quarta-feira, 2 de outubro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Faltam planejamento e integração no combate a queimadas

O Globo

Era prevista temporada mais intensa de incêndios florestais. Reação dos governos tem sido tardia e insuficiente

Não é novidade que o Brasil vem se tornando mais seco. De 2011 a 2020, houve em média cem dias sem chuvas por ano, 25% a mais que no período de 1961 a 1990. Também não é novidade que, para 2024, era previsto recrudescimento da seca. Climatologistas advertiam sobre o agravamento dos incêndios florestais. O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) afirma que eles começaram no segundo semestre de 2023. Diante da escalada previsível, a prudência aconselhava se preparar. Não só para combater o fogo, mas também com campanhas de esclarecimento sobre o risco de queimadas antes do plantio provocarem incêndios incontroláveis. Não foi o que o governo fez.

Pelos dados oficiais, fica evidente que a reação tem sido insuficiente. De acordo com os boletins do Ministério do Meio Ambiente, a área queimada na Amazônia cresceu 140% entre o fim de junho e o fim de setembro, alcançando 11,7 milhões de hectares, ou 2,8% da floresta. No Cerrado, apenas em duas semanas de setembro, a superfície incendiada cresceu quase 40%, para 12,3 milhões de hectares, ou 6,2% do total. No Pantanal, a área queimada triplicou desde julho, com destruição de 2 milhões de hectares, 13,4% do bioma.

Vera Magalhães - As palavras-chave da eleição em SP

O Globo

Violência que marcou a disputa em São Paulo conseguiu colocar prosperidade e civilidade em palanques diferentes

Duas palavras parecem sintetizar a reta final da mais imprevisível eleição paulistana dos últimos anos: de um lado, Pablo Marçal conseguiu chegar competitivo até aqui pregando a prosperidade como plataforma; de outro, a esquerda apela ao conceito de pacto civilizatório para tentar impulsionar a candidatura de Guilherme Boulos na reta final.

Prosperidade e civilidade não deveriam ser antônimos, mas a violência que marcou a disputa em São Paulo conseguiu colocar os valores em palanques diferentes. O que obriga a uma análise mais aprofundada e menos ligeira da rápida e constante transformação política, social, cultural e econômica da maior metrópole brasileira — que costuma levar de arrasto, com o tempo, o resto do país.

Bernardo Mello Franco – Os caminhos do voto útil

O Globo

Em SP, manifesto pró-Boulos irrita Tabata; no Rio, pressão por voto em Paes irrita Tarcísio

Na reta final do primeiro turno, a pregação pelo voto útil deu as caras nas maiores cidades do país. Em São Paulo, o apelo é para evitar um duelo entre dois candidatos da direita. No Rio, para encerrar logo a disputa pela prefeitura.

Em manifesto, artistas e intelectuais paulistanos tentam convencer eleitores de Tabata Amaral a votarem em Guilherme Boulos. O argumento é que só o psolista poderia “evitar o desfecho trágico de um segundo turno entre dois bolsonaristas”.

O texto descreve um eventual confronto entre Ricardo Nunes e Pablo Marçal como “a consagração, pelo voto popular, da violência política, da defesa da tortura, do negacionismo científico”. “Estamos diante de um risco que o país não pode correr”, dramatiza.

Elio Gaspari - Anatomia de um apagão

O Globo

Estádio do Mineirão, 8 de julho de 2014. Aos 24 minutos do primeiro tempo, Toni Kroos marcou o terceiro gol da Alemanha. Eremildo, o idiota, gritou da arquibancada para que o Brasil atacasse. Depois do desastre, o técnico Felipão teve a humildade de reconhecer que sua equipe sofreu um “apagão”.

Na segunda-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou, com uma gravidade que só os ares de Brasília concedem, que sairão do ar cerca de 500 sites de apostas que funcionam no Brasil sem o devido credenciamento.

Em 2014, todos os jogadores alemães estavam credenciados. Em 2024, os sites ilegais funcionam porque o governo viveu por mais de um ano num esplêndido apagão. Quando Haddad diz que a Anatel tirará os sites do ar, algum desavisado pode achar que a agência já poderia ter feito isso. Quem os deixou no ar foi o Ministério da Fazenda porque, em dezembro de 2023, deu-lhes o prazo de até 1º de outubro de 2024 para que regularizassem seus papéis. Prenunciava-se o apagão. (Alemanha 1 a 0.)

