O QUE PENSA A MÍDIA
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Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
quarta-feira, 20 de agosto de 2008
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

CÍRCULO CRIMINOSO
Dora Kramer
Dora Kramer
O governador do Rio, Sérgio Cabral, elogiou de início a decisão do Tribunal Superior Eleitoral sobre a necessidade de tropas federais atuarem desde já na garantia da liberdade de voto das populações das áreas dominadas pelas milícias e pelo narcotráfico.
Aparentemente desautorizando seu vice, Luiz Fernando Pezão, que, de imediato, desmentiu a existência de problema nos morros e disse que essa história de dominação é coisa de gente que não tem acesso aos votos das "comunidades".
Em seguida, Cabral entrou em atrito com o comandante militar do Leste, general Luiz Cesário da Silveira, que exige autorização expressa do governador para entrar em ação e lembra que, de outras vezes, foi esse o impedimento para a execução dos planos.
Cabral achou a idéia da Justiça uma maravilha, praticamente se apropriou dela, mas ponderou que o assunto de autorizações ou pedidos oficiais não é de sua alçada.
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, interferiu afirmando que a prerrogativa da autorização é do presidente da República. Mediante, porém, solicitação do governador.
Anda-se, portanto, de novo em círculos ao ritmo do velho bate-boca entre as responsabilidades de autoridades públicas enquanto o problema continua impávido, fazendo seus estragos.
Noves fora, fato é que tudo segue como dantes. O presidente do TSE, ministro Ayres Brito, é um bem-intencionado. Ainda vai tentar convencer os ministros da Justiça e da Defesa de que a situação requer emergência.
Acrescente-se: requer, sobretudo, um árbitro. Um mediador imune a ingerências eleitorais já poria as coisas num outro patamar e aumentaria as chances de o Estado combater preventivamente a fraude urdida pelos chefões da bandidagem para eleger seus candidatos a vereador e ajudar simpatizantes a comandar a prefeitura.
Essa arbitragem, ou pelo menos mediação, em tese seria um papel a ser exercido pelo presidente Luiz Inácio da Silva. Mas as viagens internacionais e os afazeres políticos, partidários e eleitorais do interesse exclusivo de seu projeto de manutenção de poder não lhe têm permitido perceber que governa um País em parte interditado.
E assim segue o baile. A Justiça Eleitoral assegura o sigilo do voto de longe, atrás da tela da televisão, e o bandido, agora travestido de chefe político, põe o dedo na cara do cidadão e avisa que a senha da urna eletrônica "está na mão" e será usada para descobrir quem entrará na lista dos condenados às penas do crime de crime de alta traição, segundo o código da lei do mais forte.
Quando o governador "puxa" briga com o comandante militar da região, este entra na polêmica e a fala do ministro da Defesa não apresenta uma solução para o conflito - pois remete o ato inicial a Sergio Cabral, que se recusa a fazê-lo - o cidadão continua abandonado, a criminalidade queda-se sossegada e a Justiça fica literalmente na mão. Do faz-de-conta de sempre.
Terra arrasada
Deputados e senadores talvez ainda não tenham se dado conta, mas o Palácio do Planalto avança sua mão de gato sobre funções constitucionalmente atribuídas ao Congresso.
Assim como quem não quer nada e querendo rigorosamente tudo, o Poder Executivo se imiscui mais e mais no funcionamento do Parlamento. Governando por medidas provisórias, praticamente cassou-lhe a prerrogativa de legislar.
Agora anuncia as balizas da reforma política no molde de seu interesse e, não bastasse, sinaliza intenção de restringir o campo de atuação das comissões parlamentares de inquérito.
Uma é produzida no departamento dedicado a atividades parlamentares do Ministério da Justiça e, da outra, quem se faz porta-voz é o secretário de Reforma do Judiciário, também da pasta comandada por Tarso Genro.
A assessoria jurídica do Palácio do Planalto ou a assessoria parlamentar do Ministério da Justiça - a denominação do santo não altera a origem do pecado - estão, com isso, pretendendo reescrever o regimento interno do Parlamento e a Constituição.
E logo com as CPIs, coitadas, tão desmoralizadas, ineficazes, perdidas e só raramente produtivas.
Já andam no osso. Se forem restritas suas atribuições - ainda mais como se pretende, de fora para dentro -, não lhes sobrará nem a chama das intenções.
