestante ou, no caso de acontecer o pior, como para uma tentativa de evitar o desfazimento autoritário do país.

A frente eleitoral pró-Lula é precária principalmente porque não havia partidos para uma aliança que fosse além da esquerda ou similar (toda de partidos muito pequenos ou minúsculos). A maioria do Congresso é de partidos compostos de gente de extrema direita, direita dura ou direita negocista.

Hélio Schwartsman - Democracia sem festa

Folha de S. Paulo

O bolsonarismo não irá embora, mesmo que o atual mandatário vá para a cadeia

Não muitos pleitos atrás, descrevia-se o dia da eleição como festa da democracia. Tratava-se, afinal, do momento em que o eleitor exercia seu poder de mando, definindo os nomes daqueles que o governariam pelos próximos quatro anos. Contestar as regras do jogo ou trabalhar para minar as próprias instituições era algo que ficava fora do radar. A situação hoje é mais sombria. Seria um exagero afirmar que a democracia no Brasil acabou ou está com seus dias contados, mas é forçoso reconhecer que ela se encontra em mau estado e pode piorar.

No cenário menos provável e mais dramático, Jair Bolsonaro vence o pleito e dá continuidade à escalada autoritária. Seria muito ruim, não apenas em termos institucionais mas também administrativos. A atual gestão foi especialmente destrutiva em relação a meio ambiente, educação, ciência e cultura e não há nenhum sinal de que isso possa mudar.

Bruno Boghossian - Uma eleição de duas torcidas

Folha de S. Paulo

Fatos da campanha despertaram no eleitor pouco interesse em trocar de time

Uma pesquisa feita pelo Datafolha há 535 dias desenhava o que seria a corrida presidencial. Recém-saído da prisão, Lula mostrava que havia mantido o domínio da esquerda, aparecendo como favorito. Mesmo desgastado pela tragédia da pandemia, Jair Bolsonaro tinha mais que o triplo das intenções de voto de outros nomes de direita, fechando espaços para uma candidatura alternativa.

O embate entre um presidente e um ex-presidente populares, com plataformas e defeitos públicos, fez com que a eleição se desenrolasse como uma disputa de torcidas. Movido por uma sensação de pertencimento, o país se alinhou de maneira firme em cada lado da arquibancada e reduziu o potencial de mudanças bruscas provocadas pela campanha.

Muniz Sodré* - O sétimo círculo do inferno

Folha de S. Paulo

Entre nós, uma política preventiva deveria começar desmistificando a imagem romantizada do país

Nada é mais perigoso do que uma ideia quando não se tem outras. Isso soa clichê, mas resume à perfeição o programa de governo atual: a ideia fixa da violência armada. Para essa questão social, potencializada pela triplicação da posse de armas no país, é fraquíssima a oposição do discurso progressista. Talvez porque seja fraca a percepção democrática da diferença entre força e violência. Vale uma mirada etimológica: a origem da palavra ("vis") traduz as duas noções.

Não há sociedade que prescinda da força, nem história social de que esteja ausente a violência, seja como condição ou como ato. É disruptiva tanto coletivamente, em caso de guerra, quanto individualmente, como anomia. Na Divina Comédia, Dante reserva aos violentos o vale do Flegetonte, o sétimo círculo do inferno. A modernidade tenta proteger-se com o monopólio estatal do fenômeno.

Janio de Freitas - Destino da vergonha

Folha de S. Paulo

Estender esses anos até o inimaginável ou retomar o caminho que a Constituição pavimentava até o golpe contra Rousseff

Nossas vidas de brasileiros aflitos, seja por necessidades materiais ou por turbulências políticas, transpõem neste domingo uma dramática divisória existencial.

Encerrarmos o dia com reeleição de Bolsonaro será o início da marcha forçada para um país dominado por violência, fanatismo falsamente religioso, exclusão dos direitos civis, silêncio cultural, político e pessoal.

Encerrarmos o dia com a derrota de Bolsonaro será mais um reencontro, talvez o último, com a esperança de um país enfim digno. Chegar a este dia é um êxito, mas não honra o Brasil.

