quinta-feira, 21 de novembro de 2019

Opinião do dia - Paulo Fábio Dantas Neto*

Além de formar a frente democrática, um desafio à política positiva é ser eficaz na conjuntura. Seus praticantes não podem ser uma zaga que olha para a bola, com foco eleitoral em 2022, sem marcar o atacante demolidor. Ataques do capitão convertem consensos civis em dissensos selvagens, rebaixando crenças democráticas, mesmo se ficam na ameaça. Por isso dão razões para processos de denúncia formal e pedidos de impeachment.

O realismo político descarta essa via legal preventiva, ainda mais com Lula solto. O script racional da sua política atual é negar tudo o que está no governo, mas complementa o script de um governo que nega a complexidade legal e social do País. O quadro é favorável a essa mútua negatividade bipolar. A campanha de 2022 já começou e a frente da política positiva não se construirá em ritmo de valsa. Tocando dobrado, terá de encarnar numa liderança a ideia de centro político, como em outros tempos encarnou em Tancredo e Ulysses, em FHC e no ex-Lula. Como não existe liderança natural, ela só pode sair de acordo político em torno de quem mais unir os fragmentos que hoje se supõe representarem 40% do eleitorado.

Para desmentir quem chamar essa solução de conluio sem programa, a voz do centro unificado precisará combinar realismo político, convicção democrática, responsabilidade econômica, pluralismo cultural e forte compromisso com reforma social. Para quem achar essa combinação impossível, ou indesejável, é simples: dobrar a aposta e alinhar-se a Lula ou a Bolsonaro.

*Cientista político, é professor da Universidade Federal da Bahia, - ‘Política negativa e política positiva’, O Estado de S. Paulo, 20/11/2019

Merval Pereira – Antes tarde do que nunca

- O Globo

Aras está tendo atuação impecável para quem entrou no cargo sob a suspeita de que seria mais um ‘engavetador-geral’

O voto do ministro Dias Toffoli começou a recolocar nos trilhos o Supremo Tribunal Federal (STF) que preside, dando, quatro meses depois, detalhes cruciais de sua liminar que acabou suspendendo os inquéritos baseados em informes do antigo Coaf (hoje Unidade de Inteligência Financeira) e da Receita Federal.

Embora tenha surpreendido a todos por ter dado uma reformulada nos termos de sua decisão inicial em linguagem sinuosa, o presidente do Supremo abriu caminho para a retomada do compartilhamento de dados entre os órgãos de fiscalização e os de investigação.

Os esclarecimentos de Toffoli começaram ao dizer que em nenhum momento impediu que os inquéritos prosseguissem, atribuindo a agentes públicos mal intencionados e a órgãos de imprensa usando de terrorismo as informações nesse sentido, segundo ele, erradas.

Bom saber disso, só estranhável que tenha levado tanto tempo para explicar. Se constatou que sua liminar estava sendo usada indevidamente, para atribuir a ele a obstrução das investigações de lavagem de dinheiro e corrupção, deveria o presidente do Supremo ter expedido uma nota oficial alertando para o equívoco, ou convocado uma entrevista coletiva para acabar com o “terrorismo” da imprensa.

Bernardo Mello Franco - Um ministro contra a República

- O Globo

O ministro Abraham Weintraub é um fanfarrão em tempo integral. Não descansa nem nos feriados. No 15 de Novembro, ele resolveu praguejar contra a República

O ministro da Educação, Abraham Weintraub, é um fanfarrão em tempo integral. Não dá trégua nem nos feriados. Na semana passada, ele tirou o 15 de Novembro para praguejar contra a República. “O que diabos estamos comemorando hoje? Há 130 anos foi cometida uma infâmia”, escreveu, nas redes sociais.

Uma seguidora respondeu que, em caso de volta da monarquia, o ministro seria nomeado bobo da corte. Ele se destemperou e reagiu como um menino enfezado: “Eu prefiro cuidar dos estábulos. Ficaria mais perto da égua sarnenta e desdentada da sua mãe”.

Falta de decoro à parte, a fala de Weintraub mostrou que a monarquia está em alta no bolsonarismo. As bandeiras do Império reapareceram nas manifestações a favor do impeachment de Dilma Rousseff. Eram empunhadas por grupos pequenos, que depois se incorporaram à campanha pelo atual presidente.

Guga Chacra - Bolsonaro se espelha em Orbán

- O Globo

O desafio será fazer em poucos anos o que o partido húngaro levou décadas para conseguir

Uma das maiores diferenças entre Jair Bolsonaro e líderes nacionalistas da direita internacional está na sua incapacidade de, ao menos até agora, ter conseguido construir um partido poderoso ou liderar uma agremiação pré-existente com força política para governar o Brasil. O presidente sequer integra uma sigla e apenas ambiciona lançar a Aliança pelo Brasil.

Basta observar lideranças populistas ao redor do planeta para ver o contraste. O húngaro Viktor Orbán, que talvez seja o mais bem-sucedido de todos, comanda o Fidesz. Este partido de direita conservadora nacionalista, que significa Aliança Cívica da Hungria, serve de exemplo para Bolsonaro com a sua ainda inexistente Aliança pelo Brasil. A diferença é que esta agremiação húngara surgiu como liberal nos anos 1980 para se opor ao regime comunista. Demorou anos para ser construída. Orbán assumiu o comando no final da década seguinte e foi um premier relativamente moderado até 2002, quando voltou para a oposição.

Ao longo dos oito anos seguintes, Orbán se tornou um vanguardista ao dar uma guinada nacionalista de direita, abdicando do liberalismo. Retornou ao poder com o Fidesz em 2010 e implementou o que ele próprio chama de democracia “iliberal”, com uma agenda ultraconservadora, contra o liberalismo — com o sentido americano de “progressista” da palavra. Virou símbolo do “antiglobalismo”, ou soberanismo. Das 199 cadeiras da Assembleia Nacional em Budapeste, o partido tem 117. Junto com um parceiro menor, a coalizão alcança 133 assentos, ou cerca de dois terços do total. Algo incomparável a Bolsonaro no Brasil.

Míriam Leitão - O esforço de fato e a promessa irreal

- O Globo

Na área fiscal, há boas notícias. Governo evitou relaxar a meta de déficit primário e terá o melhor resultado em cinco anos nas contas públicas

O melhor resultado primário em cinco anos é para se comemorar. E há mais notícia boa: o BNDES vai pagar R$ 40 bilhões da dívida que tem junto ao governo e isso será usado para abater dívida pública. “Será 0,4% do PIB de redução de dívida”, diz um integrante da equipe econômica. O resultado, contudo, mostra também alguns dos defeitos da maneira do Brasil de gastar.

Não apenas do governo federal. Imagine, por exemplo, o Funpen, um fundo de segurança pública que dá dinheiro a fundo perdido aos estados que queiram construir presídios. Todo ano sobra dinheiro, e o Brasil tem presídios dantescos.

Os governadores não querem construir, mesmo de graça, porque isso elevará os gastos correntes dos anos e décadas seguintes na manutenção do presídio.

Há dinheiro que não é usado porque o serviço não aconteceu por falha de gestão ou é investimento que o governante não quis executar. O descontingenciamento no fim do ano acaba na verdade virando corte porque o que não foi feito não tem mais tempo hábil.

