quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Igor Gielow - Governo admite adensamento da crise e perda de controle

- Folha de S. Paulo

A fumaça da crise adensa o ar em Brasília. O Datafolha afere rejeição inédita de Dilma Rousseff, decorrente tormenta política e econômica pela qual o país passa, e os problemas do governo ganham periodicidade contada em horas, temperados pelo imprevisível que habita a Operação Lava Jato. Enquanto a presidente fala em "travessia" e o PT convoca sua militância para ir às ruas, três dos principais atores do governo trataram de admitir a gravidade da crise nesta quarta-feira (5).

A expressão mais dramática coube a um estranhamente emotivo vice-presidente Michel Temer (PMDB), que falou em "grave crise" e pediu união. Dirigia-se principalmente ao Parlamento. Na noite anterior , a Câmara deixara aberta a porteira a uma "pauta bomba" quando todos haviam concordado em adiá-la. Temer ouviu Joaquim Levy , o ministro que se equilibra na cadeira da Fazenda, e pediu responsabilidade aos congressistas. O próprio Levy e Aloizio Mercadante (Casa Civil) reforçaram o coro.

O vice falou que poderia "reunificar todos", o que possui leitura ambígua quando Dilma pode ter um pedido de impeachment analisado. E o regente do processo será o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que se dedica a alternar frases conciliadoras a estocadas no governo, a quem culpa por sua certa denúncia no petrolão. O PSDB joga com Cunha, embora finja que não. O petrolão amplifica os temores sobre crise, já que delações premiadas que podem complicar ainda mais governo e PT estão em negociação. Por fim, o previsível panelaço da noite desta quinta (6) contra o programa do partido serve de aquecimento para o ato anti-Dilma do dia 16.

Míriam Leitão - Custo coletivo

- O Globo

O Brasil vive um enredo estranho, em que os políticos tentam se alvejar, e os petardos atingem o país como um todo. Para se vingar, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, manobra para aprovar projetos que ampliam gastos públicos. As várias facções da base parlamentar defendem interesses setoriais, a oposição ignora as próprias crenças. O preço está sendo pago por todos nós.

O custo é coletivo, porque os contribuintes é que sustentam o Tesouro, pagando impostos. Mas há também o preço do aprofundamento da crise. Hoje, se o Brasil perder o grau de investimento, todas as empresas grandes que fazem captações no exterior terão suas classificações de risco pioradas e pagarão mais caro em qualquer operação de crédito. Os investidores institucionais, que seguem regras rígidas na alocação de recursos, não poderão vir para o Brasil. O dólar mais caro será um choque de custos nas companhias e nos orçamentos familiares. Quem ganha, se o trem descarrilhar?

Evidentemente, o maior erro é do governo, que perdeu completamente a capacidade de administrar a própria base. Sem um polo de atração, pela inabilidade política da presidente, a base que deveria sustentar o governo é capturada pelos mais variados grupos de interesse. Os governistas têm, sistematicamente, votado pelo aumento de gastos.

O que deveria ter sido um ajuste fiscal no primeiro semestre foi completamente alterado. Em certos projetos, o total a ser economizado foi reduzido. Outros tiveram votação adiada. Alguns foram totalmente adulterados e se transformaram em veículo para aumento das despesas.

Quem achava que isso ficaria restrito ao primeiro semestre está vendo esta semana a continuação do mesmo filme em que eles criam despesas, para atingir o governo, e acertam a sociedade brasileira.

Algumas das medidas têm mérito, mas estão sendo aprovadas sem que se pense na dotação orçamentária para cobrir os novos gastos. O país já está em déficit primário. Mesmo que os aumentos de gastos fiquem apenas para o próximo ano, ou sejam parcelados, o problema é que este não é o momento oportuno para o Congresso criar despesas em bases diárias.

Algumas das ideias, como a de corrigir as aposentadorias pela fórmula do salário mínimo, que foi vetada pela presidente Dilma, criam despesas de forma permanente, exatamente na contramão do que deveria ser feito diante da conjuntura demográfica que o país vive. Os aumentos salariais para várias categorias do setor público têm efeito cascata sobre outros. O Congresso aprova, manda a conta para o Tesouro e não se pergunta de onde sairá o dinheiro para pagar a conta.

A disputa política entre o governo e sua base desagregada está impondo perdas ao país. A oposição se aproveita da briga intestina no governo e aprova medidas que em outros tempos abjurou. Tudo isso bate na economia. Empresários não fazem projetos de investimento porque não sabem qual será o nível do risco do país no momento de execução do projeto. A incerteza é o pior ambiente para elevar o investimento. E sem ele não há crescimento nem emprego.

Algumas das medidas e decisões têm mérito, porém este não é o momento de enfileirar projetos que vão aumentar as despesas públicas. A hora é de diminuir os gastos para o governo reorganizar suas contas e elevar a confiança na economia.

As categorias profissionais do setor público para as quais os parlamentares estão aprovando aumento salarial dizem que merecem, que estão com os ganhos defasados, que profissionais de outras áreas, com funções semelhantes, ganham mais. Há sempre uma série de argumentos. Mesmo que estejam todos corretos, este não é o momento para o governo aumentar custos com seus funcionários.

As surpresas diárias são lesivas ao país. A cada dia aparece um projeto saído de alguma gaveta que altera uma norma, cria um subsídio, transfere um custo, aumenta despesas. O governo a tudo assiste inerte. Quando toma decisões, o faz de forma atrasada e insuficiente. A origem da crise econômica está nas decisões tomadas no mandato passado da presidente Dilma e na farra para reelegê-la. As motivações dos rebelados da sua base são as mais obscuras. Tudo isso junto está criando instabilidade no país.

Maria Cristina Fernandes - Os 799 votos de Janot

- Valor Econômico

• Votação estreita margem para rejeição do Congresso

Advogado de delator é o Ministério Público. Foi assim que o advogado do ex-diretor da Petrobras Renato Duque, que fez ontem o primeiro depoimento no acordo de delação premiada, justificou a decisão de deixar sua defesa.

A frase escancara os dilemas da advocacia que tem um pé nos embargos auriculares e outro nos prazos de prescrição, mas também revela os poderes da instituição que ontem reconduziu Rodrigo Janot para o topo da lista de candidatos à Procuradoria-Geral da República.

Um dos alvos mais emblemáticos da operação, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, reconheceria os poderes da instituição ao contratar para defendê-lo um ex-procurador-geral da República. Manobraria ainda para fazer de um de seus advogados o indicado da Câmara ao Conselho Nacional do Ministério Público, que fiscaliza a atuação dos procuradores.

O avanço da delação premiada faz de Janot o mais poderoso procurador-geral da República desde que a nova configuração do cargo foi estabelecida pela Constituição de 1988.

Desde então, o Congresso nunca deixou de confirmar uma indicação do presidente da República para o cargo. Talvez porque em nenhuma dessas ocasiões houvesse tantos parlamentares bem postos sujeitos ao seu crivo. Janot arrisca-se a enfrentar a resistência de seus alvos, mas se esperar por sua aprovação no Senado para denunciá-los pode sugerir que foi feito refém.

A eventual rejeição do Senado ao seu nome não resolve os problemas dos parlamentares acossados pela Operação Lava-Jato. Qualquer outro da lista não haverá de fugir da nova engrenagem judicial. A exclusão daquele que, entre os quatro, era o mais crítico à força-tarefa de Curitiba, não deixa dúvidas de que a instituição está unida pela preservação de suas prerrogativas.

O Ministério Público é movido pela colaboração com delegados, juízes e órgãos de controle dentro e fora das fronteiras, mas, sobretudo, pelo novo perfil dos seus profissionais. Noventa por cento dos integrantes do Ministério Público Federal ingressaram na carreira depois da redemocratização quando a Justiça passou a ser mais pautada pelo resgate da cidadania que pela defesa do Estado de direito.

Pesquisa conduzida pela Escola Superior do Ministério Público da União esmiuça o perfil de uma carreira cuja escolha tem na 'possibilidade de transformação social' um motivo duas vezes mais determinante que a estabilidade no cargo. A delação premiada é defendida por 97% deles.
Os protestos os têm respaldado. Na primeira leva de manifestantes na rua em 2013 muita gente só veio a se inteirar de que havia uma proposta para limitar o poder de investigação do Ministério Público depois do desfile de cartazes contra a PEC 37.

Esse respaldo pode levá-los a excessos, como o do atual procurador que chegou a posar com o cartaz "Janot, você é a esperança do Brasil", mas as acusações de que extrapolam para o arbítrio não têm sido acolhidas pelos tribunais superiores. Dos 330 habeas corpus requeridos pela defesa dos réus da Lava-Jato, apenas 11 foram acolhidos.

Nem sempre foi assim. No mais emblemático embate das duas instituições, o Supremo Tribunal Federal rejeitou a denúncia de corrupção apresentada pelo procurador-geral Aristides Junqueira contra o ex-presidente Fernando Collor.