Eliane Cantanhêde – A história, não, mas os números se repetem

O Estado de S. Paulo

No mapa eleitoral de 2022, Lula repete Dilma e Bolsonaro replica Aécio em 2014

Luiz Inácio Lula da Silva não é Dilma Rousseff, Jair Bolsonaro não é Aécio Neves e os tempos são outros, mas há uma forte relação entre a eleição de 2022 e a de 2014, em que o tucano Aécio venceu no Sudeste, no Sul e no Centro-Oeste, mas perdeu a Presidência para a petista Dilma. O mapa de votos tende a reproduzir isso neste domingo, a favor do também petista Lula. Mesmo com o seu governo já fazendo marola e a economia morrendo na praia, Dilma surfou na onda do PT e de Lula. Venceu com enorme margem no Nordeste (que tem 27% dos votos nacionais), no Norte (8%) e… em Minas. O suficiente para subir novamente a rampa do Planalto.

O que fez a diferença foi Minas, estado natal de Aécio e Dilma. Ele venceu no Sudeste graças a São Paulo (maior colégio eleitoral), mas Dilma ficou na frente no Rio (terceiro colégio) e em Minas (segundo), a grande surpresa. Aécio perder ali?

Sebastião Ventura Pereira da Paixão Jr.* - A quem interessa um Brasil iliberal?

O Estado de S. Paulo

É hora de olhar para a frente, compor soluções. É hora de os autênticos liberais assumirem sua responsabilidade histórica com a democracia no País.

A importância da eleição presidencial brasileira vai além das fronteiras nacionais. As sérias e graves pulsões da geopolítica mundial indicam o transitar de uma nova dinâmica de poder, com novos players soberanos e corporativos (em especial as Big Techs), a ensejar redesenho estrutural de alianças estratégicas e de parcerias comerciais, acarretando impacto profundo nas lógicas econômicas internacionais. A tragédia do ontem – materializada na pandemia de covid-19 – expôs a frágil dependência ocidental à hegemonia industrial chinesa, tensionando a relação entre Washington e Pequim em arranjo sem conformação final definida, mas cujo desfecho passa necessariamente pelos desdobramentos de vetores da questão em Taiwan. Por sua vez, a eclosão da guerra na Ucrânia e as insuficiências diplomáticas no entabulamento de soluções céleres expuseram o bloco europeu a consideráveis riscos econômicos e energéticos na antevéspera da chegado do inverno; e, paralelamente, os movimentos bélicos de Putin fazem ressurgir ventos de ameaça nuclear, reacendendo ameaças de destruição total, hibernadas desde o tempo da guerra fria.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Uma eleição crucial

Folha de S. Paulo

São candidatos muito diferentes; Folha reafirma jornalismo crítico e apartidário

Os quase quatro anos de Jair Bolsonaro (PL) na Presidência colocaram em xeque as instituições do país, no maior teste de estresse pelo qual passou a democracia brasileira. Colocaram sob escrutínio também o jornalismo apartidário, pedra basilar deste jornal.

Conforme o país se prepara para fazer sua escolha, a Folha se mantém convencida de que o apartidarismo é a melhor forma de fazer jornalismo crítico, isento e independente, o de maior utilidade pública.

Neste domingo (30) o eleitor brasileiro tem duas opções bastante distintas a sua frente.

Se a escolha for por Bolsonaro, o voto recairá no político que deixou de lado as responsabilidades de governo para se dedicar a seu projeto tirânico de eliminar limites ao poder presidencial.

O que está em jogo não são apenas os próximos quatro anos. São as quase quatro décadas de exercício pleno da democracia no Brasil, exemplar em qualquer lugar do mundo. É essa conquista fundamental da sociedade que está sob a ameaça do projeto cesarista de Bolsonaro.

Poesia | José Saramago - "Catorze de Junho"

 

Música | Francis Hime - Brasil Lua Cheia

 

sábado, 29 de outubro de 2022

José de Souza Martins* - Na antemanhã do que seremos

Eu & Fim de Semana / Valor Econômico

O que está em jogo neste domingo é o marco civilizatório que regulará nosso destino como nação

Qualquer que seja o resultado da eleição de 30 de outubro, o Brasil da manhã de segunda-feira já não será o mesmo da véspera. Se vencer Bolsonaro, o país amanhecerá com um desafio de, nas sombras de seu obscurantismo, se reconstruir, no marco das tradições inconformistas e poéticas do povo brasileiro. O de reencontrar-se como nação da esperança a partir dos valores e possibilidades da Constituição de 1988.

Se vencer Lula, ele, o PT e os grupos também democráticos não petistas terão que compreender os complexos desafios de superar o autoritarismo residual da ditadura de 1964. E viabilizar o diálogo entre a sociedade civil e as Forças Armadas, para que se convençam de que sua missão histórica não é a de tutelar a sociedade nem tratá-la como inimiga do Estado.