Posse no México

Jéssica Sant'Ana / Valor Econômico

Em cerimônia com delegações de 105 países e 16 chefes de Estado, incluindo o presidente Lula, Claudia Sheinbaum destacou o protagonismo feminino e o papel de seu antecessor e padrinho político

Primeira mulher a assumir a presidência do México, Claudia Sheinbaum tomou posse ontem no cargo, que ocupará pelos próximos seis anos. Em seu discurso, ela destacou o papel de seu antecessor e padrinho político, Andrés Manuel Lopez Obrador, responsável pela “revolução pacífica da quarta transformação da vida pública” do país, como vem sendo chamada por aliados a polêmica agenda política implementada pelo governo anterior.

Sheinbaum toma posse como a primeira mulher a presidir o México

A cientista e ex-governadora da Cidade do México promete continuar o legado de seu mentor Andrés Manuel López Obrador

A cientista e ex-governadora Claudia Sheinbaum tomou posse nesta terça-feira (1°) como presidente do México, sendo a primeira mulher a ocupar esse cargo. Ela ficará à frente do país latino-americano pelos próximos seis anos.

“É tempo de transformação e é tempo de mulheres. Pela primeira vez, chegamos nós mulheres a conduzir o destino de nossa nação. E eu digo nós, porque não chegamos sozinhas, chegamos todas”, frisou em seu discurso de posse na Câmara dos Deputados do México.

Luiz Carlos Azedo - Alguém precisa barrar a escalada da guerra

Correio Braziliense

Uma guerra total entre Israel e o Irã parece iminente. O homem que poderia impedi-la é o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden. Sua impotência, porém, não tem precedentes

Jean Jaurés (1859-1914) era um liberal radical que se tornou socialista, integrando a ala direita do Partido Socialista Francês. Em 1897, com Émile Zola e Georges Clemenceau, liderou a campanha em favor de Alfred Dreyfus, o capitão francês injustamente acusado de espionagem pelo alto comando do Exército francês por ser judeu. Sempre defendeu a aproximação entre a França e a Alemanha para garantir a paz na Europa. Era um pacifista, precursor de Mahatma Gandhi (“Posso até estar disposto a morrer por uma causa, mas nunca a matar por ela!”) e Martin Luther King (“Sempre e cada vez mais devemos nos erguer às alturas majestosas de enfrentar a força física com a força da alma”).

Jaurés foi assassinado no dia da declaração da guerra, 31 de julho de 1914, por Raoul Villain, um nacionalista fanático. Foi o principal líder da II Internacional a defender a paz. Quase todos os demais apoiaram a entrada dos seus países na guerra, a começar pelos dirigentes da poderosa Social-Democracia Alemã, que estava no poder. Com exceção de Vladimir Lênin, que defendeu a paz para derrubar a autocracia czarista.

Martin Wolf - É o fim do dinheiro barato?

Valor Econômico

Taxas de juros reais? Quem se importa? A inflação galopante pode ser outra história

Estamos vendo o início de um ciclo de flexibilização da política monetária. Muitos agora perguntam até onde as taxas de juros poderão cair e o que essas quedas poderão significar para as nossas economias. No entanto, para mim, as questões mais interessantes são de longo prazo. Para ser preciso, há três. A primeira é: será que as taxas de juros reais deram finalmente um salto ascendente duradouro, após seu declínio secular para níveis extraordinariamente baixos? A segunda: a valorização dos mercados de ações deixou de ser reversível à média, mesmo nos EUA, onde parecia ser a norma há muito tempo? A terceira: a resposta à primeira pergunta pode ter alguma influência na resposta à segunda?

Lu Aiko Otta - Eleições e pressão sobre o ajuste fiscal

Valor Econômico

Resultado vai testar resolução do presidente Lula em apoiar o projeto do ministro da Fazenda, Fernando Haddad

O resultado das eleições de domingo ajudará a traçar os contornos do terreno em que dois projetos de governo se digladiarão ao longo dos próximos meses: o que busca melhorar o ambiente macroeconômico a partir do equilíbrio fiscal e o dos “tempos áureos do PT”.

Quanto pior for o resultado para o governo, mais testada será a resolução do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em apoiar o projeto do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Os encontros de Lula com integrantes das agências de classificação de risco durante sua passagem por Nova York reforçaram seu apoio um projeto que se propõe, ainda que gradualmente, a estabilizar a dívida pública brasileira e a recuperar o “investment grade” até o fim de 2026.

Fernando Exman - Por enquanto, comedimento do governo sobre a Selic

Valor Econômico

Intenção, pelo menos neste momento, é a de sofrer em silêncio

A intenção no governo Lula, pelo menos neste momento, é sofrer em silêncio por causa do início do ciclo de alta da Selic. Olha-se para frente. O “horizonte relevante” na política, para usar um termo bastante empregado pelo Banco Central quando olha para os próximos meses ao calibrar a taxa de juros, é o ano eleitoral de 2026.