O balanço da situação até o momento é o seguinte: o Executivo já capturou do Congresso a iniciativa de legislar; já interditou a atividade de parlamentar (no sentido de debater), pois com os aliados o presidente Lula monologa e com os adversários usa da popularidade para jogá-los contra a população e, assim, inibir o confronto mais consistente; agora quer solapar a função de fiscalizar "normatizando" o funcionamento de comissões de inquérito.
Quando suas excelências abrirem os olhos - se lhes interessar abrir, bem entendido - já terão perdido todas as suas atribuições, o direito de reclamar e ficarão desprovidos da própria razão de ser.
LIVRO: LANÇAMENTO

AMIGA GRAZIELA
Ivan Alves Filho
Não conheço gênero literário mais livre do que a crônica. Cabe tudo dentro dela. O pequeno ensaio. O tratado filosófico em miniatura.
Não conheço gênero literário mais livre do que a crônica. Cabe tudo dentro dela. O pequeno ensaio. O tratado filosófico em miniatura.
A prosa poética. A reminiscência. A conversa de papel. Se a crônica fosse um fenômeno da natureza – um animalzinho por exemplo –, seria sem dúvida um passarinho. Se fosse um doce, quindim de Iaiá, certamente. Desses que derretem no céu da boca, como os passarinhos se divertem no céu de verdade.
Há certas crônicas que merecem quase ser devoradas. As crônicas – e também os contos e a poesia – de Graziela Melo estão entre essas. Que livro prazeroso a minha amiga escreveu! Por vezes áspero, como quando se refere à prisão do marido Gilvan no Rio de Janeiro ou à morte do filho querido em Santiago do Chile, nos tempos do Companheiro Presidente, o nosso querido Salvador Allende. Mas... ó quão verdadeiras essas crônicas são! Quanta emoção elas nos passam!
Como isso se tornou possível, eu me perguntei a certa altura do livro. Como? Qual foi o segredo?
E creio ter encontrado a resposta: Graziela transformou sua vida – e não somente sua escrita – em uma obra de arte. Mulher sensível, a minha amiga Graziela ama viver até quase o desespero, retirando poesia das coisas mais simples do nosso cotidiano, sentindo as dores e as alegrias do mundo como as dores e as alegrias do mundo são: parte integrante da aventura da vida que ela sabe enfrentar como ninguém.
A poesia, a crônica, o conto? Ouso dizer – eu que não sou crítico literário - que esses escritos nada mais são do que uma conseqüência dessa arte maior, que é o amor de Graziela pelas coisas do mundo.
Ou para me socorrer de uma expressão sua, amiga Graziela, esses escritos, de tão sinceros, ficarão para sempre alojados “ nas desordens da minha alma, nos arquivos da minha memória.”
A poesia, a crônica, o conto? Ouso dizer – eu que não sou crítico literário - que esses escritos nada mais são do que uma conseqüência dessa arte maior, que é o amor de Graziela pelas coisas do mundo.
Ou para me socorrer de uma expressão sua, amiga Graziela, esses escritos, de tão sinceros, ficarão para sempre alojados “ nas desordens da minha alma, nos arquivos da minha memória.”
DEU EM O GLOBO

O PAPELZINHO
Merval Pereira
Merval Pereira
NOVA YORK. Embora não tenhamos até o momento nenhuma prova de fraudes em eleições com votação eletrônica, é de preocupar a mera possibilidade de que os traficantes que dominam os morros cariocas já dominem também uma tecnologia que seja capaz de violar o sigilo das urnas nas próximas eleições municipais. A declaração do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Carlos Ayres Britto, de que nosso sistema de urnas eletrônicas é inviolável e que as ameaças dos bandidos não passam de "blefes" e "bravatas" é tranqüilizadora, mas em todo o caso seria bom que fossem tomadas medidas adicionais de segurança, pois a inviolabilidade total dessas máquinas não é tecnicamente comprovável.
Aqui nos Estados Unidos, desde a crise política da tumultuada contagem de votos na Flórida que deu ao presidente Bush uma vitória definida pela Suprema Corte e até hoje considerada no mínimo discutível, há uma tendência de aumentar os investimentos para o uso de votação eletrônica e, ao mesmo tempo, um terrível temor de que esse sistema possa ser desvirtuado.
Nos Estados Unidos não há uma uniformidade nos tipos de urnas, já que cada condado (região formada por pequenas cidades) pode escolher o tipo de voto.
Nas últimas eleições de 2006, cerca de 48 milhões de eleitores, representando 30% dos registrados, usaram a urna eletrônica. Para a eleição presidencial, esse número já está estimado em aproximadamente 40% dos eleitores.