O procurador-geral seguinte, Geraldo Brindeiro, não enfrentou o mesmo problema até porque preferia arquivar as investigações a oferecer denúncia. Exerceu três mandatos seguidos, todos no governo Fernando Henrique Cardoso, que rejeitou pressão para nomear um egresso da lista tríplice montada pela associação de classe.

As insatisfações acumuladas por procuradores que viam represadas suas ambições para chegar ao topo da carreira nasceu o grupo do tuiuiú, uma desengonçada ave do Pantanal com a qual era comparado o decano deles, Cláudio Fonteles. O tuiuiú foi o primeiro a assumir a PGR como o mais votado da lista tríplice. O governo petista que inauguraria a prática foi alvo, no mandato seguinte, de Antonio Fernando de Souza, na denúncia do mensalão.

Os eleitos da lista levam anos para se consolidar. Todos os indicados, desde Fonteles, constavam da lista tríplice do biênio anterior. Havia um acordo para que não ficassem mais de um biênio. Assim dariam mais oportunidades de ascensão para o grupo. Souza romperia o acordo com a recondução. E também inovaria ao aceitar advogar, depois de aposentado, para um alvo do quilate de Eduardo Cunha.

Seu sucessor, Roberto Gurgel, sairia como o mais desgastado deles. Recuaria da denúncia contra o ex-ministro Antonio Palocci, acusado de multiplicar o patrimônio por 20 em quatro anos como deputado federal e hesitaria na investigação do senador Demóstenes Torres, que acabaria cassado por favorecimento a negócios de Carlinhos Cachoeira. Enfrentou ainda questionamentos internos da corporação pela política de compras instituída na PGR.

Janot foi de 511 votos em 2013 para 799 ontem. Alcançou o maior percentual de votos (42%) na história da lista tríplice na eleição que também teve um comparecimento inédito da corporação - 79% dos 1244 procuradores. O resultado imuniza a presidente Dilma Roussef contra pressões parlamentares anti-Janot, além de estreitar a margem de manobra do Congresso para rejeitar um nome majoritariamente respaldado pela corporação.

A acachapante recondução de Janot e a ampliação das delações premiadas tendem a reforçar a amplitude da Lava-jato e aumentar a incerteza que ameaça a sobrevida dos acordos políticos como aquele que ontem mobilizou Michel Temer.

O vice-presidente apelou contra a chamada pauta-bomba do Congresso ao ver a situação passar de uma 'crisezinha' para uma grave crise. Não foram os indicadores fiscais que se agravaram nesses 15 dias, mas a imprevisibilidade dos rumos da Lava-Jato.

O instrumento que tanto reforçou os poderes do Ministério Público, ganhou novo escopo com a legislação aprovada a toque de caixa pelo Congresso em resposta às manifestações de junho de 2013. O acordo ainda deve tardar, mas parece haver poucas dúvidas de que sairá do forno com uma pitada de povo.

Carlos Alberto Sardenberg - Ilegalidade permitida

- O Globo

Pode parecer coisa pequena neste momento de grandes crises, mas serve para demonstrar um padrão de estímulo à ilegalidade. Seguinte: de cada dez motoristas já apanhados dirigindo bêbados, seis continuam por aí guiando seus carros e com a carteira de habilitação na mão. Tudo dentro da lei. Isso foi medido em São Paulo, mas pode apostar que o padrão se repete pelo país.

Reparem agora em ambiente, digamos, mais importante, Brasília. O senador Ivo Cassol (PP-RO) está condenado no Supremo Tribunal Federal desde 2013, por fraude em licitações, crime cometido entre 1998 e 2002, quando ele era prefeito de Rolim de Moura. Se quiserem encontrar Cassol, podem procurar no seu gabinete no Senado. Ele está dentro da lei.

Nos dois casos, os recursos garantem a permanência legal da ilegalidade.

Apanhando bêbado, o motorista recebe uma multa, da qual pode recorrer em três instâncias. Se perder em todas, tendo, portanto, a multa confirmada, e se cometer outras infrações, chegando aos 20 pontos, ainda assim não perde a carteira. Tem direito a mais três recursos. E segue por aí, barbarizando com carteira em ordem.

Cassol foi o primeiro senador condenado no STF desde a vigência da Constituição de 88. Foi recentemente condenado outra vez, na Justiça Federal, por improbidade administrativa. Tudo somado, são quatro anos e oito meses de cadeia, mais cerca de R$ 2 milhões entre multas e dinheiro que deve devolver. Deveria. Tem recurso pendente no STF. A reparar: ilícitos, na sentença do tribunal, cometidos há 13 anos, condenado há dois e, tudo bem, continua ativo no Senado.

Entre suas recentes tarefas, aliás, relata um pedido de investigação de contratos da Procuradoria-Geral da República, apresentado pelo seu colega Fernando Collor.

Diante disso, qual o problema de dirigir bêbado? Ou ainda, qual o problema se os presidentes da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros, são oficialmente investigados no STF, no âmbito da Lava-Jato, e continuam no cargo?

Nos Estados Unidos, o sujeito apanhado dirigindo bêbado vai para a cadeia, de lá para o juiz, já recebe a pena e perde a carteira. Pode recorrer, mas fica sem o documento. Aqui, vai para a delegacia, assopra o bafômetro, se quiser, e vai para casa. Se bobear, dirigindo o seu carro.

(Um amigo meu, homem honesto, tomou os 20 pontos. Em vez de recorrer, deixou o carro em casa e foi se matricular em um curso de direção, condição legal para reaver a habilitação. A atendente deu o preço e informou que incluía estacionamento. Ele estranhou: mas é um curso para quem perdeu a carteira! E ela: ora doutor...).

Em países eticamente mais desenvolvidos, como no Japão, o político, quando denunciado de maneira maios ou menos consistente, mesmo que seja só na imprensa, renuncia e vai se defender. Na Alemanha, um ministro renunciou ao ser acusado de plágio numa tese acadêmica apresentada vários anos antes.

Não vale simplesmente colocar a culpa nos políticos e legisladores. Sim, é fácil mudar o sistema de punições no trânsito. Basta alterar a lei no Congresso Nacional. Mas por que não se toma essa iniciativa? Porque mesmo políticos honestos não gostam de se meter nessas pautas ditas impopulares. Já anistias de multas passam facilmente nas Assembleias Legislativas.

Também são populares as reclamações contra radares. Por isso mesmo, até 2012, a lei determinava que o radar deve ser colocado em lugar visível e com sinalização avisando que o "pardal" está logo adiante. A mensagem: caro motorista, a velocidade máxima aqui é de 100 km/hora, mas você, perdão, o senhor ou a senhora só precisam respeitá-la nos trechos imediatamente anteriores aos radares, convenientemente sinalizados. Mais: no caso de se distrair e for flagrado, fique tranquilo, tem direito a seis recursos.

O Conselho Nacional de Trânsito eliminou a exigência de aviso prévio dos radares, mas há vários projetos de lei no Congresso restabelecendo a sinalização anterior (curiosamente, um desses projetos é do ex-deputado Luís Argolo, preso na Lava-Jato). Em câmaras de vereadores, toda hora aparece um projeto proibindo radares móveis, por exemplo. A Assembleia Legislativa de Santa Catarina foi mais longe: chegou a proibir a instalação de radares de qualquer tipo nas rodovias estaduais.

São coisas pequenas e coisas grandes. O padrão de ilegalidade é o mesmo. Dos "pequenos crimes" chega-se a uma Lava-Jato. O desmonte da grande corrupção deve fazer o caminho inverso e levar o pessoal a perceber que, convenhamos, tem que respeitar a regra, do estacionamento proibido até a licitação de uma plataforma de petróleo.

Os fatos se impõem – Editorial / O Estado de S. Paulo

Em sua coluna de ontem no Estado Dora Kramer colocou o dedo na chaga: "Vamos ao ponto: José Dirceu só fez o que os investigadores da Operação Lava Jato dizem que ele fez na Petrobrás e cercanias da máquina pública porque a instância superior a ele deixou que fizesse". De fato, o conjunto de evidências e provas fartamente apresentadas pelo juiz Sergio Moro na decretação da prisão preventiva do ex-ministro e ex-presidente do PT estimula a suspeita – que perdura há 10 anos, desde o estouro do escândalo do mensalão – de que José Dirceu não agiu por conta própria ao arquitetar e executar a trama criminosa pela qual foi condenado. Com a cautela que se exige de um profissional de imprensa responsável, Kramer observa: "Resta saber – e comprovar – se a instância superior a José Dirceu, a Presidência da República, à época ocupada por Luiz Inácio da Silva, detinha o domínio daqueles fatos".

Domínio do fato – este é o ponto crucial da questão. Essa teoria, que embasou várias decisões no julgamento do mensalão, consagra, simplificadamente, o princípio de que, em determinadas circunstâncias, quando existe uma relação hierárquica, mesmo que não seja o mandante, é impossível que o hierarca superior ignore o delito praticado por seu subordinado, o que o torna corresponsável pela infração.

