quinta-feira, 11 de julho de 2024

O que a mídia pensa| Editoriais / Opiniões

STF deve manter progressividade na Previdência pública

O Globo

Reforma de 2019 criou sistema justo para funcionalismo: quem ganha mais paga proporcionalmente mais

A reforma da Previdência aprovada em 2019 corrigiu uma injustiça histórica ao impor a servidores públicos federais a alíquota progressiva de contribuição. Ficou decidido que ela começaria em 7,5% para quem ganha até um salário mínimo e subiria de forma escalonada até 22% nos salários mais altos. Quem ganha mais paga proporcionalmente mais. Nada mais justo. Mas esse avanço está agora sob risco. A questão está em análise no Supremo Tribunal Federal (STF), com o placar empatado em 5 a 5. O voto decisivo será do ministro Gilmar Mendes, que pediu vista. Ministros que votaram pelo retrocesso deveriam reconsiderar a posição.

O caso chegou à Corte depois que a 5ª Turma Recursal Federal do Rio Grande do Sul condenou a União a restituir a uma servidora federal os valores descontados pela alíquota progressiva, por considerar que a tributação é confiscatória e fere o princípio de isonomia. Os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Dias Toffoli e André Mendonça votaram pela inconstitucionalidade da alíquota. O relator, Luís Roberto Barroso, confirmou a legalidade e foi acompanhado pelos ministros Luiz Fux, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Nunes Marques.

Merval Pereira - Em busca do eleitor

O Globo

Entendimento de que a guerra de Lula contra o BC é a razão principal da melhora na popularidade pode levar a diagnóstico errado

Mais que mostrar a melhora na popularidade do presidente, o resultado da última pesquisa Quaest reafirma a sensibilidade de Lula em relação a seu eleitorado. À primeira vista, sua campanha contra os juros altos pode ser a responsável pelo crescimento, mas é preciso que se restrinja esse efeito aos cerca de 30% que tomaram conhecimento das críticas e entenderam que ela se refere ao aumento dos preços, este sim o grande problema.

Não adianta ter uma inflação controlada, em torno de 4% ao ano, se a inflação de alimentos vai a mais que o dobro disso. O entendimento de que a guerra de Lula contra o Banco Central é a razão principal da melhora na popularidade pode levar a um diagnóstico errado, fazendo com que o presidente dobre seu empenho nos ataques aos juros altos, que não trarão nenhum benefício direto. Ainda mais depois que Lula indicar o novo presidente do Banco Central, fazendo com que a expectativa seja de baixa dos juros.

Diego Werneck Arguelhes* - ‘Usurpação’, ‘revanche’ ou oportunismo?

O Globo

Constituição de 1988 deu a juízes independentes o poder de decidir se as leis respeitam direitos fundamentais

Um Supremo ativista “usurpou” poderes do Congresso? Ou congressistas conservadores estão apenas querendo “revanche” contra decisões de que discordam? Para avaliar as recentes movimentações do Congresso em temas como aborto e drogas, essas narrativas binárias não ajudam.

A Constituição de 1988 deu a juízes independentes o poder de decidir se as leis respeitam direitos fundamentais como igualdade, liberdade e saúde. A aplicação desses direitos sempre será controversa. Decisões judiciais sobre temas que dividem a sociedade também gerarão, elas mesmas, reações fortes. Isso não é sintoma de alguma disfunção no STF. Seu papel é decidir essas controvérsias com independência da política e com base na Constituição — mesmo sem conseguir convencer cidadãos, deputados e senadores a mudar de ideia.

Luiz Carlos Azedo - Os últimos dias do reinado de Lira

Correio Braziliense

Lira precisa do apoio de Bolsonaro e do PL para eleger seu candidato a presidente da Câmara, Elmar Nascimento, o que explica a sua agenda contraditória

Escrito no século XIX, no estilo romântico, Os Últimos Dias de Pompeia é um romance histórico do autor inglês Edward Bulwer-Lytton, datado de 1834. Retrata a vida na antiga cidade romana de Pompeia às vésperas de sua destruição, durante a erupção do Monte Vesúvio, no ano 79 d.C. Pompeia era uma cidade próspera e sofisticada, com uma população estimada em 20 mil habitantes.

Bulwer-Lytton fez um resgate histórico de hábitos alimentares, vestimentas, aspectos culturais mais complexos, como a diversidade de povos e costumes da cidade e os conflitos entre as crenças religiosas greco-romanas e o cristianismo primitivo, em meio à história fictícia do jovem ateniense Glaucus, do escravo Nídia e da bela aristocrata Júlia, em meio à decadência do Império Romano.

