sábado, 16 de maio de 2020

Merval Pereira - A pílula da vez

- O Globo

Um governo voluntarista que coloca em risco a população que preside e tenta fugir do controle das instituições democráticas

A cloroquina é a pílula do câncer da vez de Bolsonaro. A obsessão do presidente Bolsonaro com a cloroquina, que derrubou o ministro da Saúde Nelson Teich e já colocara o ministro anterior, Luiz Henrique Mandetta na linha de tiro, pode ser explicada pela busca de um remédio milagroso que permita dar a sensação de segurança aos cidadãos para abrir a economia. Assim como fez campanha pela pílula do câncer e, ao ser perguntado se acreditava mesmo na sua eficácia, respondeu: ” Sou Capitão do Exército. Minha especialidade é matar, não é curar ninguém. Se cura, não sei. Mas vamos dar uma chance àquele que está com dia marcado para morrer”.

A Medida Provisória que ele editou esta semana pode ser considerada a “excludente de ilicitude” da Covid-19. Aquele instrumento, que foi rejeitado pelo Congresso, dizia que o agente público não pode ser culpado quando age sob "escusável medo, surpresa ou violenta emoção". Na Medida Provisória relacionada à Covid-19, os agentes públicos “somente poderão ser responsabilizados nas esferas civil e administrativa se agirem ou se omitirem com dolo ou erro grosseiro pela prática de atos relacionados, direta ou indiretamente, com as medidas de combate ao coronavírus (…)".

O espírito é o mesmo, isentar de culpa agentes públicos que se excederem no cumprimento do dever, até mesmo provocando mortes, como no caso da cloroquina. Inclusive o próprio presidente.

Míriam Leitão - Erros do general e do procurador

- O Globo

Divulgar o vídeo não é atentado à segurança nacional, como diz Heleno, nem causará instabilidade, como afirma Aras

O general Augusto Heleno diz que a divulgação do vídeo da reunião ministerial seria “quase um atentado à segurança nacional, um ato impatriótico”. O procurador-geral da República, Augusto Aras, usou argumentos políticos — em vez de teses jurídicas — para defender que não seja divulgada a íntegra da reunião. Segundo Aras, poderia provocar “instabilidade pública” e ser usada como “palanque eleitoral precoce para 2022”. O que provoca instabilidade é um presidente criando uma sucessão interminável de crises no meio de uma pandemia. O que ameaça a segurança nacional é colocar vidas em risco com prescrição de medicamentos não comprovados e o incentivo ao descumprimento da recomendação das autoridades médicas do mundo.

O general Heleno comete um erro velho, o de confundir interesses de um governo com os do país. Governo é passageiro, a Nação é permanente. Mentes autoritárias fazem essa confusão. Regimes fechados fazem essa fusão porque assim manipulam o sentimento de amor à pátria para encobrir seus erros. A democracia é diferente. Impropérios na boca do presidente, críticas à China feitas em reunião de governo, ministros bajuladores tentando agradar o chefe — um propõe a prisão dos ministros do STF, outra sugere a de governadores e prefeitos — esconder isso não é proteger a segurança nacional.

Ascânio Seleme - Ministro da saúde não importa

- O Globo

Quem comanda as ações nacionais no combate ao coronavírus são governadores e prefeitos

Para nossa sorte, o ministro da Saúde não tem muita importância. Quem comanda as ações nacionais no combate ao coronavírus são governadores e prefeitos. O Supremo Tribunal Federal já deixou isso resolvido. Teich, Pazuello ou Terra, nenhum deles tem poder para alterar a jornada de combate e controle da maior crise sanitária desde a gripe espanhola. O distanciamento social, principal mecanismo para conter o contágio, é determinado pelos gestores estaduais e municipais. Nem o decreto de Bolsonaro ampliando os setores considerados essenciais, como salões de beleza e academias, colou. Os governadores ignoraram o presidente.

A demissão de Nelson Teich guarda, entretanto, alguns problemas de naturezas diversas. A primeira e mais grave, aumenta a desconfiança dos agentes econômicos no Brasil. O drama da economia vai se transformando em caos diante de mais este terremoto promovido por Bolsonaro. Em seguida, medidas como compras centralizadas de ventiladores, EPIs e outros produtos usados pela rede pública de saúde podem sofrer solução de continuidade. Sob Teich já se via este imobilismo. Ele gastou apenas o equivalente a 9% do despendido pelo seu antecessor.

Daniel Aarão Reis - O dia depois

- O Globo

Enquanto pesquisadores tentam encontrar vacina, bancos e investidores já têm a sua, graças à intervenção de bancos centrais

Como será o dia depois da pandemia?

Há opiniões positivas: Michel Maffesoli, sociólogo, fala do reencantamento do mundo. Artistas anunciam dias melhores. Mais preocupação com a saúde, a ecologia, a organização das cidades. E também reconhecimento do papel do Estado na regulação dos mercados e, sobretudo, na organização dos serviços públicos essenciais — saúde, educação e segurança, em contraste com a degradação progressiva, evidenciada no combate ao maldito vírus, mesmo em sociedades opulentas, como os EUA. Pesquisa realizada na França aponta para a expectativa de um mundo mais solidário, sóbrio, democrático, preocupado com o meio ambiente.

São perspectivas construtivas, animadoras, viáveis. Em tese. Se forem enfrentadas e neutralizadas outras tendências, ameaçadoras.

Uma delas é o assustador crescimento da concentração da renda e das desigualdades sociais. Como demonstrou Thomas Piketty, um processo de décadas. Aprofundado com a crise de 2008. Ganha velocidade no curso da pandemia atual e, se as coisas continuarem assim, a situação pode piorar. Stéphane Lauer, em recente artigo, apontou para uma economia em crise face a sólidos mercados financeiros. Milhões de desempregados, dezenas de milhares de mortos, parentes, amigos e entes queridos angustiados e enlutados, empresas em dificuldades, à beira da falência. Entretanto, as bolsas de valores vão bem, obrigado. O índice Dow Jones está 25% superior ao que era há alguns anos. Os lucros das grandes empresas suscitam euforia. A especulação com títulos e moedas corre livre e sem freios.

Ricardo Noblat - A última de Bolsonaro: premiar quem deveria ser punido

- Blog do Noblat | Veja

Uma mentira puxa a outra
Se durante a reunião ministerial de 22 de abril último, o presidente Jair Bolsonaro queixou-se de falhas na sua segurança pessoal no Rio, e não de falhas da Polícia Federal que nada tem a ver com isso pois a tarefa cabe à Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), por que diabos ele promoveu recentemente o general responsável direto por sua segurança pessoal no Rio?

Se a Polícia Federal é uma polícia judiciária que não cuida da segurança pessoal do presidente nem da sua família no Rio e em parte alguma, por que Bolsonaro demitiu seu diretor-geral, o delegado Maurício Valeixo, o que acabou provocando a saída do governo do ex-ministro Sérgio Moro? E por que o novo diretor demitiu o superintendente da Polícia Federal no Rio?