O Brasil não é um quartel, não é uma confraria religiosa, não é um curral político, não é um cercadinho de bajuladores de porta de palácio. A imensa maioria do povo brasileiro é constituída de gente que trabalha e pensa, para a qual o verde e amarelo não é o da cueca e da veste carnavalesca, mas o do coração.

Para que nos reencontremos na consciência de que a sociedade é a unidade do diverso e da retidão e não a desunião do único e da linha reta.

Ascânio Seleme - O que você vai escolher amanhã?

O Globo

Amanhã é um dia de escolhas. Inúmeras escolhas. Não pense que votando no 13 ou no 22 você estará apenas elegendo Bolsonaro ou Lula. Não mesmo. O número que você digitar amanhã na urna eletrônica vai representar mais do que seria possível resumir em uma lista que coubesse nos quatro mil toques do abre desta coluna. Mas, talvez respondendo a algumas questões, se possa entender tudo o que está em disputa nesta eleição. E qual o melhor caminho a seguir.

O que você vai eleger amanhã, o respeito às leis e à Constituição ou o desrespeito total e a permanente ameaça de interferir e destruir as instituições?

Na transparência ou nos cem anos de sigilo, sobretudo para malfeitos políticos ou familiares, em qual você votará?

Como terá de optar, você vai escolher a educação com recursos e dignidade ou escolas malcuidadas e meninos sem merenda?

Ao votar, você dirá quer um país culturalmente pujante e múltiplo, com incentivos fiscais a quem produz, ou uma nação de sertanejos que se recusa a fomentar uma indústria que gera 6,6 milhões de empregos e representa quase 3% do PIB?

Sua escolha de amanhã será em favor dos pregadores da paz e da esperança ou dos defensores do armamento generalizado da população? Você é Caçador, Atirador e Colecionador (CAC) ou um cidadão que prefere ficar longe de armas?

Você que é cristão e acredita na redenção final, vai votar em quem defende pastores que trocam o amor de Deus por sacolas de dinheiro e barras de ouro ou em quem apoia religiosos que distribuem o pouco que têm com os que mais precisam?

Pablo Ortellado - O paradoxo da frente ampla

O Globo

Deputado federal por 28 anos, o presidente conseguiu se apresentar aos eleitores como 'outsider'

A campanha de Lula para a Presidência foi cautelosa. Seguiu as recomendações mais prudentes dos especialistas que indicavam constituir uma frente ampla em defesa da democracia para enfrentar Jair Bolsonaro. E, embora as pesquisas sugiram que a estratégia deverá ser bem-sucedida, ela também terminou por confirmar os fantasmas do discurso populista do atual presidente.

Cientistas políticos e a experiência de outros países recomendavam formar uma frente ampla, da esquerda até a centro-direita, para derrotar Bolsonaro. No meio acadêmico, o cientista político Steven Levitsky, de Harvard, foi o mais preeminente defensor da frente ampla. No influente livro “Como as democracias morrem”, mostrou como frentes amplas podem salvar a democracia de ameaças autoritárias, a exemplo do que aconteceu quando a oposição a Pinochet se uniu para derrotá-lo no plebiscito de 1988. Foi com uma estratégia assim, de união nacional, que Macron derrotou duas vezes a candidata da extrema direita Marine Le Pen, em 2017 e 2022.

Carlos Alberto Sardenberg - Entre pelegos e não pelegos

O Globo

A polarização é primitiva. Divide o mundo entre o bem e o mal, as situações pessoais entre ‘gosto’ e ‘odeio’

Foi positivo que tenha havido um segundo turno. Mesmo sem grandes novas alianças partidárias, Lula e Bolsonaro tiveram de ampliar repertório, elencos de apoio e foram mais expostos.

Se o objetivo de um e outro era sair da respectiva bolha, Lula saiu-se melhor. Obteve apoios importantes, que vieram sem cobrança e com uma posição que ajuda na busca de eleitores indecisos. Ajuda a escapar da polarização.

Sim, porque, se o embate se dá entre o bem e o mal absolutos, isso mantém no jogo apenas os fiéis de cada lado. Mas o Brasil seria isso? Metade lulista e metade bolsonarista?

Simone Tebet, cujo crescimento como figura nacional até se reforçou após o primeiro turno, respondeu. Não é lulista, não apoia o programa histórico do PT, mas vota no ex-presidente por entender que esse voto preserva a democracia. Não é apenas um voto anti-Bolsonaro, mas a favor de algo mais.