Míriam Leitão - Dívidas, lobbies e ajuste econômico

O Globo

A aprovação da regulamentação da Reforma Tributária e o avanço da renegociação das dívidas são ganhos, só é preciso ter cuidado com os termos que estão à mesa

A economia sempre tem muitas tarefas. Enquanto a Câmara negociou e aprovou a regulamentação da Reforma Tributária, o Senado apresentava uma proposta de renegociação da dívida dos estados, uma montanha de quase R$ 800 bilhões. Nem tudo é bom na reforma, mas a mudança que começará a ser preparada após toda a tramitação vai modernizar o sistema tributário. A proposta de renegociação das dívidas dos estados, da maneira como foi apresentada pelo senador Rodrigo Pacheco, aumenta a transferência de recursos federais para os maiores estados e impacta a dívida federal. O Tesouro deve estar presente desde o primeiro momento, não pode ser o último a ser ouvido.

Eduardo Belo - Um prêmio para Estados endividados

Valor Econômico

Sinalização do projeto de Rodrigo Pacheco é de que o compromisso fiscal do país continua frouxo e ao sabor da consciência e conveniência de quem está no cargo

O Brasil tem um histórico de leniência com a questão fiscal, em todos os níveis da administração pública. A forma paternal como a União trata os governos regionais muitas vezes estimula a inconsequência e, volta e meia, resulta em desequilíbrios profundos nas contas de Estados e municípios.

A nova rodada de renegociação de dívidas dos Estados que se desenha desde o início do governo Lula não é muito diferente. Mas a proposta do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, para favorecer algo como R$ 700 bilhões em dívidas soa como uma prêmio para filhos pródigos.

O projeto de lei de Pacheco aprofunda benefícios que o próprio Ministério da Fazenda estava disposto a conceder. A redução do indexador de IPCA mais 4% para IPCA puro e simples, por exemplo, é praticamente a institucionalização do juro real zero, algo bastante fora da realidade brasileira.

José Serra - Novos leilões de ferrovias com aporte público

O Estado de S. Paulo

A política precisa considerar a expansão das linhas férreas um projeto de Estado prioritário para o desenvolvimento sustentável do País

O Ministério dos Transportes tem demonstrado espírito de responsabilidade ao buscar novos recursos para viabilizar um programa de leilões no setor de ferrovias, visando a impulsionar o desenvolvimento da infraestrutura logística no País. Essa iniciativa representa não somente um compromisso real com a modernização e expansão das estradas de ferro, mas também uma estratégia fiscalmente sustentável de longo prazo para o futuro das ferrovias no Brasil.

Ao contrário de inúmeros programas governamentais que vendem o futuro vazio para obter aceitabilidade no momento presente, o programa do Ministério dos Transportes é baseado em planejamento sólido e transparente para o desenvolvimento do País. Essa abordagem responsável e visionária é o que nos permitirá transformar a infraestrutura ferroviária brasileira, trazendo benefícios concretos e duradouros para a sociedade.

William Waack – A volta à normalidade

O Estado de S. Paulo

As coisas parecem como sempre foram no País, em meio à grande mediocridade

Há um ar de modorrenta normalidade nos debates sobre a regulamentação da reforma tributária. Ela segue exatamente o caminho “lógico”: quem é mais organizado garante para si o que acha ser seu direito. Não há uma discernível noção de conjunto e o grosso volume da conta será pago no final com pesada carta tributária.

Congresso brasileiro é um fiel retrato dessa normalidade. Fora uma ou outra explosão de temas como aborto e saidinhas, trata-se de tocar os negócios como sempre foram tocados. Ou seja, é a representação de interesses regionais, setoriais ou corporativistas sem que se registre uma “força condutora” por parte de lideranças ou partidos nacionais.

Eugênio Bucci - Um nacionalismo internacionalista?

O Estado de S. Paulo

Forças xenófobas vêm se dedicando a promover encontros internacionais. Para quê? Ora, para celebrar a desunião e exacerbar o ódio contra qualquer forma de entendimento

A ideia do internacionalismo vem da esquerda. Apareceu no Manifesto Comunista, um pequeno livro assinado por dois jovens autores, Karl Marx e Friedrich Engels. Jovens de verdade: em fevereiro de 1848, quando a brochura incendiária foi lançada, Marx tinha 29 anos de idade e Engels, 28. O bordão que eles inventaram, “Proletários do mundo, uni-vos”, sobreviveu a ambos e demarcou o conceito.