Luiz Carlos Azedo - Que partido é esse?

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“O xis da questão do novo partido que será criado hoje pelo presidente Jair Bolsonaro é o seu ideário programático, ou seja, seu real compromisso com a ordem democrática”

Com 30 deputados, liderados por Eduardo Bolsonaro (SP), e um senador, Flávio Bolsonaro (RJ), o presidente Jair Bolsonaro deve fundar hoje, em convenção nacional, a Aliança pelo Brasil, seu novo partido, consolidando o rompimento com o PSL, de Luciano Bivar (PE). A criação da nova legenda está na contramão da legislação partidária vigente, que força a redução do número de partidos, por meio da cláusula de barreira, e do fim das coligações nas eleições proporcionais. O desafio da criação do novo partido não é a arregimentar quase 500 mil filiados em todo país, mas a transferência dos parlamentares do PSL para a nova legenda, anunciada ontem pelo líder do governo na Câmara, deputado Vitor Hugo (GO), sem perda de mandato, e também a obtenção de recursos do fundo partidário.

Bolsonaro não terá dificuldade para estruturar o partido nos estados e municípios, porque conta com apoio de grupos organizados nas redes sociais com grande poder de mobilização: evangélicos, caminhoneiros, garimpeiros, milicianos, agentes de segurança, militares reformados, etc. Tem a seu favor uma base eleitoral ainda muito robusta, apesar da relativa perda de popularidade, por causa do natural desgaste nos primeiros 10 meses de governo. Ou seja, conta com militantes e lastro eleitoral para viabilizar seu projeto. Ideologicamente, o perfil do partido também está resolvido: será uma organização política de direita, com viés reacionário, que mistura religião com política, ideias conservadoras e nacionalistas, de combate aberto à esquerda e aos movimentos identitários.

Sem dúvida, trata-se de uma nova direita. A narrativa política do novo partido, porém, lembra a radicalização política que antecedeu a II Guerra Mundial aqui no Brasil. Naquela época, na Europa, a carnificina havida na I Guerra Mundial (1914-1918) e a Grande Depressão de 1929 serviram de caldo de cultura para o surgimento de partidos de massas de direita, principalmente o fascista, na Itália, e o nazista, na Alemanha, que se opuseram aos social-democratas, socialistas e comunistas. No Brasil, essa polarização foi representada pela Aliança Nacional Libertadora (ANL), encabeçada pelo líder comunista Luiz Carlos Prestes, e pela Ação Integralista Brasileira (AIB), de Plínio Salgado. Essa radicalização resultou na chamada Intentona Comunista, de 1935, após a dissolução da ANL por Getúlio Vargas, e no Levante Integralista de 1938, após a instauração do Estado Novo, contra o qual os integralistas se insurgiram, atacando o Palácio Guanabara, por causa da dissolução da AIB. Em ambos os casos, houve mortos, feridos e milhares de ativistas presos.

Ricardo Noblat - Quando o porteiro mentiu?

- Blog do Noblat | Veja 

História mal contada
As polícias Federal e Civil do Rio de Janeiro estão empenhadas em descobrir quando foi que mentiu o porteiro do Condomínio Vivendas da Barra, onde têm casas Jair Bolsonaro (duas) e Ronni Lessa, o miliciano acusado da morte da vereadora Marielle Franco.

O porteiro mentiu no dia 7 de outubro último, e dois dias depois, quando disse e repetiu à Polícia Civil que em 14 de março de 2018 “seu Jair” autorizara a entrada no condomínio de Élcio Queiroz, também acusado da morte de Marielle?

Ou o porteiro mentiu anteontem à Polícia Federal ao negar que “seu Jair” tenha autorizado a entrada? À Polícia Federal, ele disse que em 14 de março de 2018 anotara errado o número da casa para onde Queiroz pretendia ir. Não foi a casa 58, mas a 66.

Na 58 morava Bolsonaro, ainda deputado federal. Na 66, Lessa. Queiroz chegou ao condomínio no final da tarde daquele dia. Saiu dali com Lessa. Horas mais tarde, Marielle foi executada a tiros no centro do Rio. Morreu também seu motorista, Anderson.

Por que o porteiro teria mentido nos dois depoimentos de outubro à Polícia Civil? Segundo ele contou à Federal, porque não quis admitir que errara ao registrar no livro da portaria do condomínio que o destino de Queiroz era a casa 58, e não a 66.

Que dizer: à Polícia Civil, mesmo sabendo que “seu Jair” já não era um mero deputado, mas o presidente da República, o porteiro, ao invés de confessar um erro de anotação, preferiu inventar a história de que “seu Jair” liberou a entrada de Queiroz.

Ora, ora, ora. Faz sentido? Em tempo: no dia da morte de Marielle, Bolsonaro estava em Brasília. Carlos Bolsonaro, que mora na outra casa do pai, estava no Rio, mas não em casa na hora em que Queiroz pediu licença para entrar no condomínio. É o que ele diz.

Segue o baile.

Maria Cristina Fernandes - Instinto de sobrevivência

- Valor Econômico

Suscitado pelos instintos mais primitivos, o extremismo bolsonarista só poderá ser moderado pela chance de sobrevivência na política

Em agosto, depois das críticas do ex-presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Ricardo Galvão, aos dados preliminares de que as queimadas na Amazônia haviam aumentado, o presidente da República demitiu o cientista, culpou organizações não- governamentais pelo fogo na mata e acusou governadores de conivência com o incêndio das florestas.

Três meses depois, Jair Bolsonaro, ao ser questionado pelos dados do mesmo Inpe que indicam desmatamento apontou o dedo para a gestão da ex-ministra Marina Silva no Meio Ambiente, quando se registrou um dado um terço superior ao desmatamento atual, disse que se trata de uma questão “cultural” e sugeriu que identificação da titularidade das propriedades nas florestas facilitará a responsabilização de seus autores. Ainda não está claro como, além de beneficiar grileiros, a medida pode vir a proteger o meio ambiente, mas o gesto traz menos danos à imagem do Brasil no exterior do que a demissão do presidente do Inpe.

O dinheiro e a política baixaram a bola e o tom do discurso e da ação governamental. Não é um Bolsonaro paz e amor que parece estar em curso, mas uma segmentação do seu comportamento para plateias e fins específicos e uma calibragem maquiada das políticas de governo - e não apenas ambientais - guiada pelo instinto de sobrevivência.

Ribamar Oliveira - Receita atípica bate recorde neste ano

- Valor Econômico

Os leilões de petróleo salvaram o governo mais uma vez

A União vai registrar, neste ano, um novo recorde. A receita atípica ou não recorrente (aquela que não se repete nos anos seguintes) será a maior da história e ficará próxima de R$ 100 bilhões. A arrecadação obtida com os leilões de petróleo, principalmente, salvou o governo mais uma vez, compensando com sobras a queda da receita com tributos em relação ao que estava previsto no Orçamento.