O aumento do uso de urnas eletrônicas deve-se principalmente à legislação aprovada em 2002, no rastro das seqüelas políticas da eleição presidencial de 2000, que destinou uma verba de mais de U$3 bilhões para compras de equipamentos e modernização do sistema eleitoral, que ainda é feito em grande parte em cartões perfurados e cédulas escaneadas.
Pela legislação em vigor, as urnas devem ter cópias em papel da votação, que podem ser utilizadas em caso de recontagem.
Ao mesmo tempo em que as urnas eletrônicas estão sendo utilizadas mais amplamente, muitos problemas técnicos surgem, e até mesmo nas últimas primárias os dois partidos registraram erros.
Um caso famoso foi o do condado de Tarrant, no Texas, onde máquinas fabricadas pela Hart InterCivic contaram alguns votos, em determinadas situações até seis vezes mais, totalizando mais de 100 mil votos "fantasmas".
O problema foi atribuído a um erro técnico de programação, e não ao trabalho de algum "hacker". No Colorado, por exemplo, a firma responsável pelas máquinas de votar foi desabilitada depois que ficou comprovado que elas podiam ser alteradas e apresentavam erros de contagem.
O estudo mais famoso sobre vulnerabilidade no sistema de votação eletrônica é um realizado em 2004 pelo Centro para Política de Informação Tecnológica, do departamento de Ciência do Computador da Universidade de Princeton.
Eles analisaram o modelo de urna eletrônica Diebold AccuVote-TS, da fábrica Diebold, que hoje é a proprietária da firma brasileira que criou o modelo de urna eletrônica que está em uso no Brasil.
O estudo de Joseph A. Calandrino, J. Alex Haldeman e Edward W. Felten criou em laboratório um software capaz de roubar votos em uma urna eletrônica e de espalhar um vírus para outras urnas, contaminando-as com o mesmo poder de alterar o resultado de uma eleição.
Embora os representantes da firma Diebold tenham alegado na ocasião que aquele modelo não estava mais em uso, tendo sido substituído por outros, mais modernos e seguros, eles não aceitaram submeter ao laboratório de Princeton esses novos modelos, alegando questão de segurança.
Ao mesmo tempo, admitiram indiretamente que as antigas urnas, que já haviam sido usadas em eleições passadas, poderiam ser vulneráveis. Várias outras auditorias independentes encontraram problemas com as urnas eletrônicas em diversos estados do país.
Em Maryland, vários defeitos foram verificados, mas a auditoria não desclassificou o uso das máquinas. Auditoria da Califórnia examinou os sistemas Diebold Elections Systems, Hart InterCivic e Sequoia Voting Systems, permitindo o uso nas eleições, mas exigiu mudanças e maior controle.Testes revelaram que um vírus poderia ser introduzido em qualquer um dos modelos de urnas, podendo se espalhar por toda a região de votação.
A questão é tão discutida que Ronald L. Rivest, um cientista do Massachusetts Institute of Technology, e o matemático e advogado especialista em eleições Warren D. Smith propuseram uma complicada solução: cada eleitor, ou pelo menos um bom número deles, receberia aleatoriamente um papel após a votação, com um número de registro de um voto, sem que fosse o seu, naturalmente.
Os registros de todos os votos computados seriam colocados em um sítio na internet, e todos os eleitores que receberam o comprovante poderiam constatar se o número correspondente àquele voto foi contabilizado. Seria uma maneira de colocar os cidadãos como os fiscais da lisura da eleição.
Uma combinação de alta tecnologia com o papelzinho, que o falecido Leonel Brizola tinha como grande reivindicação, que confere credibilidade à eleição mesmo nos tempos mais avançados tecnologicamente. Ou até mesmo por isso.
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE - NAS ENTRELINHAS

CEIA ANTECIPADA
Luiz Carlos Azedo
Luiz Carlos Azedo
É muito comum, em época de eleições, cronistas políticos espinafrarem os partidos e os políticos. E abominarem a propaganda eleitoral. Mas não se deve esquecer que só há democracia com eles
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva resolveu tirar o gênio da garrafa e promover uma reforma política. Fará seis pedidos aos Congresso: restaurar a cláusula de barreira, acabar com as coligações em eleições proporcionais, exigir fidelidade partidária, endurecer a lei de inelegibilidades , implantar o financiamento público de campanha e adotar o voto em listas partidárias. Com isso, o quadro partidário seria mais enxuto e definido ideologicamente. Acredita que assim acabaria o me-dá-me-dá na base governista. Hoje, a negociação é voto a voto, o que obriga o Executivo a comer pela mão de deputados e senadores da base governista a cada vez que precisa aprovar alguma coisa no Legislativo. Muitas vezes, um acordo com a oposição sai mais barato. Prevista para depois das eleições municipais, a reforma política proposta pelo presidente Lula é mais ou menos a mesma coisa do que convidar os perus para uma ceia de Natal antecipada.