No século 20, uma das incompatibilidades fatais entre Josef Stalin e Leon Trotsky passava exatamente por aí. O primeiro, já entronizado como tirano da União Soviética, abraçou (feito urso) a tese de que era possível erigir o socialismo num só país. O segundo, pulando de exílio em exílio, afirmava que a revolução socialista teria de ser internacional – ou não seria nem revolução, nem socialista.

Thiago Amparo - Não há extrema direita moderada

Folha de S. Paulo

Por trás dos debates semânticos está a tentativa de normalizar o extremismo

O que faz de nós brasileiros é a implacável capacidade de banalizar barbaridades. O esporte nacional neste país é justificar com voz mansa e sorriso no rosto a arma na cabeça de filhos de diplomatas, desde que negros, por óbvio, a legítima defesa do tiro de fuzil nas costas de João Pedro, de 14 anos, e, mais recentemente, o racismo da extrema direita europeia. Dos criadores do bolsonarismo moderado —movimento cujo slogan era uma arma executando opositores— fomos presenteados com o oxímoro do extremista moderado, desde que seja branco, por óbvio.

Ruy Castro - Pega ladrão!

Folha de S. Paulo

Bolsonaro reduziu o Planalto à caverna do Ali Babá. Mas até como contrabandista é um desastrado

Durante três anos de Bolsonaro, esta coluna o chamou de corruptor. De corruptor, não de corrupto. Embora fosse evidente sua prática de comprar o Exército para costurar o regime de força que viria no segundo mandato, não se sabia que roubasse além da prática familiar da rachadinha, que lhe rendeu mais de 50 imóveis. Só quase no quarto ano percebi o óbvio: não existe corruptor sem corrupção. Bolsonaro não estava usando seu dinheiro para subornar os militares. Estava usando dinheiro do Estado, e isso é corrupção.

Bruno Boghossian - Um governador complexo

Folha de S. Paulo

Comentário do governador já seria bizarro se estivesse em esquete sobre mediocridade da política fluminense

O governador do Rio encontrou um novo problema na segurança pública fluminense. O que incomoda Cláudio Castro, no entanto, está bem distante dos batalhões e das ações dos policiais nas ruas do estado

Nos últimos dias, o governador se lançou numa investida insólita contra a diplomacia brasileira. Castro criticou a postura do Itamaraty após a abordagem de três jovens negros em Ipanema, na semana passada. Na ocasião, policiais apontaram armas para os adolescentes, filhos de diplomatas estrangeiros. O ministério pediu desculpas às embaixadas.

Vinicius Torres Freire - Mais um calote de estados ricos

Folha de S. Paulo

Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, quer facilitar o calote de dívidas estaduais com a União

Imagine a leitora que o governo federal vá doar R$ 30 bilhões por ano aos estados. Esse dinheiro inexiste. Agora mesmo, o ministério da Fazenda pensa em mágicas e milagres para tapar parte do rombo das contas, que calcula em R$ 26 bilhões neste ano. A fim de doar, teria de tomar emprestado, a taxas de juros horríveis.

Em resumo, é o que propõe projeto de lei de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado. Por falar em grandes ideias, Pacheco também é autor da proposta de que seja crime, previsto na Constituição, a posse de qualquer droguinha, um plano de incentivo ao encarceramento em massa, entre outras degradações.

Paulo Fábio Dantas Neto* - A mensagem tricolor da República francesa

Na última década do século passado, Krzysztof Kieślowski, diretor de cinema polonês, brindou-nos com sua “Trilogia das cores”, uma sequência de três filmes (“A liberdade é azul”; “A  igualdade é branca”; “A fraternidade é vermelha”), alusiva à simbologia das cores da bandeira da França. Em linguagem metafórica, ele dramatizou sua percepção da experiência contemporânea com os valores constituintes do lema da revolução francesa. O modo personalíssimo como o artista imaginou a migração desses valores do universo das crenças políticas para o de relações interpessoais socialmente condicionadas não permite um uso direto de suas metáforas num comentário político, a não ser que o comentarista confesse, de saída, uma mera percepção desejosa, talvez mesmo idiossincrática. É o que faço agora, acrescentando que ela foi adquirida em contato leigo e já distante no tempo com aqueles filmes.