Até cair nas malhas da Justiça José Dirceu era o segundo no comando do governo e do PT. Foi ele, com a ousadia e o destemor que sempre marcaram sua atuação política, o articulador da estratégia de alianças que quebraram as resistências da ortodoxia petista e abriram caminho para a vitória nas urnas em 2002. Chegou ao governo com uma autoridade incontrastável que desde logo o guindou à condição de herdeiro presuntivo da coroa. Razão mais do que suficiente para que o rei do pedaço se mantivesse sempre muito atento a seus passos, até porque o elevara à condição de primeiro-ministro de fato.

Cabe, então, a pergunta: é plausível a hipótese de que Lula – que, definitivamente, de tolo não tem nada – não se tenha dado conta de que José Dirceu tramava sob seu nariz aquela que se revelou ser apenas a primeira fase de um processo de corrupção que evoluiu para o petrolão e ainda não se sabe onde vai chegar? Tratava-se, afinal, de uma conspiração para dar respaldo financeiro ao ambicioso projeto político do PT e, já que o dinheiro estava à mão, engordar a poupança de políticos, empresários e agentes inescrupulosos.

O retrospecto do episódio do mensalão demonstra que era de natureza essencialmente política o principal motivo pelo qual as investigações de então passaram ao largo da Presidência da República. A chefia do governo era exercida por um líder popular de origem humilde, com prestígio em ascensão dentro e fora do País, envolto pela aura de construtor de uma nova era de justiça social e de prosperidade. Até por conta de seu carisma, qualquer ameaça ao poder de Lula poderia ser interpretada pela maior parte dos brasileiros como golpismo da "elite" e pôr em risco o equilíbrio das instituições. A oposição partidária se deu conta desse risco e aliviou a pressão sobre o Planalto. Lula saiu ileso e fortalecido, mas hoje não é mais o mesmo.

Como comprovam as investigações da Lava Jato, o esquema criminoso ensaiado no mensalão ampliou-se em proporções gigantescas com o propinoduto da Petrobrás e, ao que tudo indica, espalhou-se pelo setor público numa extensão ainda desconhecida. De quebra, José Dirceu, o herói popular "injustiçado" pelo STF, surge desse enredo como um tipo muito diligente também quando se trata de encher o próprio bolso.

Reagindo à nova prisão do desmoralizado "guerreiro do povo brasileiro", intelectuais "de esquerda", alheios aos fatos, recorrem a qualquer argumento na tentativa de desmoralizar as investigações do Ministério Público e da Polícia Federal, bem como a integridade do juiz Sergio Moro. Um deles "denunciou" que a intenção dissimulada da "direita" é atingir Lula. É difícil de saber se a "direita" terá esse poder. Mas hoje a Justiça certamente o tem, se houver provas que o incriminem. E não há nada de sub-reptício nisso.

Desconcerto – Editorial / Folha de S. Paulo

• Deputados oposicionistas e até governistas se prestam ao papel de coadjuvantes do presidente da Câmara nas ameaças contra o Planalto

Bastou um dia de sessão na Câmara dos Deputados para ficar evidente que o recesso parlamentar não arrefeceu o confronto entre Legislativo e Executivo. Pior, o conflito parece enveredar pela via arriscada do descontrole político e da chantagem desabrida.

Nem mesmo as decisões concertadas entre líderes partidários se mostram capazes de pôr a Câmara nos trilhos do interesse nacional.

Após intensas conversas, decidiu-se retirar da agenda o item da chamada pauta-bomba que equipararia vencimentos na Advocacia-Geral da União e na Polícia Federal aos vigentes no Judiciário. A trégua duraria três semanas, mas, em questão de horas, o plenário derrubou o acordo dos líderes.

Há duas hipóteses para explicar a confusa reviravolta; nenhuma é animadora. A primeira: falta de controle dos próceres sobre as suas bancadas. A segunda: que outra liderança –mais forte, mais influente e mais avessa aos trâmites democráticos– esteja em ação.

Todas as evidências apontam para o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Acossado pela acusação de recebimento de propina, o presidente da Câmara multiplica confirmações de sua prontidão para pôr a Casa a serviço de inconfessáveis objetivos pessoais.

Como um trator desgovernado, a bancada fiel a Cunha atropela e aleija não só o esforço para equilibrar as contas do governo federal neste momento de crise econômica. Também enlameia dois institutos valiosos para corrigir desvios nos rumos do país, a saber, as comissões parlamentares de inquérito e o mecanismo do impeachment.

As CPIs são esgrimidas pela Câmara como vergonhoso instrumento de pressão. Há boas razões para investigar o BNDES e os fundos de pensão associados ao governo petista, mas não são elas que movem a abertura das comissões e a exclusão do PT de sua direção.

O objetivo dos parlamentares é acuar uma presidente fraca e impopular. Para tanto, a Câmara de Cunha –com o apoio até do outrora comedido PSDB– não hesita em brandir a ameaça do impedimento de Dilma Rousseff (PT).

O impeachment é um recurso extremado da democracia para as raras situações em que se torna necessário ejetar um governante legitimamente eleito. Requer sólida comprovação jurídica de crime de responsabilidade, antes de mais nada, e depois o consenso político de que o mandatário perdeu toda a condição de governar.

Nenhum desses pré-requisitos está dado. Ao manobrar nos bastidores para que seus colegas mantenham viva a chantagem e camuflem suas impressões digitais, Eduardo Cunha dá mostras de que não mede as consequências de seus atos e maquinações para a República –e é espantoso que tantos no Congresso Nacional se disponham a secundá-lo.

Ney Matogrosso - A Rosa de Hiroshima ( Vinicius de Moraes)

Vinicius de Moraes - Rosa de Hiroshima

Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa, sem nada

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Opinião do dia Aécio Neves

"As investigações já chegaram muito perto do Palácio do Planalto, porque esse assalto aos cofres públicos serviu para alimentar esse projeto de poder. Se alguns se enriqueceram lateralmente, devem responder por isso. Mas a montagem dessa organização e dessa estrutura, segundo o Ministério Público continuada após o mensalão, teve um objetivo central: manter esse grupo político que está no poder.

O Brasil tem um desgoverno. As coisas já não caminham minimamente na direção correta, porque falta ao governo autoridade, credibilidade, e isso não se conquista com palavras vazias, com discursos de boas intenções.
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Aécio Neves é senador (MG) e presidente nacional do PSDB. Valor Econômico, 5 de agosto de 2015

Cunha isola PT em CPIs e manobra pelo impeachment

Crise. Após o recesso parlamentar, presidente da Câmara dos Deputados se aproxima dos tucanos, coloca em prática medida para isolar aliados de Dilma Rousseff nas comissões de inquérito e monta estratégia que pode facilitar a votação das contas da presidente

Daniel Carvalho – O Estado de S. Paulo

Antes mesmo de abrir a primeira sessão da Câmara depois do recesso, o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), deixou claro que transformará em ação prática seu rompimento com o Palácio do Planalto. Cunha excluiu o PT do comando de todas as Comissões Parlamentares de Inquérito, iniciou diálogo com a oposição em torno de um pedido de impedimento da presidente Dilma Rousseff e fez manobra nessa mesma direção. Cunha trabalhou para aprovar no plenário da Casa uma espécie de regime de urgência para acelerar a votação das contas da petista que pode, no limite, levar a crime de responsabilidade fiscal e facilitar o questionamento de seu impedimento.

As articulações contra Dilma, começaram na noite de anteontem. Enquanto a presidente reunia líderes da base no Palácio da Alvorada para tentar reaglutinar seus apoios, Cunha conversava com a oposição em sua residência oficial. No fim da noite, aliados do Planalto também chegaram. O convescote contou com representantes de PMDB, PSDB, Solidariedade, DEM, PP, PR e PSD, os dois últimos governistas e integrantes do grupo do PT na Casa. Nenhum petista foi convidado.

Conforme a tradição do Legislativo, as maiores bancadas possuem lugar cativo no comando das CPIs. A do PT é a segunda maior da Câmara. Ainda assim, ficou acertado que a CPI do BNDES será presidida pelo PMDB e relatada pelo governista PR. A dos fundos de pensão ficará sob comando do DEM e será relatada pelo PMDB. PSDB comandará a CPI dos crimes cibernéticos e o PSD ficará com a de maus-tratos a animais.

O líder do governo, José Guimarães (PT-CE), condenou a articulação. "Era só o que faltava, a segunda maior bancada ficar fora da CPI. Baixa o tom. Isso não é aconselhável aqui dentro. Quem decide é a base. Nem presidente nem oposição decidem quem vai ser presidente ou relatora Esse discurso não é real. É um desejo vão da oposição", afirmou.

O líder do PT na Câmara, Sibá Machado (AC), disse que o assunto não está encerrado. Cunha tratou a exclusão do PT como algo natural. "O PT não está excluído de todas as CPIs. O PT está na (CPI da) Petrobrás. Os outros partidos querem participar também. É natural, faz parte do jogo. Por que o PT tem que ficar com tudo? É uma questão de negociação en-tre eles" disse.

