segunda-feira, 15 de maio de 2023

O apogeu da influência dos economista

Binyamin Appelbaum, editorialista do “New York Times”, se junta a nomes como Thomas Friedman e Joseph Stiglitz no livro “A hora dos economistas”

Por Diego Viana - Eu & Fim de Semana / Valor Econômico

Lançado originalmente em 2019, “A hora dos economistas: falsos profetas, livre mercado e a divisão da sociedade” se inscreve em um subgênero de não ficção que se consolidou nos Estados Unidos na última década. Trata-se do diagnóstico de uma era, um meio século quase paradoxal, em que o país mais rico do mundo vivenciou uma explosão de consumo e riqueza, ao mesmo tempo que sentia seu poderio se erodir aos poucos. O autor, Binyamin Appelbaum, que é editorialista do “New York Times”, se junta a nomes como o colunista Thomas Friedman (“Éramos nós”, de 2011) e o economista Joseph Stiglitz (“Povo, poder e lucro”, 2019) na tentativa de explicar esse paradoxo.

Seu foco está na ascensão de um determinado grupo de economistas que, mais do que gerir a economia, quiseram revolucionar o mundo e as mentes. Para Appelbaum, é, de fato, uma revolução, cujos componentes são, por vezes, difíceis de distinguir. Na introdução, o leitor é apresentado a três vertentes: o prestígio ampliado do economista, que, segundo o autor, deixou de ser encarado como calculadora humana para se tornar conselheiro governamental em quase qualquer tema; as ideias sobre regulação financeira e política pública adotadas desde a década de 1980; e a relação às vezes conflituosa, às vezes simbiótica, entre o conservadorismo econômico e o social.

Abrindo ao mesmo tempo todas essas portas, o autor busca fazer um registro equilibrado. De um lado, pesa a convicção de que “os mercados são uma das ideias mais geniais da humanidade”, que em 50 anos legaram um acesso quase irrestrito a bens e uma economia global. Do outro, Appelbaum considera que o redesenho dos governos e das sociedades, a partir da visão de mundo dos economistas, “foi longe demais”: agravou a desigualdade, destruiu relações humanas e resultou na crise de 2008. A escolha de termos, porém, desequilibra a balança, já que os economistas são ditos “alquimistas” e “falsos profetas” que dividiram a sociedade.

Marcus André Melo* - O presidente e suas escolhas

Folha de S. Paulo

A margem de manobra do presidente e suas escolhas

O Brasil tem o mais poderoso Poder Executivo do mundo democrático. A afirmação é de Matthew Shugart e John Carey, em Presidents and Assemblies: constitutional design and electoral dynamics, Cambridge, 1992.

Seguiram-se outros trabalhos com foco regional e, invariavelmente, Brasil e Chile têm se alternado nas primeiras posições.

No índice que formularam, distinguem os poderes proativos (áreas de iniciativa exclusiva, etc) dos reativos (veto presidencial, etc). Concluem que há uma relação inversa entre os poderes constitucionais dos presidentes e seus poderes partidários (tamanho e coesão do partido (s) do presidente): quando os constituintes esperam que estes sejam débeis, haverá maior delegação de poderes aos presidentes por receio de ingovernabilidade futura. Foi o que aconteceu em 1988.

Muita coisa mudou desde aquele primeiro trabalho pioneiro de mensuração dos Poderes constitucionais. É certo que ocorreram poucas mudanças substantivas nos poderes reativos --nas medidas provisórias e nos poderes orçamentários (orçamento impositivo). No entanto, as relações Executivo-Legislativo sofreram grandes transformações em virtude de alterações estruturais que afetam os demais Poderes.

Bruno Carazza* - Governo e montadoras, uma história de amor

Valor Econômico

Alckmin e Lula são os novos alvos do lobby da indústria automobilística

No dia 09 de fevereiro de 1957, os jornais anunciaram “o maior investimento de capitais estrangeiros no Brasil”: a empresa americana Ford havia apresentado ao governo de Juscelino Kubitschek a intenção de aplicar US$ 16 milhões (quase US$ 160 milhões atuais, corrigidos pela inflação nos Estados Unidos) para produzir em São Paulo camionetes e caminhões F-100, F-350 e F-600.

Embora a Ford já realizasse desde o final dos anos 1910 a montagem de veículos a partir de peças importadas dos EUA (por isso chamamos as empresas desse setor de “montadoras”), desta vez o Brasil poderia se orgulhar de ter uma verdadeira fábrica de automóveis. Havíamos entrado para o seleto grupo das nações industrializadas, celebrava JK, o político que prometera fazer o país crescer “cinquenta anos em cinco”.

A obsessão com a fabricação de carros no Brasil justificava-se pelo seu poder de alavancar outros segmentos a montante e a jusante, como a produção de placas de aço, autopeças, vidros, plásticos e toda uma rede de revendedores e assistência técnica. Como nosso mercado consumidor não possuía escala, para que o investimento das empresas estrangeiras se mostrasse viável o governo brasileiro prometeu uma série de incentivos. Entre os benefícios estava um tratamento cambial favorecido para a importação de máquinas e equipamentos.