Não se premia quem se revelou incompetente – no caso, o tal general. Não se pune inocentes – no caso o diretor-geral da Polícia Federal e o superintendente da Polícia Federal no Rio. O chefe do general supostamente relapso era o delegado Alexandre Ramagem, diretor da ABIN. Pois Ramagem foi justamente a escolha feita por Bolsonaro para substituir Valeixo. Não faz sentido. Não faz.

Quanto mais mente para se defender da acusação de que tentou intervir na Polícia Federal porque desejava tê-la diretamente ao seu serviço, obediente às suas ordens, a produzir relatórios diários com informações que por lei estava proibida de fornecer, mais Bolsonaro se arrisca a ser denunciado pelos crimes de obstrução à investigação de organização criminosa e advocacia administrativa.

Marco Antonio Villa - O suicídio de uma nação?

- Revista IstoÉ

A política externa do governo Bolsonaro transformou o Brasil numa espécie de África do Sul, na época do Apartheid

O Brasil passa pela crise mais grave da história republicana. Não há nada que se compare ao desastre representado pelo governo Jair Bolsonaro. A crise sanitária avança a cada dia e a tendência é que permaneça por boa parte do ano tendo em vista a dificuldade das autoridades de impor, com eficácia, o isolamento social. O maior aliado do coronavírus é Bolsonaro e suas sucessivas ações e declarações que desmoralizam o protocolo estabelecido pelo próprio Ministério da Saúde. A ampliação do número de infectados e de óbitos, além da extensão no tempo da epidemia, deve deixar um rastro de destruição que vai perdurar por alguns anos, principalmente nas comunidades mais pobres.

À crise sanitária deve ser acrescentada a crise econômica. Seus efeitos devem se estender a 2021. O efeito vai ser devastador levando ao fechamento de milhares de empresas e a uma fabulosa taxa de desemprego. Para piorar, há uma séria crise político-institucional. Bolsonaro faz do ataque às instituições o seu passatempo favorito. E ao afrontar os outros dois poderes estimula seus adeptos a comportamentos que se assemelham às milícias nazi-fascistas.

Bolívar Lamounier - Parece loucura, mas tem método

- Revista IstoÉ

O bolsonarismo é uma força política perigosa, agressiva e hostil à ordem democrática

É lógico que uma democracia representativa digna do nome não tem condições de se firmar onde a ética da impessoalidade do Estado não se desenvolva; e tal ética, por sua vez, não se consolida se as Forças Armadas se mantiverem no universo do populismo ou do caudilhismo. Em qualquer país, a inexistência de harmonia entre essas esferas institucionais cedo ou tarde dará ensejo a retrocessos e, no limite, ao próprio rompimento da ordem constitucional. No Brasil, tal situação ficou claramente exemplificada nos episódios da renúncia de Jânio Quadros (1961) e do desgoverno de João Goulart (1961-1964).

Em 1945, logo ao regressar da guerra na Itália, o marechal Mascarenhas de Moraes deu o cartão vermelho para o ditador de plantão, o Sr. Getúlio Vargas, e exigiu a realização de eleições e a convocação da Assembleia Constituinte, como viria a ocorrer em 1946. Mesmo nos 21 anos (1964-1985) em que exerceram autoritariamente o poder, os militares não permitiram a personalização do poder, como era tradicional na América Latina.

Alvaro Costa e Silva - Mamatas, bravatas e besteiras

- Folha de S. Paulo

O Brasil sob Bolsonaro é um país cheio de oportunidades

A pandemia está provocando uma fila de mortos —e de oportunidades. Aquelas que, segundo os homens mais ricos do mundo, acompanham as crises.

Oportunidade de mamata. Identificar como uma "garotada" (palavra usada por Bolsonaro) o grupo de militares que recebeu de forma irregular o auxílio emergencial do governo é mais uma desculpa sem pé nem cabeça; pelo tamanho do golpe, envolvendo mais de 70 mil fraudadores, trata-se de coisa orquestrada de dentro.

Oportunidade de rasgar a Constituição. A doença autocrática avança em paralelo às vítimas da Covid-19. Vide o artigo do general Mourão, ex-Mozão, com ataques à liberdade de imprensa. Ou as milícias bolsonaristas acampadas e armadas no Distrito Federal, pregando a "ucranização" do Brasil. Quem financia essa gente de bem?

Oportunidade de falar palavrão. O charivari ministerial de 22 de abril —quando o coronavírus já se tornara uma ameaça sanitária— mostrou que são alheios à saúde os interesses dos que comandam o país. O negócio é proteger filhos e aliados de investigações da PF; vender o Banco do Brasil; prender ministros do STF, governadores e prefeitos.

Hélio Schwartsman - Jairpédia

- Folha de S, Paulo

Reações institucionais a seus destinos precisam lhe provocar dor

É possível definir inteligência como a capacidade de aprender. Num sentido muito básico, todos os seres humanos e um bom número de bichos conseguem extrair lições das regularidades da natureza.

A assimilação é fácil quando o intervalo entre a causa e o efeito é instantâneo ou muito breve. Não precisamos de mais do que uma ou duas experiências negativas para aprender que não devemos pôr a mão no fogo. Nos animais um pouco mais complexos, dor e prazer são as moedas de troca que intermedeiam e dão valência a nosso aprendizado do mundo.

O que diferencia homens de outros bichos é que desenvolvemos ferramentas que nos permitem aprender mesmo quando o intervalo entre causa e efeito é longo e não é intermediado por nenhum processo homeostático.

Julianna Sofia – Deserto de ideias

- Folha de S. Paulo

São ações provisórias com cheiro, cor e gosto de perenes

Ainda eram as trombadas iniciais do presidente Jair Bolsonaro com o Congresso, no primeiro trimestre de 2019, quando Rodrigo Maia (Câmara) afirmou que o governo não tinha uma proposta clara para os problemas do país e que o Brasil era um "deserto de ideias". Poucos avanços desde então. Parcas e obtusas, medidas aventadas ao longo dos 16 meses de gestão bolsonarista agora encontram momento conveniente para prosperar.

A se confirmarem os dados do termômetro de atividade do Banco Central, a economia levou um tombo de 5,9% em março, quando a pandemia começou a produzir seus estragos. O Ministério da Economia projeta para o ano uma retração de 4,7%, considerando que as medidas de isolamento serão suspensas no final deste mês.

Vários dos programas de socorro anunciados pela equipe econômica precisarão ser prorrogados inevitavelmente, apesar da resistência do time do Ministério da Economia, como o auxílio emergencial de R$ 600. Outros começam a ser remodelados por não atingirem o efeito desejado --o financiamento da folha de salários, por exemplo.

Demétrio Magnoli* - Réplica a um confinado bacana

- Folha de S. Paulo

Eu, que furo a quarentena, sou pretexto para você desviar tua indignação

Li a tua carta a um não confinado, na Folha (9 de maio). Vesti a carapuça e o jornal abriu espaço para essa minha resposta. Você é um cara bacana, ama o planeta, valoriza a vida, me despreza. Concordo com teus argumentos sobre a necessidade de confinamento.

Só não pratico o que acho certo: furo a quarentena todos os dias. Coerência é coisa de bacana, num outro sentido.

