domingo, 1 de outubro de 2023

Merval Pereira - O consenso possível

O Globo

Embora o governo tenha conseguido formar uma maioria eventual para temas específicos da política econômica, continua minoritário no Congresso

As recentes pesquisas de opinião demonstram que a lua de mel tradicional no primeiro ano entre a sociedade e o novo governo eleito está sendo superada pela polarização partidária que se mantém ativa no país. Embora o governo petista tenha conseguido, às custas de excessivas concessões ao Centrão, formar uma maioria eventual para temas específicos da política econômica, continua minoritário no Congresso.

A incongruência ideológica entre os três Poderes, analisada aqui na coluna de quinta-feira, com um Executivo de esquerda, um Legislativo predominantemente conservador e um Supremo Tribunal Federal (STF) majoritariamente progressista, gera conflitos entre eles que o novo presidente do Supremo nega, mas se dispõe a mediar, e pode ser também uma virtude, na visão do cientista político das Fundação Getulio Vargas do Rio, Carlos Pereira.

Ele vê entre nós um sistema político extremamente competitivo e de perfil “consensualista”, o qual não permite que nenhuma força política consiga sozinha ser majoritária. As saídas dos conflitos, quase que inexoráveis, portanto, precisam ser negociadas e pactuadas a todo momento. Por um lado, adverte, perdemos eficiência governativa, “temos a sensação de que nada acontece ou, quando acontece, é fruto de negociações escusas, o que gera mal-estar, muitas vezes generalizado”.

Míriam Leitão - Um recomeço com emoção

O Globo

Posse de Barroso como presidente do STF teve emoção e também sensação de alívio pelo afastamento do perigo real que a democracia enfrentou

A posse do ministro Luís Roberto Barroso foi bonita. Sim, teve Maria Bethânia e, quando ela canta, “há uma fagulha de divino” como disse Barroso. Sim, o discurso do novo presidente foi literário. Mas a beleza maior era outra. Havia uma sensação de alívio no ambiente, pelo afastamento do perigo real que a democracia enfrentou. Palmas acolhiam o nome da ministra Rosa Weber, cada vez que era pronunciado. O que se aplaudia era sua firmeza na reconstrução do Supremo Tribunal Federal após o 8 de janeiro. “Estivemos aqui naquela noite — a ministra Rosa, o ministro Toffoli e eu próprio — vimos os destroços e foi uma emoção em tão pouco tempo ver tudo reconstruído.” Foram 21 dias para os consertos físicos. Para os institucionais, ainda estamos em obras.

Constatei o sentimento de alívio pelo perigo autoritário afastado, até em pessoas que colaboraram direta ou indiretamente com o governo anterior, inclusive militares. Os detalhes relatados por testemunhas dos bastidores daquele governo confirmam que a democracia brasileira teve, por quatro anos, um presidente à espreita, esperando a hora de golpeá-la.

Bernardo Mello Franco - Brazão volta à mira

O Globo

Apuração sofre nova reviravolta e será federalizada após delação de ex-PM

A investigação da morte de Marielle Franco passa por nova reviravolta. Há poucos dias, o inquérito que apura o assassinato da vereadora e do motorista Anderson Gomes saiu do Rio e foi enviado ao Superior Tribunal de Justiça. O motivo é o surgimento de novas suspeitas sobre Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado.

Na prática, a mudança de foro fará com que a investigação seja federalizada. Isso ampliará os poderes da Polícia Federal, que voltou ao caso no início do ano por determinação do ministro Flávio Dino.

Em março, a Justiça do Rio rejeitou uma primeira denúncia contra Brazão. Ele havia sido acusado de plantar pistas falsas para atrapalhar a identificação dos mandantes do crime.

O ex-deputado estadual voltou à mira após a delação premiada do ex-PM Élcio Queiroz. Num trecho que já veio a público, ele confessou ter dirigido o carro usado no ataque e confirmou que Ronnie Lessa foi o autor dos disparos.

Luiz Carlos Azedo - A fumaça que encobre Manaus e as novas cadeias de valor

Correio Braziliense

A Zona Franca adotou o velho vício que esgotou o modelo de substituição de importações: criar obstáculos à concorrência

Uma onda de fumaça, proveniente das queimadas da Amazônia, em razão da mudança do regime de ventos provocada pelo El Niño, nos últimos dias encobriu a paisagem e transformou a cidade de Manaus numa capital irrespirável. O jovem deputado federal Amom Ridel (Cidadania-AM), eleito aos 22 anos com 288 mil votos, um fenômeno político de sua geração, desistiu de convocar uma manifestação de protesto porque o ar estava irrespirável e os olhos das pessoas ardiam quando saiam às ruas.