Das lembranças de tê-la visto, lá atrás, e do fato de agora ter buscado ler breves comentários sobre a trilogia, fixei-me numa hipótese de interpretação (decerto uma entre inúmeras que circularam à época): a de que, nos três filmes, as metáforas sugerem a impossibilidade de aproximação a esses ideais, caso desejados em estado de pureza ou plenitude. Tentativas levariam a experiências com obstáculos embaraçadores de sua realização. A liberdade (azul), diante de perdas e seus danos, não seria possível em isolamento face ao mundo; a igualdade (branca), perante diferenças de condição, não seria praticável sem os diferentes experimentarem, no sentimento, a condição do outro; a fraternidade (vermelha), na presença de sentimentos de solidão, ganharia sentido em relações insólitas, condutoras à compreensão compassiva de paralelos também não previstos entre dores do outro e as suas próprias.

Maria Hermínia Tavares - O progressismo possível

Folha de S. Paulo

Proposta sobre drogas desloca o tema da esfera criminal para a da saúde

Um realismo progressista teria sido a chave da folgada vitória do Partido Trabalhista britânico, pondo fim a 14 anos de domínio dos conservadores.

É o que argumenta, em artigo para a revista americana The Atlantic, a escritora e jornalista Anne Applebaum. Segundo ela, a receita vitoriosa consistiria em menos guerra ideológica, mais sintonia fina com as preocupações das pessoas comuns e uma linguagem capaz de chegar a elas.

Realismo, por sinal, é o que não tem faltado ao presidente Lula. Para isso, o empurram o seu conhecido tino político, o desenho de nossas instituições, que favorece a moderação política, bem como o fato de o PT e seus aliados de esquerda estarem longe de ser maioria no Congresso.

Cláudio Carraly* - Repensando a Política de Drogas: Liberação sob a Tutela do Estado

O contexto da política de drogas no Brasil tem sido marcado por décadas de discussões, mas o cenário atual revela uma crescente violência vinculada ao tráfico e um aumento notável no número de usuários de substâncias ilícitas. Diante desse quadro desafiador, emerge a provocativa ideia de transferir ao Estado o controle total da produção, distribuição, tributação e comercialização de drogas atualmente consideradas ilícitas, esta proposta, longe de ser apenas uma mudança na legislação, sugere uma profunda reestruturação na abordagem tradicional, transformando a guerra às drogas em ações de saúde pública e segurança.

O atual paradigma de repressão e punição tem se mostrado ineficiente na redução do consumo e no combate ao poder do tráfico, nesse contexto, é crucial considerar uma abordagem centrada na redução de danos, encarando a política sobre drogas como uma questão de saúde pública, a liberação total do consumo de drogas permitiria ao Estado não apenas certificar a qualidade e segurança dos produtos, mas também oferecer tratamento e apoio aos usuários, ao invés de simplesmente encarcerá-los conforme feito hoje.

Uma das vantagens evidentes dessa mudança de abordagem é a oportunidade de utilizar os recursos provenientes da venda legal das drogas em campanhas de conscientização e prevenção, essa verba poderia ser direcionada para essas campanhas alertando sobre os riscos do consumo, informando sobre os serviços de saúde disponíveis e reforçando a segurança pública em áreas afetadas pelo tráfico de drogas, os números do investimento em prevenção e tratamento podem ser o divisor de águas na eficácia dessas ações.

Poesia | João Cabral de Melo Neto - O Sertanejo Falando

 

Música | Mariana Aydar, Mestrinho e Jazz Sinfônica - Lamento Sertanejo

 

quarta-feira, 10 de julho de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Teimosia de Biden amplia favoritismo de Donald Trump

O Globo

Presidente americano não dá sinal de desistir da reeleição, apesar da pressão e das evidências de declínio cognitivo

O encontro que celebra os 75 anos da Organização do Tratado do Atlântico Norte acontece em Washington com todos os olhos voltados ao anfitrião, Joe Biden. O mundo vive uma situação crítica, com guerras na Ucrânia e no Oriente Médio, a ascensão de regimes autoritários e a pressão sobre a democracia por toda parte. E, apesar de tudo isso, a principal preocupação do governo da maior potência planetária é mostrar que Biden, aos 81 anos, tem plena capacidade cognitiva e silenciar quem exige que desista da reeleição.