Sergio Lamucci - O dólar abaixo de R$ 5 e os limites para novas quedas

Valor Econômico

As incertezas que persistem sobre as contas públicas dificultam uma valorização adicional do real, assim como medidas do governo que elevam a insegurança jurídica

Nos últimos dias, a taxa de câmbio tem oscilado na casa de R$ 5 ou menos. Para alguns analistas, o real tem potencial para se fortalecer ainda mais em relação à moeda americana, com estimativas para o valor justo apontando para números entre R$ 4,40 e R$ 4,70. As incertezas que persistem sobre as contas públicas, mesmo após a apresentação do projeto do novo arcabouço fiscal, dificultam uma valorização adicional da divisa brasileira. Também atrapalham medidas e declarações do governo que elevam a insegurança jurídica, como mudanças na Lei das Estatais, decretos que buscavam alterar o marco do saneamento e a ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra aspectos da privatização da Eletrobras. Para completar, as críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Banco Central (BC) e ao nível dos juros jogam contra um câmbio mais apreciado.

Um real mais valorizado teria efeitos bastante favoráveis neste momento. Ajudaria a reduzir as pressões sobre os preços e as expectativas de inflação, dando mais conforto para o BC começar a cortar os juros, além de contribuir para um alívio das condições financeiras, fator importante para a retomada da atividade.

Entrevista | Tomás Undurraga: ‘Existe um mal-estar real em relação ao dia a dia no Chile’

Tomás Undurraga, da Universidade Alberto Hurtado, em Santiago, avalia a movimentação política no país em torno da redação da terceira tentativa de uma nova Constituição

Por Marcos de Moura e Souza / Valor Econômico

Há dez anos o Chile discute a criação de uma nova Constituição para substituir a atual, que é herança do regime militar de Augusto Pinochet. No entanto, nos últimos anos os eleitores rechaçaram nas urnas dois projetos de uma nova Carta. A primeira, durante o governo Sebastián Piñera; e a segunda, no ano passado, no governo do jovem presidente esquerdista Gabriel Boric, de 37 anos. A terceira proposta está no forno. Um grupo de juristas está delineando o esqueleto do texto e uma comissão de constituintes eleitos no último dia 7 vai se encarregar de dar a redação final dessa terceira proposta, que será levada às urnas em dezembro. Em entrevista ao Valor, o diretor Departamento de Sociologia da Universidade Alberto Hurtado, em Santiago, Tomás Undurraga, avalia a movimentação política no país em torno da redação da nova Constituição. Fala sobre a vitória da direita (dos 50 assentos da comissão constituinte, legendas de direita venceram 34), sobre José Antonio Kast, o principal líder da direita chilena sobre um clima de descontentamento do país em relação ao momento político e econômico e sobre o que esperar da proposta de Constituição a ser definida nos próximos meses.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Demétrio Magnoli - O círculo chileno

O Globo

Esquerda resolveu 'passar o trator', escrevendo um projeto de Constituição à sua imagem e semelhança

O círculo se fechou. Há uma semana, os chilenos deram maioria absoluta à direita na eleição do Conselho Constitucional. O Partido Republicano, de José Antonio Kast, ultraconservador, ficou com 23 das 51 cadeiras. A direita moderada ficou com outras 11. O ciclo iniciado com a vitória da esquerda nas eleições para a Assembleia Constituinte, dois anos atrás, conclui-se na forma de um teorema: a política identitária move o eleitorado para a direita.

As manifestações populares de 2019 e 2020 desaguaram no plebiscito que aprovou a produção de uma nova Constituição, em substituição à Carta herdada da ditadura de Pinochet e várias vezes emendada. Sob o impulso das ruas, que queriam redes ampliadas de proteção social, a esquerda obteve maioria na Constituinte.

Camila Rocha* - Extrema direita não precisa de fake News

Folha de S. Paulo

Mesmo com PL das Fake News, debate manterá conflitos e divisões políticas

Ainda hoje é comum a ideia de que a força da extrema direita repousa na disseminação de fake news nas redes sociais. Por esse motivo, o projeto de lei 2.630/2020, que institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, e recebeu o apelido infeliz de PL das Fake News, é visto como uma tábua de salvação por certos setores progressistas, sobretudo após a invasão golpista de 8 de janeiro.

É verdade que a aprovação do PL irá dificultar a circulação de conteúdos criminosos nas redes que já se enquadram na lei brasileira, como crimes contra o Estado democrático de Direito, atos de terrorismo e atos preparatórios de terrorismo.

Para tanto, as plataformas serão instadas a conter conteúdos ilícitos de forma análoga ao que já ocorre na legislação recém-aprovada pela União Europeia: o que for ilegal offline também passa a ser ilegal online.

Fernando Gabeira - Big techs como aliadas da pandemia

O Globo

De um modo geral, não temos tempo para comemorar nem para lamentar erros: há sempre uma tarefa à frente

Em maio, tiro férias. Não paro de escrever. Na verdade, dedico-me a escrever bobagens, ler livros inúteis e trabalhar imagens sem nenhum valor comercial.

