quarta-feira, 10 de julho de 2024

Fernando Exman - Os caminhos para a PEC da Segurança Pública

Valor Econômico

Lewandowski e sua equipe buscaram produzir um texto simples e enxuto

Aguarda-se, em gabinetes dos três Poderes, uma decisão política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação ao destino da PEC da Segurança Pública.

Há urgência para combater o crime organizado. No Rio de Janeiro, facções já passaram a utilizar “drones” na guerra urbana, reproduzindo o terror vivido na Ucrânia e no Oriente Médio. É também crescente a preocupação de autoridades federais com o avanço desses grupos sobre as estruturas municipais de poder no pleito de outubro, sobretudo as câmaras de vereadores. Mas o envio da PEC pode acabar ocorrendo somente em agosto, depois do recesso parlamentar e antes do início formal da campanha eleitoral, evitando assim a contaminação da pauta legislativa no momento que a Câmara corre para concluir a regulamentação da reforma tributária.

Ainda assim, mantido esse cronograma, o governo demonstrará compromisso com o combate de um problema crônico em todas as regiões do país.

Não é novidade que a área se tornou também uma questão eleitoral. Pesquisas recentes apontam que a má avaliação do governo federal é puxada, principalmente, pelas áreas de segurança pública e saúde, além da inflação e do desemprego. Levantamento do Ipec divulgado em abril, por exemplo, apurou que elas têm avaliação ruim ou péssima para 42% de entrevistados. Nesse contexto, dizem interlocutores do presidente, candidatos aliados poderiam aproveitar a PEC como bandeira durante a campanha, unindo-a a outras duas propostas: a implementação de câmeras corporais pelas guardas municipais e a ampliação da segurança nas escolas para impedir atos de violência.

Formulada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, a minuta foi encaminhada para análise da Casa Civil há cerca de duas semanas e está em maturação. Não enfrenta problemas do ponto de vista técnico, mas ainda será preciso observar se ministros que foram governadores, os quais Lula tem provocado a discutir internamente o assunto, apresentarão grandes objeções à ideia.

O presidente já foi alertado que pode haver resistências nesse sentido. Na semana passada, durante viagem à Bahia, elogiou durante uma entrevista a iniciativa do ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, mas logo demonstrou estar ciente dos potenciais obstáculos. Garantiu que a ideia não é ter uma ingerência do governo federal nos Estados.

Até por isso Lewandowski e sua equipe buscaram produzir um texto simples e enxuto. A PEC constitucionaliza o Sistema Único de Segurança Público (Susp), de maneira a permitir que a União defina diretrizes para algumas políticas, crie um sistema nacional para padronizar o registro de boletins de ocorrência e outro para a emissão de antecedentes criminais.

O plano também é garantir maior estrutura para a Polícia Federal (PF) investigar o crime organizado e sua estruturação financeira e, em outra frente, dar mais competências, orçamento e equipamentos para a Polícia Rodoviária Federal (PRF). Qual apoiador do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) criticaria isso?

Ocorreriam novas contratações. Do ponto de vista financeiro, uma das medidas em estudo é dar mais flexibilidade ao uso de recursos dos fundos constitucionais, o que poderia mitigar os impactos fiscais.

A PRF seria rebatizada. O nome ainda é desconhecido e, nas palavras de uma fonte, “isso é o de menos”. O importante é que a corporação agregaria, além da divisão Rodoviária, outros departamentos para assumir o policiamento ostensivo de ferrovias, hidrovias e portos. A meta é sufocar financeiramente as organizações criminosas, além de atacar todas as rotas e o sistema logístico que elas utilizam.

No governo, a expectativa é que o atual formato da PEC não seja bombardeado pela oposição. Mas um ponto de atenção deve ser a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. O colegiado será presidido pela oposição pelo menos até fevereiro do ano que vem. E é nele que a admissibilidade das PECs é analisada, ou seja, quando elas não violam cláusulas pétreas da Constituição - forma federativa de Estado; voto direto, secreto, universal e periódico; separação dos Poderes; e os direitos e garantias individuais dos cidadãos. Sempre haverá quem aponte desrespeito em relação à forma federativa do Estado. A base terá que se organizar.

A CCJ da Câmara também tem sido um ambiente fértil para a oposição pautar propostas caras ao eleitorado conservador. Enquanto o Ministério da Justiça redigia a PEC da Segurança Pública, articuladores políticos do Palácio do Planalto percebiam que uma ala mais radical da Câmara se preparava para fazer sua próxima investida. Não tardou para os repórteres Marcelo Ribeiro e Raphael Di Cunto, do Valor, revelarem que a presidente da CCJ, deputada Caroline de Toni (PL-SC), desengavetara um projeto que propõe a convocação de um plebiscito sobre a redução da maioridade penal. A matéria estava parada há quase cinco anos.

A notícia positiva é que no Senado já há um movimento a favor da PEC. Se o Planalto desistir de enviar a proposta ao Parlamento, aliás, é bem possível que o texto seja encampado pelos parlamentares e apresentado diretamente por lá. Neste caso, além de perder um precioso tempo, o Palácio do Planalto corre o risco de compartilhar o bônus político com o Congresso. É também por isso que alguns governistas têm interesse em acelerar os trâmites burocráticos do Palácio do Planalto.

 

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