Sou "zé povinho", como você escreveu. E, pior, não estou entre os mais pobres. Tenho um estabelecimento (não direi de que tipo, nem onde fica), que toco com minha mulher e dois funcionários. Fechei por três semanas, cumprindo a ordem do governador. Reabri, clandestinamente, para evitar a falência. Enquanto você vê Netflix e até pinta, passo o dia no Whats, marcando hora com clientes. Levanto a porta, eles entram, abaixo rápido. Um "ser antissocial", na tua síntese bacana.

Você me odeia; eu te invejo. Suspeito que o epidemiologista mencionado na tua carta, aquele da quarentena por "mais de um ano", tem salário garantido na universidade ou em cargo público, com grana do meu imposto. A moda dos bacanas com renda certa é posar de bacana diante dos sem renda certa. O governo declarou-me "não essencial" e proíbe que eu ganhe a vida, mas não me dá um tostão. Diz que devo salvar vidas, mas não salva a minha. Bacana, né?

José Álvaro Moisés* - Por que abandonaram o barco?

- O Estado de S.Paulo

Bolsonaro em nenhum momento deu ouvidos aos seus ministros sobre a necessidade de isolamento social como meio de impedir o colapso do sistema de saúde

Nelson Teich não é mais ministro da Saúde. Sua entrevista não deu pistas claras sobre as razões que levaram o governo a perder dois auxiliares em área estratégica de políticas públicas em pouco mais de um mês. A perda ocorre quando o número de mortes causadas pelo coronavírus está perto de ultrapassar 15 mil e o de contaminados da mais grave pandemia experimentada pelo país – e talvez pela humanidade – está quase superando 220 mil casos. O que levou dois colaboradores tidos como competentes a abandonarem o barco em tão curto espaço de tempo, e em meio a um auge da crise?

A primeira resposta é conhecida: Bolsonaro em nenhum momento deu ouvidos aos seus ministros sobre a necessidade de isolamento social como meio de impedir o colapso do sistema de saúde. Em alguns momentos, foi mais longe e humilhou seus auxiliares em público. Nos últimos dias, contudo, os indícios apontaram em outra direção: sem que haja qualquer comprovação científica de sua eficácia, o presidente pressionou os ministros a adotarem o uso da cloroquina. Mandetta já tinha feito ressalvas a isso em protocolo que irritou o presidente, e Teich, ao ser supostamente forçado, não aceitou manchar a sua carreira. O governo, então, ficou acéfalo na área da saúde.

Eros Roberto Grau* - O tempora, o mores

- O Estado de S.Paulo

O tempo nos livrará da angústia da pandemia e da insegurança política que suportamos

Repito a mim mesmo um verso de um poema do Augusto Meyer, gaúcho como eu que conheci pelas mãos de Manuel Bandeira em 1958, no Instituto Nacional do Livro, no Rio de Janeiro. Tornamo-nos amigos então, ele encantado pelo fato de eu declamar alguns de seus poemas. Em especial aquele verso que, em glosa, agora repito assim: masco e remasco a minha ansiedade, minha angústia chewing gum.

Começo a escrever estas linhas também a partir do Cântico Negro, do José Régio: “não sei por onde vou, não sei para onde vou, sei que não vou por aí!”. O ímpeto de escrever a respeito de mim mesmo e da superposição do passado, do presente e do futuro toma conta de mim. Múltiplo enquanto ser humano, fui membro do Poder Judiciário, voltando a atuar como advogado desde 2010. Hoje produzo livros jurídicos e literatura de verdade, retornando à fotografia. Muitos eu mesmo no passado e no presente – hoje, aqui, agora – convictos de que o tempo é convenção.

Escrevi a respeito disso no meu A(s) Mulher(es) que Eu Amo, afirmando que os acontecimentos não são encadeados, não se seguem uns aos outros. Menos ainda consequentes. Nada impede que o antes ocorra depois e um estalar de dedos seja mais longo do que a eternidade. No quadro da literatura que tento praticar, um sujeito inventou um descompressor do tempo, mexeu no lugar errado e pum! Entramos na Antiguidade e passamos a ser uma civilização sem pré-história. Começamos pela metade. Dei-me conta de que se aumentarmos cem vezes, exatamente na mesma proporção, o tamanho de todas as coisas que enxergamos, nada será diferente do que é. Tudo exatamente na mesma proporção. Objetos, pessoas, horizontes, nós mesmos. Multipliquem por mil ou os dividam por um milhão e tudo será exatamente igual ao que temos aqui, agora.

Realmente estou confuso. Não sei a respeito do que escrever, pois o tempo é uma convenção e – aprendi ouvindo o Lulu Santos – nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia. Pois tudo passa, tudo sempre passará. O velho Heráclito me ensinou ser impossível pisarmos duas vezes no mesmo rio. Depois Hegel, ao ensinar que a História não se repete e outro autor, ao escrever sobre o 18 Brumário.

Adriana Fernandes* - As disputas de Guedes

- O Estado de S. Paulo

Se tem algo que incomoda o ministro na aliança entre Bolsonaro com o Centrão é um avanço sobre os bancos públicos

Se tem alguma coisa que pode tirar o ministro da Economia, Paulo Guedes, do sério na aliança em construção do presidente Jair Bolsonaro com o Centrão é a tentativa de avanço sobre os bancos públicos: BNDES, Caixa e Banco do Brasil. Esse é o sinal.

O presidente já atropelou pontos importantes da agenda econômica do ministro, mas ao final os dois acabam sempre arrumando um jeito de acertar os ponteiros, numa relação simbiótica de patamar bem diferente daquela que havia entre Bolsonaro e Sergio Moro.

É só fazer uma retrospectiva dos embates em torno das empresas retiradas do alvo do programa de privatização, a reforma administrativa, a autorização para lançamento do Pró-Brasil, o congelamento de salários dos servidores públicos e o atraso do presidente em vetar a lei do auxílio emergencial aos Estados e municípios. Isso só para citar a lista mais recente das disputas bolsonarianas com o seu ainda superministro.

Dimas Ramalho* - MP 966 é redundante e apaga fronteira da legalidade

- O Estado de S. Paulo

Entre os fundamentos de uma república, o mais nuclear deles talvez seja o império da lei. Monarcas e seus representantes só deixaram de fazer aquilo que lhes convinha ou brotasse na cabeça depois que diferentes sociedades criaram uma lista de normas chamada Constituição para limitar e responsabilizar aqueles que alcançassem o controle do Estado.

É justamente essa premissa, tão básica, que está sendo fragilizada pela Medida Provisória 966, publicada neste 14 de maio pelo presidente da República. Sua motivação explícita refere-se à insegurança jurídica que estaria assombrando políticos e servidores, pressionados a agir rapidamente no combate à pandemia e seus reflexos sociais e econômicos.