Ricardo Henriques - Amanhã são décadas

O Globo

Recolocar o país nos antigos trilhos já seria muito atualmente, mas seguramente insuficiente diante dos desafios do porvir

Vivemos uma encruzilhada sobre o projeto de futuro que queremos para o país. Como disse Nelson Rodrigues: “Subdesenvolvimento não se improvisa. É obra de séculos”. Pois desenvolvimento também não se improvisa, mas tampouco pode ser obra de séculos. Desenvolvimento requer ciência, conhecimento de práticas, governança política e institucional, e intencionalidade no desenho do projeto de futuro.

Deve ser uma tarefa desta geração para podermos sonhar e projetar o Brasil do futuro, ousado, ambicioso, realista e democrático.

No entanto, as políticas públicas nas áreas de Meio Ambiente, Educação, Saúde, Assistência Social, Cultura, Ciência e Tecnologia se encontram, nos últimos quatro anos, em um interregno. Assoladas pela pandemia e pela inoperância do governo federal, regrediram em compasso com o aumento da pobreza, da fome e do desemprego.

Hélio Schwartsman - Por que políticos mentem?

Folha de S. Paulo

Algumas mentiras, porém, são tão escancaradas que assustam até aliados

Às vezes, o logro está no cerne de sua estratégia. É o caso de líderes da extrema direita, mas não só dela, cujo sucesso depende de criar uma realidade paralela e nela manter a base mais fiel de seguidores. Só que essa não é a única situação em que políticos mentem. Eles o fazem também em circunstâncias em que só podem sair perdendo.

É o que ocorre quando exageram suas realizações e desfilam dados absurdos, que são incontinenti contestados pelas agências de checagem. Se sabem que serão desmentidos, por que insistem no logro? Parte da resposta é a cara de pau mesmo. Você sempre pode dizer que é o checador que está errado. Uma parte dos seus eleitores acredita mais em você do que nas agências e outra não liga para as mentiras. Os que ficam irritados são aqueles que já não votariam mesmo em você.

Cristina Serra - Navegar, com Lula, é preciso

Folha de S. Paulo

Votar no ex-presidente é a chance de reencontrarmos o território dos nossos sonhos

Neste domingo, vote como quem mergulha no fundo do oceano para nos resgatar de um naufrágio. Muitos navegantes, antes de nós, foram abatidos pelas tempestades, mas deixaram traçadas as rotas de navegação e o mapa-múndi dos nossos desejos de nação.

Vote por eles, construtores de Brasil, que tiveram a ousadia de projetar a pátria soberana. O país da educação e da ciência, de Darcy Ribeiro, Anísio Teixeira e Paulo Freire. De Oswaldo Cruz e de todos os sanitaristas, de Nise da Silveira, de Milton Santos e de Josué de Castro, que apontou a chaga mais dolorosa, a fome, ainda a nos atormentar.

Alvaro Costa e Silva - Eleitores à beira de um ataque de nervos

Folha de S. Paulo

Chegam a Copa, o Natal, o Ano Novo, mas não chega o dia da votação

Chegam o Mundial do Qatar, o Natal, o Ano Novo, as modas do verão, o Carnaval, o Brasil do futuro de Stefan Zweig. Mas não chega o dia da eleição.

A importância do pleito de 2022 — que se transformou num plebiscito sobre a Constituição e a democracia — mexeu com a já combalida saúde mental dos brasileiros, que vão às urnas neste domingo (30) como uma personagem de Almodóvar: à beira de um ataque de nervos. Medo, raiva, desespero, ansiedade e angústia na escala máxima, tornando a convivência entre os adversários uma impossibilidade.

Muitas relações familiares já tinham ido para a cucuia desde 2018. As amorosas, idem. Mais importante que a atração física, hoje, é uma pergunta-chave: você é Lula ou Bolsonaro? Dependendo da resposta, não dá match. Freguês há mais de 20 anos da cerveja gelada, do caldinho de feijão e do papo no bar que fica na rua onde ele mora, um amigo meu cancelou o lazer dos sábados porque uma camisa da seleção, com o 22 às costas, surgiu tremulando na porta do boteco.