O objetivo do debate na TV entre Biden e Donald Trump em junho era acabar com qualquer dúvida a respeito de suas faculdades mentais. A voz rouca e titubeante, as frases sem nexo e os silêncios repentinos surtiram o efeito oposto. Seu desempenho constrangedor e suas aparições posteriores só fizeram crescer a pressão para que abra mão da candidatura. Publicações de prestígio, como The Economist, The Wall Street Journal, The Boston Globe, The Washington Post ou The New York Times — este último duas vezes—, defenderam em editoriais a desistência de Biden. De acordo com pesquisa da CBS e da YouGov, 72% dos eleitores acham que ele não tem a saúde mental e cognitiva necessária para o cargo de presidente, sete pontos percentuais a mais que antes do debate. Num levantamento da Morning Consult, 60% defenderam a troca por outro candidato. Na sondagem New York Times/Siena College, Trump ampliou sua vantagem na preferência dos eleitores, abrindo diferença de seis pontos percentuais (49% contra 43%). Em todos os subgrupos — demográfico, geográfico ou ideológico —, a maioria considera Biden inepto ou senil.

Elio Gaspari - Milei é um provocador

O Globo

Lula perdeu tempo na segunda-feira ao responder às provocações do presidente argentino, Javier Milei, mesmo sem citá-lo. Foi diplomaticamente elíptico, mas, mesmo assim, era isso que Milei queria. O presidente hermano tornou-se uma ausência relevante na reunião do Mercosul em Assunção. Sua ausência teve peso superior a uma eventual presença. Para um presidente performático, melhor negócio não há.

As relações do Brasil com a Argentina sempre tiveram altos e baixos mas, pela primeira vez, numa das pontas está um provocador interessado em tirar proveito do tumulto. Caso típico de fanático sem causa.

O Brasil já se meteu nos assuntos argentinos impedindo que o ex-presidente Juan Perón descesse em Buenos Aires, em 1964. A Argentina, nos anos 1970, dedicou-se à tarefa impossível de barrar a construção da hidrelétrica de Itaipu. (As duas ditaduras só se entenderam quando colaboraram para sequestrar e assassinar brasileiros e argentinos.)

Bernardo Mello Franco - Tarcísio em Camboriú

O Globo

Governador usou encontro da extrema direita para se projetar como candidato em 2026

Na quinta passada, a Polícia Federal indiciou Jair Bolsonaro no inquérito das joias. Dois dias depois, Tarcísio de Freitas foi à quermesse da extrema direita em Balneário Camboriú. No palanque, ignorou o escândalo e se apresentou como um soldado a serviço do capitão.

“Nós tivemos um professor. Nós tivemos a oportunidade e o privilégio de conviver com o presidente Bolsonaro quando ele estava à frente do nosso Brasil. Quanta inspiração! Quanta motivação!”, derramou-se.

O governador descreveu o ex-chefe inelegível como um estadista injustiçado. “Ele nos ensinou a amar o verde e amarelo, a cantar o hino”, exaltou. Em seguida, disse se aconselhar com o padrinho para comandar o estado mais rico do país. “Ele é a pessoa que dá fortaleza para nós. É a pessoa a quem a gente recorre quando está com dúvida, quando está com problema”, adulou.

Luiz Carlos Azedo - Ao negociar dívidas, Pacheco empareda o governo

Correio Braziliense

Haverá uma queda de braços entre a Fazenda e os governadores, principalmente Tarcísio de Freitas (SP), Romeu Zema (MG), Cláudio Castro (RJ), Eduardo Leite (RS) e Ronaldo Caiado (GO).

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), apresentou proposta para renegociar dívida dos estados, o que pode fazer com que o governo perdoe R$ 28 bilhões por ano desses débitos. R$ 764,9 bilhões ficariam congelados. Segundo Pacheco, o objetivo é dar uma solução efetiva ao problema das dívidas dos estados, permitindo que eles façam investimentos e paguem os débitos com a União.

São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Goiás lideram a lista dos maiores devedores. Para Pacheco, “isso gera um grande desconforto, um grande problema nacional, com os estados perdendo sua capacidade de investimento, perdendo suas condições de sobrevivência”. O Programa de Pleno Pagamento da Dívida abre a possibilidade de os estados usarem seus ativos para o abatimento da dívida e propõe mudanças no seu indexador de correção. O senador Davi Alcolumbre (União-AP) será o relator do projeto.

Fernando Exman - Os caminhos para a PEC da Segurança Pública

Valor Econômico

Lewandowski e sua equipe buscaram produzir um texto simples e enxuto

Aguarda-se, em gabinetes dos três Poderes, uma decisão política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação ao destino da PEC da Segurança Pública.

Há urgência para combater o crime organizado. No Rio de Janeiro, facções já passaram a utilizar “drones” na guerra urbana, reproduzindo o terror vivido na Ucrânia e no Oriente Médio. É também crescente a preocupação de autoridades federais com o avanço desses grupos sobre as estruturas municipais de poder no pleito de outubro, sobretudo as câmaras de vereadores. Mas o envio da PEC pode acabar ocorrendo somente em agosto, depois do recesso parlamentar e antes do início formal da campanha eleitoral, evitando assim a contaminação da pauta legislativa no momento que a Câmara corre para concluir a regulamentação da reforma tributária.