Segundo a MP, somente poderão ser responsabilizados civil e administrativamente os agentes públicos que “agirem ou se omitirem com dolo ou erro grosseiro” ao praticarem atos administrativos de enfrentamento direto ou indireto à crise do novo coronavírus. O texto, em seu art. 3º, diz ainda que o erro grosseiro somente será configurado após análise que levará em consideração:

Alberto Aggio* - Sobre o artigo de Hamilton Mourão

- Esquerda Democrática

Em relação ao sentido político do artigo do vice-presidente Hamilton Mourão [O Estado de S. Paulo, 14 de maio], creio que se deverá especular muito sobre o seu sentido diretamente político, ou seja, de conjuntura e de ação política. O ambiente bolsonarista instaurou uma "guerra de movimento" em que o confronto é o tom mais habitual (no mesmo 14 de maio, Bolsonaro foi explícito ao falar com empresários contra o governador de São Paulo João Doria: "É guerra").

A complexidade da situação pode ser mobilizada sugerindo que, em certo sentido, Mourão revela que sob o bolsonarismo estaríamos imersos naquela metáfora dos "45 cavaleiros húngaros" comentada por Gramsci em referência a situações abertas ou que são maturadas para um possível assalto ao poder por parte de um grupo minoritário [cf. o texto de Gramsci no post abaixo]. A fala de "um jipe, um cabo e um soldado para fechar o STF", pronunciada pelo Eduardo Bolsonaro, bem como os “300 de Brasília” são exemplares dessa situação.
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O artigo de Mourão faz, no essencial, uma defesa do governo e cita várias vezes os "pais fundadores" do federalismo norte-americano. É possível especular sobre as fontes, sua validade, correção ou mesmo instrumentalização. Mas é preciso considerar que o artigo tem nível e Bolsonaro seria incapaz de escrever algo minimamente similar.

George Gurgel de Oliveira* - A Vida em Pandemia e o Pós Isolamento Social

As transformações ocorridas na sociedade moderna, desde o Iluminismo e a industrialização, modificaram qualitativamente a vida política, econômica, cultural e espiritual de toda a humanidade. Construiu-se uma maneira de viver e conviver responsável pela concentração de populações nas cidades e polos industriais, modificando radicalmente as relações da própria humanidade em si e com a natureza .

Este modelo mundializou-se, transformando, destruindo e incorporando valores das sociedades anteriores, como também criando novos valores, modificando hábitos e costumes seculares, com alto custo social e ambiental, impactando cada vez mais a vida das pessoas.

A base científica e técnica da sociedade atual, principalmente a partir do aparecimento da internet – do funcionamento das redes de comunicação em escala mundial, construiu uma nova dinâmica nessas relações políticas, econômicas, culturais e espirituais, modificando crenças e valores, proporcionando uma troca de informações em tempo real, entre diferentes povos e culturas, mudando radicalmente a nossa percepção da realidade, no tempo e no espaço – território, onde vivemos e construímos as nossas vidas.

A globalização da economia é um processo inexorável. Atende às expectativas das principais economias mundiais, em confronto com os interesses da maioria dos Estados nacionais, periferia deste sistema mundial.

A sociedade e o mercado desafiam o indivíduo na sua vida cotidiana, frente a tudo e a todos, a sua capacidade de realização, de acumular e de ser competitivo. É o imperativo da sociedade contemporânea. O Ter construiu uma hegemonia, colocou-se no lugar do Ser.

Coexistem práticas, nas esferas da sociedade civil, em disputa com as organizações do Estado e do Mercado, buscando novas formas de hegemonias, trazendo para a esfera da política os desafios desta construção.

Assim, a sociedade funciona, vertiginosamente.

O que podemos fazer, nesse momento de incertezas e de dúvidas em relação ao nosso futuro imediato?

Marcus Pestana - O legado possível da pandemia

Já ficou gasta, pelo excessivo uso, a afirmação de que as crises, por um lado, geram desafios, ameaças e problemas graves, por outro, abrem oportunidades. Do enfrentamento de eventos catastróficos como a atual pandemia do coronavírus e do aprendizado individual e coletivo decorrente, podem nascer mudanças de atitudes, gerando saltos de qualidade nas políticas públicas, no comportamento empresarial e no relacionamento humano e social.

Tudo pode acontecer, inclusive nada. Não é uma decorrência automática. Depende do comportamento de cada um e de todos. A “gripe espanhola” de 2018, que infectou 25% da população mundial da época, 500 milhões de pessoas, e levou a morte de 17 a 100 milhões de pessoas, segundo as precárias e imprecisas estatísticas, se deu em plena 1ª. Guerra Mundial e não obrigatoriamente gerou mais solidariedade e integração entre as Nações e as pessoas, visto que logo à frente tivemos a maior recessão da história em 1929 e a 2ª. Guerra Mundial, de 1939 a 1945.

Sejamos otimistas. Vamos torcer e trabalhar para que a pandemia da COVID-19 produza, no Brasil e no mundo, avanços civilizatórios na direção de uma sociedade mais solidária, humana, justa e democrática.

A saúde, que sempre foi uma preocupação central dos brasileiros, assumiu um protagonismo inédito. O verdadeiro bombardeio de notícias e informações sobre o coronavírus, roubando a cena de outros assuntos da política e da economia, tende a gerar uma atenção maior às políticas públicas de saúde. Um primeiro legado da pandemia, portanto, pode ser o crescimento da consciência de que é preciso aumentar os investimentos em saúde e melhorar muito a gestão de nosso sistema.

O sistema brasileiro de saúde, apesar de no nome o SUS carregar a palavra “único”, é composto de três subsistemas: o sistema público nacional universal, de cobertura integral e gratuita; a saúde suplementar – planos e seguros privados; e o sistema de desembolso direto dos cidadãos – os pagamentos particulares feitos nos balcões das farmácias e laboratórios ou para remunerar serviços médicos e odontológicos.

O que a mídia pensa - Editoriais

• Bolsonaro decide multiplicar os riscos à vida na pandemia – Editorial | O Globo

Ao confrontar a Ciência, presidente assume responsabilidade histórica pela politização da epidemia

Quando o ortopedista Luiz Henrique Mandetta foi demitido do Ministério da Saúde, o Brasil contava duas mil mortes na pandemia do novo coronavírus. Ontem, o oncologista Nelson Teich escolheu se demitir do comando do ministério. A sexta-feira terminou com quase 15 mil mortos na contagem governamental.

Em apenas 27 dias o país teve dois ministros da Saúde. Nesse período viu aumentar em 650% o número de mortes e consolidou indesejável liderança em disseminação da doença na América Latina. É a dimensão trágica da propagação de um vírus, para o qual o mundo ainda não desenvolveu formas de controle, vacina ou tratamento eficaz.

No entanto, esse drama brasileiro está sendo agravado por um componente de irracionalidade política: o pandemônio na pandemia capitaneado por um presidente cujo desgoverno faz multiplicar, diariamente, os riscos à vida de 211,5 milhões.

Ao confrontar a Ciência, Bolsonaro assume a responsabilidade histórica pelas consequências nefastas da politização de uma epidemia sem precedentes. Ao transformar o Palácio do Planalto numa usina de crises, conseguiu desorganizar a já fragilizada estrutura de ação federal na Saúde.

Música | Caetano Veloso - Oração ao tempo

Poesia | Fernando Pessoa -Cruz na porta da tabacaria!

Cruz na porta da tabacaria!
Quem morreu? O próprio Alves? Dou
Ao diabo o bem-estar que trazia.
Desde ontem a cidade mudou.