Mesmo com toda a arrecadação extra, o governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) deverá fechar um ano com déficit primário pouco abaixo de R$ 80 bilhões, de acordo com previsão do ministro da Economia, Paulo Guedes. Isso corresponde a mais de 1% do Produto Interno Bruto (PIB), o que é um “buraco” considerável, mostrando que um superávit primário, mesmo que pequeno, ainda está longe de ser obtido.

A receita atípica recorde ajudou o governo não só a melhorar o resultado primário deste ano, como também permitiu descontingenciamento das dotações orçamentárias, que estava sufocando os ministérios. Neste ano, o corte de verbas foi provocado pela frustração das receitas tributárias, e não pelo teto de gastos. Assim, as receitas não recorrentes ajudaram o governo a sair do aperto.

Pedro Cavalcanti Ferreira/ Renato Fragelli Cardoso* -Tributar mais para distribuir?

- Valor Econômico

Além da má distribuição de renda quando tributa, o Estado não prioriza os pobres ao gastar os recursos arrecadados

Neste momento em que a má distribuição de renda no mundo e no Brasil tem suscitado propostas agressivas de elevação de impostos, é preciso uma discussão objetiva sobre o tema da desigualdade.

O primeiro passo é compreender o inevitável conflito entre prosperidade e equidade. Para se gerar prosperidade, entendida como uma abundante produção física, é preciso eficiência na atividade produtiva. Esta resulta dos incentivos econômicos proporcionados pela economia de mercado. Neste regime econômico, entretanto, os cidadãos mais aptos, tudo mais constante, levam vantagem, de modo que a prosperidade traz consigo a desigualdade. Decorre desse conflito estrutural que, para se conciliar prosperidade com equidade, é preciso sacrificar parcialmente cada um dos dois objetivos, no intuito de se assegurar um pouco de ambos.

Cabe ao Estado tributar os cidadãos que mais se beneficiam da economia de mercado, transferindo os recursos para os menos capacitados ou para aqueles que por algum motivo externo - como choques negativos, falta de oportunidade, obstáculos institucionais, etc. - ficaram para trás. A tributação, por reduzir incentivos ao trabalho e ao empreendedorismo, reduz a prosperidade, mas é o preço a pagar para se diminuir a desigualdade.

Maria Hermínia Tavares* - Os chilenos se falam

- Folha de S. Paulo

Lá, como em outras partes, a radicalização serve à direita

É impossível —e, portanto, inútil— querer decifrar os motivos que continuam levando milhões de chilenos às ruas há quatro semanas. Como sempre, quando uma gigantesca massa humana se põe em movimento, nestes dias no Chile e em Hong Kong, ou em 2013 no Brasil, as razões são certamente múltiplas. E o melhor —e o muito pouco— que se pode dizer é que na sua origem pulsa um sentimento muito forte de injustiça. Tampouco conhecemos o ponto de ebulição que transforma um mal-estar difuso em protesto social multitudinário.

Por isso, vale mais a pena acompanhar a reação do sistema político à força e à cacofonia das ruas —uma reação que diz muito da maneira como governo e oposição jogam o jogo da democracia no Chile.

Enquanto a primeira-dama do país, trocando mensagens com uma amiga, se perguntava se as ruas de Santiago haviam sido tomadas por alienígenas, o presidente Sebastián Piñera, eleito pela direita, ordenou violenta repressão que deixou mais de uma dezena de mortos e muitas centenas de feridos. Um cenário mais do que propício à radicalização e ao confronto entre governo e partidos de oposição, com vistas a ganhos eleitorais futuros.

Fernando Schüler* - O detalhe esquecido da Constituição

- Folha de S. Paulo

Modelo misto de gestão da educação se transformou, numa alquimia bem tropical, em monopólio estatal

Lembrar de duas histórias nos ajuda um pouco a entender o que se passa hoje na educação brasileira. Uma delas nos leva a 1987, nos debates da Constituinte. Um dos temas em jogo era o monopólio ou não do Estado sobre a educação pública.

A questão era se os recursos para a educação deveriam ser usados apenas nas redes estatais de ensino, no modelo tradicional que todos conhecemos, ou se poderiam também ser investidos em escolas não estatais, sem fins lucrativos, a partir de contratos celebrados com estados e municípios.

A posição vencedora foi a segunda. Está lá, no artigo 213 da Constituição. Recursos públicos serão destinados “às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas”. Até hoje acho engraçado que muita gente boa desconhece, ou faz de conta que desconhece, esse trechinho da Constituição.

Esta é a primeira história. A segunda nos leva a exatos 20 anos depois, quando foi criado o Fundeb, o principal instrumento de financiamento da educação básica do país. Para resumir a história, a lei, por estas coisas bem brasileiras, decidiu restringir o uso dos recursos apenas para as redes estatais de ensino.

Bruno Boghossian - Após criar distração ambiental, Bolsonaro lava as mãos para desmatamento

- Folha de S. Paulo

Diversionismo parece ser o único método de um presidente que escolhe não agir

O presidente fabricou a própria crise na área ambiental: pôs em dúvida dados oficiais, demitiu o responsável pelo órgão de monitoramento do setor e comprou briga com países que ajudavam o Brasil a conter a derrubada das florestas. Agora, os números mostraram um recorde na devastação da Amazônia. Jair Bolsonaro não está nem aí.

Quando foram divulgadas as estatísticas, no início da semana, o presidente fingiu que não tinha nada a ver com o assunto. "Não pergunte para mim, não", disse, na terça (19).

No dia seguinte, instado mais uma vez a comentar a destruição de uma área equivalente a seis vezes o território da cidade de São Paulo, agiu como se fosse melhor deixar as coisas como estão. "Você não vai acabar com o desmatamento, nem com as queimadas. É cultural", afirmou.

Roberto Dias - #MaisComMenos ou #ComMaisPosts?

- Folha de S. Paulo

Posts vendem ilusão de que o governo atapeta o país a toque de caixa

A Folha mostrou que o investimento federal em rodovias está no menor nível desde 2014, e isso causou especial irritação em Brasília.

O governo valeu-se da hashtag #MaisComMenos para responder. “Dizer que há menos para investir é algo óbvio, herdamos um país quebrado”, afirmou o ministro Tarcísio Freitas, da Infraestrutura. “O que não é lógico é associar isso como demérito do governo. Tivemos que fazer muito com pouco.”

Uma ilha de ponderação na Esplanada, o ministro ganhou lugar cativo nas redes presidenciais. Entre seus méritos, está o de ter atraído para as rodovias uma atenção que havia muito não recebiam.

Mas seus posts vendem a ilusão de que o governo atapeta o país a toque de caixa e que o Exército é capaz de resolver problema desse tamanho e urgência —dimensionados pelos 75 mortos no feriado da República, número maior do que no ano passado.

Mariliz Pereira Jorge - Casa da Mãe Joana

- Folha de S. Paulo

O comportamento dos atuais congressistas tem sido deplorável

Fotos de sunga na praia e de cuecas samba-canção motivaram a primeira cassação de um parlamentar, no Brasil. O deputado Edmundo Barreto Pinto (PTB-DF) perdeu o mandato ao ser retratado nesses trajes, no ensaio “Barreto Pinto Sem Máscara”, na revista O Cruzeiro. Isso foi lá em 1949. Eu nem era viva, mas que saudade de um tempo em que quebra de decoro não era apenas levada a sério, mas causada por motivos dessa irrelevância.