Impeachment. Cunha e aliados discutiram manobra para pautar pedido de impeachment de Dilma de maneira que não o comprometa diretamente. Dois participantes do encontro disseram ao Estado que ficou acertada a possibilidade de, após o Tribunal de Contas da União (TCU) encaminhar seu parecera respeito das contas de governo, Cunha rejeitar o pedi do de abertura de processo de impeachment.

A oposição apresentaria um recurso, que seria votado e aprovado pelo plenário, garantindo a votação do impedimento de Dilma. Cunha negou "veementemente" que tenha discutido o assunto. "Não há discussão de impeachment", ressaltou Cunha. "Da minha parte, eu desminto veementemente as notícias que estão publicadas nos onlines que eu tive qualquer discussão acerca disso."

Logo depois, na primeira sessão do semestre, o plenário da Câmara aprovou urgência para análise das contas governamentais de 1992 (de 29 de setembro a 31 de dezembro, período pós-Fernando Collor de Mello), 2002 (último ano da gestão de Fernando Henrique Cardoso), 2006 e 2008 (contas do governo Luiz Inácio Lula da Silva).

O objetivo e garantir que as contas sejam votadas em um único turno e não em dois. Com isso, essas contas devem ser votadas até o fim da semana, abrindo espaço para apreciação das contas de Dilma tão logo saia o parecer do TCU.

Cunha e oposição discutem impeachment e isolam PT

Cunha discute fórmula para fazer avançar impeachment

• Rompido com o PT, ele quer dar caráter coletivo à eventual ação contra Dilma

• Peemedebista acertou a exclusão do PT de postos de comando das CPIs do BNDES e dos fundos de pensão

Ranier Bragon, Andréia Sadi, Aguirre Talento – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Rompido com o Planalto, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), discutiu nos últimos dias com a oposição e parte da base governista uma forma de fazer avançar um pedido de impeachment contra Dilma Rousseff na Casa.

A ideia é dar à ação um caráter coletivo, reduzindo o risco político que ele teria caso tomasse de forma solitária uma decisão desse porte.

Pela lei, cabe a Cunha definir se os pedidos de impeachment apresentados –foram 12, até agora, no segundo mandato– têm fundamento para prosseguir ou devem ser arquivados sumariamente. O peemedebista sinalizava a intenção de autorizar a tramitação dos mais bem elaborados.

Em jantar na noite de segunda (3), Cunha discutiu outra possibilidade com seus aliados. No novo cenário, ele rejeitaria dar sequência aos pedidos, mas algum deputado aliado recorreria de sua decisão ao plenário, o que é permitido pelo regimento interno da Câmara. Com isso, a decisão seria tomada pela maioria simples dos presentes.

São dois os objetivos manifestados nos bastidores: minimizar os riscos políticos de Cunha e constranger os aliados fiéis a Dilma a assumir perante a sociedade, no voto, uma eventual recusa a dar seguimento a um processo contra a petista.

Caso essa votação decida pelo seguimento do pedido, é criada uma comissão especial que emite parecer a ser apreciado pelo plenário. O processo contra Dilma só é aberto ""e ela afastada"" com o apoio mínimo de dois terços dos deputados (342 de 513).

Cunha negou ter discutido o assunto. "Alguém pode fazer um ou outro comentário, cada um tem o direito de opinar ou falar o que quiser, mas da minha parte eu desminto que tive qualquer discussão acerca disso. Isso é uma coisa muito séria para ser tratada de uma forma jocosa como está sendo colocada."

Sob a condição de anonimato, quatro deputados que participaram do jantar confirmaram a informação à Folha. O encontro promovido pelo presidente da Câmara ocorreu após jantar oferecido por Dilma a seus aliados. Foi uma reunião totalmente anti-Planalto, apesar de contar com a presença de líderes governistas.

CPI
No mesmo jantar, Cunha acertou a exclusão do PT dos postos de comando de duas CPIs que têm grande potencial de desgaste para o governo: a que vai investigar supostas irregularidades no BNDES (que será presidida pelo DEM) e a dos fundos de pensão (PMDB).

Isso só foi possível graças à adesão de PR e PSD, cujos deputados têm manifestado nos bastidores insatisfação com o Planalto. Eles estão aliados formalmente ao PT, mas fecharam com Cunha nessa questão.

Dos 27 integrantes titulares de cada CPI, 11 são indicados pelo bloco liderado pelo PMDB. O bloco do PT tem direito a escolher 8 nomes, mas desse grupo fazem parte o PR e o PSD, que ficaram ao lado de Cunha.

Os presidentes das CPIs são eleitos por seus integrantes. Estes são indicados pelos líderes partidários, em número proporcional à bancada.

Porém, as principais legendas acertam antecipadamente quem irão apoiar. Eleito, o presidente indica o relator. O PT promete resistir e tenta negociar um acordo com Cunha.

O presidente da Câmara declarou oposição ao governo, no mês passado, sob o argumento de que há uma dobradinha entre Planalto e Ministério Público para incriminá-lo na Lava Jato. Cunha é apontado por dois delatores como destinatário de propina do esquema de corrupção na Petrobras. Seu nome aparece também em requerimentos que, segundo os delatores, foram usados na Câmara para achacar fornecedores da estatal.

Contas
Em outra frente, a Câmara aprovou o regime de urgência para análise das contas de ex-presidentes, o que abrange Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Lula (PT). Cunha disse que irá votá-las ainda nesta semana.

Com isso, os parlamentares buscam abrir caminho para votar as contas da presidente Dilma do ano passado, que serão apreciadas pelo Tribunal de Contas da União e correm o risco de rejeição por conta de manobras fiscais feitas pelo governo.

Cunha arma novas ‘bombas’ para o governo

Sem trégua, Cunha articula contra governo

• Na volta do recesso, presidente da Câmara exclui PT do comando de comissões e contempla PSDB e DEM

Júnia Gama e Isabel Braga – O Globo

BRASÍLIA - No primeiro dia de sessão após o recesso parlamentar, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), deu demonstrações claras de que não dará trégua ao governo. O peemedebista articulou a exclusão do PT do comando das CPIs do BNDES, dos Fundos de Pensão e dos Crimes Cibernéticos; conseguiu a aprovação de regime de urgência para a análise de contas da Presidência da República de anos anteriores, abrindo caminho para a votação das contas da presidente Dilma Rousseff; e desobstruiu a pauta para votar o quanto antes o projeto que corrige o FGTS pela poupança, um dos maiores temores do governo devido ao impacto nas contas.

Cunha também se recusou a retirar da pauta a PEC 443, que aumenta o teto salarial de advogados públicos e procuradores. Os governistas apresentaram um requerimento para adiar a votação da matéria. Porém, com a base aliada esfacelada, o requerimento foi derrotado. Antes que a PEC fosse votada, ontem à noite, coube ao próprio Cunha adiar para hoje a sua apreciação.

- Não é falta de articulação do governo, é falta de fidelidade da base - reagiu o líder do governo, José Guimarães (PT-CE). - Foi bom esse susto para dizer o tamanho mesmo da base. Daqui por diante, ou é base ou não é. Vamos exigir fidelidade. Você acha que é razoável um partido ter ministro e a base votar contra o governo?

As movimentações de Cunha durante o dia foram recebidas com frustração pelo Palácio do Planalto. Havia uma expectativa de que, após diversos apelos dos articuladores políticos do governo, o presidente da Câmara balanceasse suas decisões neste segundo semestre. Segundo interlocutores do vice-presidente Michel Temer, emissários enviados por Cunha no recesso haviam sinalizado com a possibilidade de diálogo, o que contribuiu para dar uma esperança - que acabou não se confirmando ontem.

- Ficou evidente que ele não vai dialogar com o governo. Agora, é avaliar o que fazer - disse um auxiliar do Planalto.

A preparação das ações contra o governo começou na noite de segunda-feira. Apesar de anunciar que cancelaria o encontro que havia marcado com líderes partidários em razão do jantar oferecido para eles pela presidente, Cunha recebeu na mesma noite líderes da oposição e da base aliada. Nesse encontro, ficou definido que o PT seria excluído dos cargos de comando das CPIs que funcionarão neste segundo semestre, e que seria a vez de a oposição controlá-las.

Segundo o acerto entre os líderes, a presidência da CPI do BNDES ficará com o PMDB e a relatoria com o PR, aliado dos petistas. Na CPI dos Fundos de Pensão, o DEM, mais radical opositor ao governo, terá a presidência e o PMDB, a relatoria. O também oposicionista PSDB comandará a CPI de crimes cibernéticos e o PP ficará com a relatoria da comissão. Já o PSD, aliado do PT, terá a presidência da CPI de maus-tratos aos animais e o PMDB indicará o relator.

José Guimarães demonstrou irritação por ter sido excluído da reunião na casa de Cunha e pela retirada do PT dos comandos das CPIs. Guimarães disse que, se houver exclusão, o governo irá "virar a mesa". Mas há pouco espaço para manobra do Planalto. A definição dos cargos de comando se dá por acordo entre os partidos, e o bloco do PMDB é o maior da Casa. Dele faz parte o DEM. Além disso, PR e PSD são do bloco do PT, o segundo maior; portanto o bloco ao qual pertencem os petistas está sendo atendido em duas comissões.