Quem era? Ora, era quem eu via.
Todos os dias o via. Estou
Agora sem essa monotonia.
Desde ontem a cidade mudou.

Ele era o dono da tabacaria.
Um ponto de referência de quem sou
Eu passava ali de noite e de dia.
Desde ontem a cidade mudou.

Meu coração tem pouca alegria,
E isto diz que é morte aquilo onde estou.
Horror fechado da tabacaria!
Desde ontem a cidade mudou.

Mas ao menos a ele alguém o via,
Ele era fixo, eu, o que vou,
Se morrer, não falto, e ninguém diria.
Desde ontem a cidade mudou.

sexta-feira, 15 de maio de 2020

Ricardo Noblat - Um dia de fúria na vida do ex-capitão contaminado pelo medo

- Blog do Noblat | Veja

Um presidente acuado
No papel de presidente do sexto país do mundo com o maior número de vítimas do Covid-19, o ex-capitão Jair Bolsonaro, afastado do Exército porque planejou detonar bombas em quartéis, viveu 24 horas de fúria sem que ninguém ao seu lado tentasse contê-lo.

Naturalmente não foi a primeira vez e nem será a última. Mas desta vez tinha razões de sobra para se comportar assim. Quantas vezes já não se disse que o cerco se fecha em torno dele e que seu mandato corre risco? Ninguém melhor do que Bolsonaro sabe e sente.

Daí as reações desatinadas que indicam a medida do desespero que toma conta dele. Uma coisa é Bolsonaro disparar para todos os lados a cada momento. É seu instinto assassino. Não sabe viver em paz. Foi treinado para matar, mas nunca lutou uma guerra de verdade.

Outra coisa é atirar em tudo que se mexa à sua frente porque está com medo do que possa acontecer amanhã ou daqui a pouco. Bolsonaro testou positivo para o vírus da crise política desatada com a saída do governo do ex-ministro Sérgio Moro. O hospedeiro do vírus é ele.

Fernando Gabeira - A vida numa ‘live’ sobre coronavírus

- O Estado de S.Paulo

Política de negação da extrema direita encontrou no Brasil sua face mais rude

Nem sempre tenho chance de falar sobre tudo isso que está acontecendo. Quero dizer, limito-me a comentar todos os dias apenas alguns aspectos de uma realidade que me desafia, ou, se quiserem, me atropela.

Nesta semana tive a chance de conversar com o embaixador Marcos Azambuja, num encontro promovido pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais. Além da amizade, partilhamos um certo senso de humor, que sobrevive mesmo nestas horas sombrias.

Trabalho com a questão ambiental desde a década de 1970. Sei que as pessoas têm certa dificuldade em reconhecer um perigo invisível. Foi assim no desastre de Chernobyl. Muitos europeus não acreditavam que o próprio leite que consumiam poderia estar contaminado. Em Goiânia não era tanto a invisibilidade, mas a sedução de uma pedra brilhante (césio-137) que enganava as pessoas na Rua 57.

Com Chernobyl acentuou-se o declínio das classes dirigentes soviéticas. A epidemia de coronavírus não trouxe desgaste do mesmo nível para o PC chinês. Há um vácuo da presença americana, uma vez que o país abandonou suas pretensões de liderança e refugiou-se no lema America first. Coube a uma potência média, a Austrália, com apenas 25 milhões de habitantes, lançar uma iniciativa internacional para apurar a responsabilidade da China.

Eliane Cantanhêde - A fila anda

- O Estado de S.Paulo

Bolsonaro tem crise de abstinência quando não persegue alguém. Vítima da vez é Nelson Teich

“Tratar isso como não essenci..., como... como não essen... como essencial é um passo inicial. Foi decisão do presidente... que decidiu isso aí. Saiu hoje isso? Manicure, academia... barbearia? Não... Isso aí... não é atribuição nossa.”

Foi assim, pego de surpresa, balbuciando, que Nelson Teich, ministro da Saúde, médico oncologista respeitado, com especialização em gestão em saúde, descobriu numa entrevista coletiva que não apenas não manda nada como passou a ser o novo saco de pancadas do presidente Jair Bolsonaro no governo.

Mal acabou de demitir Luiz Henrique Mandetta e de empurrar porta afora o “superministro” Sérgio Moro, o presidente já passou a desautorizar ninguém menos que o novo ministro da Saúde, justamente em meio à pandemia e com o número de mortos chegando a mil por dia. Por dia!

O enredo é bem conhecido. Primeiro, o presidente dá bronca no ministro ou auxiliar em entrevistas. Depois vai minando a autonomia e a autoestima da vítima. Por fim, demite ou pressiona para a demissão. No script, falas recheadas de autoafirmação: “Eu sou o presidente, pô!”, “eu que fui eleito”, “Eu nomeio, todos têm de ser afinados comigo”, “Quem manda sou eu. Ou vou ser um presidente banana?”.

Ascânio Seleme - Ida de Maia ao Palácio do Planalto foi emboscada de ingênuo

- O Globo

Presidente da Câmara se reuniu brevemente com Bolsonaro nesta quinta-feira

Atender um convite para um café do presidente, tudo bem. Poderia até agradecer e enrolar, mas aceitar demonstra boa educação. E, depois, como se viu, foi uma emboscada difícil de escapar. Agora, sair e dar uma entrevista como se estivesse tudo normal é um pouco demais. Rodrigo Maia deixou o gabinete de Bolsonaro falando em construir os caminhos para o Brasil sair da crise. Falou em diálogo, de reformas e do Enem, como se o interlocutor que o recebeu momentos antes fosse dado a debater qualquer coisa.

Maia tem memória curtíssima. Esqueceu o apoio de Bolsonaro aos milicianos que pregam intervenção militar, fechamento do Supremo e do Congresso e a prisão dele e de seu colega Davi Alcolumbre. Disse que seu papel é o de construir pontes. Só se forem pontes para o abismo. Mesmo tendo sido objeto de uma armadilha, ele não podia ter facilitado tanto as coisas para Bolsonaro. Rodrigo Maia está perdendo o seu protagonismo e se sente de certa forma enfraquecido. Por isso falou ao sair do gabinete. Devia ter ficado calado, ou denunciado a emboscada.

E Bolsonaro jogou bem politicamente. Ele engessou o presidente da Câmara, que é o único com poder de aceitar e dar encaminhamento a qualquer pedido de impeachment do presidente da República. Se conseguir segurar Maia por mais uns dois meses, ganha tempo importante para tentar construir junto com o Centrão uma nova liderança parlamentar capaz de pulverizar o protagonismo de Rodrigo Maia e alicerçar uma candidatura para a sua substituição na presidência da Câmara.

Ingênuo, Maia perdeu pontos importantes. Bolsonaro ganhou essa.