Já se espera, ainda que com muito pesar, o aumento do juro nas próximas duas reuniões do Copom, em novembro e dezembro. Pelo cenário atual, viria então um período de estabilidade da Selic e na sequência, a partir de meados do ano que vem, uma nova rodada de afrouxamento da política monetária. Isso abriria espaço para uma aceleração da economia no ano seguinte.

Maria Cristina Fernandes - Segundo turno está nas mãos do eleitor de Tabata

Valor Econômico

Candidata tenta fidelizar eleitor que Boulos - e Nunes - buscam atrair com ‘voto útil’

A definição do primeiro turno está, em grande parte, nas mãos do eleitor de Tabata Amaral. Apesar de as pesquisas indicarem que a candidata do PSB não tem chance de passar para o 2º turno, seu desempenho na reta final pode privar tanto Guilherme Boulos (Psol), que é a segunda opção de dois terços de seus eleitores, quanto de Ricardo Nunes (MDB), segunda opção de um terço, dos votos de que precisam para assegurar a vaga. A Quaest de segunda-feira mostrou a candidata do PSB à Prefeitura de São Paulo, pela primeira vez, além da barreira dos dois dígitos (11%), na maior subida, a única fora da margem de erro, da pesquisa.

A disposição em não abrir mão desse quinhão foi exposta pelo comportamento da candidata depois do debate do Flow na semana passada. Foram seis “merdas” e um “filha da puta” em três minutos. Despejou aborrecimento pela repercussão do murro no marqueteiro Duda Lima a ofuscar as propostas apresentadas. Antecipou, assim, as dificuldades que os adversários terão para conquistar o “voto útil” de seus eleitores.

Bruno Boghossian - Três fatores vão desatar o nó em São Paulo

Folha de S. Paulo

Chave da disputa estará no voto de última hora, no eleitor silencioso e na abstenção

Três fatores vão desatar o nó da disputa pela Prefeitura de São Paulo: o voto de última hora, o eleitor silencioso e a abstenção. O apelo final dos candidatos vai levar em conta quem são esses paulistanos e o que eles pensam. As últimas pesquisas dão pistas importantes.

Há um atalho para entender esses votos e ausências que serão decisivos. É o grupo de entrevistados que, poucos dias atrás, não sabiam citar um candidato de forma espontânea, sem ver uma cartela com as opções. Segundo o Datafolha, eles eram 28% dos paulistanos na semana anterior à votação.

Hélio Schwartsman - Pelo voto útil

Folha de S. Paulo

Particularidades do pleito paulistano dão um nó nos raciocínios que costumam justificar o voto útil

Sou fã incondicional do voto útil, que é um outro nome para pensamento estratégico. O panorama da disputa pela prefeitura paulistana, contudo, dá um nó nos raciocínios que normalmente embasam um voto útil.

A grande dificuldade é definir o objetivo que orienta as preferências do eleitor. Uma meta "civilizacional" defensável seria excluir do segundo turno o candidato extremista e antissistema que é Pablo Marçal. Seria uma aposta na volta da normalidade eleitoral, com um candidato mais à esquerda enfrentando um da direita republicana.

Wilson Gomes - Debates eleitorais em questão

Folha de S. Paulo

Como melhorar esses eventos para impedir os 'pombos enxadristas'?

Os debates eleitorais ao vivo têm servido bem à democracia desde o primeiro grande confronto televisionado entre Kennedy e Nixon, em setembro de 1960. Por 64 anos, esses eventos forneceram uma plataforma para que eleitores comparassem, lado a lado, as propostas e visões dos candidatos, algo que sabatinas ou entrevistas isoladas não conseguem oferecer.

Isso não impediu, contudo, que os debates fossem transformados em arenas para encenações, constrangimentos e manipulações. Todo mundo aprendeu a jogar o jogo, a mentir descaradamente, a se esquivar de perguntas constrangedoras, a atacar os adversários por meio de acusações falsas. Esse jogo de dissimulação chegou a um extremo recentemente em São Paulo, com a participação de um candidato cujo propósito declarado era desmoralizar tanto o debate em si quanto o jornalismo que o promove. Um único "pombo no tabuleiro" mostrou-se capaz de instalar um caos de que só ele é beneficiário.

Vera Rosa - O dia em que Alckmin dormiu no posto

O Estado de S. Paulo

Amigos do vice veem suas andanças pelo interior como sinal de que ele pode disputar governo de SP

Enquanto a disputa para a Prefeitura de São Paulo continua embolada, Geraldo escapa para “Lins” sempre que pode, nos fins de semana, e dá um “baile” nos seguranças. Engana-se, porém, quem pensa que o destino da viagem seja a cidade localizada a 430 quilômetros da capital paulista, na região centro-oeste do Estado.