O Código de Ética da Câmara, como conhecemos hoje, está em vigor desde 2002. As regras preveem os deveres fundamentais, os atos incompatíveis e os atentatórios ao exercício dos cargos. Basicamente, tem que exercer a função com dignidade, respeitar os coleguinhas, a Constituição, não perturbar a ordem ou infringir as regras de boa conduta, não usar dinheiro público para fins próprios, não tirar proveito do cargo.

Sabemos que nada disso é respeitado por parte deles desde sempre, mas o comportamento dos atuais congressistas tem sido deplorável. Os episódios de racismo desta semana, que envolveram os deputados Coronel Tadeu e Daniel Silveira, do PSL, são só os mais recentes de uma lista de episódios execráveis que deveriam ser severamente punidos.

William Waack - O STF e o senso comum

- O Estado de S.Paulo

Transformado em instância política, o STF enfrenta o descrédito da própria instituição

Dias Toffoli deu prosseguimento ao que o Supremo vem fazendo há anos – tratar de identificar o que é a repercussão política e popular daquilo que decide – quando praticamente instou o Congresso a alterar normas para permitir a execução de sentença condenatória antes do famoso “trânsito em julgado”. É o que o Congresso está fazendo, motivado sobretudo pelo próprio voto de Toffoli, segundo o qual não se trata de alterar (na pretendida modificação do Código Penal) uma cláusula pétrea da Constituição.

A questão jurídica é fascinante pois, como assinalou aqui Ives Gandra Martins na edição desta quarta-feira as duas teses que se opõem na discussão são consistentes. A saber: a) como alguém que, até o trânsito em julgado, é inocente, pode ser levado a cumprir pena? b) tribunais superiores não tratam mais das questões fáticas decididas nas duas instâncias iniciais de um processo, portanto recursos à terceira e quarta instâncias não se destinam mais a provar inocência.

O que está em jogo, no fundo, é uma questão sobretudo política, de central relevância para qualquer sociedade que pretende viver num Estado de direito, pois envolve o trato de princípios fundamentais como o da presunção da inocência. No campo da disputa política a discussão (como tudo que acontece hoje) descambou segundo a caracterização de uns como “fanáticos punitivistas” (os que defendem a execução de pena após a segunda instância) e de outros, seus oponentes, como “garantistas que favorecem corruptos e criminosos”.

Vera Magalhães -Toffoli tenta impor limites a órgãos de controle

- O Estado de S. Paulo

Em longo voto em que aparentou nervosismo e confusão, presidente do STF tentou justificar liminar controversa

Senta, que vai demorar. Dias Toffoli fez um voto longo. Muito longo. Longo, mesmo. Não é hábito do presidente da Corte se estender tanto em seus votos, e a exceção já permitia antever o que se viu: um voto na defensiva, procurando justificar decisões difíceis de defender, como a paralisação de mais de 900 procedimentos de investigação, e a extensão da decisão a dados da Receita - quando o próprio STF já tinha decidido a questão ao julgar uma Adin - e o apelo aos colegas a um argumento não jurídico, o de que os órgãos de controle fazem "assassinato de reputação" com o compartilhamento de dados.

Flávio? Que Flávio? No voto longo e confuso, Toffoli começou dizendo que o caso em discussão não tinha nada a ver com Flávio Bolsonaro, pelo fato de ser anterior ao seu pedido para sustar a investigação contra o ex-assessor Fabrício Queiroz. Imediatamente o argumento virou chacota nas redes sociais: afinal, sua liminar foi dada a partir de pedido de Flávio Bolsonaro, e depois Gilmar Mendes tratou por reforçá-la em outra decisão cautelar.

Como é? O voto foi tão tortuoso que os ministros pediram esclarecimentos ao final. Toffoli teve de reforçar que aprovava o compartilhamento de informações dos órgãos de controle, desde que mediante autorização judicial. O julgamento será retomado nesta quinta-feira, e dificilmente concluído, uma vez que a questão é espinhosa e pode haver votos com diferentes modulações.

Eugênio Bucci - Bom dia, escravo

- O Estado de S.Paulo

Perto do novo formato de exploração, dar espelhinho a índio é um gesto solidário

Nos EUA, a senadora democrata Elizabeth Warren abriu uma cruzada contra o Facebook e outros titãs da tecnologia digital (tech industry), como Amazon e Google. Possível candidata à sucessão de Donald Trump, ela pretende quebrar os monopólios exercidos por essas empresas.

Do outro lado do Atlântico, a União Europeia (UE) procura fazer a sua parte. Tentou proibir os gigantes Facebook e WhatsApp (ambos controlados pelo cyberimperador Mark Zuckerberg) de compartilhar dados sobre seus usuários, uma prática que, segundo o Parlamento Europeu, violaria as políticas de proteção de dados do continente e favoreceria ainda mais o mercado monopolista. A UE também vem exigindo que os conglomerados digitais adotem medidas mais efetivas contra as fake news, mas não impôs recuos significativos aos tais titãs.

No Velho Mundo, como no Novo, as democracias ainda estão longe de enquadrar os conglomerados. Ao contrário, eles é que ameaçam engolir a democracia de uma vez.

Não é difícil de entender por quê. Se uma sociedade que se pretende livre deixa os eleitores se afogarem na desinformação, as decisões aprovadas por esses mesmos eleitores tendem a perder racionalidade, legitimidade e sustentabilidade. Quando a desinformação é crônica, aflora o risco real de que o processo decisório da democracia deságue na negação da democracia. O risco, aliás, já está posto. Em diversos países, líderes nacionais, depois de ganharem eleições livres, passam a combater a ordem democrática: em várias partes do mundo a democracia vem gestando seu oposto.

Zeina Latif* - Perdas

- O Estado de S. Paulo

Escravidão deixou marcas na nossa sociedade pela violência e pelas posturas oportunistas

A escravidão esteve presente em várias civilizações ao longo dos séculos, geralmente por conta de conquistas e guerras. O que distingue o caso dos negros é o racismo e o fato de o tráfico de escravos ter sido uma atividade muito lucrativa, com ampla rede de negócios, fornecedores e prestadores de serviços, em terra e no mar. Um negócio que inclusive ajudou a financiar as viagens dos descobrimentos.

Os números do comércio de negros impressionam. Entre 1500 e 1850, 24 milhões de indivíduos foram tirados de seus lares em todo continente africano com destino às Américas. Algo como 11,5 milhões morreram antes mesmo de embarcar, em decorrência das condições precárias e maus tratos no caminho até o embarque, que poderia demorar vários meses. Apenas 10,7 milhões chegaram ao continente americano; cerca de 1,8 milhão não sobreviveu à travessia.

O ambiente insalubre nos navios, os maus tratos e suicídios explicam essa trágica mortalidade. Famílias e amigos eram separados, e procurava-se misturar os diferentes grupos, para evitar a uniformidade linguística, e assim reduzir fugas e rebeliões.

O Brasil era o principal destino. Ao longo de 350 anos, 47% do tráfico negreiro veio para o Brasil, dez vezes mais do que para a América do Norte, totalizando quase 5 milhões de pessoas.