Os partidos
Logo após o golpe de 1964, os militares também tentaram dar um jeito no que consideravam a “bagunça” dos partidos. Todos foram extintos, inclusive a UDN, que havia apoiado o golpe de Estado. O general Castelo Branco, que havia assumido a Presidência, tentou dar “racionalidade” ao sistema partidário e implantou o bipartidarismo. Além de uma Lei Orgânica dos Partidos, na qual foram criados a Arena e o MDB, implantou um código eleitoral e uma lei de inelegibilidades. A partir das eleições de 1974, porém, o bipartidarismo passou a funcionar contra os militares, porque aglutinou toda a oposição, com exceção dos que haviam aderido à luta armada.
Após sucessivas derrotas eleitorais, os militares promoveram nova reforma partidária, em dezembro de 1979, logo após a anistia política. Concebida pelo general Golbery do Couto e Silva, restabeleceu o pluripartidarismo para dividir a oposição. A antiga Arena virou PDS, o atual PP. O MDB manteve a sigla, o PMDB. Mas a oposição se dividiu com o “racha” do PTB, cuja legenda ficou sob controle de Ivete Vargas; o surgimento do PDT, de Leonel Brizola; e a fundação do PT, sob a liderança de Lula. Tancredo Neves fundou o PP, mas com a adoção do voto vinculado, que proibia as coligações, voltou ao PMDB, partido pelo qual foi eleito presidente da República.Os partidos comunistas (PCB, PCdoB, PSTU) só foram legalizados em 1985, pelo presidente José Sarney. Na Constituinte, peemedebistas dissidentes criaram o PSDB.
As eleições
Com o restabelecimento das eleições diretas em todos os níveis e a liberdade de organização partidária, consagradas pela Constituição de 1988, o quadro partidário se ampliou ainda mais, porém o sistema eleitoral continuou o mesmo. O próprio Congresso tem um regimento herdado do bipartidarismo. Todas as tentativas de reforma política, como a adoção do parlamentarismo ou do voto distrital, fracassaram. Os remendos aprovados pelo Congresso não modificaram significativamente o sistema eleitoral, que passou a ser aperfeiçoado muito mais em razão de medidas adotadas pela Justiça Eleitoral. Recententemente, graças a um ativismo jurídico que muitos caracterizam como a “judicialização da política”, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) passou a preencher o vácuo criado pela inércia do Legislativo. E adotou medidas para fortalecer os partidos e aperfeiçoar o processo eleitoral, algumas delas na contramão de decisões tomadas pelo Congresso. É o caso, por exemplo, da interpretação dada à cláusula de barreira, aprovada pelos parlamentares, mas invalidada pelo TSE, e da nova jurisprudência sobre a fidelidade partidária.
Apesar dos escândalos envolvendo os partidos e seus políticos, não se pode, entretanto, jogar a criança fora com a água da bacia. O Brasil tem a maior democracia de massas do mundo, com voto direto e secreto, apuração eletrônica e propaganda eleitoral gratuita na tevê e rádio. Está à frente de muitos países desenvolvidos, inclusive os Estados Unidos, e nem de longe pode ser comparado com a Índia, a Rússia e a China. Somos mais de 130 milhões de eleitores, num ambiente de ampla liberdade, com eleições limpas, apuradas no próprio dia da votação. É muito comum, em época de eleições, cronistas políticos espinafrarem os partidos e os políticos. E abominarem a propaganda eleitoral. Mas não se deve esquecer que só há democracia com eles. E a reforma política de Lula parece mais um casuísmo, cujo objetivo é reabrir as porteiras do troca-troca partidário e facilitar a vida do PT na sucessão presidencial de 2010.