“Lins”, para o vice-presidente da República Geraldo Alckmin, significa “Local incerto e não sabido”. Foi driblando os seguranças que no fim do ano passado, por exemplo, Alckmin acabou dormindo num posto de gasolina que vende pamonha, em plena Via Dutra.

O vice estava voltando de Pindamonhangaba para São Paulo quando decidiu estacionar o carro que dirigia para dar uma cochilada. Tinha capinado um lote de seu sítio por três horas e estava cansado. Perto de 18h30, parou embaixo de uma árvore do posto, reclinou o banco e dormiu.

Ivan Alves Filho - Tecnologia, ciência das forças produtivas

O mundo está mudando de uma maneira extremamente rápida. Temos que pensar em formas novas de organizar aqueles que trabalham. Estamos sem política para uma área tão fundamental e em profunda transformação como a do trabalho, essa é a verdade. 

O mundo hoje é o da renovação das fontes de energia: o petróleo do futuro é a indústria eólica ou solar, por exemplo. E ainda há a questão das plataformas digitais. Um dos caminhos pode ser uma proposta de controle coletivo dessas plataformas. Se o movimento anarquista foi a face política da primeira fase da Revolução Industrial, de corte ainda artesanal, o comunismo da Terceira Internacional foi a face política de um período em que predominava a indústria pesada, o chamado “chão da fábrica”. Hoje, com a automação, a robotização e a inteligência artificial (que por enquanto ainda repete o que está armazenado nos bancos de dados) há uma profunda alteração no exercício do trabalho. A própria geração de valor vai mudando e esse é um ponto ainda pouco estudado. Algumas das empresas mais fortes hoje se encontram no setor de informação, com seus trabalhadores do conhecimento. A base material tem sempre o que dizer e acredito que a própria Democracia irá se reformar muito em função dessas alterações.

Aylê-Salassié F. Quintão* - Heróis de hoje serão os vilões amanhã

Este País é, de fato, muito grande e diversificado para ser conduzido pelo bom ou mau humor de um homem só . Como o eleitor se engana, hein! Surpreende ver  as coisas andando - aos trancos e barrancos - mas, aparentemente, sozinhas. O presidente sempre viajando e o vice receoso de assumir. É tudo muito litúrgico, e sem efeitos práticos. Atira-se para todos os lados: criminaliza-se  e se descriminaliza de todos os jeitos. É uma verdadeira "deglutição" ao estilo macunaímico, seja no Executivo, no Legislativo ou no Judiciário.

Concluo que a  Nação pode estar  diante de um modelo poético ou  de uma grande farsa. Ninguém acredita - e nem é para acreditar mesmo - que  estamos numa democracia, alimentada  por uma aristocracia, de base corporativa , que   flutua nas superfícies constitucionais, surfando  pelos corredores dos palácios de Governo.

Poesia | A vida, de Mario Quintana

 

Música | Anitta & Jetlag - Zé do Caroço

 

terça-feira, 1 de outubro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Decisão de Toffoli incentiva leniência com corrupção

O Globo

Sozinho, mais uma vez ministro anulou processos contra outro réu confesso da Operação Lava-Jato

Faz um ano que o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), vem anulando decisões da Operação Lava-Jato e de outras operações de vulto contra a corrupção em decisões individuais, com a anuência da maioria da Segunda Turma da Corte. A última, anunciada na semana passada, beneficiou Leo Pinheiro, ex-presidente da construtora OAS. Réu confesso, Pinheiro relatou propinas na Petrobras e as reformas no apartamento do Guarujá e no sítio de Atibaia que levaram aos processos, depois anulados, contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Toffoli acatou a versão da defesa, segundo a qual Pinheiro, condenado a mais de 30 anos de prisão, foi vítima de “ilegalidades processuais”. Sozinho, cancelou todas as ações contra ele. Tem sido esse o procedimento-padrão no desmonte da maior operação contra corrupção da História do Brasil. Nada de debate no plenário, nenhuma possibilidade de a população ouvir opiniões divergentes. É difícil pensar que isso contribua de algum modo para a confiança dos brasileiros no Judiciário.

Em setembro do ano passado, Toffoli invalidou as provas do acordo de leniência firmado pela Odebrecht (hoje Novonor). Tornou nulos todos os dados obtidos pelos sistemas de informação do “departamento de propinas” da empreiteira. Cinco meses depois, suspendeu o pagamento das multas. Em maio, anulou as decisões da Lava-Jato contra o também réu confesso Marcelo Odebrecht, ex-presidente da empreiteira. Ele baseou seu despacho nas mensagens trocadas pelo então juiz Sergio Moro e integrantes do Ministério Público. Obtidas de forma ilegal, elas mostraram cooperação entre os responsáveis pela acusação e o juiz. A partir da decisão que beneficiou a Odebrecht, sabia-se que haveria uma avalanche de pedidos de condenados.