Celso Ming - Até onde vai esse dólar?

- O Estado de S.Paulo

Parece temerário contar com importante deterioração das contas externas do Brasil, mas o governo precisa agir

Desde agosto, as cotações do dólar vêm subindo no câmbio interno (veja o gráfico) e a balança comercial dá sinais de enfraquecimento. Para esvaziar a procura mais forte de moeda estrangeira dos últimos dias, o Banco Central (BC) anunciou para esta quinta-feira três leilões de câmbio e promete a intervenção que vier a ser necessária para evitar a disparada que prejudique a economia.

Há questões no ar, nem sempre com respostas satisfatórias. A primeira procura identificar a origem das pressões por compra de moeda estrangeira. Há pelo menos cinco fontes diferentes. Vamos a elas.

A frustração com os leilões de áreas do pré-sal realizadas neste mês reduziram a expectativa de entrada de dólares, como apontou terça-feira o presidente do BC, Roberto Campos Neto. O governo esperava arrecadar pelo menos R$ 106,5 bilhões e terá apenas R$ 69,9 bilhões dessa operação. A crise da Argentina e o baixo desempenho da economia mundial derrubaram as exportações do Brasil, a mais importante fonte de entrada de moeda forte. A queda foi, neste ano até a terceira semana de novembro, de 9,6%. As importações vêm caindo bem menos, 1,5% até o último dia 9. Assim, o saldo comercial (exportações menos importações), embora ainda positivo em US$ 34,5 bilhões, caiu 33,8% no mesmo período.

Outra fonte de pressão por maior procura de dólares está na ação de grandes empresas, como Petrobrás, que vêm trocando dívida externa por dívida interna. Mas este é um movimento cujos números não se conhecem.

O que a mídia pensa – Editoriais

Desmatamento acelerado põe por terra álibis do governo – Editorial | Valor Econômico

O governo e o ministério da área empenharam-se em destruir a credibilidade do Ibama e do ICMBio.Não há mais política ambiental

O governo agrediu os fatos e os mensageiros das más notícias sobre aumento acelerado do desmatamento na Amazônia. O presidente Jair Bolsonaro exonerou o diretor do Inpe, Ricardo Galvão, que divulgou assustadores números preliminares, e insinuou que ele estava a serviço de ONGs do mal. Foi à tribuna da Organização das Nações Unidas (ONU) afirmar que a região “não está sendo devastada nem consumida pelo fogo, como diz mentirosamente a mídia”. Na segunda-feira, divulgou a maior taxa de desmatamento da década no período de 1 de agosto de 2018 a 31 de julho de 2019 - 9,76 mil km2, um avanço de 29,5% - e, candidamente, como se nada tivesse dito antes, prometeu vagas providências.

As condições em que o desflorestamento ocorrem agora são diferentes das do passado. A destruição se acelerou onde antes estava até certo ponto contida, como em Roraima, com avanço de 216,4%, com 617 km2 de florestas no chão, e no Acre, com aumento de 55% (688 km2), a maior área desde 2004. A gravidade do fato foi apontada pelo diretor do Inpe, Darcton Damião: “Há uma nova fronteira de desmatamento que merece atenção”. E a “velha fronteira” prosseguiu na rotina da devastação. Pará, Mato Grosso, Amazonas e Rondônia viram sumir 8.213 km2 de áreas florestais. O Pará continua à frente, com 39,5% da área total.

Livro | O Mundo Rural Brasileiro do Século XXI

Orelha do livro

Esta coletânea institucional faz parte das comemorações dos 40 anos do Programa de Pós-graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento Agricultura e Sociedade, da UFRRJ (CPDA/UFRRJ), celebrados em 2016 e 2017, reunindo, para tanto, uma série de capítulos de docentes, muito deles em parceria com orientandos discentes, ex-discentes e colaboradores.

A ideia é dar visibilidade e trazer para a reflexão uma produção ainda inédita e qualificada da casa, resultado das atividades de pesquisa, trabalhos de orientação, apresentações em congressos e em encontros, consultorias e assessorias etc.

Em comum aos autores, o reconhecimento da importância do olhar interdisciplinar – uma das marcas do CPDA – na reflexão dos processos sociais identificados com o nosso objeto de estudo e buscando, assim, assegurar um olhar plural sobre o tema e a preocupação em entender as significações e a atualidade de processos e questões.

Desde já agradecemos todos os que colaboraram com a realização e viabilização da coletânea, começando pelo apoio efetivo e imediato da Coordenação do próprio Programa, estendendo nosso reconhecimento à Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e à Action Aid Brasil, que aportaram recursos financeiros para tanto. Somos gratos também a Délcio da Costa Peçanha Júnior pelo apoio na editoração preliminar do material.

A coletânea encontra-se dividida em três partes, ou blocos, que buscam dialogar entre si, além do prefácio de nossa sempre amiga e referência de reflexão, Maria de Nazareth Baudel Wanderley.

A primeira parte aborda de forma abrangente os diferentes os significados do rural contemporâneo, tratando de analisar situações específicas que marcam a compreensão e o reconhecimento desses processos em diferentes áreas de estudo. O último bloco da coletânea enfatiza o tratamento das políticas públicas em perspectiva histórica.

A parte subsequente volta-se sobre a análise de processos e mobilizações sociais que envolve um número expressivo de novos e velhos atores, bem como as diferentes redes estabelecidas a partir dos mesmos, buscando evidenciar a emergência de conflitos e disputas em diferentes áreas de estudo.

O último bloco da coletânea enfatiza o tratamento das políticas públicas em diversos setores e níveis, problematizando desde a concepção e o contexto político que caracterizam o Estado brasileiro até os processos de mediação examinados à luz da capacidade de implementação de um número diferenciado de instrumentos de programas governamentais.

(Fonte: O mundo rural brasileiro na perspectiva do século XXI, editora Garamond universitária, Rio de Janeiro, dezembro de 2019. Orelha.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade -Canção Amiga

Eu preparo uma canção
em que minha mãe se reconheça,
todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos.

Caminho por uma rua
que passa em muitos países.
Se não me vêem, eu vejo
e saúdo velhos amigos.

Eu distribuo um segredo
como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
dois carinhos se procuram.
Minha vida, nossas vidas
formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
e tornei outras mais belas.

Eu preparo uma canção
que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.

Música | Laura I Francis Hime com Chico Buarque

quarta-feira, 20 de novembro de 2019

Opinião do dia - Papa Francisco*

Não é coincidência que, às vezes, haja um ressurgimento de símbolos típicos do nazismo. E preciso confessar a vocês que, quando ouço um discurso de alguém responsável pela ordem ou pelo governo, penso nos discursos de Hitler em 1934, 1936.

Com a perseguição de judeus, ciganos e pessoas com tendências homossexuais, hoje essas ações são típicas e representam ‘por excelência’ uma cultura de desperdício e ódio. Foi o que foi feito naqueles dias e hoje está acontecendo novamente.