Míriam Leitão - Um dia na vida de Bolsonaro

- O Globo

Em reunião com empresários, Bolsonaro tenta atraí-los contra Dória. “É guerra.” Depois ataca Maia. Ele, o suposto gestor da crise

Basta um dia. Um dia é o suficiente para saber que o presidente Jair Bolsonaro é incapaz de gerir a crise dramática que o país vive. De manhã, ele vociferou contra os governadores, logo ao sair do Palácio. Depois, numa teleconferência, aos brados, convocou os empresários a atacarem o governador de São Paulo por manter o isolamento social. “É guerra”, ele diz. Acusou o presidente da Câmara de querer “afundar a economia para ferrar o governo”. O ministro da Economia, Paulo Guedes, reforçou o chefe e pediu que os empresários, “financiadores de campanha dos políticos”, os pressionem. Por fim, baixou uma estranha Medida Provisória que isenta de culpa os agentes públicos nesta pandemia.

– Vai morrer? Lamento, lamento. Mas vai morrer muito, mas muito mais se a economia continuar sendo destroçada por essas medidas (dos governadores) – disse ele logo de manhã.

O lamento dele não tem lamento. Não fala a palavra como quem a sente, o tom é aquele de sempre, voz alterada, como um capitão corrigindo recrutas. Sinceramente é difícil entender – psicólogos devem ser capazes de diagnosticar – uma fala assim sempre colérica. Não há um momento em que o presidente Jair Bolsonaro tenha um tom natural. Ele sempre lança as palavras como quem está atacando o interlocutor:

– O Brasil está quebrando. Vamos ser fadados a ser um país de miseráveis, como tem países da África subsaariana, temos que ter coragem de enfrentar o vírus – disse ainda na fala da manhã, em que avisou aos repórteres que só falaria se houvesse perguntas pertinentes.

Rogério L. Furquim Werneck* - O jogo do impeachment

- O Estado de S.Paulo / O Globo

Em que medida ele estreita as possibilidades de atuação eficaz no combate à pandemia e a seus desdobramentos?

Salta aos olhos que, se continuar isolado, fragilizado e acuado como está, o presidente estará fadado a enfrentar dificuldades redobradas para lidar com a pandemia e seus complexos desdobramentos socioeconômicos. Não surpreende que Bolsonaro insista em reservar posição para poder alegar inocência quando a conta desses desdobramentos chegar. Mas, se as notícias sobre a letalidade da pandemia continuarem tão alarmantes como se teme, é bem possível que o seguro que Bolsonaro vem tentando fazer, na esperança de que o custo político da recessão possa recair sobre governadores e prefeitos, acabe se revelando proibitivamente caro.

É natural que a popularidade do presidente esteja caindo, na esteira das suas dificuldades com a pandemia e a crise econômica. O problema é que, tendo aberto uma terceira frente, ao desencadear crise política tão grave, Bolsonaro se viu agora exposto a risco crescente de impeachment. O que torna o quadro ainda mais intrincado é a forma peculiar com que Bolsonaro vem reagindo à elevação desse risco. Em contraste com o ex-presidente Temer, que, a partir do episódio do porão do Jaburu, passou a pautar cada movimento seu pelo objetivo de minimizar o risco de impeachment, Bolsonaro tem se permitido reações que, muito ao contrário, parecem exacerbar tal risco e chegam até a dar margem a novas razões para impeachment.

Nelson Motta - Beijos e abraços

- O Globo

Pior era o cheiro dos pés depois de vários dias presos em botas

Com saudades de beijos e abraços? Já foi pior. A historiadora Mary Del Priore conta que antigamente, e até os anos 1940, beijos na boca e abraços aconteciam mais na ficção do que na real, mais por motivos higiênicos do que morais. O desodorante só foi lançado em 1941. No século 19, na Europa, o banho era raro, contentavam-se em esfregar o corpo com colônia e criar uma mistura nauseante de cê-cê e perfume. Pior era o cheiro dos pés depois de um dia, de vários dias, presos em botas fechadas, sem banho.

Sem dentistas, sem escovas de dentes, sem pastas, sem flúor, nem os mais belos príncipes e princesas deixariam de exalar um bafo de onça quando abrissem suas lindas bocas de dentes cariados. Para beijá-las, seria preciso não respirar pelo nariz.

Flávia Oliveira - Aos 60 anos, atualíssimo

- O Globo

Folhear ‘Quarto de despejo’ no Brasil do coronavírus é um espanto

‘Quarto de despejo está aí”. A frase breve de Conceição Evaristo, escritora, professora, referência para mulheres negras brasileiras de todas as idades, resume a relevância da obra de estreia de Carolina Maria de Jesus, cujo lançamento completa 60 anos neste 2020. Sexagenário, se rejuvenesce. É livro mais atual que nunca, porque retrata um país incapaz de escapar do círculo vicioso da vulnerabilidade social. A escrita em primeira pessoa, na forma de diário em linguagem crua, denuncia a fome, o trabalho precário, o desemprego, a escassez de serviços e assistência a que favelados brasileiros, como foi Carolina, estiveram submetidos historicamente. E estão ainda hoje, com a sobreposição de crises (sanitária, social, econômica) decorrentes da pandemia de Covid-19.

Conceição Evaristo se juntou virtualmente a Vera Eunice de Jesus, professora e poeta, filha e zeladora da obra e da memória de Carolina, num encontro organizado pela Flup. Foi a primeira edição digital da Festa Literária das Periferias, que tira leitores e autores de onde o mercado editorial só via descampados. Do mesmo território brotou Carolina. Os 60 anos de “Quarto de despejo – Diário de uma favelada” viraram tema do evento que, desamarrado da agenda presencial no Rio de Janeiro, ganhou o país. De todas as unidades da Federação, à exceção de Alagoas, mulheres negras, 485 ao todo, se inscreveram em forma de carta à autora para participar do ciclo de formação do qual sairá, ano que vem, a versão Século XXI da obra.

Ruy Castro* - Ilhados no manicômio

- Folha de S. Paulo

Logo seremos impedidos de entrar em outros países. Cada brasileiro já está sendo visto como uma bomba

Já viajei muito por aí e, em todos os países em que estive, senti que, ao ouvir a palavra “brasileiro”, as pessoas reagiam com encantamento, prazer e até inveja. Era, talvez, um eco de Carmen Miranda, Copacabana, Pelé, o Carnaval, “Garota de Ipanema”, símbolos históricos de um país musical, colorido e ensolarado. Claro que, mais a par da realidade, eu estranhava tanta aprovação. Ela ignorava nossas mazelas, como a ditadura, a tortura, a violência, a corrupção, a miséria. Mas era como se, mesmo que soubessem, não fosse da conta deles.

Agora, pela primeira vez, o que se passa aqui dentro ficou da conta do mundo. O Brasil está sendo visto como uma bomba prestes a explodir e despejar o coronavírus por toda parte. Nossos vizinhos na América do Sul estão alarmados —cada metro de fronteira, em qualquer dos sentidos, pode levar à morte de seus nacionais. Claro que isso não deve preocupar o governo brasileiro. Mas talvez preocupe o dos países para os quais nos sentamos nas patas traseiras e arfamos, e eles tomem certas providências.