Amom optou por percorrer os gabinetes de Brasília, entre os quais o de Marina Silva (Meio Ambiente), em busca de socorro federal, e pôs a boca no trombone, ou melhor, os dedos no teclado, para denunciar a situação e a omissão das autoridades locais nas suas redes sociais. Só então o governador do Amazonas, Wilson Miranda Lima (União Brasil), principal responsável pela gestão da crise ambiental, decretou o estado de emergência.

Elio Gaspari - Lula quer mudar o mundo

O Globo

Lula viajou pelos sete mares propondo uma nova governança mundial para o meio ambiente, a reforma do Conselho de Segurança da ONU e novas moedas para as transações internacionais. Tudo muito bonito, mas, quando ele voltar ao Planalto, terá um país onde coisas mais imediatas e graves estão queimando nas panelas.

1- O Supremo Tribunal Federal e o Congresso estão em curso de colisão com temas como o aborto e a demarcação de terras indígenas.

2- A base de apoio parlamentar do governo virou uma paçoca, com o Centrão pedindo a entrega da Caixa Econômica de “porteira fechada”. Ou ainda o loteamento da Funasa.

3- A segurança pública nacional está acuada entre a anomia e a selvageria. De um lado, o crime tornou-se um poder paralelo na Amazônia. De outro, a Bahia tornou-se campeã nas estatísticas de letalidade policial. De lá, vêm as notícias de que foram mortos “nove suspeitos” numa operação contra traficantes realizada na periferia de Salvador. O que vem a ser um “suspeito” morto? Essa figura pertencia à necropolítica do Rio de Janeiro. A Bahia tem governos petistas desde 2007. Um de seus ex-governadores é o atual chefe da Casa Civil; outro lidera a bancada do governo no Senado.

Dorrit Harazim - Dores civilizatórias

O Globo

Enfadados, assistimos a guerras reais em tempo real, com a geopolítica mundial em terreno movediço

Para tempos incertos, recomenda-se apaziguar a alma com algum dos escritos de Bertrand Russell. Não apenas porque esse generoso filósofo e matemático do século XX sabia pensar, como também porque sabia escrever — tanto assim que levou o Nobel de Literatura em 1950. Acima de tudo, porém, ele foi um humanista, e é de humanistas com profundo respeito pela História que nosso planetinha mais carece.

Tome-se, ao acaso, “New Hopes for a Changing World” (de domínio público no original em inglês), escrito quando o mundo começava a se reconhecer entre os destroços da Segunda Guerra e o medo de um novo perigo, o nuclear. Vivia-se um “sentimento de impotente perplexidade”, em meio ao qual quem ostentava certezas era ignorante, e os dotados de criatividade, de percepção da realidade, afundavam em dúvidas e indecisão.

— Homens e mulheres manifestam dúvidas genuínas sobre o que é certo ou errado — escreveu o pensador — a ponto de “certo” e “errado” serem frequentemente descartados como superstições obsoletas.

Nada mais atual que essa tormenta universal definida por Russell como “dores do amadurecimento de nossa civilização”. Hoje, essas dores se agravaram, e o que mais se vê é ausência de maturidade no horizonte. Regredimos para aquém do “certo” ou “errado”, pois nem sequer nos entendemos sobre o que existe, o que é real, o que é fato. Nessa toada, nosso tripé de embates civilizatórios — com a natureza, com nossos semelhantes e de cada um consigo mesmo — retrocedeu algumas casas.

Eliane Cantanhêde - Mar de sangue

O Estado de S. Paulo

Em Brasília, crise entre os Poderes; no Brasil real, um mar de violência e de sangue

Enquanto os três Poderes se estranham, a segurança pública está uma tragédia nas capitais, grandes cidades, em toda parte, e passa a ser a preocupação número um dos brasileiros, governadores e prefeitos e desaba na capital da República, onde o governo Lula articula uma espécie de pacto nacional contra a violência, envolvendo Poderes, Estados, municípios, mídia, academia e, onde couber, iniciativa privada.

Sob fogo cerrado, ou fogo amigo, o ministro da Justiça, Flávio Dino, corre contra o tempo para alinhavar um projeto ambicioso contra essa calamidade. Na segunda-feira passada, reuniu o ministro de Portos e Aeroportos, o diretor-geral da PF, Andrei Passos, assessores e secretários e ouviu os governadores do Rio e da Bahia, onde a coisa está pior, e também a governadora de Pernambuco, às voltas com crise no sistema penitenciário.

Jorge Caldeira* - Capital ambiental desenvolve?

O Estado de S. Paulo

Pode ser que fração relevante da montanha de capital para aplicação em energia renovável e fixação de carbono desabe cada vez mais por aqui. Bom? Nem sempre

A pergunta do título talvez expresse um antigo senso comum nacional – que destoa de certos movimentos da economia. Começando por estes: um fluxo de riqueza acumulada, na forma de capital, medido num mínimo de US$ 2 trilhões anuais, está indo especialmente de investimentos em carvão, gás e petróleo para aplicações basicamente em energia renovável e fixação de carbono.