Merval Pereira - Voto útil

O Globo

Levantamentos preliminares indicam que a direita terá uma vitória importante no quadro nacional. A presença de Marçal, no entanto, vitorioso tanto quanto Tabata na esquerda mesmo que não vença, deixa o futuro incerto na direita

O voto útil, esse nosso velho conhecido nas eleições, responsável por tantas surpresas nas últimas campanhas eleitorais, volta a dar as caras nas duas maiores cidades do país, São Paulo e Rio de Janeiro. A mais recente foi a vitória de Wilson Witzel para o governo do Rio. Para evitar que Romário pudesse ir para o segundo turno contra Eduardo Paes, muita gente pregou o voto útil em Witzel na ilusão de que seria derrotado no segundo turno com facilidade. Não contavam com a tempestade perfeita que vinha a reboque do fenômeno Bolsonaro naquele 2018, que transformou aquele juiz desconhecido em um fenômeno, passageiro felizmente.

Ao mesmo tempo que, no Rio de Janeiro, o reconhecimento de Ramagem como candidato apoiado por Bolsonaro o leva a melhorar de posição, em São Paulo os candidatos da direita dividem o eleitorado bolsonarista e caminham de maneira quase independente nos últimos dias de campanha, sem que o ex-presidente tente intervir.

À esquerda, também o presidente Lula se afasta da candidatura de Boulos, certo de que dificilmente terá chance de ver seu candidato vencer a disputa, mesmo que vá para o segundo turno. O problema da esquerda paulistana é não ter representante no segundo turno, o que seria uma derrota de grandes proporções. A disputa acirrada pelo segundo turno levou a que um grupo de artistas e intelectuais divulgasse texto defendendo o voto útil a favor de Boulos, para impedir que a direita leve seus dois candidatos ao segundo turno.

Míriam Leitão - O que já se sabe destas eleições

O Globo

As pesquisas das eleições municipais mostram que Bolsonaro não é um bom cabo eleitoral, mas o PT também não tem o que comemorar

A uma semana da eleição, já se pode afirmar que o ex-presidente Jair Bolsonaro não se revelou um grande eleitor. Em São Paulo, caso o candidato Ricardo Nunes vença, a vitória será atribuída ao governador Tarcísio de Freitas. Se ele perder, será debitado na conta de Bolsonaro, que não defendeu a candidatura e viu parte do seu eleitorado migrar para Pablo Marçal. No Rio, seu reduto eleitoral, o candidato apoiado pelo ex-presidente, Alexandre Ramagem, subiu, mas está na reta final com 20% dos votos. Essa é a visão do cientista político, Carlos Melo, do Insper. “Ele não sai dessa como grande eleitor, ele sai fragilizado até porque se for mantida a inelegibilidade, Bolsonaro não tem expectativa de poder.”

As pesquisas de ontem da Quaest mostraram que em Belo Horizonte, o candidato bolsonarista Bruno Engler cresceu, mas ainda está em segundo. No Recife, o ex-ministro do Turismo Gilson Machado está com 11% numa eleição já decidida.

Luiz Gonzaga Belluzzo - Dívida pública: as garantias da maldição

Valor Econômico

Os catastrofistas de mercado esperneiam para promover a elevação da Selic

Não cessa a barulhenta inconformidade com a relação dívida/PIB. Na visão dos catastrofistas, o risco fiscal está associado a uma trajetória “insustentável” da dívida pública.

Não são poucos os que antecipam um calote na dívida do Estado. Calote? Seria devastador para a riqueza financeira privada, aquela que frequenta os balanços de bancos, fundos, gestoras de ativos e seus clientes do dinheirão e do dinheirinho.

Em sua trajetória secular, o capitalismo abriu espaço para o surgimento e desenvolvimento de instituições encarregadas de administrar a moeda e os estoques direitos - títulos de dívida e ações - que nascem de seu incessante movimento de criação e apropriação do valor.

No afã de se apropriar da riqueza, as criaturas do mercado estão submetidas à soberania monetária do Estado. O Estado é o senhor da moeda, mas os bancos, sob a supervisão e o controle do Banco Central, são incumbidos de atender à demanda de crédito das gentes privadas. Esse sistema complexo, em sua evolução, engendrou essa forma de criar dinheiro para dar início ao jogo do mercado. Os bancos apresentam-se como os agentes particulares do senhor da riqueza universal. Universal, porque a forma inescapável que deve denominar e mediar todas as negociações, transações e, sobretudo, marcar o valor da riqueza registrada nos balanços.