Ainda assim, mantido esse cronograma, o governo demonstrará compromisso com o combate de um problema crônico em todas as regiões do país.

Lu Aiko Otta - Sem choque pelo lado das despesas

Valor Econômico

O corte a ser anunciado dia 22 funcionará como um termômetro da disposição do governo em cumprir as metas fiscais

Como na máxima do filósofo espanhol José Ortega y Gasset, o ajuste das contas públicas é ele e sua circunstância. Não será o que se espera, mas o que for possível.

Há exasperação nos bastidores da equipe econômica quando o mercado se agita diante dessa constatação. A leitura é que parece haver uma torcida por um choque no orçamento pelo lado das despesas.

Não será bem assim, avisa-se. A opção é por “fazer o ajuste de maneira justa”, e não partir para o “tudo ou nada” que parece ser cobrado.

Num governo de DNA avesso à austeridade fiscal, emparedado por taxas modestas de popularidade e sem base de apoio em um Congresso Nacional cada vez mais empoderado, o ajuste fiscal tende a ser feito como o consumo de um prato de mingau quente: pelas bordas e aos poucos.

Fábio Alves - O bloqueio, a meta e Lula


O Estado de S. Paulo

Circulou nos bastidores a disposição do governo de anunciar bloqueio de R$ 10 bilhões, o que não seria suficiente

Mesmo com as declarações recentes do presidente Lula e do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o cenário ainda é o de que a pressão de alta sobre as expectativas de inflação e de desvalorização do câmbio deve prosseguir. Isso porque quase ninguém hoje aposta que o governo irá anunciar um bloqueio de gastos no valor necessário para dissipar totalmente o temor de que, até o fim do ano, a meta fiscal de déficit primário zero em 2024 será alterada.

Na semana passada, o dólar chegou perto de R$ 5,70 no auge das críticas de Lula ao Banco Central e de suas declarações indicando resistência a cortar gastos. Com o estresse, Lula interrompeu os ataques ao BC e mudou de tom em relação ao fiscal, autorizando, após reunião com Haddad, o corte de quase R$ 26 bilhões para 2025 em despesas obrigatórias com um pente-fino em cadastros de benefícios sociais.

Zeina Latif - As diferentes respostas da política

O Globo

O populismo não entregou o prometido, vida digna a todos e prosperidade. Melhor buscar concorrência e renovação da política

O embate entre esquerda e direita não parece ser a melhor forma de analisar o cenário político no mundo – e tampouco no Brasil, onde a diferença programática entre os partidos é opaca e as classes populares desconfiam das elites.

Nas últimas eleições parlamentares na Europa, prevaleceu o desejo de mudança por conta da decepção de eleitores com os governantes, acrescido do sentimento de vulnerabilidade diante de temas diversos, como questões ambientais, geopolíticas e de empregabilidade dos trabalhadores pelo uso de novas tecnologias.

Há muita inquietação, inclusive com apelo para o populismo, e não exatamente simpatia pela esquerda.

No Reino Unido, os Trabalhistas derrotaram o Partido Conservador de forma esmagadora, após 14 anos de governo. Não sem razão. Ficou claro para a sociedade o alto custo econômico do Brexit, quadro agravado pela inflação alta e pela insatisfação com a saúde pública na Inglaterra.

Mansueto Almeida* - Contas públicas são desafio ao país

O Globo

Desequilíbrio das contas pode atrapalhar o crescimento, nos levar a um cenário de juros altos e inflação fora da meta

É preciso que todos entendam que temos um problema fiscal no Brasil e que esse desequilíbrio das contas pode atrapalhar o crescimento, nos levar a um cenário de juros altos e inflação fora da meta. Nesse cenário, todos perdem.

O Brasil tem hoje um déficit primário estrutural (receita menos despesas do governo central sem incluir pagamento de juros) por volta de 1% do PIB e, quando se inclui o pagamento de juros, um déficit nominal de mais de 6% do PIB. Com esses números, mesmo com crescimento da economia entre 2% e 2,5% ao ano, a dívida bruta e a dívida líquida do setor público crescerão todos os anos neste governo.

Terminaremos o atual mandato presidencial, em 2026, com a dívida bruta em 82% do Produto Interno Bruto (PIB), crescimento de pelo menos dez pontos em relação a 2022. Esse ritmo de crescimento da dívida não é sustentável no médio e longo prazos.