Continuo com olho no mundo.

OMS suspendeu a emergência internacional, embora a pandemia não tenha acabado. Bill Gates é um bilionário, sou apenas um remediado, como se diz em Minas. No entanto concordo plenamente com ele que é necessário trabalhar para evitar a próxima pandemia.

Gates propõe uma estrutura mundial de vigilância que custaria US$ 1 bilhão por ano, um décimo dos gastos em defesa, uma gota no oceano de trilhões de dólares perdidos com uma pandemia.

No livro “Como evitar a próxima pandemia”, ele fala na necessidade de haver um bom número de pessoas que acordam todas as manhãs pensando no tema. Não é meu caso. Às vezes acordo de pá virada; às vezes, melancólico. Nem todas as manhãs dedico à humanidade.

Edu Lyra - Tecnologias sociais têm de amadurecer

O Globo

É saudável que passemos a encarar a inovação científica como se houvesse uma ‘curva de amadurecimento’

Tecnologias como o ChatGPT são diferentes de tudo o que conhecíamos até então. Tipicamente, um avanço tecnológico ocorria quando uma empresa ou um grupo de pesquisadores desenvolviam um produto ou serviço inovador. Ou ainda quando descobriam uma maneira mais inteligente de realizar uma velha tarefa.

A inovação estava, portanto, no ato de criar ou de aperfeiçoar uma tecnologia. Com o advento da Inteligência Artificial (IA) e das aplicações de machine learning, isso mudou.

O lançamento de uma ferramenta como o ChatGPT para o público geral é apenas uma etapa na sua curva de amadurecimento. Só conheceremos o pleno potencial dessa tecnologia com o passar do tempo, à medida que ela aprender interagindo com os seres humanos e encontrar maneiras ainda mais certeiras de responder às nossas demandas. Se você está impressionado(a) com o ChatGPT hoje, espere só ele atingir altitude de cruzeiro.

Luiz Claudio Latgé* - Algoritmos, jabuticabas e jabutis

O Globo

A receita para avançar é focar nas questões de consenso, essenciais para uma regulamentação efetiva das redes

O Brasil costuma ter problemas com a lei. Estamos no país onde “vale o que está escrito”, existem “leis para inglês ver” e em que “há leis que colam e leis que não colam”. Portanto, no momento em que o Brasil se prepara para escrever a regulamentação das redes sociais, o Projeto de Lei 2.630, é importante evitar singularidades brasileiras, como jabuticabas e jabutis.

Os recentes ataques a escolas em São Paulo, Santa Catarina e Goiás e a onda de posts disseminando o medo mostraram o tamanho do problema. Governo e mídias se mobilizaram rapidamente para conter as publicações que incitavam a violência, em alinhamento com as melhores práticas internacionais. O Twitter, no entanto, se recusou, num primeiro momento, a adotar o mecanismo de proteção. Alegou que as publicações não feriam “os termos de uso da empresa”, como se o contrato particular pudesse estar acima da legislação existente.

Carlos Pereira* - O barato que sai caro

O Estado de S. Paulo

Um dos aspectos mais peculiares do sistema multipartidário, seja no parlamentarismo, mas sobretudo no presidencialismo, é que o chefe do Executivo necessita dispor de moedas de troca para a construção de maiorias legislativas estáveis e disciplinadas. Quase nunca o programa ou a ideologia partidária são elementos suficientes para que outros partidos aceitem fazer parte da coalizão de governo.

Quanto maior e mais diversificada forem as moedas de troca na “caixa de ferramentas”, maiores as chances de o Executivo governar por meio de coalizões eficientes. Ou seja, aprovando mais a sua agenda com menores custos possíveis.

No artigo “Executive Toolbox”, em colaboração com Eric Raile e Tim Power, mostro que cada tipo de moeda de troca (ministérios, emendas parlamentares, cargos na burocracia pública, etc.) no presidencialismo brasileiro tem características próprias que as torna substitutos imperfeitos. A mudança de ministros gera “custos afundados” para o governo e, portanto, proporciona maior eficiência quando implementada para parceiros próximos do presidente; já as emendas orçamentárias são mais flexíveis, permitindo atrair parceiros ideologicamente distantes com um menor impacto nas políticas do governo.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

‘Opep das florestas’ terá de tornar real a promessa ambiental

O Globo

Brasil, Congo e Indonésia pretendem fazer da preservação uma mercadoria tão valiosa quanto o petróleo

O principal item na pauta da viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Brazzaville, prevista para o mês que vem, é a aliança entre países com grandes áreas de floresta tropical, ativo valorizado em razão do combate às mudanças climáticas. A iniciativa, cujo objetivo é unificar o discurso e os compromissos de preservação perante os países ricos, vem sendo chamada informalmente de “Opep das florestas”, numa referência ao cartel que controla os preços do petróleo.