*Papa Francisco, em homilia, Reuters | Exame, 16/11/2019

Paulo Fábio Dantas Neto* - Política negativa e política positiva

- O Estado de S.Paulo

Frente democrática terá de encarnar numa liderança a ideia de centro político

A fórmula que inspira o título foi de San Tiago Dantas, ministro de Jango, nos idos de 1964. Ajuda a pensar a frente democrática exigida pela experiência de 10 meses de mandato de Jair Bolsonaro. Sistema político, instituições jurídicas, algumas corporações profissionais do Estado e setores da sociedade civil, imprensa incluída, reagem com cautela ao ataque do Executivo a fundamentos democráticos da ordem política. O professor Werneck Vianna chama essa estratégia defensiva de guerra de posição. Uso política positiva em sentido análogo.

Em conjuntura crítica, San Tiago Dantas chamou de esquerda positiva a política que propunha, com senso agônico de urgência de um político progressista que pressentia a aproximação do pior. O horizonte da política positiva era um país com progresso social e economicamente moderno, horizonte submetido a duas regras de ouro: respeito rigoroso às instituições políticas e recusa de ideias de revolução ou de refundação do País. Certos conservadorismo e ceticismo, em vez de obstáculos ou argumentos contra as reformas, eram o método político para fazê-las.

San Tiago perdeu e a derrota foi do Brasil, que viveu duas décadas de ditadura. Sua agenda foi, com o tempo, revisitada, pelos militares, do modo autocrático que ele rejeitava por convicção. Pragmatismos em contraste: o de San Tiago, que propunha um futuro pela via da democracia e da civilização do conflito social pela moderação da política; e o de Golbery do Couto e Silva, que atrelava o presente a uma guardiania contra o demos, um regime que revogava a política (ou a restringia a jogo palaciano) em nome de eliminar os extremos. Num caso, construção moderada do centro político, no outro, extremismo de centro, que a história de outros povos nos ensina ser um dos biombos do fascismo.

Rosângela Bittar - Happy birthday

- O Estado de S.Paulo

Neste 1.º ano, Bolsonaro dividiu com os filhos o pensamento, palavras e obras. Nada deu certo

O adiamento da data de envio ao Congresso da proposta de reforma do Estado não significa que o governo tenha desistido do seu projeto, seja amplo ou restrito. A formulação de ideias, na instância Paulo Guedes, é uma etapa inicial e, mesmo que fosse levada à tramitação, este mês ou este ano, ficaria para as calendas, quando as eleições municipais permitissem.

Até deputados e senadores aprovarem redução de salário do servidor público, uma das propostas da reforma adiada, já terão rodado naqueles plenários a roleta de três CPMFs e derrubado incontáveis vetos presidenciais. O funcionalismo, da elite das carreiras de Estado ao barnabé, tem a mais forte corporação em condições de, para manter suas vantagens, enfrentar Executivo, Legislativo e Judiciário.

O gesto do presidente Jair Bolsonaro expressa a tensão que há no Planalto, especialmente no Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, com o risco de eclosão de protestos, como os que mobilizam os governos do Chile e da Bolívia. O propósito do presidente é não dar espaço à inclusão de problema novo em sua já extensa lista de fracassos políticos neste primeiro ano de mandato.

Vera Magalhães - Chega de treta?

- O Estado de S.Paulo

Supremo Tribunal Federal pisa no freio das polêmicas na reta final do ano

“Chega de temas traumáticos e conflituosos. Estamos correndo maratona em ritmo de 100 metros, e isso não é bom.” A frase me foi dita nesta terça-feira por um ministro do Supremo Tribunal Federal. Ele nega que a pisada no freio na maratona de decisões controversas seja uma reação à pressão popular contra a Corte, traduzida em manifestações de rua com pautas como a defesa da prisão após condenação em segunda instância e o impeachment de integrantes do tribunal. Mas o timing veio exatamente a calhar.

A principal consequência prática da propensão do STF de refrear as polêmicas deverá ser o recuo na ideia de que a Segunda Turma analise ainda neste ano o pedido de suspeição do ex-juiz e hoje ministro Sérgio Moro no julgamento de Lula no caso do triplex.
Antes, a ideia de Gilmar Mendes era levar o habeas corpus de volta à turma ainda neste mês. Agora, ministros do colegiado já dizem que o caso não deve ser analisado neste ano.

No entendimento de observadores dos humores supremos, o fato de que a decisão sobre prisão após condenação em segunda instância já levou à soltura de Lula ajudou a arrefecer a pressão pelo julgamento da suspeição de Moro.

Monica De Bolle* - Dentro do túnel

- O Estado de S.Paulo

Profundamente desigual, o Brasil foi o único País da América Latina que viu a pobreza aumentar desde 2014

Em 1973, o grande economista Albert O. Hirschman publicou artigo intitulado “A mutabilidade da tolerância à desigualdade de renda durante o desenvolvimento econômico”. Nesse artigo, ele elaborou a tese do “efeito túnel” a partir de metáfora prosaica. Imagine que você esteja preso em um engarrafamento dentro de um túnel. De repente, a faixa ao seu lado começa a se mover lentamente enquanto a sua continua absolutamente imóvel. A constatação de que enfim o tráfego começou a se mexer lhe dá esperanças de que eventualmente a sua faixa também passe a andar. Portanto, você haverá de tolerar a injustiça inicial de sua imobilidade pois há a expectativa de que em algum momento a movimentação incipiente lhe beneficie.

Assim descreve Hirschman os primeiros estágios do desenvolvimento econômico. Quando as economias começam a se desenvolver e crescer, algumas faixas de renda serão beneficiadas primeiro, deixando outras para trás. Há, portanto, um aumento da desigualdade.

Contudo, a população tende a tolerar esse aumento da desigualdade porque, como os carros dentro do túnel, têm a esperança de que em breve os benefícios do crescimento econômico acabará lhes trazendo ganhos semelhantes. Nas palavras de Hirschman, enquanto o efeito túnel durar, todos sentem que a qualidade de vida melhorou, ainda que alguns tenham ficado ricos e outros não.

Luiz Carlos Azedo - O pacote social de Maia

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“O ímpeto reformista de caráter ultraliberal começa a perder força e a agenda social ganha densidade no Congresso, inclusive por causa das eleições municipais”

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou, ontem, um pacote de propostas de combate à desigualdade e à pobreza, elaborado por um grupo de deputados de esquerda coordenado pela deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP), cuja liderança se consolida na Casa. Participam do grupo os deputados Felipe Rigoni (PSB-ES), João Campos (PSB-PE), Pedro Cunha Lima (PSDB-PB) e Raul Henry (MDB-PE), todos apadrinhados por Maia, que também começou a carreira no Congresso muito jovem e agora aposta na consolidação desse grupo para sintonizar a Câmara com os ventos de renovação política que ainda sopra nas ruas.

A iniciativa quebra o monopólio da agenda social por parte da frente formada pelo PT e outros partidos de esquerda. O pacote abarca os seguintes temas: garantia de renda, inclusão produtiva, rede de proteção ao trabalhador, água e saneamento e governança e incentivos. Maia vem se reunindo com o grupo há algum tempo, num esforço para ampliar o bloco que lhe dá sustentação no comando da Casa. “A nossa agenda vai além das reformas econômicas, com o objetivo de ter um país mais igual”, disse, no lançamento.