Esse fluxo tem o Brasil como um dos alvos preferenciais – o que gera um inusitado problema. O Produto Interno Bruto (PIB) do País flutua em torno de US$ 1,5 trilhão. Paira a possibilidade de uma fração relevante da montanha de capital, de magnitude maior que esse PIB, desabar cada vez mais por aqui.

Jaime Pinsky* - Nossas cidades

Correio Braziliense

O crescimento desorganizado provoca o surgimento de cidades com populações incompatíveis com sua estrutura de serviços

Meus leitores com mais de 50 anos de idade nasceram em um país rural. Hoje somos uma nação urbana, cheia de cidades, algumas delas enormes. Brasília, que acaba de se tornar a terceira maior, batida apenas por São Paulo e Rio de Janeiro, é uma exceção, pois começou a ser construída após ser planejada. A regra, em nosso país, é não planejar nada, ou só planejar alguma coisa depois que as cidades estão de pé, cresceram e incharam, trazendo problemas insolúveis. Basta ver o problema da Cracolândia, em pleno centro de São Paulo. Uma parte importante da cidade é subutilizada porque algumas centenas de dependentes de drogas se instalaram em ruas, estimulados por um comércio que supostamente não deveria existir e impedindo a vida normal de milhares de cidadãos.

Por conta do crescimento desorganizado temos muitas cidades com populações incompatíveis com sua estrutura de serviços. Enquanto Lisboa (almejada por muitos brasileiros), Manchester (que tem o melhor time de futebol do mundo) e Lyon, a terceira maior cidade da França não registram mais de 500 ou 600 mil habitantes, temos numerosas cidades com população bem maior do que elas no Brasil. O êxodo rural, fenômeno concomitante com o desenvolvimento industrial (não por acaso), em diferentes fases da nossa história, tornou-se mais intenso em nosso país a partir dos anos 1970 e provocou o crescimento, geralmente desordenado de nossas cidades. E o que as pessoas buscam nas cidades, desde a Antiguidade? Ora, gente procura gente, não apenas ocupação e segurança, gente procura liberdade e direitos, não apenas um cantinho para construir sua casa.

Vinicius Torres Freire - Governo vai cobrar imposto de Shein, Shopee etc., mas ainda não sabe como

Folha de S. Paulo

Criação de tributo sobre compras de menos de US$ 50 pode demorar pelo menos dois meses

Empresários do varejo têm procurado gente do governo para pedir a cobrança de imposto sobre as importações de produtos com valor até US$ 50 —além desse valor, a alíquota é de 60%. Para as compras por meio de plataformas de comércio eletrônico que aderem ao programa "Remessa Conforme", não há imposto federal, apenas 17% de ICMS (estadual).

Gente do governo diz que vai haver imposto, mas é difícil que se adote alguma decisão em menos de dois meses. Quanto imposto? Talvez uma alíquota entre 20% e 25% (além dos 17% do ICMS). É possível também que se discuta um aumento do ICMS estadual, para 25%. O assunto ainda está enrolado.

No começo do ano, o Ministério da Fazenda tentou colocar ordem nessas importações e na cobrança de imposto. Deu o rolo sabido, pois a providência é impopular e caiu nas redes insociáveis. Em abril, a Fazenda deu um passo atrás, por ordem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Celso Rocha de Barros* - Movimentos 'identitários' querem conquistar coisas, não cancelar pessoas

Folha de S. Paulo

Demissão de assessora levou turma de sempre a ressuscitar variantes do 'racismo reverso'

Não é fácil a oposição de direita reclamar da aliança de Lula com o centrão, porque a oposição de direita e o centrão são mais ou menos as mesmas pessoas. A política econômica de Haddad é bem moderada e está dando certo. Restou ao pessoal, portanto, reclamar do "identitarismo".

As críticas recentes foram suscitadas pela postagem de uma jovem assessora do Ministério da Igualdade Racial no dia da final da Copa do Brasil. De maneira infeliz, ela ofendeu os são-paulinos por serem europeus, brancos e paulistas. Foi demitida. Torço para que se reerga na carreira.

O episódio levou a turma de sempre a ressuscitar variantes do tema "racismo reverso", o racismo de negros contra brancos.

Bruno Boghossian - Oposição procura gatilho ultraconservador para despertar eleitorado

Folha de S. Paulo

Direita bolsonarista tenta inflar de maneira artificial itens adormecidos da chamada guerra cultural

Há pouco mais de uma semana, deputados bolsonaristas aproveitaram uma sexta-feira morna e lançaram uma isca falsa para seus seguidores. Em tom indignado, espalharam o alerta de que Lula havia instituído o "banheiro unissex" no Brasil.