Comparecerão à cúpula na capital da República Democrática do Congo países de América do Sul, África Central e Sudeste Asiático. Apenas três dos presentes — Brasil, Congo e Indonésia — concentram 52% das florestas tropicais do planeta. Lula faz questão de levar também Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Guiana, Suriname e Venezuela — integrantes da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) —, além de outros países africanos e asiáticos de grande cobertura florestal, de modo a reunir 80% das florestas tropicais do planeta.

A agenda oficial prevê a troca de experiências na preservação e exploração das florestas úmidas na Bacia Amazônica, na Bacia do Congo e na região do Bornéu-Mekong, no Sudeste Asiático. De acordo com o governo congolês, a proteção e o desenvolvimento das florestas precisam se assentar sobre três pilares: cooperação científica, cadeias de produção sustentáveis e mecanismos inovadores de financiamento para a biodiversidade.

Poesia | Eduardo Galeano - Os ninguéns

 

Música | Tereza Cristina - Você passa eu acho graça

 

domingo, 14 de maio de 2023

Muniz Sodré* - Um modo canibal de ser

Folha de S. Paulo

Mentir é construir realidade falsa com saberes reais

Em tempo de verdade líquida, até mesmo o falso é incerto.

Uma noveleta policial sem maior interesse literário, mas reveladora do imaginário criminoso, retrata um falsário tão obcecado pela perfeição que, com essa reputação, não quer seu nome associado a algo que pudesse ser denunciado como falso. Entenda-se: o transgressor busca a autenticidade, isto é, o ser-fundado-em-si-mesmo, que no limite seria um álibi, um "estar em outro lugar", não criminoso. Ou seja, uma mentira redimível, como uma joia sintética que passa por natural.

Isso vem a propósito da disseminação de falsidades entre nós, em tal grau de dano cognitivo e social que a ala menos mentirosa do Congresso parece convicta quanto a uma lei reguladora. Fake news, porém, é tão só uma fração do fenômeno. Essa expressão, aliás, já está algo envelhecida, considerando-se os desdobramentos e a sua irradiação no meio social.

Celso Rocha de Barros – Para onde, esquerda chilena?

Folha de S. Paulo

Resta ao presidente chileno aliar-se à centro-direita para garantir moderação nas regras do jogo

No domingo passado, o governo de esquerda de Gabriel Boric foi derrotado nas eleições dos novos constituintes chilenos. A coalizão governista Unidad para Chile obteve apenas 17 das 51 vagas no conselho que discutirá o novo texto constitucional.

A coalizão de centro-direita Chile Seguro também foi mal, obtendo apenas 11 vagas. O grande vencedor da noite foi o Partido Republicano, de direita radical, que obteve 23 cadeiras.

Na última semana, proliferaram análises da derrota chilena que eram 100% previsíveis quando já se conhecia a posição política do analista. A esquerda radical acusou Boric de se aproximar demais do centro. A direita acusou o presidente chileno de ter se perdido em seu esquerdismo.

Eu mesmo, social-democrata e simpatizante do velho Partido Socialista Chileno, me sinto tentado a dizer que a nova esquerda chilena deveria se limitar a reformar o Estado de bem-estar do país, cujo caráter privatista foi um dos principais alvos das revoltas da última década. Posso até estar certo, mas também estou fazendo diagnóstico por reflexo ideológico.

Janaína Figueiredo - A hora do voto enfurecido na América Latina

O Globo

Nova onda rosa era apenas expressão de desejo de alguns nostálgicos

Nos últimos tempos, muitos tiveram a expectativa de uma nova onda rosa na América Latina. As vitórias de Alberto Fernández na ArgentinaGabriel Boric no ChileGustavo Petro na Colômbia e Luiz Inácio Lula da Silva no Brasil entusiasmaram setores que, precipitadamente, comemoraram o fim da onda direitista na região. O recente resultado da eleição para formar o novo Conselho Constitucional no Chile, somado ao fortalecimento da candidatura de Javier Milei na campanha presidencial na Argentina e ao bom desempenho do candidato de extrema direita Paraguayo Cubas no Paraguai — lá considerado um anarquista —, confirmou que a nova onda rosa era apenas expressão de desejo de alguns nostálgicos.

A América Latina vive um novo ciclo, mas ele nada tem a ver com experiências do passado recente. Em tempos de auge das redes sociais — que na região operam quase sem restrições —, a política tradicional está desconectada da sociedade e de suas demandas prioritárias, em momentos de deterioração da economia. Com governos que não entregam bons resultados, a extrema direita tem um terreno fértil para crescer. Com propostas em muitos casos delirantes, seus representantes — sempre habilidosos usuários das redes — estão conectados com uma rede global de extrema direita e aplicam ao pé da letra um manual de operações que inclui questionamento ao sistema eleitoral e aos partidos no poder. O discurso de Milei contra a “casta política” virou mantra entre setores de classe baixa, média e alta na Argentina.

Bernardo Mello Franco – Alerta no bloco 59

O Globo

Ministro pressiona Ibama a ignorar parecer técnico e conceder licença à Petrobras

Lula aproveitou a coroação de Charles III para produzir uma boa notícia na área ambiental. O Reino Unido anunciou a doação de R$ 500 milhões ao Fundo Amazônia. A preservação da floresta não foi discutida apenas com o primeiro-ministro Rishi Sunak. “A primeira coisa que o rei disse para mim foi para cuidar da Amazônia”, confidenciou o presidente, após ser recebido no Palácio de Buckingham.