- Não é razoável fazer uma reunião para excluir outros. Vamos trabalhar para resolver essas coisas que não são boas para o jogo democrático. Se tiver exclusão, a gente vira a mesa. No sertão do Ceará, virar a mesa quer dizer não aceitar imposição de ninguém - afirmou o petista, que admitiu ter havido "desentendimento" com Cunha.

- São os partidos que se entendem. Eles (PT, PR, PSD) têm que se entender no bloco deles. Eu não articulo nada, eu apenas tomo pulso para poder indicar. Cada partido luta pelo seu espaço. O PT não está excluído, está na (relatoria) da Petrobras. Os outros partidos querem participar. Por que o PT tem que ficar com tudo? - disse Cunha.

Outra rasteira de Cunha na pretensão do governo de evitar a votação de projetos que possam comprometer as contas públicas foi a votação de dois projetos sobre terrorismo, que tramitavam com urgência e obstruíam a pauta. Os deputados aprovaram o primeiro e devem concluir a votação do segundo hoje, abrindo espaço para o projeto que corrige o FGTS pela poupança.

Contas: regime de urgência aprovado
A Câmara aprovou ontem o regime de urgência para os quatro projetos de decreto legislativo que recomendam a aprovação de contas da Presidência da República de anos anteriores. Há na lista uma conta do ex-presidente Itamar Franco, uma do ex-presidente Fernando Henrique e duas do ex-presidente Lula. A intenção do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é votar essas contas entre hoje e amanhã. Isso deixa livre o caminho para a apreciação das contas da presidente Dilma Rousseff, que podem ser rejeitadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

Cunha anunciou que ainda não há decisão sobre o que fazer com contas que têm parecer pela rejeição, como é o caso de uma do ex-presidente Fernando Collor. Apesar do regime de urgência, ainda há dúvidas sobre o que fazer caso a Câmara ou o Senado rejeite uma das contas na votação. Outro percalço para a conclusão dessas votações é o fato de a presidente da Comissão Mista de Orçamento, senadora Rose de Freitas (PMDB-ES), ter defendido ontem que, constitucionalmente, as contas teriam de passar primeiro pela comissão e anunciado que irá ao STF para que isso ocorra.

Câmara aprova urgência para análise de contas

Daniel Carvalho – O Estado de S. Paulo

• Deputados decidem votar em turno único balanços pendentes, o que aceleraria discussão sobre pedalada de Dilma

O plenário da Câmara aprovou ontem regime de urgência para análise das contas governamentais de 1992 (de 29 de setembro a 31 de dezembro, período pós-impeachment de Fernando Collor de Mello), 2002 (último ano da gestão Fernando Henrique Cardoso), 2006 e 2008 (ambas do governo Luiz Inácio Lula da Silva). Com isso, a aprovação ou rejeição de cada um dos balanços poderá ser feita em votação única, e não em dois turnos, o que deve ocorrer até o fim desta semana.

Dessa forma, a apreciação das contas da presidente Dilma Rousseff relativas a 2014, cujo parecer está prestes a ser julgado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), poderia ser apreciada pelos parlamentares tão logo a corte conclua sua análise.

Os ministros do TCU vão recomendar a aprovação ou rejeição do balanço levando em conta questões como as chamadas pedaladas fiscais, manobra contábil executada pelo governo na qual atrasou despesas obrigatórias e repasses a bancos públicos responsáveis por pagamentos de benefícios sociais, entre outras medidas. A inclusão da urgência na pauta do plenário e a consequente aprovação da medida causou um bate-boca na Câmara.

Em defesa de Dilma, o vice-líder do governo na Casa, Sílvio Costa (PSC-PE), disparou críticas ao TCU e ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que classificou de "ditador e burro". Cunha não respondeu à provocação. "Não me interessa se Vossa Excelência vai prestar atenção ou não, até porque estou me lixando para Vossa Excelência", disse o parlamentar. "Agora, sinceramente, o cara pegar o cargo da Casa para transformar numa questão pessoal... Essas contas estavam aqui há 11 anos."

Para Costa, a atitude de Cunha é "uma questão pessoal" com vistas a prejudicar Dilma, com quem o presidente da Câmara disse ter rompido após vir a público delação do lobista Júlio Camargo, na Operação Lava Jato, na qual disse que o peemedebista cobrou propina no esquema da Petrobrás - ele nega.

O vice-líder do governo também criticou o TCU. "É uma vergonha para a Câmara Federal ser pautada por um TCU bichado, que tem dois ministros na Operação Lava Jato. Querem pautar isso hoje para mais na frente votar as contas da presidente Dilma."

Presidente da Câmara mostra força e exclui PT de principais cargos em CPIs

Por Thiago Resende – Valor Econômico

BRASÍLIA - Em uma demonstração de que ainda exerce forte influência na Câmara dos Deputados, o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), costurou um acordo com governistas e oposição que exclui o PT dos principais cargos de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) a serem instaladas e que podem comprometer o governo.

Quase que simultaneamente ao jantar oferecido pela presidente Dilma Rousseff aos líderes no Palácio da Alvorada, o pemedebista, que recentemente rompeu com o governo e responde a inquérito no Supremo Tribunal Federal dentro da Operação Lava-Jato, marcou um encontro "rival", na residência de presidente da Câmara.

Em outra manifestação da força de Cunha na Câmara, quase todos os líderes partidários defenderam abertamente a permanência dele no cargo mesmo após o lobista Julio Camargo, delator da operação Lava-Jato, dizer que o pemedebista cobrou o pagamento de propina em contrato da Petrobras.

Apesar de Cunha alegar que o jantar foi para discutir os comandos das CPIs e projetos que serão votados pela Câmara, deputados contaram que o pemedebista e a oposição falaram sobre uma possível tramitação de pedidos de impeachment. Um integrante do PSDB afirmou que, ao recusar um pedido, Cunha poderia dar o primeiro passo - já que os deputados poderiam levar o caso para o plenário. O assunto não avançou.

Os deputados entenderam que deve-se aguardar o Tribunal de Contas da União (TCU) analisar a contabilidade da presidente Dilma referente a 2014 - as chamadas "pedaladas fiscais".

Mal tinham deixado o jantar de Dilma, governistas foram até a residência do presidente da Câmara, onde estavam lideranças do DEM, PSDB e SD.

Além desse gesto, relataram ainda um episódio no Palácio da Alvorada em tom de chacota: o ministro da Defesa, Jaques Wagner, pediu para os garçons servirem champanhe aos convidados, se levantou, e propôs um brinde conjunto, mas, na sequência, Dilma reconheceu ser melhor aguardar o país superar algumas dificuldades para fazer a saudação. O brinde, no fim, foi à saúde de todos.

O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), disse que "não é razoável você fazer uma reunião para excluir outra". Informado sobre a divisão de cargos das CPIs feitas entre integrantes da oposição e da base aliada, como PR, PP, PDT e PHS, petistas tentaram desarmar a estrutura desenhada.

Quatro CPIs serão criadas em agosto. Duas delas desagradam o Palácio do Planalto e foram autorizadas por Cunha no dia em que anunciou passar para o lado da oposição: a que vai apurar supostas irregularidades em contratos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a que vai tratar de ilícitos em fundos de pensão.

Ao longo desta semana, o PT ainda vai tentar ficar com a relatoria da Comissão do BNDES. Pelo acordo feito no jantar de Cunha, essa vaga seria ocupada pelo PR, que pertence ao bloco petista. O PR, no entanto, já tem até um nome cotado para o cargo: o deputado Márcio Alvino (PR-SP). O parlamentar argumenta que, na CPI da Petrobras, o relator é do PT. "Estamos caminhando para isso", afirmou o líder do PR na Câmara, Maurício Quintella Lessa (AL).

"É claro que o PT reivindica a relatoria. Estou trabalhando para isso. Pelo menos a do BNDES", declarou o líder do partido na Câmara, Sibá Machado (AC). "Esse assunto nós ainda não encerramos. Eu quero buscar o consenso. Temos um bloco e quero respeitar meu bloco e quero reivindicar esse direito", completou o petista.

Na divisão dos comandos das CPI articulada por Cunha, o PMDB indicaria o presidente da Comissão sobre o banco de desenvolvimento. Deve ser indicado o deputado Marcos Rota (AM). O partido também deve ocupar a relatoria da CPI dos fundos de pensão. O nome mais cotado é de Sérgio Souza (PR). O DEM, por sua vez, ficaria com a presidência dessa Comissão que pode ir para Efraim Filho (PB).

"O PT não esta excluído. Ele está na CPI da Petrobras. Você está instalando mais quatro [CPIs]. Os outros partidos querem participar também. É natural. Faz parte do jogo. Por que o PT tem que ficar com tudo?", afirmou Cunha, que negou ter articulado o acordo. O líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), avaliou que o PT "não pode culpar os outros partidos pelo seu isolamento", pois não convenceu os outros partidos da sua participação nas CPIs.