DEU NO VALOR ECONÔMICO

DESARMONIA NA LARGADA DA ESQUERDA
Rosângela Bittar
Rosângela Bittar
Foi mal recebida por um grupo importante do PSB, partido do bloco de esquerda que tem candidato viável para a sucessão do presidente Lula, a iniciativa do ex-ministro José Dirceu de iniciar agora negociações de aliança para 2010, numa tentativa de amarrar, com precipitação, os destinos do PSB, PCdoB e PDT ao projeto do PT, atropelando desta forma a candidatura presidencial de Ciro gomes. O ex-ministro chefe da Casa Civil no primeiro governo petista apresentou suas armas na forma de uma entrevista com o presidente do PCdoB, Renato Rebelo, publicada em seu blog. Na conversa, quase um depoimento, com poucas e certeiras intervenções do entrevistador, o dirigente comunista compromete o PCdoB com duas posições caras ao PT.
Uma delas é a concordância com a idéia de convocação de um plebiscito para "viabilizar", na pergunta de Dirceu e na resposta de Rebelo, a reforma política. Segundo entendimento no diálogo dos dois políticos, esta não seria uma reforma para se realizar com o atual Congresso. Ao expor sua aprovação à idéia, Rebelo deixa atendido, por esta reforma, o desejo do PT, transcrito na velha e recorrente proposta do deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), de revisão do mandato do presidente da República.
Isto não é dito assim, tão diretamente, nem assumido como apoio oficial dos dois partidos, PT e PCdoB, ao terceiro mandato consecutivo para o presidente Lula.
- José Dirceu: "Estou convencido que para viabilizar a reforma política só um plebiscito"...;
- Renato Rebelo: "No Congresso atual, dificilmente vamos aprovar uma reforma política. Ela exige uma série de questões que deveríamos levar em conta, como, por exemplo, o tempo de mandato do senador e do próprio presidente da República"...
Mais à frente, o presidente do PCdoB concorda com a assertiva de que a saída para uma reforma política é "um plebiscito, como você levanta". E, de passagem, condena, como "enganação", a reforma política parcial, fatiada, exatamente do tipo que o governo Lula, por intermédio dos ministros Tarso Genro (Justiça) e José Múcio (Relações Institucionais), está propondo ao Congresso.
Primeiro, projeto de país, depois, o candidato
Definição clara de posição, no mesmo diálogo, foi apresentada na questão de ter o bloco um candidato próprio a presidente da República ou seguir aliado ao PT, desde o primeiro turno, em 2010, ainda que não seja Lula o candidato. Diz Renato Rebelo que Lula acaba sendo o grande cabo eleitoral dos 12 partidos que o apóiam. "Numa situação como essa, o candidato deveria ser do PT, o partido do presidente, com maior índice de aprovação pela população, e que cresce mesmo depois da crise que atravessou".
Os partidos são responsáveis pela construção desta candidatura, diz, sobretudo aqueles que estão com Lula desde 1989. "Os interesses particulares têm que ficar subordinados a interesses maiores". Segundo Rebelo, para construir esta candidatura, são necessárias a intervenção direta do presidente e a convergência política dos partidos. "O presidente assinala o nome de Dilma Rousseff. Hoje, Lula procura essa construção, e ele está certo".
Antes de integrar a chapa como vice de Marta Suplicy, na eleição para escolha do futuro prefeito de São Paulo, o deputado Aldo Rebelo, também do PCdoB, apresentou sua candidatura a prefeito, e nela insistiu até que o presidente Lula, diante de um PT isolado na sucessão municipal, fizesse o apelo à desistência. Um dos argumentos principais de Aldo para manter a candidatura a prefeito era que, para passar a existir politicamente, o bloco tinha que ocupar um espaço eleitoral em disputa privilegiada para isto, como a prefeitura, além do fato de o PT só haver recorrido aos partidos de esquerda depois de preterido em alianças preferidas.
Com nuances, é esta a argumentação que se vê agora, no PSB, contra o alinhamento automático ao PT proposto pelo PCdoB na entrevista de Renato Rebelo. O vice-presidente dos socialistas, Roberto Amaral, afirma que se não houver uma razão eleitoral para estes partidos de esquerda estarem juntos, o bloco perde sua razão de ser. "Passa a ser um bloco parlamentar, não político", afirma. E não entende como adequada, para o momento, a discussão sobre 2010 a um nível tão avançado. "Quer desestabilizar o governo, discute a sucessão".
O dirigente socialista destaca os méritos do governo Lula, diz que não é um ponto de chegada, mas de partida, e defende que o candidato à sucessão do presidente, pelo qual se deve lutar dentro do bloco de esquerda, deve ser alguém que "mantenha esse projeto popular de Lula e o aprofunde". Todos os partidos, na sua opinião, têm direito a pleitear esta escolha. "Pelo menos os que têm nomes nacionais, e o PSB tem o Ciro Gomes, o Eduardo Campos e a Luiza Erundina". Entretanto, pondera, não devem os políticos da esquerda discutir candidatura agora. O PSB, inclusive, segundo informa, não aprovou sequer o princípio da candidatura própria.