Alemanha e Estados Unidos já haviam anunciado doações ao Fundo, que ficou paralisado no governo Bolsonaro. Os aportes indicam a retomada da confiança no Brasil como protagonista da agenda climática. A diplomacia verde está funcionando, mas não pode se sustentar só em palavras. Depende de decisões concretas a serem tomadas pelo governo.

Luiz Carlos Azedo - Oposição aposta na desagregação do governo Lula

Correio Braziliense

O intervencionismo do governo Lula na economia provoca um realinhamento de forças políticas na sociedade, que já se reflete no Congresso e fortalece os bolsonaristas

Por várias razões, entre as quais a vitória apertada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a campanha eleitoral de 2026, que normalmente começaria após as eleições de 2024, está sendo antecipada, às vezes pelo próprio estilo palanqueiro do presidente da República. A disputa pelas bandeiras da democracia, da ética e do moderno está instalada no cenário político. Em torno delas se decidirá o destino do país. Lula da Silva, com suas diatribes, ajuda um precoce realinhamento de forças políticas que o apoiaram no segundo turno e já se descolaram ou começam a se afastar do seu governo.

Além disso, também existe vida inteligente no campo da oposição ligada ao presidente Jair Bolsonaro, que já se movimenta para aprofundar essas fissuras na base política e social do governo. Na sexta-feira, isso ficou claro durante a gravação de conversa como o ex-ministro e senador Rogério Marinho (PL-RN), líder da oposição no Senado, na Confraria do Brito (um grupo de jornalistas que se reúne semanalmente, criado pelo falecido Orlando Brito, craque do fotojornalismo político), para o Canal MyNews (YouTube).

Bruno Boghossian - Lula e o barulho da esquerda

Folha de S. Paulo

Esquerda petista puxa agenda econômica, e MST promete pressão sobre o governo

Lula tem ouvido um certo barulho à esquerda do Palácio do Planalto. Na economia, alas do PT mantêm uma campanha contra o aperto do arcabouço fiscal negociado pela Fazenda com o Congresso. No campo, o MST promete aumentar a pressão sobre o governo pelo avanço de iniciativas de reforma agrária.

O presidente não é um principiante nessa área. Quando a esquerda petista atacou a agenda econômica do primeiro mandato, Lula deu sinal verde para a expulsão de parlamentares da sigla. Com os movimentos sociais, o governo conseguiu uma relação amigável graças à aceleração de políticas públicas e à partilha de cargos na máquina federal.

Merval Pereira - Lula enfezado

O Globo

Lula deveria apaziguar os ânimos, para que o país possa recuperar sua energia, consumida há anos nessa disputa de “nós contra eles”

O desassombro com que o presidente Lula se referiu aos organizadores do Agrishow de Ribeirão Preto como “fascistas” e “maus-caracteres”, é demonstrativo do seu estado de espírito, enfezado, agressivo e ressentido com “as elites”. É permite que seja chamado de "senil", como fez um vereador da região.

Quando tinha poder para controlar as crises com sua oratória, ao mesmo tempo que levava a massa para onde queria, tudo ia bem para Lula, que se convenceu de que era “o cara” quando o então presidente Barack Obama assim o aclamou em uma reunião internacional de líderes. Com o surgimento dos escândalos de corrupção, Obama arrependeu-se.

O encanto de Lula foi suficiente para terminar o segundo mandato com 80% de aprovação e eleger Dilma presidente da República. Mas, a partir do fracasso de sua criatura, e a escalada da Operação Lava Jato, Lula entrou para o rol dos humanos, e seus defeitos de repente começaram a pesar.

Eliane Cantanhêde - Recuo tático

O Estado de S. Paulo

Lula ameniza o tom, mas as pautas petistas são só questão de tempo e oportunidade

As manchetes e o noticiário em geral deslizam para o escândalo explosivo no futebol, a crise da Light, a crise das grandes varejistas e, claro, as revelações sem fim sobre joias, vacinas, contas e sanha golpista do casal Bolsonaro. Nada disso, porém, tira o foco do presidente Lula, muito menos das preocupações quanto às intenções e ações do governo.

Lula avisou que, na volta da China, iria botar a mão em dois vespeiros, a meta de inflação e os preços dos combustíveis. A mudança da meta ainda corre discretamente nos bastidores, mas a interferência na política de preços da Petrobras será anunciada nesta semana. Segundo o presidente da companhia, Jean Paul Prates, os valores ao consumidor serão “inexoravelmente mais baixos”. Há controvérsias.

A paridade internacional será trocada por uma cesta de indicadores: produção nacional de petróleo, cotação externa e “perfil do cliente”. Mas... como o Brasil importa até 30% dos combustíveis e o governo não tem poder para determinar o preço nos postos, o risco é a Petrobras perder receita e o consumidor não pagar, “inexoravelmente”, menos.