A gritaria não fazia sentido. O alvo era uma resolução contra a discriminação em instituições de ensino, recomendando a "instalação de banheiros de uso individual, independente de gênero, para além dos já existentes masculinos e femininos". Além de não citar espaços compartilhados, o texto havia sido editado por um conselho que não tem nenhum poder de decisão.

Aquela não foi uma distorção inocente. A direita bolsonarista abusa de gatilhos ultraconservadores para replicar o pânico moral das últimas eleições e inflar de maneira artificial o peso de itens adormecidos da chamada guerra cultural.

Muniz Sodré* - Sons do silêncio

Folha de S. Paulo

Na crise de consenso das classes dirigentes, o que se defende com estatuto ministerial é o status-quo bem-nutrido contra a imprevisibilidade dos precarizados de tudo

"As pessoas ficam, as instituições passam." Este penoso ato falho do procurador-geral da República em seu discurso de despedida no STF pode trazer alguma luz também para as ruminações do ministro da Defesa sobre a relutância de militares em saírem de cena. Na insuperável autoapoteose do procurador, o silêncio vestiu capa de super-herói. Se houvesse algum grau de realidade, não faltariam, num ambiente próprio a latinórios, interjeições do tipo "valete et plaudite!" (amém!, assim seja!). O protocolo, porém, foi sóbrio.

Ato falho é uma espécie de fala silenciada, que transparece num equívoco e pode resultar em acerto. Décadas atrás, já pública a intenção da ditadura de devolver o poder aos civis, determinado ministro militar declarou na tevê que "sim, era hora de voltar à caverna". Lapso de língua, inequívoco ato falho freudiano, sujeito a interpretação diversa daquela em que incorreu o procurador.

Hélio Schwartsman - Física existencial

Folha de S. Paulo

O passado ainda existe? Partículas pensam? Livro discute com rigor questões instigantes da ciência

Fui dormir mais aliviado depois de ler "A Ciência Tem Todas as Respostas?", de Sabine Hossenfelder. É que, a uma dada altura do livro, ela diz que não podemos estar seguros de que é correta a ideia, muito popular entre os físicos, de que no futuro distante (para lá de 10100 bilhões de anos) o Universo conhecerá sua morte térmica. Sim, é isso mesmo, leitor, o fim derradeiro não é uma certeza, porque não sabemos se, nessas escalas de tempo, as atuais leis da física continuarão válidas. É bem verdade que Hossenfelder também diz que não podemos descartar a possibilidade de que ocorra a qualquer momento um decaimento espontâneo do vácuo, que dilaceraria instantaneamente toda a matéria do Universo. Mas, eterno otimista que sou, me fixei mais na primeira do que na segunda possibilidade.

Samuel Pessôa* - A nova onda de política industrial

Folha de S. Paulo

Políticas de desenvolvimento industrial foram essenciais para leste asiático

Nos últimos dez anos tem havido renovado interesse da academia pelas políticas de desenvolvimento industrial (PI).

A nova literatura, no meu entender, demonstra convincentemente que a PI foi essencial para as mudanças na estrutura produtiva que ocorreram nos países de desenvolvimento rápido do leste asiático. Nesse sentido, a literatura recente de economia confirma os achados de uma literatura dos anos 1980 e 1990 da sociologia.

Esses resultados são contrários a resultados anteriores da academia em economia. As mudanças decorreram de uma melhora substancial na capacidade de mensuração do emprego da PI e de seus impactos.

Por exemplo, Nathan Lane, em cuidadoso trabalho empírico, documentou em detalhe que a política industrial praticada entre 1971 e 1979 pelo governo do presidente Park, de internalizar a indústria pesada (petroquímica, siderúrgica e naval), foi muito bem-sucedida em alterar a estrutura da indústria sul-coreana. O bonito no trabalho é que há evidências de que a decisão tomada pelo presidente pode ser considerada exógena à dinâmica da indústria.

O que a mídia pensa: editoriais / opiniões

Esqueletos fiscais

Folha de S. Paulo

Governo acerta ao querer regularizar precatórios, mas não pode usar artifícios

Uma despesa vultosa e de crescimento acelerado nos últimos anos tem sido escamoteada desde 2022 pelo governo brasileiro. Trata-se do pagamento de precatórios, para o qual a administração de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) apresentou agora uma proposta tortuosa.

O problema se originou sob Jair Bolsonaro (PL), que, com a anuência do Congresso, escapou de pagar integralmente uma conta de quase R$ 90 bilhões imposta por sentenças judiciais. O calote abriu espaço para mais gastos em ano eleitoral.

Uma emenda à Constituição determinou que apenas parte dos compromissos deve ser honrada a cada ano, e o restante pode ser postergado até 2026. Em 2027, os esqueletos têm de sair do armário —isto é, tudo precisa ser quitado, num montante estimado em torno dos R$ 200 bilhões.