A esquerda, diz Roberto Amaral, tem que discutir um programa, um projeto de país, promover debates nacionais. "Temos que definir qual vai ser nossa postura em 2009, que reforma política a esquerda pretende fazer, como vão se reorganizar as Forças Armadas, como tratar este futuro do país que está no litoral - com o pré-sal e o gás".
As grandes questões do mundo - a crise financeira, "que pega o fígado do capitalismo"-, a energia, os alimentos, a água, encontram o Brasil, na avaliação do dirigente socialista, bem equipado para enfrentá-las e contribuir para sua solução. "Mas qual o projeto do país agora, que temos alimentos, energia, água? Rodo o país inteiro e não estou vendo esta discussão". A oposição não debate nada, assinala. A omissão, nota, é não só dos políticos, mas também da imprensa e da sociedade.
Desqualificando mais uma vez as definições precipitadas, o vice-presidente do PSB conclui: "Só com a visão do país terei a visão do meu candidato ideal".
Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras
DEU NO JORNAL DO BRASIL

A FLOR DA ESPERANÇA MURCHOU
Villas-Bôas Corrêa
O que já se sabia de véspera foi apenas confirmado na estréia do milionário programa de propaganda eleitoral, com a gratuidade à nossa custa mais uma vez reprovada no teste da sua inutilidade.
Para começo de conversa, com a experiência de várias campanhas a caduca legislação eleitoral já deveria ter sido reformada para os ajustes difíceis, mas não impossíveis, à sua serventia. Não há como levar a sério a bagunça de fim de feira de um flagrante, com provável baixíssimo nível de audiência que as pesquisas devem quantificar, mas que os números conhecidos antecipam: são 1.244 os candidatos que se apresentam para pedir o nosso voto para o sacrifício de servir o povo no nobre exercício da vereança na Câmara Municipal.
Com tal inflação de borbulhante fervor cívico, depois de passar pelo triturador a distribuição das migalhas chega ao ridículo de quatro segundos para a apresentação do programa de alguns candidatos e que, certamente, arrastaria multidões se pudesse ser exposto com o mesmo enfeite gongórico dos discursos nas tribunas da antiga gaiola de ouro.
O candidato estreante Adelson Alípio, do PCdoB, que ainda não tive o prazer conhecer, em confessada ignorância que se estende ao programa do partido, queixa-se que está se submetendo a um treinamento diário para conseguir anunciar ao ainda não conhecido eleitorado o seu nome, número e a síntese tão espremida como bagaço de laranja: pela saúde e educação. Um recado que, pelo ineditismo, certamente levará multidões ao delírio e a marcha batida para as urnas.
Se o programa de ontem foi de encher as medidas além de outros espaços da nossa paciência, certamente que, por todo Brasil, a mesma ansiedade aguarda a entrada em cena, na meia hora matinal e na fatia mais cobiçada no horário nobre, das 20h30m às 21h. em rede de emissoras de TV, hoje e às segundas, quartas e sextas-feiras durante 45 dias, um mês e meio. Nas emissoras de rádio, o horário eleitoral invade o ar das 7h às 7h30m e do meio-dia às 12h30m. Como se vê, o que não vai faltar é emoção em pacotes distribuídos ao longo do dia. Ufa!
Dos 14 candidatos a recuperar a ex-cidade maravilhosa, quatro terão menos de um minuto para a abordagem crítica e as propostas de soluções da crise dos setores de segurança, saúde, educação, a favelização e o tráfico de drogas, limpeza, lixo e outras encrencas.
O tom jocoso de um assunto da mais preocupante seriedade é intencional, mas não leviano. Mas, que adjetivos, mesmo baixando ao calão, podem exprimir a vergonha, o asco e a indignação do eleitor diante de denúncias como a da manchete de primeira página do JB de ontem, que expõe as vísceras da Câmara Municipal do Rio: a maioria dos 48 vereadores que sobem ao palco para pedir o voto da reeleição dobrou o seu patrimônio nos quatro anos do mandato.
A honrada vereadora Liliam Sà (PR) é a campeã olímpica de enriquecimento, com a disparada do seu patrimônio, descontada a inflação, chegando à altura de 809%.