Cristovam Buarque* - Ritaleegria

Blog do Noblat / Metrópoles

Rita Lee é sinônimo de irreverência, rebeldia, coragem, vanguardismo, mas sobretudo sinônimo de alegria

Rita Lee escreveu um divertido auto obtuário, um meu seria menos divertido: “teve o privilégio de ser contemporâneo da Rita Lee, de quem recebeu parte das alegrias que viveu”. Não escolhemos o período de vida, nem o nascimento, nem a morte, por isto é sorte viver no mesmo tempo que pessoas como Chico Buarque, Sebastião Salgado, Pelé, Caetano Veloso e outros personagens. Cada um enriqueceu minha vida, mas Rita Lee foi certamente a contemporânea que mais encantou, mais provocou e mais alegria passou. Ela foi uma “ritaleegria” com suas composições e performances.

Míriam Leitão - As lutas de Lula. Que lutas lutar?

O Globo

Presidente assumiu em um momento de crise, mas deve focar no que realmente importa: consolidar a democracia

O presidente Lula, ao assumir, enfrentou emergências em vários ministérios e uma tentativa de golpe de estado que tinha como participantes até militares da ativa. Seus primeiros atos para derrotar a conspiração foram rápidos e eficientes. Precisou acudir as urgências e, em algumas, tem se saído bem. Suas propostas econômicas de revogar a independência do Banco Central, dar vantagens por decreto a empresas estatais no saneamento, reestatizar a Eletrobras não vão prosperar. São lutas em que será derrotado. No caminho, sofrerá desgastes e talvez tenha que fazer concessões inaceitáveis em pontos do seu projeto.

É comum dizer que essas medidas não serão aprovadas porque esse Congresso é liberal, a favor da austeridade e o presidente Lula está com uma pauta de esquerda. Acho que isso precisa ser repensado. Nem uma coisa, nem outra. Quem esteve do lado de Bolsonaro, no parlamento ou fora dele, aprovou a intervenção serial numa empresa de capital aberto, como a Petrobras, capitalização fora do teto de gastos de estatais militares, uma reforma da previdência militar que elevou gastos e vantagens para um grupo de servidores, o não pagamento de dívidas vencidas da União e estouro eleitoreiro dos cofres. Tudo isso fere princípios liberais e de austeridade. Foi feito por Bolsonaro com aprovação dos parlamentares da direita brasileira. São liberais de conveniência.

Vinicius Torres Freire – O esgotamento do Bolsa Família

Folha de S. Paulo

Programa ainda vai ajudar a reduzir bem a pobreza em 2023, mas essa fonte vai secar

renda dos brasileiros cresceu em 2022, dizem os números do IBGE divulgados na semana passada. A informação causou certa indiferença. É compreensível.

O ano de 2021 havia sido o pior de uma década tenebrosa. Ainda assim, a despiora foi maior para os mais pobres. Na média, o aumento da renda domiciliar per capita foi de 6,9%. Para os 10% mais pobres, de 57,3%.

Com o Bolsa Família de Lula 3, o aumento de renda dos mais pobres deve ser expressivo em 2023. Mas, daqui em diante, será muito difícil que a vida dessas pessoas melhore por meio de aumento de transferência de renda.

Antes de mais nada, explique-se a "melhora". O rendimento médio por pessoa entre os 10% mais pobres passou de R$ 102 por mês em 2021 para R$ 162 em 2022. É miséria.

Em 2021, a falta de trabalho foi a pior da década, afora o 2020 do início da epidemia. O governo das trevas enxugou o auxílio emergencial. Foi o terror social. Em meados de 2022, Jair Bolsonaro veio com o Auxílio Brasil porque sua candidatura naufragava. Era um programa social improvisado, ruim, mas que pagava mais.

Rolf Kuntz - Entre mandar e governar

O Estado de S. Paulo

Empenhado em buscar a paz entre Rússia e Ucrânia, Lula também tenta mandar nos juros e rever decisões do Congresso, mas cuida pouco da obrigação de administrar seu país

Lula quer mandar, muito mais do que governar, como tem demonstrado em quase cinco meses de mandato. Quer mandar nos juros, na Eletrobras, na política de pessoal das estatais, no Orçamento e nos serviços de utilidade pública. Seu desejo pode conflitar com alguma lei sancionada, mas isso pouco importa. De forma desaforada, tentou mudar com dois decretos o marco legal do saneamento, atropelando uma legislação aprovada em 2020. De forma grosseira e indigna, tem atacado pessoalmente o presidente do Banco Central (BC), acusando-o de trabalhar sem compromisso com o Brasil. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também tem criticado os juros, mas sem as baixarias presidenciais. De forma civilizada, já apontou dois nomes para vagas na diretoria do BC. Pode ser uma forma de introduzir a opinião do Executivo nas discussões de crédito e juros. Mas o risco de intervenção permanece, mesmo com as boas maneiras de um ministro conciliador.