Poesia | Vinicius de Moraes - Mensagem à Poesia

 

Música | Ana de Hollanda - Acalento (Aldir Blanc)

 

sábado, 30 de setembro de 2023

Cristovam Buarque - Dar o exemplo

Revista Veja

Lula trouxe o Brasil de volta ao mundo, mas só discurso não basta

Na recente reunião do G20, o presidente Lula apresentou três eixos para o mundo: desenvolvimento sustentável, reforma das instituições de governança global e inclusão social com combate à desigualdade. Na semana seguinte, na ONU, reafirmou a necessidade desse esforço internacional. Graças à sua história pessoal, às características do Brasil e ao vazio de outras lideranças, nesses nove meses de governo Lula se afirmou como o líder mundial na luta contra a desigualdade social. Essa liderança será consolidada quando, além do discurso, ele mostrar que é capaz de conduzir o país na direção do que defende para o planeta.

Mas, quando ouvem o discurso contra a desigualdade, os demais presidentes olham para Lula sabendo que somos campeões em concentração de renda, nosso IDH está na 87ª posição, que esse quadro social não mudou ao longo das últimas décadas. Têm conhecimento de que a última edição do Estudo Internacional de Progresso em Leitura (Pirls) mostra os alunos brasileiros no 4º ano com média equiparada à pior pontuação entre todos os países. Sabem que essa péssima média esconde a tragédia da desigualdade conforme a classe social da criança. Eles são informados de que sucessivos governos das últimas décadas não tentaram corrigir essa realidade; e, por experiência histórica em seus países, sabem que a educação de base com qualidade para todos é o caminho para superar a pobreza e a desigualdade.

Luiz Gonzaga Beluzzo - O passado presente

Revista CartaCapital

A eterna repulsa dos endinheirados aos pobres e ao Estado

Nos idos de 1983, o senador Roberto Campos, avô do nosso Campos Neto, prolatou suas sabedorias na Ordem dos Economistas do Estado de São Paulo. Entre outras pérolas do conhecimento, afirmou que o Brasil “é uma sociedade criptossocialista, apesar do sistema privado teoricamente praticado no País”. Então parlamentar mato-grossense, o vovô Campos fundava sua escatológica denúncia na constatação de que o governo, no Brasil, era responsável por em torno de 45% do dispêndio total e 60% dos gastos em investimento.

Se aceitarmos os critérios do ilustre senador, vamos chegar à conclusão de que não só o Brasil, como a totalidade dos países do Ocidente, passou-se para o outro lado, sem se dar conta do que estava ocorrendo. Éramos todos socialistas e não sabíamos.

Alvaro Costa e Silva - Mourão, o sabe tudo

Folha de S. Paulo

Para Mourão, tramar um golpe é mero blá-blá-blá

General da reserva, ex-vice-presidente e atual senador, Hamilton Mourão anda deitando cátedra sobre direito penal. À plebe ignara ele ensinou que não há gravidade quando o presidente da República, que se candidatou à reeleição e perdeu, convoca uma reunião com os chefes das Forças Armadas e, apresentando uma minuta adrede preparada, propõe um golpe de Estado, com novas eleições e prisão de adversários.

"É um mero blá-blá-blá", ilustrou o professor Mourão. Deu um exemplo: "Vão dizer que uma tentativa de homicídio tem que ser punida, mas uma investida de golpe é diferente de homicídio. No caso de quase assassinato, eu te dou um tiro e erro. Uma tentativa de golpe seria o quê?". A tese seduziu grupos bolsonaristas, que passaram a divulgá-la nas redes, deixando de chamar o general de melancia.

Dora Kramer - Só rindo... Ou chorando

Folha de S. Paulo

Otimismo do ministro Padilha contrasta com o realismo voraz das onças do Congresso

O ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) aparece em público sempre muito alegre e otimista. Diz que está tudo ótimo mesmo quando está tudo péssimo. Exibe sorriso permanente, faz piada com as dificuldades que enfrenta na cadeira a partir da qual busca domar as onças vizinhas na praça dos Três Poderes. Pois é, em determinadas situações, só rindo. Ou chorando.

Nesta semana, acossado em pleno Palácio do Planalto por parlamentares com cobrança para entrega de lotes na Funasa, levou o constrangimento meio à brinca, meio à vera: "Vocês não imaginam o que fazem comigo a portas fechadas".

A julgar pelo que dizem a portas abertas, é possível, sim, imaginar. No cerco a Padilha no "after" de cerimônia oficial, suas altezas felinas foram bastante explícitas na ameaça de derrubar a ministra da Saúde caso não tivessem seus apetites saciados. Isso uma semana depois de o presidente da Câmara proclamar-se dono da Caixa Econômica Federal e de suas 12 vice-presidências.