O ajuste fiscal necessário para colocarmos as dívidas bruta e líquida numa trajetória de queda é de pelo menos três pontos do PIB (R$ 350 bilhões) — e precisa ser feito ao longo dos anos. Fazer ajuste fiscal não é mágica. Envolve, necessariamente, aumento de receita e/ou corte de despesas.

Vinicius Torres Freire - A república não é a do Brasil

Folha de S. Paulo

Política francesa entretém e alarma, mas líder golpista é o maior cabo eleitoral neste país

Alguns brasileiros estamos entretidos com as reviravoltas da política francesa. Alguns estivemos alarmados com as ameaças à liberdade, à igualdade, à fraternidade e à dignidade humana em geral, postas em risco pela possibilidade de vitória do partido Reunião Nacional, de Marine Le Pen, de ultradireita ou o nome que se dê.

Um rótulo político qualquer não vai esconder que se trata de um partido adversário da república, ideia para a qual jamais demos muita bola, mas que na França ainda comove muita gente. A república envolve princípios e direitos reais e muito caros para massas de pessoas; sua instituição periclitou por um século e meio e custou muito sangue e guerra civil.

Faz menos de dois anos, vimos aqui no Brasil assaltos até contra o direito de termos um sistema eleitoral democrático, que é um meio para se chegar a uma democracia substantiva e à república.

Bruno Boghossian - O 'caixa dois' das joias

Folha de S. Paulo

Em áudio obtido pelos investigadores, chefe de departamento diz que alguns presentes não eram registrados oficialmente

Polícia Federal descreve no inquérito das joias o funcionamento de uma máquina que reproduz marcas conhecidas da relação de Jair Bolsonaro com o poder. Uma delas é o uso das estruturas oficiais do governo para fins particulares. Outra é a confusão deliberada entre bens públicos e patrimônio privado.

Esses dois desvios aparecem no que poderia ser descrito como uma espécie de "caixa dois" de presentes recebidos pelo então presidente. Segundo a PF, o departamento responsável pela catalogação desses bens deixava de registrar certos itens quando Bolsonaro manifestava interesse neles.

Hélio Schwartsman - Irredutivelmente autoritário

Folha de S. Paulo

Política de governo paulista para cracolândia abusa de internações involuntárias, que deveriam ser excepcionais

Deu na Folha que o número de internações involuntárias de usuários de crack na capital paulista disparou no último ano. Ao que tudo indica, isso é um reflexo da política de combate às drogas adotada pelo governo de Tarcísio de Freitas.

Há poucas coisas tão complexas e difíceis quanto os transtornos mentais. Se, em condições normais, a marca do ser humano já é a diversidade, ela ganha escala logarítmica quando falamos de doenças mentais.

Aí, cada caso é um caso. O que funciona para um paciente ou mesmo para muitos pacientes não funciona para outro grupo, de modo que o sistema precisa ter abertura para lidar com múltiplas situações.

Wilson Gomes - O dilema de Marine Le Pen

Folha de S. Paulo

Se os franceses se entregarão ao canto dessa sereia, o tempo é quem dirá

É raro, mas acontece muito. Debates tipicamente acadêmicos entre especialistas na nova onda de partidos e movimentos extremistas no mundo se tornam temas de divergências no jornalismo.

Em toda parte, acontece o debate se Marine Le Pen e seu partido devem continuar sendo classificados como de extrema direita ou se, após um enorme esforço de reabilitação de imagem, agora podem ser considerados como uma direita republicana, ainda que nacionalista.

A "desdiabolização", para usar a expressão que os franceses empregam, é um tipo de normalização que consiste na remoção de certas características presentes em uma imagem pública, no deslocamento de outras para o segundo plano ou na adição de novos predicados que tornem o partido ou movimento mais palatável ao gosto médio dos eleitores.

No caso francês, foi crucial a remoção do antissemitismo, antissionismo e do racialismo, a moderação dos radicais do partido, a oferta de políticas sociais e um novo discurso sobre gênero.

É preciso reconhecer que Marine Le Pen fez um esforço explícito e consciente para reabilitar o movimento herdado do pai, Jean-Marie. Sinal de que entendeu que não havia esperanças de superar o sarrafo republicano ainda alto da maioria dos franceses com uma oferta ideológica que seduzia apenas os feios, sujos e malvados.