Bruno Boghossian - Candidatos buscam afastar indecisos do rival em debate de rejeição e confusão

Folha de S. Paulo

Candidatos reforçam discurso, mas encontro dificilmente produzirá avalanche a favor de um deles

Na última oportunidade de assegurar o voto dos eleitores que ainda não decidiram o voto no segundo turno, Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PL) levaram ao debate da TV Globo uma rajada de ataques que tinham o objetivo de ampliar a rejeição do adversário.

O petista fez um investimento para dar à reta final da disputa a cara de um plebiscito sobre a continuidade do governo. Em praticamente todos os blocos, Lula perguntou repetidamente a Bolsonaro sobre as realizações de sua gestão –aproveitando a hesitação do rival para acusá-lo de fazer poucas entregas e não apresentar propostas.

Foi uma tentativa de levar a discussão para um terreno que o PT acreditava ser mais fértil antes do segundo turno. O comitê de Lula achava que o eleitor julgaria o governo Bolsonaro e encerraria rapidamente sua gestão, mas a dinâmica da corrida elevou o antipetismo a fator de definição de voto de uma parcela razoável do eleitorado.

Igor Gielow - Lula leva a melhor em debate de monólogos

Folha de S. Paulo

Evento na Globo coroa eleição de rejeições que marca a disputa que chega a seu fim

Coroando uma corrida presidencial marcada por uma disputa entre rejeições, o embate final do segundo turno desenhou-se como um debate entre monólogos.

O objetivo primário de qualquer encontro do tipo é evitar um escorregão fatal, e nisso tanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quanto o atual, Jair Bolsonaro (PL), foram bem-sucedidos.

Já o alvo secundário, a conquista de indecisos (2% segundo a pesquisa mais recente do Datafolha, número que pode mudar a equação final), parece ter ficado bastante longe. Os candidatos falaram para si mesmos e com uma estridência colegial, trocando de temas incômodos para outros assuntos

Bolsonaro passou a campanha na casa dos 50% de rejeição, onde está segundo o Datafolha, e Lula subiu para os 45% atuais. Ao longo dos três primeiros blocos, o que se viu foram acusações alternadas, orientadas pelo que dizem pesquisas qualitativas a suas coordenações de campanha.

João Gabriel de Lima* - A véspera e o dia seguinte

O Estado de S. Paulo

Temos a obrigação de retomar o debate adulto e civilizado sobre as questões que importam

Que tal ler um livro na véspera da eleição? Aí vai uma sugestão: Nós do Brasil, da economista Zeina Latif. Trata-se de uma reflexão de rara clareza sobre a questão fundamental para nós, eleitores: de onde vem e para onde vai nosso país? Ou, nos termos do livro: estamos condenados ao baixo crescimento e ao desenvolvimento medíocre, ou há alguma perspectiva de mudar esse destino?

Para responder à pergunta, Latif mergulha na história brasileira e na melhor literatura acadêmica. As respostas são múltiplas – não existe solução simples para problema complexo –, mas a autora elege uma razão central para nosso atraso: a demora em criar um sistema nacional de educação pública. O livro mostra, com dados e gráficos, que ficamos na rabeira no Ocidente, em geral, e na América do Sul, em particular, atrás de países como Argentina, Chile e Peru.

Rafael Cortez* - Debate mostra campanha do passado e não deve ter peso eleitoral

O Estado de S. Paulo

Sensação de mais do mesmo logo apareceu por meio de acusações de quem seria mais mentiroso em meio às comparações com os governos anteriores

O cardápio de acontecimentos na última semana da corrida presidencial foi bastante farto, o que à primeira vista causaria impacto importante na cena eleitoral. A oferta de temas agradava diferentes freguesias; dos temas associados ao debate econômico, passando por discussões relativas à segurança pública e ao Estado democrático de direito. A particularidade da corrida presidencial de 2022 era justamente de combinar o protagonismo do voto econômico com peso crescente do debate moral/costumes.

As pesquisas mais recentes, contudo, apontam oscilações na margem de erro. Dito de outro modo: as mudanças no debate público parecem não afetar as preferências do eleitorado. Notem, leitoras e leitores estamos tratando de discussões relevantes como a política de ajuste do salário mínimo e de um ex-parlamentar que respondeu a autoridade policial com artefatos bélicos.