Demétrio Magnoli - Um Congresso de 11

Folha de S. Paulo

Ao celebrar avanço de juízes sobre pautas do Legislativo, progressistas sacrificam futuro

O longo voto de Rosa Weber pela descriminalização do aborto apresenta-se, quase inteiramente, como um discurso parlamentar. A agenda definida pela magistrada para o Supremo –drogas, marco temporal, aborto– forma uma pauta de deliberações apropriada ao Poder Legislativo. Por aqui, o STF produz legislação enquanto o Congresso dedica-se a distribuir verbas de emendas a clientelas eleitorais e a indicar ministros ou diretores de estatais.

A alegação dos juízes supremos de que apenas interpretam a Constituição não resiste nem mesmo a um escrutínio superficial. Interpretar a Constituição é derrubar o que não pode ser feito; legislar é decidir regras positivas sobre o que deve ser feito. Weber determinou o período de aborto descriminalizado (12 semanas), os magistrados procuram consenso interno sobre o peso exato da maconha de uso pessoal, Fachin elabora regras específicas para atribuição de terras aos indígenas.

Rodrigo Zeidan* - Lula e o acordo entre Mercosul e União Europeia

Folha de S. Paulo

França faz exigências ambientais e Lula quer 'proteger' a indústria nacional

Parece que é hora da verdade. Vai sair o acordo entre Mercosul e União Europeia? O presidente paraguaio, Santiago Peña, deu um ultimato aos europeus: se o acordo não sair até o dia 6 de dezembro, quando Lula lhe entrega a presidência rotativa do Mercosul, o bloco vai encerrar as negociações.

Com o decoupling (dissociação) de economias como as americanas e europeias e a China, as cadeias globais de valor estão se rearranjando pelo mundo. A União Europeia é o maior investidor nas economias sul-americanas. Seria hora de estimular investimentos para revitalização da nossa indústria. Infelizmente, a chance de isso acontecer é mínima. As lideranças políticas regionais ignoram a integração comercial com o resto do mundo. No Brasil, estamos ainda presos no modelo de substituição de importações, um desastre há décadas.

Ricardo Rangel - Os desafios de Luis Roberto Barroso no STF

Revista Veja

Como o presidente mais liberal que o Supremo já teve lidará com o Congresso mais retógrado que o Brasil já elegeu?

Luis Roberto Barroso assume a presidência do Supremo Tribunal Federal em um momento de crise entre o Congresso e o tribunal.

Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, botou pra votar, e aprovou, o marco temporal das terras indígenas à revelia de declaração prévia do Supremo de que ele seria inconstitucional. Já adiantou que pretende apresentar projeto de lei para considerar crime a posse de toda e qualquer quantidade de maconha — a despeito de que o STF está na iminência de decidir sobre o assunto. E, enquanto o Supremo discute a descriminalização do aborto, o Congresso se movimenta para aprovar contra ele leis ainda mais duras.

Eduardo Affonso - Lula é uma ideia

O Globo

Presidente é, ao mesmo tempo, o rei que ostenta a roupa nova e o menino que aponta que o rei está nu

Houve certa incompreensão quando, naquele longínquo abril de 2018, o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou:

— Não sou mais um ser humano. Sou uma ideia. Uma ideia misturada com a ideia de vocês.

O tom parecia ser de empáfia — reforçado, talvez, pelo hábito que Lula tem de referir a si mesmo na terceira pessoa.

Como ensinou um sábio alagoano, o tempo é o senhor da razão. Hoje é possível entender o porquê do ileísmo, que nada tem de imodéstia. É que Lula são dois. Como nos casos de TDI (transtorno dissociativo de identidade), ora estamos diante de um, ora de outro. Por terem ambos o mesmo nome, quando Lula diz “O Lula”, tanto pode ser o Lula-ideia falando do Lula-pessoa-física (doravante, Lula-PF, para economizar caracteres) quanto o contrário.

Carlos Alberto Sardenberg - E se o detento não for o culpado?

O Globo

Toda grande empresa brasileira está no Carf. Toda grande empresa tem litígios com a Receita

É assim: a empresa recebe uma autuação da Receita Federal, cobrando impostos, multa e juros. O advogado da empresa acha que a cobrança é indevida e resolve contestar.

Primeiro, reclama na auditoria que emitiu a notificação; perdendo, o que acontece quase sempre, vai para a instância superior, ainda dentro da Receita Federal. Perde de novo. Aí, antes de entrar na Justiça, a empresa pode tentar o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), criado justamente para reduzir a judicialização excessiva.

Pablo Ortellado -Crítica implica com filme conservador

O Globo

Mario Frias, Damares Alves e Eduardo Bolsonaro se mobilizaram para divulgar 'Som da liberdade'

Depois de muita polêmica nos Estados Unidos, estreou no Brasil na quinta-feira passada “Som da liberdade”, do diretor mexicano Alejandro Monteverde. O thriller sobre um ex-agente que se dedica a resgatar crianças sequestradas em redes internacionais de abuso sexual infantil não é apenas um filme independente de sucesso. Foi lançado por meio de uma campanha política conservadora, e sua estratégia de promoção — meio comercial, meio militante — despertou reação muito negativa da crítica.