Bruno Boghossian – Bolsonaro fabrica uma guerra

- Folha de S. Paulo

Por desinteresse ou incompetência, presidente não toma medidas de emergência e fabrica uma guerra

No início do mês, Jair Bolsonaro declarou que o país só não tinha ondas de “saques e violência” graças ao pagamento dos R$ 600 do auxílio emergencial. Sem querer, o presidente denunciou a perversidade do próprio governo. Milhões de brasileiros que perderam renda com a crise esperam há mais de 15 dias pela segunda parcela do benefício.

Enquanto o governo atrasa a transferência do dinheiro, Bolsonaro faz propaganda do caos. Na conversa que teve com empresários nesta quinta (14), ele disse prever “saque a supermercados, desobediência civil”. Ainda completou: “Não adianta querer convocar as Forças Armadas”.

Por desinteresse ou incompetência, o presidente abre mão de comandar a aplicação das medidas emergenciais contra os efeitos da pandemia. Longe disso, prefere explorar a pressão econômica sobre os miseráveis para se proteger politicamente e atacar seus adversários.

Na reunião com os associados da Fiesp, Bolsonaro pediu ajuda dos ricos nessa missão. Como se patrocinasse a formação de uma milícia, disse aos empresários que eles deveriam “jogar pesado” com governadores que implantaram medidas de isolamento. “Jogar pesado, porque a questão é séria, é guerra”, disse, antes de citar a ameaça de desordem.

Hélio Schwartsman - Passaporte para a felicidade

- Folha de S. Paulo

Em teoria, faz sentido testar pessoas e permitir que aquelas que apresentem anticorpos voltem a trabalhar

Se há pessoas que já são imunes à Covid-19, seria loucura não utilizá-las na prestação de serviços essenciais e para começar a reerguer a economia. Não ignoro que o Sars-Cov-2 é um vírus novo, sobre o qual existem mais dúvidas do que certezas. Ainda não sabemos ao certo se uma infecção prévia confere imunidade nem, em caso afirmativo, por quanto tempo. Há também dúvidas quanto à confiabilidade dos testes para anticorpos disponíveis.

Muita pesquisa está sendo feita, e essas questões deverão ser respondidas em breve. Pelo que sabemos de outros coronaviridae, a melhor aposta é que os recuperados desenvolvam ao menos uma imunidade transitória. Também já teve início um processo de validação dos testes que deverá excluir os que não prestam.

Assim, se essas hipóteses se confirmarem, faz sentido, pelo menos em teoria, implementar os passaportes de imunidade, isto é, testar pessoas e permitir que aquelas que apresentem anticorpos (mais especificamente as imunoglobulinas do tipo G) voltem a trabalhar.

Reinaldo Azevedo – O AI-5 de Bolsonaro e Guedes

- Folha de S. Paulo

Medida provisória que protege agente público é direito criativo de lunáticos

A medida provisória 966 é escandalosamente inconstitucional. No hospício a que, por hábito, chamamos “governo”, resta só loucura. Foi-se o método. Quer a excludente de ilicitude da pandemia ou o AI-5 do coronavírus. Segundo o texto, os agentes públicos só poderão ser responsabilizados nas esferas civil e administrativa se agirem ou se omitirem por dolo ou erro grosseiro. É direito criativo de lunáticos.

O texto vale para decisões ligadas à Covid-19, afeitas à saúde e à economia. O que é “erro grosseiro”? Jair Bolsonaro e Paulo Guedes explicam: é o “erro manifesto, evidente e inescusável, praticado com culpa grave, caracterizado por ação ou omissão com elevado grau de negligência, imprudência ou imperícia.” O que esse mar de subjetividade quer dizer? Qualquer coisa. Contra o usuário do serviço estatal.

Dispõe o parágrafo 6º do artigo 37 da Constituição: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

César Felício - O dilema do sofá-cama

- Valor Econômico

No mundo ao contrário, presidente é um oposicionista

A epidemia provocada pelo novo coronavírus começou a mudar a vida de cada brasileiro há cerca de sessenta dias, quando houve o despertar global para o problema. Foi pouco antes dos meados de março que a Organização Mundial de Saúde, depois de alguma hesitação, decretou a existência de uma pandemia.

O contraste do Brasil com o panorama internacional é gritante. Ásia, Europa e mesmo os países da América do Sul fecharam ou estão na iminência de fechar um ciclo, preparando-se para a provável segunda onda de contaminação da doença. No Brasil, a roda claramente gira em falso. Não há preparação para nada.

A semeadura fraca que justifica colheita tão pobre era sugerida pela leitura de qualquer matutino cerca de dois meses atrás.

Uma grande polêmica no Brasil em 14 de março era sobre o resultado do exame para detectar a doença feito pelo presidente da República. O governador de São Paulo, João Doria, acusava Bolsonaro em entrevista de desrespeitar outros poderes. Epidemiologistas diziam que a única forma do Brasil conter o flagelo era por meio da paralisação das atividades. Faltava um dia para Bolsonaro participar de aglomerações em Brasília que pregavam a ditadura. O conflito entre ele e o então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, começaria na semana seguinte.

Claudia Safatle - Bolsonaro dribla seu ministro da Economia

- Valor Econômico

O presidente é a maior oposição ao seu governo

“Não há governo”, constata e lamenta o ex-ministro Delfim Netto. Ele teme pelo dia em que o vídeo da reunião ministerial de 22 de abril vier a público. “Acho que isso é o maior opróbrio a que será submetida a sociedade brasileira. Vai ser uma vergonha internacional! E ninguém mais vai nos leva à sério”, comentou o ex-ministro que, em seus 92 anos completados no dia 1º de maio, disse que nunca viu ou teve notícias de uma “esculhambação dessa dimensão” nos governos anteriores do país. O vídeo, recheado de palavrões, foi submetido a investigadores da Polícia Federal, Segundo quem o assistiu, ele indica que Bolsonaro pressionou o então ministro da Justiça, Sergio Moro, a trocar o superintendente da PF do Rio, que estaria no encalço da sua família, dos seus filhos.

“O presidente Jair Bolsonaro só faz confusão”, completou Delfim, acrescentando que Bolsonaro fica alimentando uma briga “absurda” com João Doria, governador de São Paulo, em uma disputa eleitoral que se mistura à política de combate à pandemia da covid-19 e deixa as pessoas completamente confusas.

“Em 2022, na campanha pela sucessão presidencial, Bolsonaro vai dizer que o Doria matou 1 milhão de pessoas e o Doria acusará Bolsonaro de ter matado 1 milhão de pessoas”, com as políticas de isolamento social total ou, como prega o presidente, de isolamento vertical em decorrência da pandemia.

José de Souza Martins* - Entre parênteses

- Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

A performance de Jair Bolsonaro revela uma nova etapa do país: os diferentes são satanizados e excluídos, enquanto fica assegurada a cumplicidade de bajuladores que não sabem nem querem saber o que é democracia


Com a difusão da notícia trágica de que o número de mortos, em decorrência da pandemia da covid-19, ultrapassara o marco de dez mil pessoas, a nação começou a reconhecer-se oficialmente de luto. O STF decretou luto. O Senado e a Câmara dos Deputados decretaram luto.