Para a oposição, o PT não pode ocupar a presidência nem a relatoria das CPIs para que a investigação seja isenta. "A maioria entendeu que deve definir as posições nessa lógica até porque o próprio PT tem sido o partido colocado no calor dessas investigações", disse o líder do DEM, Mendonça Filho (PE).

PSDB mantém 'distância segura' de peemedebista

• Tucanos querem dosar grau de proximidade com Cunha, mas usarão as inserções de TV amanhã e sábado para apoiar os atos pró-impeachment

Erich Decat – O Estado de S. Paulo

A cúpula do PSDB quer dosar o grau de proximidade a ser estabelecido com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), neste semestre que deve ser decisivo para o futuro da presidente Dilma Rousseff. A avaliação foi feita ontem por tucanos após o peemedebista e representantes da oposição articularem uma manobra para tentar assegurar a votação de um processo de impeachment na Casa.

O Estado apurou que há um entendimento de parte da cúpula do PSDB de que, antes de fechar qualquer acordo com o presidente da Câmara, é preciso aguardar as manifestações do dia 16 e o eventual desgaste do Planalto com a crise econômica. Há o receio de que embarcar num projeto de impeachment sem ter um verdadeiro "termômetro social" pode abrir caminho para o governo sair das cordas. A discussão da manobra regi mental para votação do impedimento de Dilma foi colocada na reunião realizada ontem em Brasília entre lideranças do PSDB.

Segundo relatos, o presidente da legenda, senador Aécio Neves (MG), não se posicionou nem contra nem a favor da iniciativa. Em público, disse ser "provável" que vá ao protesto do dia 16. Dentro do ninho tucano também tem sido colocado em avaliação diária até onde o partido deve se "abraçar" com Cunha, que é alvo da Operação Lava Jato. O entendimento é que até onde for de interesse do partido haverá uma "parceria" como a que prevista no caso das CPIs do BNDES e dos Fundos de Pensões. Cunha tem articulado para assegurar espaço de destaque aos opositores nessas comissões.

Segundo integrantes da cúpula do PSDB que estão em negociação com o peemedebista, entre as cadeiras que o partido deverá ocupar nas CPIs estão as duas vice-presidências. Os deputados da legenda escalados para integrar a CPI do BNDES já foram definidos: Marcus Pestana (MG), Betinho Gomes (PE) e Miguel Haddad (SP). Ainda não foram escolhidos os membros para investigar os fundos. Já a comissão para tratar de crimes cibernéticos, a ser comandada pelo PSDB, deverá ser presidida por Mariana Carvalho (RO).

Acordo. Para não se expor diretamente coma condução do processo de impeachment, Cunha tem costurado alternativas. Entre os cenários traçados está ode ele rejeitar um pedido oriundo do julgamento das contas do governo, no Tribunal de Contas da União (TCU). Ern contrapartida, colocaria em votação recurso apresentado pela oposição para o plenário dar a palavra final. "Você pedir para que o presidente da Câmara que é do PMDB defira o pedido é um pouco demais. Não podemos exigir que ele defira o pedido de impeachment", afirmou ao Estado o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP). "Sempre trabalhamos com a hipótese de ele indeferir e nós apresentarmos um recurso para que o impeachment vá ao plenário."

Protestos. Ontem o PSDB também reafirmou apoio aos protestos contra Dilma marcados para o próximo dia 16. Amanhã e no sábado, o partido vai usar suas inserções de TV para convocar a população a tomar parte nas manifestações.

PSDB vai usar fala de Dilma em propaganda pró-manifestações

- Folha de S. Paulo

O PSDB vai usar falas da presidente Dilma Rousseff nas propagandas partidárias em que vai estimular a adesão aos protestos contra o governo, marcados em diversas cidades do país para o dia 16.

Segundo a Folha apurou, os tucanos vão exibir imagens de Dilma falando sobre temas como a redução na conta de luz e a inflação, para evidenciar que as promessas feitas durante a última eleição não foram cumpridas pela petista.

Nenhum político aparecerá no filme, apenas atores. Ao final da propaganda, será exibida uma mensagem dizendo que o PSDB "apoia" as manifestações de rua.

As inserções irão ao ar nesta quinta-feira (6) e sábado (8). A tese de que a presidente cometeu estelionato eleitoral já foi explorada pelo partido em seu último programa nacional. Na peça, um ator afirmava que Dilma havia mentido para todo o país. O discurso era emoldurado com imagens da presidente dizendo, por exemplo, que, eleita, não faria ajuste para demitir e arrochar salários.

A adesão oficial do PSDB às manifestações foi anunciada pelo presidente da sigla, senador Aécio Neves. Nesta terça-feira (4), o tucano disse que a prisão do ex-ministro José Dirceu é um novo ingrediente para os protestos.

"Reiteramos nosso apoio às manifestações, registrando sempre que são da sociedade, e nós, dentro dos limites da democracia, mostraremos também nossa indignação com a corrupção e com a mentira que tomou conta do país", disse Aécio.

Ele afirmou que "possivelmente" irá aos atos. Disse, no entanto, que a sigla continua tratando com cautela temas como o impeachment.

Para Aécio, investigações estão muito perto do Planalto

Raquel Ulhôa - Valor Econômico

BRASÍLIA -O senador Aécio Neves (MG), presidente nacional do PSDB, disse ontem que as investigações da Operação Lava-Jato, sobre o esquema de corrupção na Petrobras, já chegam "muito perto" do Palácio do Planalto e o governo "está à beira de um ataque de nervos", por não saber quem será o próximo envolvido. Com relação à prisão do ex-ministro José Dirceu, o tucano disse que chama atenção é a "continuidade da obra".

O PSDB não pretende ser algoz do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mas também não está disposto a ir para o "abraço de afogado", dando apoio a ele enquanto estiver no comando da Casa. O assunto foi discutido na reunião. "Não vamos empurrar Eduardo Cunha para o buraco. Não vamos fazer nada para favorecer a presidente Dilma Rousseff. Mas também não vamos adotar nenhuma atitude para salvá-lo", disse um participante da reunião. A avaliação é que o PSDB deve ocupar os espaços que Cunha está oferecendo à legenda nas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) da Casa e aguardar o desfecho da situação do pemedebista sem assumir defesa ou campanha de desestabilização dele. Cunha foi acusado pelo lobista Júlio Camargo, em delação premiada na Operação Lava-Jato, de receber US$ 5 milhões de propina.

"As investigações já chegaram muito perto do Palácio do Planalto, porque esse assalto aos cofres públicos serviu para alimentar esse projeto de poder. Se alguns se enriqueceram lateralmente, devem responder por isso. Mas a montagem dessa organização e dessa estrutura, segundo o Ministério Público continuada após o mensalão, teve um objetivo central: manter esse grupo político que está no poder", afirmou.

Após a reunião, Aécio disse que está "pensando seriamente" em participar das manifestações do dia 16. Nas inserções comerciais da propaganda partidária amanhã e no sábado, em cadeia de rádio e televisão, o PSDB vai convidar a população "indignada com a corrupção e a mentira" a participar dos atos.

Os tucanos manifestaram preocupação com a "instabilidade política do país" e com a falta de solução de curto prazo para a crise econômica. "O Brasil tem um desgoverno. As coisas já não caminham minimamente na direção correta, porque falta ao governo autoridade, credibilidade, e isso não se conquista com palavras vazias, com discursos de boas intenções", afirmou Aécio.

Um dos assuntos tratados na reunião foi a notícia de que, na ação coletiva em curso na corte de Nova York contra a Petrobras, a defesa da empresa informou que os comunicados enviados ao mercado eram mera publicidade. Teria sido a resposta à cobrança feita pelo juiz Jed Rakoff, sobre as informações que a empresa dava a investidores sobre as "melhores práticas de governança corporativa", "os mais altos padrões de ética" e condução dos negócios com "transparência e integridade".

"Isso é grave. (...) Se for confirmado, é a constatação de que esse governo, não satisfeito em mentir reiteradamente para os brasileiros, passa a mentir também para os estrangeiros que investem no país. E um governo que age desta forma cada vez se distancia mais do resgate da sua própria credibilidade", disse Aécio. Para ele, trata-se de crime de responsabilidade. O deputado Antônio Imbassahy (PSDB-BA), vice-presidente da CPI da Petrobras, vai apresentar requerimento à comissão para que a empresa envie os documentos.

Charge de Chico Caruso - O Globo


Intelectuais ligados ao PT criticam prisão

- Folha de S. Paulo

Em um contraponto ao comando nacional petista, intelectuais e artistas de esquerda saíram em defesa nesta terça-feira (4) do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e criticaram sua prisão no rastro da Operação Lava Jato.

Para o cineasta Luiz Carlos Barreto, a detenção do petista foi "redundante", uma vez que ele já cumpria prisão domiciliar pelo mensalão. Para ele, sem poder fazer grandes deslocamentos, Dirceu não tinha como fugir do país ou pressionar ninguém.

"Estamos em um caminho perigoso", disse. "Há exagero e é preciso que as pessoas saibam que existe um Estado de Direito democrático", acrescentou.