Luiz Schymura - O que pode estar por trás dos erros de previsão do PIB

Valor Econômico

Além das reformas de vulto, há políticas que vêm sendo trabalhadas sem muito alarde e que também trazem ganhos relevantes para a economia do país

Nos cenários apresentados pelos analistas de conjuntura econômica, um aspecto tem chamado a atenção da classe política e dos formadores de opinião: o erro sistemático na previsão do PIB. Ao se avaliar uma série, com dados a partir de 2020, de projeções decrescimento econômico no boletim Focus do Banco Central para o ano subsequente, é fácil constatar que as subestimações para o PIB são recorrentes e significativas.

Em dezembro de 2020, a média das expectativas apontava crescimento de 3,4% para o PIB de 2021. Todavia, a taxa efetivamente aferida ficou em 4,8%. No término de 2021, o cenário apontava apenas 0,4% de elevação para 2022, e acabaram acontecendo vistosos 3%. Já no encerramento de 2022, a perspectiva era de que 2023 vivenciasse um crescimento do PIB de somente 0,8%. No caso, a surpresa também ocorreu e foi bastante favorável, 2,9%. Por fim, no ano passado, havia o entendimento de que o PIB terminaria 2024 com uma expansão na casa de 1,5%. No entanto, as projeções já apontam para uma ampliação na faixa de 3%.

Maria Cristina Fernandes - Marçal e ‘bets’, faces da mesma moeda

Valor Econômico

Candidato do PRTB surfou na ilusão do dinheiro fácil e se valerá dela para enfrentar a crescente rejeição feminina

O voto envergonhado deu ao ex-presidente Jair Bolsonaro cinco pontos percentuais a mais do que a média das últimas pesquisas do segundo turno de 2022 registravam. O candidato do PRTB à Prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal, pode vir a ser beneficiado pelo mesmo fenômeno, ainda que tenha ficado mais difícil para ele diminuir a rejeição feminina depois de dizer que é burrice votar em mulher.

Emulou seu apoiador, o fundador do grupo G4 Educação, Tallis Gomes, que pediu a Deus para livrá-lo de uma CEO mulher e sua própria esposa, Carolina Marçal, que, no seu livro, “A verdadeira força da mulher”, disse que a mulher é substituível na profissão mas não nos cuidados com o marido e os filhos. Até domingo, Marçal vai tentar tirar o voto envergonhado das mulheres do armário com suas armas habituais enquanto os adversários tentarão empurrá-lo de volta com a declaração do candidato no debate da Folha/Uol.

Eliane Cantanhêde - Ousadia ou delírio?

O Estado de S. Paulo

Marçal caiu de paraquedas na eleição de São Paulo, mas o céu é o limite para a sua ambição

Não se brinca com fogo, nem na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal, nem nas eleições para qualquer esfera de poder, mas a campanha de 2024 girou o tempo todo e continua girando até o fim em torno de um personagem como Pablo Marçal, como se não houvesse mais ninguém disputando em São Paulo e não tivesse eleição no Brasil inteiro. Isso é brincar com fogo.

Ninguém sabe exatamente como Marçal caiu de paraquedas na eleição para a principal capital do País. Nem como nem por que caiu, com quem e principalmente para o quê. Mas todo mundo já sabe que ele veio para tumultuar, confundir, provocar, mentir e… dar saltos ainda mais altos.

Carlos Andreazza - O direito xandônico

O Estado de S. Paulo

Por que multar a recém-nomeada representante legal do X, senão para intimidá-la?

O bloqueio ao X no Brasil continua. A empresa já tem representação regularizada; teve transferidos os milhões necessários ao pagamento de multa; cumpriu a ordem de bloqueio de contas na plataforma. E permanece fora do ar.

Permanecerá até quando Alexandre de Moraes quiser. O ministro já determinou algumas condições para o fim da censura. A cada semana, cria novas exigências, que se desdobram das precedentes. Está sempre faltando algo; lista extra – surpresa! – que conhecemos assim que cumpridas as demandas anteriores. Logo faltarão comprovante de residência e fotos 3x4.

Luiz Carlos Azedo - Febre de apostas tem freio de arrumação

Correio Braziliense

O governo corre atrás do prejuízo, depois de fazer vista grossa à jogatina digital, na expectativa de aumentar a arrecadação de impostos

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou, ontem, que até 600 sites de apostas on-line, as chamadas bets, serão banidos do Brasil nos próximos dias por irregularidades em relação à legislação aprovada pelo Congresso Nacional. Desde a semana passada, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) está fazendo um pente-fino para bloquear os sites. O ministro recomendou aos apostadores que retirem seu dinheiro o quanto antes. Haddad admitiu que a febre de apostas está "completamente fora de controle" e que os sites devem ter regulamentação, como acontece com o fumo e a bebida alcoólica.