Nas tradições brasileiras, o luto quer dizer muita coisa. Quer dizer o silêncio e a compostura da dor e do sofrimento, o respeito. Quer dizer solidariedade. O luto coletivo significa que nos reconhecemos como um todo, um povo, em que cada um sofre com o sofrimento alheio. Estamos juntos e não separados.

Mito do Brasil fragmentário e conflitivo, o presidente da República não entendeu. Passeava de jet ski no lago Paranoá e confraternizava com violadores da norma sanitária da quarentena, de seu próprio governo. Ao desdenhar o sofrimento e a dor dos brasileiros, desdenha-se, desbrasileiriza-se. E delira: já anunciou que o término de seu mandato será em 31 de dezembro de 2027.

Não foi ele quem inventou a maldade da pátria entre parênteses. Mas é ele quem a personifica nos reiterados gestos, ações, palavras de menosprezo com os quais demonstra seu alheamento em relação ao povo.

O grande problema brasileiro, desde que o Brasil é Brasil, tem sido o de decifrar quem fica dentro e quem fica fora desses parênteses do processo político. De quem é povo e de quem não o é. Sempre houve gente dentro e gente fora deles.

Dora Kramer – Pau da barraca

- Revista Veja

Não há em nenhuma atitude produzida diariamente pela usina de exorbitâncias instalada no Palácio do Planalto resquício sequer de racionalidade

A cada chute dado nos pilares de sustentação do regime em vigor e, por consequência, no governo que preside, Jair Bolsonaro reforça a impressão de que entregou aos desígnios das divindades do imponderável a chance de reeleição. Diz o contrário (“vou sair daqui em janeiro de 2027”), como é de seu costume, mas age justamente na direção da toalha jogada ao chão. Abre todos os flancos imagináveis, anulando qualquer possibilidade de defesa.

A dúvida é se o faz de propósito, já satisfeito de integrar o mais rápido possível o panteão dos ex-presidentes em posição de (desastroso) destaque mundial, ou se é burro mesmo e não se dá conta dos efeitos de seus gestos. A primeira hipótese revelaria alguma inteligência na execução de um plano; a segunda confirmaria uma forte suspeita.

A pessoa desprovida de cognições cerebrais mais ágeis tende a ver seu baixo grau de compreensão como regra geral. Daí decorre a incapacidade de perceber que determinadas atitudes quando aplicadas a situações diferentes não alcançam os mesmos resultados obtidos anteriormente.

Monica de Bolle* - A economia da exclusão

- Revista Época

Do debate sobre a renda básica à discussão sobre desigualdade de gênero e racial, o país que se revela é devastador

Como muitos leitores já sabem, tenho usado parte de meu tempo neste período de quarentena para me dedicar a um canal que criei no YouTube com a finalidade de disseminar conhecimentos sobre economia e de trazer alguns debates. A hora que eu perdia entre idas e vindas do trabalho agora uso nessa empreitada. Entre explicações sobre economia e debates com interlocutores, tem ficado cada vez mais evidente que nossa economia, essa economia que aceitamos como natural e pela qual passamos a conviver com injustiças diversas, é profundamente excludente.

Segundo dados do IBGE, em 2018, quando a economia brasileira estava “em bom estado”, isto é, não havia crise e o país ensaiava uma retomada, tínhamos cerca de 12 milhões de desempregados. Desses 12 milhões de desempregados, dois terços eram pessoas negras e pardas. Dois terços. Estamos agora no meio de uma pandemia, e o desemprego haverá fatalmente de subir. Se a queda do PIB for da ordem de 10% neste ano, conforme estimo, teremos, em breve, mais de 20 milhões de desempregados no país, ou 10% da população brasileira. Vou repetir: em poucos meses, 10% da população brasileira provavelmente estará desempregada. Quem serão essas pessoas? A julgar pelos dados de 2018, certamente a composição do desemprego será marcada pela gritante disparidade racial, refletindo o que já está acontecendo em outros países. Aqui nos Estados Unidos, onde a taxa de desemprego alcançou exorbitantes 14,7% no mês de abril, os que perderam seus empregos foram desproporcionalmente negros e hispânicos.

Guilherme Amado - O silêncio sem inocentes

- Revista Época

Todos se calaram diante da festa de despautérios que foi a reunião ministerial de 22 de abril. Talvez porque, para os 40 ali presentes, fosse só mais um dia como outro qualquer no governo

A reunião ministerial do dia 22 de abril, aquela em que Sergio Moro afirmou ter sido ameaçado pelo presidente, caso não entregasse a ele o comando da Superintendência da Polícia Federal no Rio de Janeiro, tem tudo para se tornar um retrato sem retoques do que é o governo Bolsonaro. O que já se sabe do encontro, mesmo antes de seu vídeo se tornar público, é de extrema gravidade. O presidente afirma querer trocar a chefia da Polícia Federal (PF) em seu estado para proteger a família e os amigos.

O ministro da Educação defende a prisão dos ministros do Supremo e a dos Direitos Humanos a dos governadores e prefeitos. O chanceler ataca a China e diz que estamos todos sendo tragados pelo... tchan, tchan, tchan… comunavírus. Poderia parecer um esquete da Escolinha do Professor Raimundo não estivessem todos no terceiro andar do Palácio do Planalto, enquanto do lado de fora o país já contava naquele dia quase 3 mil mortos. Mas o episódio traz ainda outro significado grave. Havia ali pelo menos 40 pessoas — isso é o que mostram os 33 registros que o fotógrafo Marcos Corrêa, da Presidência da República, fez naquele dia.

Ninguém se insurgiu contra essa festa de despautérios. Nem mesmo os ministros tidos como os mais técnicos, a exemplo do titular da Economia, Paulo Guedes; a da Agricultura, Tereza Cristina; o advogado-geral da União e agora na Justiça André Mendonça; ou o controlador-geral da União, Wagner Rosário. Todos se calaram diante de tudo isso. Talvez porque o “tudo isso” seja novo para a sociedade como um todo, mas, para os 40 ali presentes, fosse só mais um dia como outro qualquer no governo.

Merval Pereira - Caminho do entendimento

- O Globo

Convite para Rodrigo Maia ir ao Palácio do Planalto foi um primeiro passo importante para distender o ambiente político

“Todos cobram do PR (presidente da República), mas ninguém busca um caminho para o entendimento”, me disse o vice-presidente da República, General Hamilton Mourão ao definir o que o levou a escrever o artigo que publicou ontem no jornal Estado de S. Paulo. Em resumo, não seria uma crítica, mas um convite à reflexão e ao entendimento, para todos, como resumiu um de seus assessores mais próximos.

O artigo provocou diversas interpretações, desde a de que se tratava de uma necessidade de demonstrar apoio público ao presidente Bolsonaro neste momento de crise, até mesmo que estaria enviando um recado a seus companheiros de tropa, garantindo que, mesmo em caso de impeachment do presidente Jair Bolsonaro, ele continuaria uma linha de governo ao gosto dos militares, nacionalista e desenvolvimentista, na definição do cientista político Christian Edward Lynch, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ.

O convite para que o presidente da Câmara Rodrigo Maia fosse ontem ao Palácio do Planalto para conhecer o gabinete de crise montado para o combate à Covid-19 foi um primeiro passo importante para distender o ambiente político.