Maria Cristina Fernandes - Lula melhora desempenho

Valor Econômico

Lula não se deixou acuar pelo adversário e Bolsonaro mostrou-se nervoso desde o início

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisava de um empate para administrar sua vantagem frente ao presidente da República, mas ganhou o debate. Não se deixou acuar pelo adversário, que subiu o tom das acusações, administrou melhor o tempo e evitou ficar perto de Bolsonaro para não ser intimidado como o foi no encontro da TV Bandeirantes. Jair Bolsonaro mostrou-se nervoso desde o início ao começar o debate sem dar boa-noite aos telespectadores, sem cumprimentar o apresentador William Bonner ou ao seu adversário. Colecionou xingamentos (“Lula, tenha vergonha na cara”, “O crime compensa, Lula?”, “Você é um bandido, Lula”, “Ele só transpôs dinheiro pro bolso dele”, “Você é chefe de organização criminosa”, “Tu és um grande farsante, a começar pela escolha do vice”), levando Lula a pedir desculpas aos telespectadores pelo nível do debate.

A acusação de Lula de que Bolsonaro estava desequilibrado encontrou sua imagem literal nos escorregões de Bolsonaro no palco. Ele se manteve sempre à frente no palco mas não conseguiu mais trazer Lula para seu lado, condição que evidencia a diferença da estatura entre ambos.

Bruno Carazza* - Desempenho dos candidatos

Valor Econômico

Sem bala de prata, nem arma secreta. O último confronto frente a frente entre Lula e Bolsonaro não teve declarações ou revelações bombásticas, mas deixou claro que a eleição de domingo não está definida.

Não se sabe se por excesso de confiança em função dos resultados das pesquisas ou pelo cansaço de quem chega ao fim de uma dura campanha aos 77 anos de idade, Lula não esteve bem neste que pode ser o último debate presidencial de sua vida – independentemente de vencer ou não a eleição no próximo domingo.

Para piorar sua situação, Jair Bolsonaro se mostrou muito mais bem preparado do que nos debates anteriores.

O formato mais livre dos debates do segundo turno – inaugurado na Band e repetido na Globo – favoreceu Bolsonaro. Sem a rigidez de perguntas pré-estabelecidas, Bolsonaro foi bem mais eficaz em controlar a temática e em fugir das armadilhas armadas pelo adversário.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Transporte gratuito no dia da eleição favorece democracia

O Globo

Todas as 27 capitais decidiram liberar as roletas para tentar reduzir a abstenção nas urnas

É uma excelente notícia que as 27 capitais brasileiras tenham decidido oferecer transporte público gratuito para que os eleitores possam votar amanhã. A medida, que visa a combater a abstenção, deverá beneficiar quase 36 milhões de cidadãos, o dobro do contingente contemplado no primeiro turno. As capitais concentram um quarto dos brasileiros aptos a votar.

No primeiro turno, apenas 15 delas ofereceram gratuidade no transporte. Outras duas, Cuiabá e Natal, implantaram tarifas mais baratas para facilitar o deslocamento às seções eleitorais. A diferença é que agora os prefeitos ganharam o aval do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Supremo Tribunal Federal (STF). Os ministros entenderam que os gestores não podem ser punidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal por empregar recursos públicos para custear as passagens.

Ainda que a gratuidade não se estenda a todos os tipos de transporte (em geral o passe livre é para os ônibus), a iniciativa é uma medida importante para tentar reduzir a abstenção. No primeiro turno, 32,7 milhões de eleitores deixaram de comparecer às seções, ou 20,9% do eleitorado, índice pouco acima de 2018 (20,3%). Pelos dados do TSE, os moradores de cidades pequenas e médias (10 mil a 200 mil habitantes), especialmente nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, são os mais propensos a não comparecer. Entre as capitais, a maior abstenção no primeiro turno foi registrada no Rio (24,19%) e a menor no Recife (14,17%).

Poesia | Ferreira Gullar - Meu povo meu poema

 

Música - Chico Buarque - Mulheres de Atenas

 

sexta-feira, 28 de outubro de 2022

Entrevista | Maria Hermínia - Despolitização foi a marca da eleição

Professora critica falta de debate sobre proposta social, política econômica e papel do Estado

Por Daniela Chiaretti /Valor Econômico

SÃO PAULO - A campanha para presidente de 2022 teve como marca a despolitização extrema, na análise de Maria Hermínia Tavares de Almeida, professora titular aposentada de ciência política da Universidade de São Paulo. “Sem dúvida é a campanha mais despolitizada que já vi. Uma campanha onde não se discute proposta social, onde não se discute política econômica, onde não se discute o papel do Estado, onde não se discute nada. É um jogo pesado o tempo inteiro, dos dois lados”, critica. De pontos positivos ela enxerga o amadurecimento da sociedade na discussão do racismo e em permitir que o tema ambiental entre definitivamente na agenda.