Uma das propostas em estudos é uma emenda para modificar o artigo 203 da Constituição Federal e assegurar a garantia de transferência de renda a famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza, transformando o Bolsa Família, principal programa de transferência de renda do país, em política de Estado. Principal herança do governo Lula, o Bolsa Família sempre foi polêmico. Na essência, trata-se de uma política social-liberal, de concentração do gasto social nas camadas da população abaixo da chamada linha de pobreza.

Rotulado de populista pela oposição aos governos petistas, o programa é criticado por não ter porta de saída e não estar vinculado à educação, como o antigo Bolsa-Escola, um programa criado pelo então governador de Brasília, Cristovam Buarque (Cidadania), e encampado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva desvinculou o programa da política de educação e ampliou sua escala para 12,5 milhões de famílias, transformando-o no carro-chefe de sua reeleição. O presidente Jair Bolsonaro não só manteve o programa como aprovou o que seria o 13º Bolsa Família neste ano. Hoje, o programa atinge 13,9 milhões de famílias.

Ricardo Noblat - Supremo deve confirmar decisão de Toffoli

- Blog do Noblat | Veja

Em jogo, o compartilhamento de informações financeiras sigilosas

Refeitas as contas, o ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal, está convencido de que contará, hoje, com o apoio dos seus pares para manter a decisão que beneficiou o senador Flávio Bolsonaro e Fabrício Queiroz ao suspender todas as investigações em curso com base em informações financeiras sigilosas compartilhadas sem prévia autorização judicial.

Estão parados no país cerca de 950 processos que apuram crimes de lavagem de dinheiro e de corrupção. Se mantida a decisão de Toffoli, caberá ao Supremo fixar o destino deles. Se todos voltarão à estaca zero sendo obrigados a recomeçar, ou se só alguns – e quais. Toffoli guarda alguns trunfos para reforçar sua posição na hora dos debates. Ainda não sabe se se valerá deles.

Um dos trunfos: a descoberta de que determinados grupos de procuradores tinham uma lista de pessoas consideradas por eles perigosas porque poderiam a qualquer momento virem a atrapalhar seu trabalho. Nesse caso, ameaçariam investigá-las – quando nada para tentar demovê-las do seu propósito. Marcada para esta manhã, a sessão deverá se estender pela tarde.

Fernando Exman - Bolsos e corações da juventude em disputa

- Valor Econômico

Governo beneficia jovens, enquanto mina entidades

A juventude se transformou em objeto de cobiça dos dois principais grupos da polarizada política nacional.

O presidente Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva disputam bolsos, corações e, claro, os votos dos mais jovens. O mesmo embate já havia ocorrido na última campanha eleitoral. Vinha ganhando nova forma após Bolsonaro assumir a Presidência da República, e agora tem novo impulso com o retorno do ex-presidente aos palanques.

A convocação de Lula não poderia ter sido mais clara. No último dia 9, durante discurso em São Bernardo do Campo, foi pedindo que aliados resistissem ao que considera retrocessos feitos pelo governo, até que fez uma provocação específica: “A juventude ou briga agora ou o futuro será um pesadelo”.

Lula voltou ao assunto no fim de semana, durante discurso no Recife, quando novamente cobrou que a juventude permanecesse nas ruas. O petista aposta na ligação histórica entre a esquerda e o movimento estudantil, que se beneficiou da ascensão política do PT e agora, na mira do novo governo, deveria contribuir na sua jornada contra a Lava-Jato e a administração Bolsonaro.

Durante as gestões do PT, os líderes das entidades estudantis não só passaram a figurar na lista de convidados ilustres das solenidades realizadas no Palácio do Planalto como também foram chamados para participar do governo. Ajudaram a criar canais diretos de diálogo entre a base dos estudantes e a máquina federal.

O Conselho Nacional da Juventude e a Secretaria Nacional da Juventude ganharam peso nessa época. Tudo isso, contudo, passa hoje por transformações. A seu modo, o governo Bolsonaro faz acenos em direção aos jovens de forma constante e consistente.

PEC da prisão em segunda instância afetará questões tributárias e cíveis

Texto está em debate na CCJ, mas é polêmico por alterar uma cláusula pétrea, o que só seria possível numa Constituinte

Por Raphael Di Cunto, Beatriz Olivon, Joice Bacelo e Vandson Lima | Valor Econômico

BRASÍLIA - Negociada na Câmara como uma resposta à decisão do Supremo Tribunal Federal de exigir o trânsito em julgado (fim de todos os recursos) antes da prisão de condenados, a nova versão da proposta de emenda constitucional (PEC 199/2019) da prisão em segunda instância terá repercussão em todas as demais decisões do Judiciário, dos julgamentos tributários aos cíveis. A execução das decisões de segunda instância - tribunais regionais - seria automática não apenas para condenações criminais, mas também para pagamento de dívidas e de impostos, por exemplo.

A PEC 410/2018, até então foco da discussão pela Câmara dos Deputados, limitava-se a mudar o momento de execução das penas criminais e dizer que “ninguém será considerado culpado até a confirmação de sentença penal condenatória em grau de recurso”. O texto está em debate na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), mas é polêmico por alterar uma cláusula pétrea, o que só seria possível numa Constituinte.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), defendeu, então, mudanças nos artigos 102 e 105 da Constituição, para dizer que os recursos especial e extraordinário, usados para recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao STF, não impedirão o trânsito em julgado. Essa alternativa recebeu apoio de outros partidos, como Republicanos, e de deputados do Centrão.

Por trás dos protestos, um Chile desigual e dividido

Dados do projeto World Inequality Database mostram que o Chile é o segundo mais desigual da região, atrás apenas do Brasil

Por Marsílea Gombata - Valor Econômico

SÃO PAULO - No último mês, o Chile viu a sua imagem de prosperidade, desenvolvimento e estabilidade ruir rapidamente frente às maiores manifestações contra o governo desde o fim da ditadura militar em 1990. Na esteira de outros distúrbios na região e ao redor do mundo, os protestos desvendaram um Chile fortemente dividido pelo ressentimento com a desigualdade histórica - ofuscada nas últimas décadas pela significativa evolução macroeconômica do país em relação aos seus pares latino-americanos.

Os distúrbios começaram em 18 de outubro em reação à alta de 3% na tarifa de metrô - anulada dias depois. O movimento rapidamente se espalhou pelo país, assim como a violência, com relatos de saques. Os confrontos com as forças de segurança deixaram mais de 20 mortos e levaram ao cancelamento de eventos internacionais que serviriam de vitrine do governo liberal de Sebastián Piñera.

A fúria nas ruas surpreendeu os observadores externos, considerando o sucesso macroeconômico do país. Pelo ranking de desigualdade do Banco Mundial, o Chile é o 10º país mais desigual das Américas, segundo o coeficiente Gini. Porém, dados do projeto World Inequality Database colocam o Chile como o segundo mais desigual da região, atrás apenas do Brasil.

O projeto, que tem como um dos criadores o economista francês Thomas Piketty - autor de “O Capital no Século 21” e “Capital e Ideologia” -, mostra que a parcela do 1% mais rico da população no Chile concentra 23,7% da renda do país hoje. No Brasil esse percentual chega a 28,3%, na Colômbia, a 20,4% e nos Estados Unidos, 20,2%. Quando são analisados os 10% mais ricos, a concentração chega a 54,9% no Chile e 55,6% no Brasil.