A produtora do filme, Angel Studios, começou como empresa que oferecia um serviço de filtragem que censurava (silenciava ou pulava) passagens profanas, violentas ou com nudez em conteúdos audiovisuais do streaming. O modelo fracassou depois de ser tragado numa série de processos por violação de direitos autorais. A empresa então se reinventou como produtora de conteúdos religiosos e conservadores, assentada num modelo econômico inovador com dois pilares: financiamento coletivo e compra antecipada de ingressos.

Alvaro Gribel - A história por trás do déficit

O Globo

Piora fiscal este ano era não só esperada, como inevitável. Governo precisa é garantir o reequilíbrio à frente

O setor público registrou déficit de R$ 79 bilhões no acumulado de janeiro a agosto deste ano, o pior resultado para um início de governo desde o início da série. Lula 1 herdou as contas em dia de Fernando Henrique, e apertou ainda mais o cinto sob Palocci. Manteve as contas no azul no segundo mandato, já sob Mantega. A deterioração das contas públicas aconteceu sob Dilma, passou por Temer e Bolsonaro, e voltou a piorar agora, com a recomposição de despesas represadas pelo teto de gastos. A fala do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, na quinta-feira, que passou a fazer campanha pública por aumentos salariais dos servidores do banco, é a prova de que o funcionalismo federal foi sucateado pela regra do teto, que se mostrou extremamente draconiana. A piora fiscal agora, portanto, era não só esperada, como inevitável. O que é preciso é garantir o reequilíbrio à frente.

Marcus Pestana - Privatizações e a mudança do papel do Estado (II)

Já discutimos aqui o papel do Estado no desenvolvimento da sociedade moderna e da economia capitalista, onde adquiriu formas variadas em função das peculiaridades históricas de cada país. Nas últimas décadas do século XX, o estrangulamento fiscal do “Welfare State”, a onda neoliberal liderada por Reagan e Thatcher, a dissolução da URSS e do bloco comunista, a globalização, a internet e a emergência da sociedade pós-industrial desencadearam um novo ciclo em que a “Reforma do Estado” ocupou espaço central.

No Brasil, a consolidação de nosso capitalismo tardio e o processo de industrialização por substituição das importações tiveram o Estado como protagonista para suprir as lacunas deixadas por um ainda débil setor privado.

Também, em nosso país, desencadeou-se, nos anos de 1990, um vigoroso processo de reforma do Estado, impulsionado tanto pela crise fiscal quanto pela necessidade de modernização do modelo de intervenção estatal. Programas de desestatização avançaram com a privatização de empresas estatais, venda de participações, concessões públicas e parcerias público-privadas (PPPs).

Maílson da Nóbrega* - Por que é quase impossível cortar gastos

Valor Econômico

A rigidez orçamentária é o verdadeiro calcanhar de Aquiles do regime fiscal da União

Tem sido comum a demanda por corte de gastos do governo federal. No mercado financeiro, alega-se que a isso é necessário, dado que o novo arcabouço fiscal depende excessivamente da elevação de receitas para cumprir metas de resultado primário e de endividamento. Gente com experiência no governo federal diz o mesmo. Outros argumentam que a reforma administrativa reduzirá despesas da União, o que está longe de ser totalmente verdadeiro.

Teoricamente, o clamor está correto. Vários estudos demonstram que o melhor ajuste fiscal é aquele realizado via despesa, pois pode se concentrar em áreas menos essenciais e poupar dos cortes os investimentos e outros programas fundamentais. A opção pela receita eleva a participação do governo na economia e acarreta alocação menos eficientes dos recursos, o que afeta negativamente a produtividade e o potencial de crescimento.

Claudia Safatle - Chance para pensar em faxina geral nos gastos

Valor Econômico

Para Arminio Fraga, não basta ter um ajuste fiscal que coloque a dívida em trajetória de queda

Quase 80% do gasto no Brasil é com Previdência Social e com a folha de pagamentos dos três níveis de governo e nos três Poderes.

Esse é um dado que chama a atenção por ser fora da curva. Na grande maioria dos países a soma das duas despesas se situa na casa dos 60%.

O gasto com saúde, no Brasil, fica aquém dos 4% do Produto Interno Bruto (PIB). Esse é outro número que surpreende. É impossível pretender ter um sistema de saúde universal e gratuito com esse padrão de gasto. Apenas para ter uma ideia, no Reino Unido, ele é de 8% do PIB.

Foi avaliando os números fiscais do Brasil que Arminio Fraga concluiu que não basta ter um ajuste fiscal que coloque a dívida em trajetória de queda. E nota-se que ela não está em queda.