Maria Hermínia, membro e uma das fundadoras da Comissão Arns, indicou uma grande mudança no espectro político da direita, que encontrou em Jair Bolsonaro um líder populista, e, portanto, forte eleitoralmente. A esquerda, por sua vez, protagonizou um grande avanço político com o apoio de muitos e diversos grupos em uma frente democrática em torno de Luiz Inácio Lula da Silva. “A grande revolução ocorreu no hemisfério da direita, não da esquerda”, constata. “O Brasil encontrou sua liderança de direita que não é de elite, é popularesca. Daí sua força”, diz. No polo oposto, ela enxerga na multiplicidade de apoios e na convergência de forças em volta de Lula, a conquista de um valioso patrimônio político: “As pessoas perceberam que era a hora da generosidade e de deixar para trás as mágoas porque o país está sob uma ameaça muito grande.”

A seguir os principais trechos da entrevista ao Valor:

Entrevista | Argelina Figueiredo - Governar depende de ter programa e partido

Especialista em governabilidade, professora do Iesp-Uerj considera que siglas precisarão se recompor

Por Caio Sartori e Paula Martini / Valor Econômico

RIO - Referência nos estudos de governabilidade, a cientista política Argelina Figueiredo refuta a ideia de que o perfil do Congresso eleito possa ser empecilho para um eventual governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Por defender bandeiras como o combate à fome, Lula teria mais facilidade que Jair Bolsonaro (PL) na relação com o Legislativo. “Políticas de combate à pobreza são bem mais fáceis de congregar, porque é difícil o Congresso se negar a votá-las.” O atual mandatário, avalia a professora do Iesp-Uerj, representa uma forma distinta de encarar a política, concentrada em temas fragmentados e sem apelo a convergências, o que causa divisões nas instâncias partidárias. Ao Valor, Argelina analisa ainda o processo eleitoral, a futura configuração partidária e a força do bolsonarismo. 

A seguir, os principais pontos da entrevista.

Entrevista | Marcus Melo - Brasil não tem problemas institucionais que possam favorecer o autoritarismo

Para cientista político, superestimação dos riscos à democracia é subproduto da polarização

Fernando Canzian / Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O Brasil não apresentaria "comorbidades institucionais" como outros países que sucumbiram ao avanço de presidentes autoritários que minaram o funcionamento de suas democracias.

Na opinião do cientista político e colunista da Folha, Marcus André Melo, é "descabido, para cenários à esquerda ou à direita", o risco de "venezuelização" do Brasil, em que as instituições perderiam espaço para o autoritarismo.

"A superestimação dos riscos à democracia é mais um subproduto da polarização. O fantasma da 'venezualização' interessa aos principais contendores, pois esvazia a discussão em torno de políticas econonômica e ambiental, entre outras", afirma em entrevista.

Fernando Gabeira - Um domingo em nossa vida

O Estado de S. Paulo

Assim como apenas um presidente não basta para o processo de pacificação do País, autoridades não bastam para conter o processo de ‘fake news’.

Domingo pode ser o fim da era Bolsonaro. Duas visões de Brasil muito diferentes se encontram. A possibilidade de mudança é alta.

Bolsonaro já foi derrotado no primeiro turno. Derrota inédita para um presidente em exercício.

Os fatos neste final de campanha parecem confirmar a tendência de derrota. O primeiro deles foi a frase de Bolsonaro confessando uma atração sexual por uma refugiada venezuelana de 14 anos: “pintou um clima”. Para um líder político que se diz defensor da família, dos bons costumes e da religião, a frase de Bolsonaro é escandalosamente contraditória. Seria o mesmo que um líder na luta contra a corrupção aparecer com milhares de dólares na cueca.

Mesmo sem pressão da mídia e da campanha opositora, o fato ganhou as redes e, num primeiro momento, produziu 1,5 milhão de postagens. Bolsonaro afirmou que as meninas venezuelanas estavam se preparando para se prostituir. Falso. Isso também causou revolta.

Vera Magalhães - Brasil: ontem, hoje e amanhã

O Globo

Eleição de domingo marca uma mudança de era, e está em jogo a vigência plena da democracia

A eleição de domingo será a última sob o signo da Nova República. Caso Luiz Inácio Lula da Silva seja eleito para um inédito terceiro mandato desde que foram restabelecidas as eleições presidenciais, em 1989, anunciou que fará seu último governo. Isso projeta para 2026 um cenário de disputa com novos nomes. Se Jair Bolsonaro vencer, a superação do ciclo pós-redemocratização, que sua primeira vitória prenunciava, se completará quatro anos antes.