O escritor Fernando Morais diz que o petista foi "vitimado" por uma tentativa de atingir o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

"Não é nem o Dirceu nem a Dilma [Rousseff] que querem, mas o Lula. O problema é 2018", afirmou.

Para o ator José de Abreu, é uma "piada" prender alguém que já foi condenando alegando continuidade criminosa.

"O juiz Sérgio Moro é o único juiz do mundo que prende preventivamente preso condenado."

Segundo o escritor Luis Fernando Veríssimo, a prisão de Dirceu é política pelo que o petista representa.

Lula diz que PT precisa de 'reflexão profunda' após nova prisão de Dirceu

Andréia Sadi, Débora Álvares e Estelita Hass Carazzai – Folha de S. Paulo

Enquanto a Executiva Nacional do PT reunia-se em Brasília, nesta terça-feira (4), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizia a amigos que a prisão do ex-ministro José Dirceu só reforça a "necessidade" de uma reflexão profunda pelo PT.

A Folha obteve o relato de pessoas que conversaram com o ex-presidente após a prisão. Segundo elas, Lula disse não ter se surpreendido com a medida e que o próprio ex-ministro e homem forte de seu primeiro governo já esperava a nova detenção, tanto que foi à Justiça em busca de habeas corpus preventivos.

Dirceu cumpria prisão domiciliar desde novembro, em Brasília, pela condenação no mensalão e foi transferido para a sede da PF em Curitiba nesta terça. Ele é apontado pelo Ministério Público Federal como um dos responsáveis pela criação do esquema de corrupção na Petrobras.

Para Lula, segundo a Folha apurou, o mais urgente é evitar uma "guerra" com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o que pode complicar a vida do governo e do PT no Congresso.

Procurado, o Instituto Lula negou as informações. "A Folha, ou suas fontes anônimas, têm essa mania de inventar e atribuir declarações e avaliações ao ex-presidente Lula. Isso não é jornalismo político ou a serviço do leitor. São apenas fofocas."

No processo do mensalão, Dirceu contou com o apoio público do PT, que avaliou sua condenação pelo Supremo Tribunal Federal como "julgamento político".

Agora, dirigentes do partido afirmam, nos bastidores, que Dirceu não contará com a mesma solidariedade. Motivo: a Lava Jato indica que ele tirou "proveito pessoal" do esquema na Petrobras.

A primeira tentativa do PT de se descolar do ex-ministro aconteceu depois da reunião da Executiva Nacional da legenda em Brasília.

Em nota, a sigla disse "reafirmar a orientação de combate implacável à corrupção", mas não fez nenhuma referência direta ao petista.

O presidente da legenda, Rui Falcão, acabou citando o companheiro de partido quando questionado se acreditava em sua inocência.

"Para mim, qualquer pessoa, não só o José Dirceu, é inocente até que provem o contrário", encerrou.

Questionado se a ausência de uma manifestação formal do PT sobre a prisão não significaria que o partido está abandonando o ex-ministro, Falcão negou.

"Não estamos abandonando nenhum companheiro nosso. Independente de abandonar ou não, não se deve presumir a culpa antes que a culpa seja provada", destacou o líder petista.

Chegada
Ao chegar em Curitiba, Dirceu era aguardado por cerca de 50 pessoas, que gritavam "ladrão" e "vagabundo".

Uma delas soltou fogos quando ele chegou ao local. Entre os manifestantes, havia integrantes de movimentos organizados, como o Acorda Brasil e o Movimento Brasil Livre.

Executiva do PT não fará defesa pública de Dirceu

Na defensiva, PT aprova texto sem citar José Dirceu

• Executiva Nacional do partido prefere isolar ex-ministro por temer que apoio represente "abraço de afogados" e adota tom protocolar

Vera Rosa – O Estado de S. Paulo

Na tentativa de se proteger demais um escândalo, a cúpula do PT decidiu não defender o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, preso pela Polícia Federal na 17.ª fase da Operação Lava Jato, batizada de Pixuleco. Em reunião da Executiva Nacional do PT, realizada ontem, dirigentes mudaram o tom adotado em relação à prisão anterior do ex-ministro, em 2013, após sua condenação pelo Supremo Tribunal Federal, no processo do mensalão, e preferiram isolar Dirceu. Ele vai dividir espaço em uma cela com dois contrabandistas, na Custódia da Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba. A presidente Dilma Rousseff também vai se distanciar do escândalo.

A avaliação reservada é de que defender Dirceu, neste momento, pode agravar ainda mais a crise que atinge o partido e o governo Dilma, porque ninguém sabe o que está por vir. Nos bastidores, o argumento de muitos integrantes do comando petista é o de que o ex-ministro da Casa Civil – que presidiu o PT com mão de ferro de 1995 a 2002 – pode ter montado um esquema na Petrobrás para enriquecimento pessoal. Dirigentes da corrente Construindo um Novo Brasil (CNB), grupo de Dirceu e do ex-presidente Lula, se dividiram sobre a defesa do ex-ministro. Ao final da reunião, porém, a maioria chegou à conclusão de que se associar agora a Dirceu poderia representar um abraço de "afogados".

Ficou decidido ali que o comando do partido, sem poder escancarar o seu temor em relação aos desdobramentos da investigação, adotaria tom protocolar sobre as acusações contra Dirceu, contrastando com o que ocorreu no mensalão. Na resolução política aprovada ontem, não há citação ao ex-ministro. Além disso, a portas fechadas, dirigentes do PT argumentaram que Dirceu não atuou na Petrobrás em nome do partido. No diagnóstico de muitos petistas, a situação do ex-ministro seria diferente da de João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT preso pela Operação Lava Jato.

Para os investigadores, Dirceu criou um esquema de desvio de dinheiro na Petrobrás, com o mesmo DNA do mensalão. Por meio da JD Consultoria, ele teria recebido R$ 39 milhões. Desse total, R$ 21,3 milhões foram pagos por três grupos empresariais no período em que o petista era investigado, processado, julgado e cumpria pena por envolvimento no mensalão.

Defesa. "O ônus da prova é de quem acusa e é preciso que José Dirceu possa fazer o contraditório das acusações que estão sendo feitas a ele em caráter pessoal", afirmou o presidente do PT, Rui Falcão. "Não estamos abandonando José Dirceu", disse, diante da insistência dos jornalistas. "Ele e todos os que são acusados antes de apresentar sua defesa não são réus até que se prove." O ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, foi na mesma linha. "Cabe aos investigados tomar as providências que julgarem necessárias para se defender perante a Justiça", disse Berzoini, que foi presidente do PT.

"O Zé (Dirceu) tem todas as condições de se explicar. Trata-se de uma atividade profissional dele, não envolve o partido", comentou o secretário de Comunicação do PT, José Américo Dias. Com duas folhas, a resolução política do PT também condenou o ataque ao Instituto Lula, alvo de um explosivo na quinta-feira.

"Causa indignação a conivência silenciosa de certos meios de comunicação e partidos, que se dizem democráticos, com o atentado de caráter fascista ao Instituto Lula", diz o documento aprovado pelo PT. O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, foi convidado para fazer uma exposição sobre as perspectivas econômicas na reunião do PT. Barbosa disse, de acordo com relatos, que o País tem todas as condições para começar a retomar o crescimento no fim deste ano.

Partido muda de tom

Em reunião, PT vê 'caráter pessoal' em prisão de Dirceu

• Partido rebateu, em 2013, acusações contra condenados no mensalão

Fernanda Krakovics – O Globo

Operação "Pixuleco"

BRASÍLIA - Assim como o governo, o PT tenta se descolar da prisão do ex-ministro José Diceu. Apesar de dizer que não está abandonando nenhum companheiro, o presidente do partido, Rui Falcão, afirmou que as acusações contra ele são de "caráter pessoal". Reunida ontem, a Executiva Nacional do PT decidiu não defender Dirceu publicamente. Resolução divulgada após o encontro criticou apenas supostos abusos na Operação Lava-Jato, sem citar o ex-ministro, que é um dos fundadores do partido e um de seus principais quadros históricos.

Na reunião da Executiva, o secretário de Organização, Florisvaldo Souza, e a de Relações Internacionais, Mônica Valente, que é mulher do ex-tesoureiro Delúbio Soares, preso no mensalão, defenderam que o partido fosse solidário a Dirceu. Falcão foi firme ao se opor. Ele argumentou, de acordo com petistas, que se tratava de uma atividade particular do ex-ministro, e não partidária; que adversários e setores da imprensa estão explorando artificialmente a vinculação dele com o PT e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para desgastá-los; e que qualquer menção ao assunto, na resolução a ser divulgada após o encontro reforçaria essa imagem.

Quando Dirceu foi preso em 2013, condenado pelo mensalão, o tom do PT foi outro. Nota divulgada por Falcão expressava solidariedade "aos companheiros injustiçados" e conclamava "nossa militância a mobilizar-se contra as tentativas de criminalização do PT". Além de querer evitar o desgaste, há desconforto com o fato de Dirceu ter se beneficiado do suposto esquema para enriquecimento pessoal. O partido também está cauteloso porque espera novas delações, como a do ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, ligado ao PT.