Joel Pinheiro da Fonseca - O 'jogo do tigrinho' eleitoral

Folha de S. Paulo

Em meio a mentiras, sobra pouco espaço para Marçal falar da cidade

Numa eleição marcada por insultos e trocas de acusações, alguns se sobressaem como especialmente precisos. É o caso da comparação que Tabata Amaral lançou sobre Pablo Marçal: ele é o "jogo do tigrinho" da eleição.

Para quem não sabe, o "jogo do tigrinho" é um jogo de azar eletrônico que promete altas recompensas em dinheiro, mas que na verdade é programado para arrancar o máximo possível do jogador.

Todos os sinais apontam que é uma furada: por que uma empresa daria dinheiro fácil assim? É óbvio que ela vive de tirar dinheiro de quem é tolo o bastante para acreditar na promessa. O influenciador que te garante que o jogo paga bem recebe altas cifras para fazer esta propaganda —o jogo paga bem a ele! Todo mundo sabe disso. E, no entanto, o jogador acredita e aposta. Nas condições certas, o salto de fé parece uma chance de salvação. O resultado é previsível.

Hélio Schwartsman - O sobrevivente

Folha de S. Paulo

Netanyahu prolonga e amplia conflito para evitar responsabilização pelas falhas de segurança de seu governo

Não importa o que você pense de Binyamin Netanyahu, é preciso tirar o chapéu para sua capacidade de sobrevivência política. Nos dias que se seguiram ao ataque terrorista de 7 de outubro perpetrado pelo Hamas, a situação do premiê israelense parecia insustentável.

Se a democracia é o regime da responsabilização de dirigentes, as falhas de segurança sob seu governo eram grandes demais para ser ignoradas. O fracasso era duplo, operacional e na estratégia de como lidar com os palestinos.

Dora Kremer - 'Direitas' entram em cena

Folha de S. Paulo

A habitual divisão de grupos na esquerda agora também toma conta da direita

Brigas internas e divisões entre partidos sempre foram características da esquerda. Isso deu origem ao termo "esquerdas", falado como se houvesse mais de um lado esquerdo a se contrapor ao flanco direito.

Pois agora já se pode atualizar a imprecisão e permitir referência a "direitas". Junto à perda de inibição dessa banda em dizer seu nome em voz alta, surge nesse espectro ideológico o elemento da divisão.

Alvaro Costa e Silva - Guarda municipal armada

Folha de S. Paulo

A surpresa são eleitores do Rio, que dizem 'chega'

Atribuição dos governadores, a segurança pública se tornou literalmente a pauta-bomba das eleições. É citada como principal problema por moradores de 7 das 10 capitais mais populosas do país. Os candidatos a prefeito anunciam um mundo de paz, omitindo as limitações a que terão de se submeter. Eleitos, eles poderão ajudar, com as guardas municipais, na prevenção e proteção. Além de fazer o básico: conservação, limpeza e iluminação do patrimônio; instalação de vigilância tecnológica.

Poesia | Um dia você aprende, de William Shakespeare

 

Música | Noite Ilustrada & Quinteto Branco e Preto

 

segunda-feira, 30 de setembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Ataque a Hezbollah era necessário para conter ameaça

O Globo

Agora, para conter danos aos civis e obter reféns de volta, as partes devem buscar um cessar-fogo

Horas depois do monstruoso ataque terrorista do grupo palestino Hamas em 7 de outubro do ano passado, quando nem se sabia ao certo quantas centenas de pessoas haviam sido massacradas, sequestradas ou abusadas sexualmente, o grupo xiita libanês Hezbollah — responsável por dezenas de atentados terroristas em vários continentes, inclusive na América Latina – começou a bombardear o norte de Israel de suas bases no sul do Líbano. Foram lançados desde então mais de 10 mil foguetes, forçando o êxodo de 67.500 habitantes da região. Foi esse o motivo para Israel atacar o Líbano nas últimas semanas, começando com a explosão sincronizada de perto de 3 milhares de pagers usados para comunicação entre integrantes do Hezbollah e culminando com a morte de seu líder, Hassan Nasrallah, atingido por um ataque em Beirute enquanto participava de uma reunião no subsolo de um prédio residencial na sexta-feira.