Uma consequência direta da desigualdade de renda é a forma como ela se reflete em outros setores da vida cotidiana, afirma o sociólogo Tomas Undurraga, da Universidade Alberto Hurtado. “Quando há grande concentração de renda, a desigualdade econômica pode se traduzir em desigualdade de poder, ou seja, algumas vozes passam a ser mais escutadas do que outras”, diz. “Quando isso acontece, as pessoas sentem que o sistema econômico e o político não funcionam mais para a maioria.”

Bruno Boghossian - Show de racismo e insensatez na Câmara é prova de retrocesso civilizatório

- Folha de S. Paulo

Eleição deu megafones àqueles que preferem comportamento selvagem e impropérios

As últimas eleições colocaram megafones nas mãos de gente que não tem vergonha da própria insensatez. A disputa que consagrou aqueles que "falam o que pensam" parece ter dado um salvo-conduto a alguns políticos que se alimentam de um comportamento selvagem e de impropérios animalescos.

O espetáculo indecente protagonizado por um grupo de deputados na Câmara nesta terça (19) é mais um sinal de que o país se lança num retrocesso civilizatório --e há disputa para saber quem será o passageiro mais desvairado.

O deputado Coronel Tadeu (PSL) pediu que um assessor gravasse o momento em que ele arrancava da parede uma placa exposta num dos corredores do Congresso. A imagem mostrava um homem negro algemado e morto diante de um policial, que andava com uma arma fumegante.

Ruy Castro* - Nem nem

- Folha de S. Paulo

A polarização de contrários cansou --mesmo porque nem parecem tão contrários assim

Você os conhece. São os brasileirinhos que nem estudam nem trabalham. Compõem a chamada geração nem-nem, a quem se acusa de ser passiva, folgada e, às vezes, viver à custa das mães até os 39 anos sem a menor vergonha. Mas por que botar toda a culpa nesses garotos que, no fundo, são só vítimas de anos de políticas econômicas e educacionais desastradas?

Além disso, há muitos, talvez todos nós, com quem dividir a responsabilidade pelo que está acontecendo de ruim no país. Há, por exemplo, os que nem atam nem desatam. Nem vão nem ficam. Nem atacam nem defendem. Nem dão nem descem. Nem fazem nem desfazem. Nem dizem nem desdizem. Nem pedem nem mandam. Nem calam nem consentem. Nem mordem nem sopram. Nem f..... nem saem de cima. Talvez por isso, nem arrisquem nem petisquem. Mas também não desocupam o penico.

Eloísa Machado de Almeida* - Fulanizado como 'caso Flávio', julgamento sobre Coaf se refere ao poder do Estado acusador

- Folha de S. Paulo

Não se alcança Estado de Direito com menos garantias ou com superpoderes à acusação

O STF (Supremo Tribunal Federal) deverá analisar se é constitucional o compartilhamento, sem autorização prévia do Poder Judiciário, de dados bancários e fiscais do contribuinte com o Ministério Público, para que este inicie ou instrua investigações criminais.

Estão em jogo não só a conformação do direito constitucional à privacidade de informações e dados dos contribuintes, isto é, o alcance da proteção dada aos sigilos bancário e fiscal, como também a delimitação dos poderes dados ao Ministério Público na persecução criminal, tendo em vista as exigências constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa.

O recurso que definirá o alcance do sigilo bancário e fiscal tem repercussão geral declarada desde junho de 2018. A suspensão de todas as ações penais e inquéritos que se valeram das informações fiscais e bancárias só foi determinada pelo ministro relator e presidente do Supremo, Dias Toffoli, um ano depois, por provocação de Flávio Bolsonaro, no ápice de um escândalo político.

Após isso, o caso esquentou. Assistiu-se a uma série de decisões que ampliaram o objeto da ação, criando um embate entre Ministério Público, Supremo, Unidade de Inteligência Fiscal (UIF, o extinto Coaf), Receita Federal e Banco Central.

Elio Gaspari - O mistério do convite a Moro

- O Globo | Folha de S. Paulo

Houve um certo sincronismo entre os vazamentos da delação de Palocci e a campanha

Gustavo Bebianno, ex-secretário-geral da Presidência e copiloto da campanha de Jair Bolsonaro quando ela cabia numa Kombi, contou ao repórter Fábio Pannunzio que o juiz Sergio Moro já estava convidado para o Ministério da Justiça antes que as urnas do segundo turno começassem a ser apuradas. Mais: naquela tarde de 28 de outubro, o “Posto Ipiranga” Paulo Guedes revelou-lhe que havia conversado com o juiz “cinco ou seis vezes”.

Talvez o mistério da conexão de Moro com a campanha de Jair Bolsonaro pudesse ser desvendado se os envolvidos ralassem nos métodos da Lava-Jato: condução coercitiva, prisão preventiva interminável e oferta de delação premiada. Não é o caso.

Diversas mensagens trocadas por procuradores da Lava-Jato indicam que eles torciam pela derrota de Fernando Haddad na eleição. Uma doutora escreveu: “Ando muito preocupada com uma possível volta do PT, mas tenho rezado muito para Deus iluminar nossa população para que um milagre nos salve.”

Num lance inexplicável, seis dias antes do primeiro turno de 7 de outubro, Moro divulgou um dos anexos da colaboração do ex-ministro petista Antonio Palocci. Era um pastel de vento, com acusações vagas que até hoje deram em nada. A oferta de delação de Palocci já tinha sido recusada pelo Ministério Público, e o próprio Moro havia duvidado de sua consistência. Segundo o procurador Carlos Fernando de Souza: “Não tinha provas suficientes. Não tinha bons caminhos investigativos”.

Merval Pereira - O STF pode tudo?

- O Globo

O que se vê no momento é um colocar de dificuldade para apuração de lavagem de dinheiro e corrupção

O Supremo Tribunal Federal (STF) julga hoje, sob pressão da opinião pública, a liminar que seu presidente, ministro Dias Toffoli deu em julho passado suspendendo todos os inquéritos baseados em informações do antigo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e da Receita Federal.

A decisão foi tomada a pedido da defesa do senador Eduardo Bolsonaro, que alegou que a investigação do Ministério Público do Rio sobre sua vida financeira fora baseada em informações detalhadas fornecidas pelo Coaf, o que representaria uma quebra ilegal de seu sigilo bancário.

Além de paralisar mais de 900 inquéritos por todo o país, a atitude de Toffoli teve conseqüências graves: três meses depois da liminar, o presidente do STF requisitou ao Coaf e à Receita Federal todos os inquéritos existentes nesses órgãos, mais tarde exigindo o nome dos auditores que tinham acesso àquelas informações.

Embora tenha revogado sua própria decisão, até anteontem ele tinha possibilidade de acesso a dados de 600 mil pessoas com detalhamento de todas as informações que ele considerou ilegais na liminar. Não os deve ter acessado, porque o Coaf os enviou digitalizados, juntamente com uma senha que identificaria quem no STF os consultou.