Também conciliador e discreto, o economista Gabriel Galípolo, indicado para a Diretoria de Política Monetária do BC, já é visto como possível sucessor do presidente da instituição, Roberto Campos Neto. Por enquanto, Galípolo permanece como secretário executivo do Ministério da Fazenda, posto equivalente ao de viceministro. Sua transferência para a nova função, disse Galípolo, poderá facilitar a harmonização das políticas monetária e fiscal. O discurso parece atraente, mas a palavra “harmonização” é um tanto estranha.

Pedro S. Malan - O primeiro inverno do governo Lula

O Estado de S. Paulo

Dada a nossa história, não teria qualquer credibilidade um governo que se limitasse a ‘afirmar’ seu compromisso com a responsabilidade fiscal

 “É perfeitamente legítimo a qualquer pessoa expressar de público suas ‘memórias do futuro’, para usar a bela expressão de Borges para caracterizar desejos, expectativas, sonhos e planos – quer se realizem, quer não.” Assim abri meu artigo de 14/12/2014 neste espaço. O comentário vinha a propósito de discurso feito por Lula durante a campanha eleitoral de 2014, no qual afirmou que já se imaginava em 2022, nas comemorações de nossos 200 anos de Independência, defendendo, com Dilma, tudo o que haviam conquistado “nos últimos 20 anos”.

O primeiro discurso de Lula eleito para seu terceiro mandato, na noite de sua vitória, parecia indicar uma clara percepção do grau de polarização a que havíamos chegado e, principalmente, o reconhecimento de que uma legião de eleitores havia votado nele porque não queria mais quatro anos de Bolsonaro. Ali Lula afirmou que governaria para 215 milhões de brasileiros, e não apenas para seus eleitores.

Entrevista | Joan Martínez-Alier: Pela sociedade pós-crescimento

Catalão Joan Martínez-Alier, que ganhou prêmio norueguês por contribuições para a economia ecológica, fala sobre necessidade de desenvolvimento realmente sustentável

Por Diego Viana – Eu & Fim de Semana / Valor Econômico  

Em 1948, o economista americano Paul Samuelson representou a economia como um encanamento circular, onde se movimentam investimentos, consumo, salários, impostos, insumos e bens. Imagens como essa se tornaram habituais, cristalizando a ideia da economia como um ciclo fechado. Hoje, com crises como a mudança climática e a degradação de terras e mares, já não é mais possível pensar assim: menos de 10% do que entra na economia circula de fato. O resto é dissipado ou descartado como resíduo. É o que aponta o economista ecológico catalão Joan Martínez-Alier, professor emérito da Universidade Autônoma de Barcelona, que recebeu neste ano o Prêmio Holberg, concedido pelo governo norueguês a acadêmicos das humanidades.

Martínez-Alier é um dos fundadores do ramo da economia ecológica, junto com autores como o romeno Nicholas Georgescu-Roegen e o americano Herman Daly, este último morto no ano passado. Esses economistas começaram a estudar as implicações do fato de que a atividade econômica é um subsistema do mundo físico, integrada ao sistema ecológico do planeta e sujeita à lei da entropia. Trata-se de um “metabolismo social” em que fluem materiais e energia, não só mercadorias e preços. Por isso, Daly e demais economistas ecológicos estão entre os primeiros a defender que o crescimento deixasse de ser o maior paradigma econômico.

“Os jovens estão muito preocupados com as futuras gerações, e esses jovens acreditam no decrescimento”

O catalão também está entre os fundadores da Sociedade Internacional de Economia Ecológica, em 1989. Entre seus principais livros estão “Economia ecológica: energia, ambiente e sociedade” e “O ecologismo dos pobres”. Este último, que aproveita sua ampla convivência com movimentos ecologistas latino-americanos, critica a ideia de que a pobreza é causa de degradação ambiental. Ao contrário, argumenta, algumas das maiores iniciativas de preservação vêm de comunidades marginalizadas.

Em 2015, Martínez-Alier atuou na criação do Atlas de Justiça Ambiental, que mapeia conflitos ligados ao meio ambiente em todo o mundo. A iniciativa foi mencionada pelo comitê do Prêmio Holberg como principal motivo para entregá-lo ao economista. O comitê citou “suas contribuições para a fundação da economia ecológica, sua análise pioneira das relações entre economia e meio ambiente, sua abordagem comparativa e interdisciplinar e seu papel na promoção da justiça ambiental”. O economista também recebeu o prêmio Leontief de 2017 e o prêmio Balzan de 2020.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

O risco da falta de comedimento no Supremo

O Globo

Decisões contra Google e Telegram destoam do ideal democrático que a Corte sempre defendeu

Ninguém em sã consciência pode negar o papel fundamental do Supremo Tribunal Federal (STF) desde que o governo Jair Bolsonaro passou a atacar direitos básicos garantidos pela Constituição. Da obrigatoriedade da vacinação contra Covid-19 a limites à política armamentista, a Corte foi um dique eficaz contra os desvarios do Executivo entre 2019 e 2022.