Poesia | Soneto XVII, de Pablo Neruda

 

Música | Boca Livre - Ponteio (Edú Lobo e Capinan)

 

terça-feira, 9 de julho de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Voto útil barrou extrema direita, mas enfraqueceu Macron

O Globo

Estratégia funcionou para deter avanço do RN. Persiste, porém, incerteza sobre o futuro na França

A estratégia do voto útil, que uniu legendas da centro-direita à extrema esquerda nas eleições legislativas da França, conseguiu barrar a vitória do Reunião Nacional (RN), de extrema direita. Com um comparecimento eleitoral recorde de 67%, os franceses mais uma vez impuseram um limite à ascensão ao poder do partido extremista, que saíra vitorioso no primeiro turno. O RN registrou um crescimento histórico e obteve 143 das 577 cadeiras da Assembleia Nacional — ou 25%, percentual que só havia superado no segundo turno de eleições presidenciais —, mas ficou longe do primeiro lugar e da maioria absoluta que pareciam a seu alcance.

Ainda que tenham se dissipado os temores sobre uma vitória do RN, ainda persiste a ansiedade sobre o futuro. Nenhum grupo obteve a maioria necessária para formar um governo. A coalizão mais votada, do esquerdista Nova Frente Popular (NFP), somou 182 deputados. Mas trata-de de um grupo heterogêneo. Fazem parte dele a legenda de extrema esquerda França Insubmissa (FI), com 74 deputados desse total, os socialistas, com 59, os verdes, comunistas e outros partidos, com 47. Em segundo lugar ficou o grupo de centro do presidente Emmanuel Macron, com 168 deputados. Em terceiro, o RN.

Pedro Cafardo - Real foi um plano genial, mas não perfeito

Valor Econômico

Justas homenagens sobre os 30 anos da estabilização monetária pecaram pela falta de crítica aos problemas que o plano não conseguiu resolver

O país comemorou nas últimas semanas os 30 anos do Plano Real, que livrou os brasileiros da hiperinflação. Foram justas as comemorações e corretos os inúmeros elogios ao grupo de jovens economistas que estruturaram o plano, hoje todos com cabelos brancos.

Justas e apropriadas foram também as homenagens ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, na época ministro da Fazenda e braço firme de sustentação do programa perante o governo do então presidente Itamar Franco.

Até o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um dos críticos do plano naquela época, visitou Fernando Henrique, hoje com 93 anos, num implícito reconhecimento de sua posição equivocada 30 anos atrás.

Quem viveu aqueles anos terríveis em que as remarcações eram contínuas e os salários não acompanhavam a corrida dos preços tem a obrigação de testemunhar a genialidade do modelo que promoveu a estabilização monetária no país. Aquilo ressuscitou o Brasil.

Andrea Jubé - Lula testa novo bordão para evangélicos

Valor Econômico

Aposta agora é no uso da palavra ‘família’

Sem alarde, enquanto as atenções voltavam-se para suas declarações sobre o equilíbrio fiscal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva começou a testar, há poucos dias, uma nova estratégia para tentar melhorar a interlocução com a população evangélica. Esse público representa cerca de um terço dos brasileiros e aderiu em massa ao bolsonarismo.

“Se tem uma coisa que eu aprendi com a [minha mãe] dona Lindu foi responsabilidade fiscal, cuidar do meu pagamento, cuidar do meu salário, cuidar da minha família”, discursou Lula na sexta-feira (5), na inauguração de novo prédio da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em Osasco (SP). “E hoje a minha família é o Brasil”, exaltou.

Carlos Andreazza - Orçamento secreto imbrochável

O Estado de S. Paulo

De Bolsonaro a Lula, sempre com Lira e Alcolumbre, Parlamentarismo orçamentário vigente não perde a energia

Imbrochável mesmo – com “tesão de 20 anos” – é o Parlamentarismo orçamentário vigente. De Bolsonaro a Lula, sempre com Lira e Alcolumbre, sem perder a energia. Aula de transição e continuidade.

Marca das gestões dessa rapaziada à frente do Congresso? A institucionalização do orçamento secreto, ora já sob a terceira fachada. O Parlamento administrador de fundos orçamentários crescentes sobre cujos usos pervertidos não tem qualquer responsabilidade.

Atenção ao que se arma. As regulamentações da reforma tributária como objeto circunstancial para os negócios. A instrumentalização das pressas a todo vapor. Tem de aprovar antes do recesso. Corrida de dez dias. Emboladas as jorrações dos bilhões em emendas e dos lobbies pela cesta básica – imposto do pecado para os outros pecadores. Ninguém reclamará agora do regime de urgências. É pela boa causa.