Rogério F. Werneck - Crônica de um esgarçamento fiscal

O Globo

Governo aposta que poderá continuar esticando a corda da irresponsabilidade fiscal

Já há material de sobra para se começar a escrever o que promete ser uma longa crônica do preocupante esgarçamento do quadro fiscal que vem tendo lugar no país.

A história remonta ao final de março, quando o governo delineou sua proposta de um novo arcabouço fiscal, com que pretendia se livrar dos rigores do teto de gastos. Prometia conter o déficit primário em 0,5% do PIB, em 2023, zerá-lo, em 2024, e gerar superávits primários de 0,5% e 1% do PIB, respectivamente, em 2025 e 2026.

No frigir dos ovos, uma promessa pífia de um superávit primário acumulado de não mais que 1% do PIB ao longo de todo um mandato presidencial.

Passados não mais que seis meses, o que hoje se constata é que mesmo essa promessa tão pífia parece a cada dia menos crível. Não duraram muito as fantasias de que o governo gastaria bem menos do que lhe permitia o limite ampliado para dispêndio primário que conseguira assegurar com a provação da PEC da Transição.

O que a mídia pensa: editoriais / opiniões

A oportunidade de Barroso no comando do STF

O Globo

Novo presidente poderá contribuir para resgate da normalidade institucional e Judiciário mais ágil

O ministro Luís Roberto Barroso assume a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) diante de um ambiente político bem menos conflagrado que o encontrado pela antecessora, Rosa Weber. Durante a gestão de Rosa, o país passou pela eleição mais polarizada de sua História recente, o STF foi alvo dos ataques do 8 de Janeiro, e a democracia brasileira resistiu em boa parte graças à ação do próprio Supremo perante a ameaça golpista. Esse momento — ainda bem — passou. Agora cabe a Barroso, afastada a ameaça antidemocrática, aproveitar o clima mais sereno para continuar, em sua gestão, a promover o resgate da normalidade institucional.

Em seu discurso de posse, ele demonstrou entender a missão e adotou um tom conciliador ao tratar dos temas que hoje polarizam a sociedade. “O combate eficiente à criminalidade não é incompatível com o respeito aos direitos humanos. O enfrentamento à corrupção não é incompatível com o devido processo legal”, afirmou. “Estamos todos no mesmo barco e precisamos trabalhar para evitar tempestades e conduzi-lo a porto seguro. Se ele naufragar, o naufrágio é de todos.”

Poesia | Fernando Pessoa - Tudo é encontrar qualquer coisa

 

Música | Joyce Moreno - Aqui, Daqui (Aldir Blanc Inédito)

 

sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Fernando Abrucio* - Como sair do dilema do emendismo

Eu & /Valor Econômico

A hora é de pensar como articular as verbas do orçamento com os programas e políticas públicas

Uma das maiores qualidades na política é encontrar interesses comuns onde há impasses e divergências. Em termos intertemporais, é muito difícil manter-se no poder em sociedades complexas sem buscar negociação e cooperação, sem que isso signifique perder a autonomia relativa de seu grupo político ou Poder institucional. Esse preâmbulo conceitual tem uma só finalidade: pensar em como sair do dilema central das relações entre o Executivo e o Congresso Nacional, referente à ampliação das emendas parlamentares.

O aumento da capacidade de gastar mais com emendas parlamentares é um fenômeno que começou em meados da década passada, com reformas legais e a partir, primeiramente, da liderança de Eduardo Cunha. Depois esse processo foi aprofundado principalmente pela ação de Arthur Lira, culminando na criação daquilo que foi chamado de Orçamento Secreto. Mesmo com a decisão do STF considerando inconstitucional esse último formato, o valor que os deputados e senadores terão direito com emendas será, no mínimo, de R$ 40 bilhões em 2024 - e, registre-se, grande parte desse dinheiro é transferido ainda com pouca transparência.

José de Souza Martins* - A anomalia da religião na política

Eu & / Valor Econômico

Há no Congresso uma bancada da Bíblia, empenhada no enquadramento dos outros em valores de sua crença em vez de enquadrar-se nos preceitos e valores da Constituição que legitima sua diferença

Neste momento, onde estão as vozes que falam pelo povo brasileiro e nos dizem o que ele se tornou, com os transtornos políticos dos últimos tempos e a ação de grupos reacionários que se empenham em criar um estado de baderna e de desorganização social e política para assegurar seu poder de toscos e incivilizados?

Entre 2003 e 2022, o lugar de referência da fala política brasileira deslocou-se de cenário. Passou lenta e ocultamente das classes sociais e subclasses para as corporações de interesses antissociais. Basicamente porque a mudança do lugar da fala foi também mudança do ator que fala.

Aqui, desde os anos da ditadura militar, a rua tornara-se o lugar de expressão dos que tinham o que falar mas não tinham lugares de dizer. Isso tem expressado a desigualdade da representação política e o decorrente fato de que nem todos estavam ou estão representados nas instituições destinadas a isso.