Nessa mudança de era, o que está em jogo é a vigência plena da democracia. A Nova República teve início com a escolha de Tancredo Neves pelo Colégio Eleitoral, etapa final da superação da ditadura. Foi marcada por momentos de instabilidade econômica e política, inclusive com dois impeachments, mas não por ameaça real à independência dos Poderes ou às demais garantias constitucionais.

Foi esse risco, de uma vitória de Bolsonaro solapar a normalidade institucional, que levou forças tão distintas do espectro político, da esquerda à centro-direita, a se unir naquela que é a frente mais ampla desde as Diretas Já, que inaugurou o período histórico que caminha para o epílogo.

Luiz Carlos Azedo - Denúncia das rádios foi tiro no pé de Bolsonaro

Correio Braziliense

A ordem na campanha de Bolsonaro é esquecer a história das rádios e deixar o assunto morrer na Justiça, porque a denúncia foi uma Operação Tabajara, como diria o humorista Claudio Manoel, da antiga Casseta & Planeta. Não se sustentou 24 horas, porque revelou atraso na entrega dos programas às rádios, falhas no monitoramento das redes sociais e uma desconfiança, por parte da própria equipe de campanha, de que o ex-secretário de Comunicação da Presidência Fábio Wajngarten, autor da trapalhada, comprou gato por lebre, ao acreditar que o dossiê com a denúncia tivesse total veracidade e poder de provocar até o adiamento das eleições.

A tese foi comprada pelo ministro das Comunicações, Fábio Faria, que divulgou a denúncia em entrevista coletiva na segunda-feira, sem que o senador Fábio Bolsonaro (PL-RJ) e o marqueteiro da campanha, Duda Lima, fossem consultados. Como todo candidato que está perdendo a eleição acredita em qualquer coisa que possa mudar o rumo da história, Bolsonaro se empolgou e agarrou a denúncia com as duas mãos, mas foi demovido de um confronto mais sério com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, pela cúpula das Forças Armadas e os caciques do Centrão — o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e próprio presidente do PL, Valdemar Costa Neto — tão logo as rádios começaram a desmentir as informações.

Eliane Cantanhêde – Hollywood é aqui

O Estado de S. Paulo

Só num país imaginário, o presidente inventa uma farsa eleitoral e todos temem golpes

Num certo país imaginário, um líder político inteligente, experiente e praticamente dono de um partido chocou todo mundo ao atacar de forma vil uma ministra da Suprema Corte, mesmo sabendo que, em estando em prisão domiciliar, seria levado de volta à cadeia. Como foi.

Antes, porém, nesse país imaginário, esse político preso, armado e amalucado recebe agentes da Polícia Federal com 50 tiros e três granadas. E o que faz o presidente da República? Destaca o ministro da Justiça para negociar, a favor do aliado criminoso, com quem ele disse que nunca tirara uma foto. A internet foi inundada de fotos dos dois.

Bernardo Mello Franco - Pintou um clima

O Globo

Se presidente queria demonstrar força, pronunciamento desta quarta teve o efeito contrário

Pintou um clima de derrota na campanha de Jair Bolsonaro.

Às vésperas do segundo turno, aliados do presidente passaram a pedir o adiamento da votação. Alegam que ele teria sido prejudicado na distribuição da propaganda eleitoral em rádios no Nordeste.

A queixa foi apresentada por Fábio Faria, dublê de ministro e animador de palanque. Anunciada em tom de escândalo, baseava-se num relatório vazio e apócrifo. Instado a dizer quem teria participado do boicote, o comitê bolsonarista listou apenas oito emissoras. A maioria de municípios diminutos, como Várzea da Roça e Santo Antônio de Jesus.

O factoide governista não sensibilizou o TSE. O ministro Alexandre de Moraes arquivou a reclamação por ausência de “qualquer indício mínimo de prova”. Para completar, determinou que seus autores sejam investigados por tentativa de tumultuar o processo eleitoral.

Ainda que a história fosse verdadeira, não teria a menor influência numa disputa que envolve mais de 120 milhões de eleitores. Além disso, a responsabilidade de fiscalizar a veiculação de propaganda é dos partidos políticos, não do Judiciário.