Os ministros do STF foram, sobretudo, primordiais para que as eleições de 2022 transcorressem sem sobressaltos. À frente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tomaram todas as medidas necessárias para garantir a lisura do pleito. Depois da tentativa de golpe no 8 de Janeiro, o STF novamente agiu de modo ágil e oportuno. Graças à Corte, nossa democracia resistiu aos ataques.

A ação diligente do Supremo, porém, não o torna imune a críticas. Acompanhar atentamente as decisões da Corte constitucional é dever da sociedade e da imprensa. Depois do turbilhão do governo Bolsonaro, o Brasil precisa restabelecer a normalidade institucional, cuidando para que os ritos e direitos previstos em lei sejam respeitados.

Poesia | Fausto Goethe - Um poema filosofante

 

Música | Clara Nunes - O vento e a rosa

 

sábado, 13 de maio de 2023

Pablo Ortellado - Não se combate abuso com abuso

O Globo

Jogo pesado em torno do PL das Fake News esgarça uma democracia que precisa se recompor

É triste assistir à guerra em torno do Projeto de Lei (PL) que regulamenta as redes sociais. Na batalha regulatória, as empresas, o governo e a Justiça estão pesando a mão, sem observar que o jogo pesado esgarça uma democracia que passou recentemente por um trauma e precisa se recompor.

Pouco antes da primeira tentativa (frustrada) de votar o projeto na Câmara dos Deputados, o Google colocou um link na capa de seu site de buscas apresentando detalhadamente os motivos por que se opunha a ele. Não haveria problema algum em a empresa publicar um post em seu blog ou canal no YouTube. Mas ela não poderia ter abusado da posição de distribuidora de conteúdo de terceiros para colocar um conteúdo próprio em destaque. O Google detém mais de 90% do mercado de buscas e é simplesmente o site mais visitado no Brasil.

Buscadores como Google, redes sociais como Facebook e sites de vídeos como YouTube não são tratados pela lei como veículos de mídia porque, em vez de produzirem conteúdos próprios, distribuem os de terceiros. É justamente por isso que, fora algumas circunstâncias excepcionais, não são responsáveis pelos conteúdos que distribuem e não têm as obrigações que cabem a jornais e TVs.

Ao pôr o link na capa, o Google privilegiou um conteúdo dele mesmo, rompendo com a alegada neutralidade que diz ter como distribuidor de conteúdo de terceiros. E não fez só isso. No recurso de autocompletar, o Google sugeria seu próprio texto quando alguém começava a digitar “PL das Fake News” — mesmo seu texto não estando entre as expressões mais buscadas. Também veiculou propaganda contra o PL no Facebook, mas este não classificou a propaganda como política, limitando a divulgação dos dados da campanha.

Carlos Alberto Sardenberg - Tudo anulado

O Globo

A anulação de condenações só esbarra num tipo de obstáculo. Quando há algo muito evidente, um rastro impossível de apagar

Agora que o Judiciário está numa onda de anular sentenças da Lava-Jato, em especial, e de processos de corrupção, em geral, o ex-senador Fernando Collor enfrenta no STF um julgamento na direção contrária. Na próxima semana, o Supremo retoma a análise de um caso que vem lá da Lava-Jato, um subpetrolão, em que Collor é acusado de receber propinas em contratos da BR Distribuidora de 2010 a 2014.

A defesa alega inocência. O relator, ministro Edson Fachin, ainda não votou, mas deu sinais de que condenará o ex-senador, por receber e lavar cerca de R$ 26 milhões. E lavar em carros de luxo — Ferrari, Lamborghini, Bentley, Land Rover e Porsche —, casa e obras de arte. Os carros chegaram a ser apreendidos — o processo vem de 2017 —, mas já foram devolvidos.

Continuam, entretanto, sendo um problema para Collor. O atual movimento de anulação de condenações só esbarra num tipo de obstáculo. Ocorre quando há algo muito evidente, um rastro impossível de apagar.

Eduardo Affonso - Fazuélysson, um brasileiro

O Globo

Ele não entendeu que milhões não queriam Lula de volta. Só preferiam qualquer coisa a mais quatro anos de desprezo pela vida

Ele veio ao mundo em parto complicado, num 8 de janeiro. Suas primeiras palavras não foram mamãe ou gugu dadá, mas um irônico “Faz o L!” — o que inspirou a família na hora do batismo.

Precoce, porém nada sagaz, Fazuélysson não consegue, até hoje, articular outra coisa que não seja isso. “Faz o L!” é seu único argumento, a síntese de sua cosmovisão. O slogan surrupiado da campanha do PT — agora com o sentido de “Eu avisei! Não adianta chorar sobre o pleito derramado” — virou um mantra, e é com ele que desdenha qualquer reparo que se faça ao novo governo.

Fazuélysson teme que Lula transforme o Brasil numa Venezuela, por regressão constitucional: corrupção gradativa das instituições, submissão do Judiciário ao Executivo, manipulação da mídia, cooptação das Forças Armadas. Mas faz cara de paisagem quando alguém lembra aquela história de fechar o STF com um soldado e um cabo, os ataques à imprensa nas laives e nos comícios no cercadinho do Alvorada ou a militarização, em todos os níveis, do governo anterior.