Já não pedimos tanto, mas a nobre vereadora poderia ensinar aos beneficiados pelos magos da equipe do presidente Lula, que arrombaram as cancelas da pobreza para a ascensão ao patamar da classe média, como aplicar as sobras do milagre da multiplicação do real com o mesmo êxito das mordomias de um parlamentar a serviço do povo.
Dona Liliam não é a única habilitada a ensinar ao povão a ficar rico jogando na bolsa.
E se a campanha para a eleição de prefeitos e vereadores pôs na berlinda os que galgam os primeiros degraus de uma escada que leva ao infinito, dentro de mais dois anos, em 2010, com a eleição para presidente, governadores, senadores e deputados federais vamos ter o espetáculo de gala que promete levar o respeitável público à fossa propriamente dita.
Villas-Bôas Corrêa
O que já se sabia de véspera foi apenas confirmado na estréia do milionário programa de propaganda eleitoral, com a gratuidade à nossa custa mais uma vez reprovada no teste da sua inutilidade.
Para começo de conversa, com a experiência de várias campanhas a caduca legislação eleitoral já deveria ter sido reformada para os ajustes difíceis, mas não impossíveis, à sua serventia. Não há como levar a sério a bagunça de fim de feira de um flagrante, com provável baixíssimo nível de audiência que as pesquisas devem quantificar, mas que os números conhecidos antecipam: são 1.244 os candidatos que se apresentam para pedir o nosso voto para o sacrifício de servir o povo no nobre exercício da vereança na Câmara Municipal.
Com tal inflação de borbulhante fervor cívico, depois de passar pelo triturador a distribuição das migalhas chega ao ridículo de quatro segundos para a apresentação do programa de alguns candidatos e que, certamente, arrastaria multidões se pudesse ser exposto com o mesmo enfeite gongórico dos discursos nas tribunas da antiga gaiola de ouro.
O candidato estreante Adelson Alípio, do PCdoB, que ainda não tive o prazer conhecer, em confessada ignorância que se estende ao programa do partido, queixa-se que está se submetendo a um treinamento diário para conseguir anunciar ao ainda não conhecido eleitorado o seu nome, número e a síntese tão espremida como bagaço de laranja: pela saúde e educação. Um recado que, pelo ineditismo, certamente levará multidões ao delírio e a marcha batida para as urnas.
Se o programa de ontem foi de encher as medidas além de outros espaços da nossa paciência, certamente que, por todo Brasil, a mesma ansiedade aguarda a entrada em cena, na meia hora matinal e na fatia mais cobiçada no horário nobre, das 20h30m às 21h. em rede de emissoras de TV, hoje e às segundas, quartas e sextas-feiras durante 45 dias, um mês e meio. Nas emissoras de rádio, o horário eleitoral invade o ar das 7h às 7h30m e do meio-dia às 12h30m. Como se vê, o que não vai faltar é emoção em pacotes distribuídos ao longo do dia. Ufa!
Dos 14 candidatos a recuperar a ex-cidade maravilhosa, quatro terão menos de um minuto para a abordagem crítica e as propostas de soluções da crise dos setores de segurança, saúde, educação, a favelização e o tráfico de drogas, limpeza, lixo e outras encrencas.
O tom jocoso de um assunto da mais preocupante seriedade é intencional, mas não leviano. Mas, que adjetivos, mesmo baixando ao calão, podem exprimir a vergonha, o asco e a indignação do eleitor diante de denúncias como a da manchete de primeira página do JB de ontem, que expõe as vísceras da Câmara Municipal do Rio: a maioria dos 48 vereadores que sobem ao palco para pedir o voto da reeleição dobrou o seu patrimônio nos quatro anos do mandato.
A honrada vereadora Liliam Sà (PR) é a campeã olímpica de enriquecimento, com a disparada do seu patrimônio, descontada a inflação, chegando à altura de 809%.
Já não pedimos tanto, mas a nobre vereadora poderia ensinar aos beneficiados pelos magos da equipe do presidente Lula, que arrombaram as cancelas da pobreza para a ascensão ao patamar da classe média, como aplicar as sobras do milagre da multiplicação do real com o mesmo êxito das mordomias de um parlamentar a serviço do povo.
Dona Liliam não é a única habilitada a ensinar ao povão a ficar rico jogando na bolsa.