Delatores fazem doações
Falcão fez, visivelmente desconfortável, uma defesa protocolar de Dirceu ao ser questionado pela imprensa:

- O ônus da prova é de quem acusa e é preciso que o companheiro José Dirceu possa fazer a contradita às acusações que estão sendo veiculadas contra ele em caráter pessoal por delatores da Lava-Jato. Há indícios que precisam ser transformados em provas. A pessoa acusada tem que ter direito à ampla defesa. Não estamos abandonando nenhum companheiro nosso. Não deve se presumir culpa antes de ser comprovada. No Brasil, atualmente, está se invertendo esse princípio.

Questionado se considera Dirceu inocente, o presidente do PT foi cauteloso:

- Para mim, qualquer pessoa, não só o José Dirceu, que seja acusada, é inocente até prova em contrário.

Na nota, o PT faz críticas à condução das investigações da Lava-Jato, mas não cita Dirceu. O documento afirma que há "manobras para criminalizar o PT" e que a orientação do partido é de combate "implacável" à corrupção.

O documento pede ainda a "reorientação" da política econômica. Na reunião, foi decidido que o PT vai ajudar a convocar os atos "em defesa da democracia" organizados por movimentos sociais para o próximo dia 20. Em outra frente, o PT fará ato político, cujo tema central será o Plano Nacional de Educação, no dia 14, em Brasília. O evento ocorrerá dois dias antes dos protestos contra o governo e contará com a presença do ex-presidente Lula.

Ontem, a Polícia Federal não descartou a possibilidade de investigar o filho do ex-ministro José Dirceu, o deputado federal Zeca Dirceu (PT-PR). Ele recebeu doações na eleição de 2010 de três delatores da Lava-Jato. Todos doaram R$ 10 mil cada. Zeca recebeu doação do operador Milton Pascowitch, do irmão dele José Afonso Pascowitch, do consultor Júlio Camargo e do sócio da empresa Hope Recursos Humanos, Raul Ortuzar Ramires.

A desilusão com o mito Dirceu

O fim do mito

• A suspeita de enriquecimento pessoal contra Dirceu apaga símbolo de ex-guerrilheiro e põe em xeque futuro do PT

Alessandra Duarte, Cristina Tardáguila e Leticia Fernandes – O Globo

No dia 12 de dezembro de 2013, a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva subiram ao palco do Centro de Convenções Brasil 21, em Brasília, e ouviram da plateia do 5º Congresso Nacional do PT um grito contínuo: "Dirceu, guerreiro do povo brasileiro! Dirceu, guerreiro do povo brasileiro!". Vinte e oito dias antes, em 15 de novembro, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu havia levantado o punho cerrado - reproduzindo o símbolo do movimento operário internacional contra os exploradores capitalistas - ao subir a rampa da Superintendência da Polícia Federal em São Paulo para começar a cumprir pena no caso do mensalão. Agora, com a nova prisão, na Operação Lava-Jato, e a acusação de que dinheiro desviado da Petrobras o beneficiou pessoalmente, a solidariedade deu lugar à decepção.

Na noite da última segunda-feira, horas depois de Dirceu ser preso de forma preventiva, o PT emitiu uma nota enxuta sobre o caso. Defendeu a legalidade das operações financeiras da legenda e não fez qualquer menção ao "guerreiro do povo brasileiro", que, em 2003, ao assumir a Casa Civil, havia sido apresentado por Lula como "o capitão do time". A nota de agora é um sinal de afastamento cauteloso da sigla em relação a um de seus ícones.

Dirceu, por sua vez, ao entrar no carro que a Polícia Federal usara para buscá-lo em sua casa, adotou postura discreta. De terno cinza e mais grisalho, não olhou para as câmeras e não levantou o braço. Muito menos cerrou o punho. Em vez do apoio que recebera, há menos de dois anos, no congresso do PT, na noite de anteontem, a prisão mobilizou uma tímida vigília com apenas 15 manifestantes, reunidos em seu apoio, em frente ao Supremo Tribunal Federal. O mito do guerrilheiro, do político alinhado com bandeiras sociais e do ministro superpoderoso ruiu e insuflou a discussão sobre o futuro de seu partido.

- Dirceu teve três momentos - analisa o deputado federal Miro Teixeira (PROS-RJ). - No primeiro, tinha muito poder. Era bajulado. No segundo, o da denúncia do mensalão, teve a solidariedade dos companheiros. A partir da condenação, veio o terceiro, que foi o de não bater em quem já está preso. Agora, a nota oficial do PT, sem falar dele, é um sintoma do quarto momento: o da decepção.

Geração desencantada
Pelos corredores de Brasília, Miro conta que são poucas as pessoas próximas a Dirceu que nos dois últimos dias teceram comentários públicos:

- Os que falam dizem apenas: "Que decepção".

Desde 2005, quando vieram à tona as primeiras denúncias do mensalão, parte da militância e de simpatizantes do partido começou a se desiludir. Anteontem, a sensação de perda se agravou, segundo relatos colhidos pelo GLOBO entre pessoas de diferentes segmentos da sociedade.

- Dirceu era meu ídolo nos anos 1960. A decepção é gigantesca - conta a escritora e pesquisadora Heloisa Buarque de Hollanda, com certo desconforto. - Ver um ídolo acusado de manipular a política, de comprar apoio& é uma dor que os anos 1960 não merecem.

Há também aqueles que lamentam o desfecho melancólico da carreira política de Dirceu.

- Politicamente, é o fim. Encerra o mito de maneira dolorosa e cruel. Tenho muita pena - afirma o ex-senador Pedro Simon (PMDB-RS), sobre seu ex-colega de Congresso. - Dirceu está em situação trágica. Foi algo que, aos poucos, foi se confirmando, mas a gente torcia para que não fosse verdade.

Um terceiro grupo, mais crítico, reúne aqueles dispostos a atacar a conduta do ex-ministro e acreditam que só agora as reais ambições de Dirceu se revelaram por completo.

- Todos os jovens querem quebrar tabus, mudar o mundo. Só conhecemos o ser humano de verdade depois da meia-idade. Agora, sabemos exatamente quem é José Dirceu. Eu nasci em Leningrado e me disseram que eu morreria em Lulagrado, numa espécie de karma. Mas acho que não vou mais, não - diz a atriz Elke Maravilha, prevendo que o PT, que "subestimou a inteligência" do povo, provavelmente não voltará ao poder.

A acusação de que Dirceu teria se beneficiado pessoalmente alimenta essa reação. Em vez de comprar apoio para seu partido, como no mensalão, teria recebido recursos de propina para, entre outras coisas, reformar a casa e viajar de avião.

- Comparando-se as duas investigações, agora chama a atenção o envolvimento no plano pessoal - destaca Ayres Britto, ex-presidente do STF. - Se for confirmada a investigação, ele passa a responder por corrupção passiva, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Sua situação se agrava muito.

Um partido sem seu "capitão"
Para Ayres Britto, ainda que Dirceu tenha sido preso preventivamente, sua situação "já respinga" e "é prejudicial para o PT". A visão é compartilhada por parlamentares aliados e de oposição.

- O PT já está todo maculado. Isso é uma pá de terra, e não sei se a última - observa o deputado federal JarbasVasconcelos (PMDB-PE). - Está enterrada essa figura do "capitão do time". Se ele foi expulso de campo, foi preso e voltou à prisão, o que o partido tem mais a dizer?

- O PT está afetado no limite máximo, pelo que algumas pessoas da sigla realizaram, tanto no chamado mensalão, como no caso da Petrobras. Não há mais o que afetar - completa Tarso Genro (PT), ex-governador do Rio Grande do Sul, que, no entanto, aponta uma "divulgação direcionada das investigações" contra o partido. -Tanto de verdades como de mentiras. Essa divulgação já causou o dano máximo que tinha que causar.

Roberto Jefferson, ex-deputado do PTB-RJ e um dos maiores desafetos de Dirceu - que nele despertava "os instintos mais primitivos" - avalia que o PT "perde um de seus alicerces":

- O PT perde um ícone, um de seus mitos. Por outro lado, a prisão de Dirceu apazigua os ânimos. O povo vê que os homens mais poderosos não escapam das garras da lei.

Sobre os efeitos a longo prazo da nova prisão do ex-ministro no cenário político-eleitoral, não há consenso. Carlos Velloso, ex-ministro do Supremo, entende que "a credibilidade do PT é praticamente zero" e que o único caminho possível para a sobrevivência do partido nas próximas eleições é "um exame de consciência":

- O PT deve abominar esses fatos, em vez de tentar justificá-los. Há membros do partido que já defendem uma tomada de posição em favor da ética, que pode até significar uma expulsão.

Já Vladimir Palmeira, um dos fundadores do PT e, hoje, filiado ao PSB, não acredita em tamanho impacto para as próximas eleições:

- Não acho que a prisão de Dirceu tenha influência para o PT nas próximas eleições. Já tinham descoberto esse tremendo esquema de corrupção na Petrobras. O estrago já está feito.