A ofensiva israelense deixou milhares de feridos e centenas de mortos, entre eles as principais lideranças do Hezbollah, representantes do governo iraniano e, lamentavelmente, civis inocentes, inclusive dois brasileiros. Ao contrário de Israel, que dispõe de um sofisticado sistema de defesa antiaéreo capaz de interceptar mísseis e foguetes ainda no ar — testado em seu limite por um ataque iraniano meses atrás —, o Hezbollah opera, a exemplo de seu congênere Hamas, infiltrado na população civil libanesa, usada como escudo humano para dissuadir ataques. Só que o Hezbollah é mais sofisticado e poderoso que o Hamas. Seu arsenal, estimado entre 150 mil e 200 mil foguetes, lhe confere dez vezes o poder de fogo do grupo palestino. O Hezbollah também é dependente militar e financeiramente de Teerã, mas os vínculos são mais fortes. Como o Irã, professa a vertente mais extremista do fundamentalismo xiita, almeja a destruição de Israel e está em conflito aberto com os valores (e países) ocidentais há décadas. O Hezbollah usufrui um status especial no Líbano, que lhe permite, ao mesmo tempo, manter representação política e uma milícia própria, além de comandar bancos, fornecimento de energia e um sistema econômico paralelo.

Fernando Gabeira - Todos os tons do setembro amarelo

O Globo

Não existe perigo de o planeta acabar, mas sim de a vida humana tornar-se inviável nele

Começou o outono em Nova York. Estive concentrado na cidade porque os líderes mundiais falariam na ONU. E também porque minha filha Maya estava por lá. O que tem a ver uma coisa com a outra? O trânsito. Ela precisava se deslocar entre um e outro evento sobre defesa do oceano e fez uma curta viagem à Califórnia. Sofreu com as longas viagens de táxi.

Os discursos na ONU se sucediam indiferentes aos pequenos transtornos urbanos. Imagino aquele prédio como um imenso transatlântico com seus oradores navegando num mar tempestuoso, repleto de icebergs.

Ouço uma voz em português de nosso presidente advertindo para a catástrofe climática. Soa sensato, mas, a 8 mil quilômetros de distância, o que sentimos ainda é o calor do fogo, o cheiro de fumaça. Estamos destruindo o planeta com regularidade, sem discriminação.

O outono começa por lá. Por aqui o inverno acabou. Ainda restam algumas folhas de amendoeira não recolhidas na Rua Almirante Saddock de Sá.

Preto Zezé - Rumo às urnas

O Globo

É preciso diferenciar a politização fácil das redes de discursos realmente conectados com a realidade

Com quase 20 milhões de pessoas, as favelas representam uma fatia importante a ser disputada pelos candidatos no próximo pleito. O futuro está nas mãos dessas populações, mais lembradas em tempos de eleição. Como dizia um professor meu:

— Favelado fica mais importante em época de eleição.

O favelado enfrenta dificuldade para participar da política. Há uma visão equivocada de que todos votamos nos mesmos candidatos.

A política tem sido a maior invenção de transformação social. Quando se participa dela, descobrem-se os caminhos dos espaços de poder e decisão. Com o advento das redes sociais, os excluídos, por um lado, ganharam voz, mas, por outro, viraram presas fáceis para todo tipo de aproveitador.

Os debates e apresentações são cada vez mais teatrais, buscando a espetacularização ou até ridicularização da política. Não há espaço para propostas sérias. Tudo parece girar em torno de curtidas que se convertem em votos.

Lygia Maria - Vícios sem paternalismo estatal

Folha de S. Paulo

Seja no caso das bets ou das drogas, poder público deve escolher o melhor problema, ou seja, o mais manejável com os recursos escassos disponíveis

O gasto de R$ 3 bilhões em apostas online (bets) por beneficiários do Bolsa Família inflamou o debate público.

Produtos que causam externalidades negativas —como dependência física ou psicológica— tendem a ser tratados, pelo Estado e pela sociedade, por um viés moralista que incita medo. A consequência são políticas paternalistas e punitivistas que, geralmente, não apenas não contêm o problema como ainda o pioram.

guerra às drogas é o exemplo clássico. Quaisquer prejuízos que o consumo de maconha ou cocaína possam causar nem sequer chegam perto dos efeitos nefastos da proibição, como o monopólio pelo crime organizado, as disputas entre cartéis do tráfico e suas facções, a violência urbana que atinge sobretudo a população mais pobre e a corrupção policial e do sistema de justiça.

Ana Cristina Rosa - A marca das eleições municipais 2024

Folha de S. Paulo

A violência política mingua a democracia, e as condenações são irrisórias

Entre cadeirada, soco, cusparada, intimidações, ataques e ameaças de morte, a violência política tornou-se a marca das eleições municipais de 2024.

A menos de uma semana para o primeiro turno do pleito (no dia 6 de outubro), é difícil encontrar quem não saiba de alguma ofensiva criminosa contra postulantes a prefeituras ou câmaras de vereadores pelo país.

O caso mais estarrecedor foi transmitido ao vivo pela televisão e envolveu dois homens na disputa pelo comando da maior cidade da América Latina.

Mas, para além do matiz ideológico, gênero e raça têm servido de agravantes da violência política, fazendo das mulheres (em especial as negras) o principal alvo.