E se a campanha para a eleição de prefeitos e vereadores pôs na berlinda os que galgam os primeiros degraus de uma escada que leva ao infinito, dentro de mais dois anos, em 2010, com a eleição para presidente, governadores, senadores e deputados federais vamos ter o espetáculo de gala que promete levar o respeitável público à fossa propriamente dita.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O DIA EM QUE NOSSO LULA IMITOU O REI SALOMÃO
José Nêumanne
O presidente da República pode não ser um homem letrado nem ilustrado, mas até seus adversários mais ferrenhos, que não toleram a hipótese do terceiro mandato nem em pesadelo, devem concordar que ele tem um bom senso invejável, além de um enorme talento para driblar obstáculos. Foi o que ele fez, aparentemente de maneira brilhante, na semana passada, ao encontrar uma solução salomônica para a proposta inoportuna e insensata feita por seu ministro da Justiça, Tarso Genro, e seu secretário de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, de reabrir unilateralmente a Lei da Anistia para punir apenas os torturadores.
Se cedesse à pressão dos comandantes militares e desautorizasse os dois auxiliares na cerimônia de apresentação dos novos oficiais-generais, terça-feira 12, no Palácio do Planalto, poderia passar a impressão de que carece de apoio da caserna para permanecer no legítimo posto em que está por decisão majoritária e soberana do povo brasileiro. Se, ao contrário, nada falasse, autorizaria uma insensata exumação de esqueletos da guerra suja, que não se sabe a quem poderia interessar, mas com certeza não interessa à sociedade nacional nem, por extensão, à paz em seu governo. O presidente calou na reunião com os oficiais, mas falou mais tarde em cerimônia no quartel-general de um dos maiores inimigos dos militares descontentes com a proposta de Paulo e Tarso: a União Nacional dos Estudantes (UNE). A escolha do lugar exalta os méritos do estrategista. A frase cunhada para encerrar o assunto comprova seu talento inato e invulgar de lidar com as palavras, ainda que muitas vezes atropele a gramática. Num arroubo digno de fazê-lo figurar entre os governantes que se celebrizaram pelo estilo conciliador quando detinham o bastão de mando, de dom Pedro II a Getúlio Vargas, de Bernardo Pereira de Vasconcelos a Tancredo Neves, Lula jogou o tema para escanteio num carrinho retórico, sem machucar ninguém: ele afirmou que era preciso “transformar os mortos em heróis, e não em vítimas”.
A sentença funcionou como um calmante para os quartéis inquietos com a reabertura da discussão imprópria. Os comandantes e seu chefe, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, saíram comemorando o encerramento da discussão e a dupla Paulo e Tarso não se sentiu desautorizada nem repreendida. Mas a reencarnação do justiceiro rei hebreu Salomão no ex-dirigente sindical metalúrgico não passa de um truque impreciso do ponto de vista semântico, de lógica canhestra e falacioso no ângulo histórico, embora muito sagaz politicamente. Não há, ao contrário do que a sentença insinua, oposição entre a condição de vítima e o heroísmo. Há até muitas vezes uma relação estreita, embora não obrigatória: nem toda vítima é herói, mas muitas vezes o herói tem de ser vitimado antes, assim como o é o mártir.
No caso que serviu de tema à fala presidencial, quem foi torturado na ditadura militar exige tratamento de herói da democracia, embora não o tenha sido. Salvo raras exceções que confirmam a regra, os inimigos da ditadura militar de direita não lutavam pelo Estado Democrático de Direito, mas por outra ditadura, de sinal oposto, cujos exemplos - a Rússia de Lenin e Stalin, a China de Mao, a Cuba de Fidel Castro ou o Camboja de Pol Pot - são tão próximos de uma democracia quanto as tiranias de Nero, Calígula, Gengis Kahn, Hitler, Franco e Mussolini. Houve, sim, heróis da democracia na resistência civil contra os militares no Brasil - e Lula está entre eles, pois ajudou a desmoralizar a legislação autoritária com as greves que liderou, à custa de prisão e pena. Mas nenhum deles pegou em armas para enfrentar a ditadura.
Ao contrário do que imaginam os ingênuos que crêem nas versões falaciosas politicamente corretas de que havia nas ruas das metrópoles e nos sertões do Araguaia mais uma versão do conflito entre o Bem e o Mal, a idéia de derrubar o regime autoritário pelas armas não contribuiu para sabotá-lo. Mas colaborou para torná-lo mais cruel e talvez mais longevo. A ditadura durou mais do que era previsto que durasse pelos oficiais que interromperam o mandato de João Goulart, em 1964, porque teve a própria fúria contra as instituições nutrida pela aventura insensata dos que tentaram implantar no Brasil as idéias insanas do foquismo cubano dos barbudos de Sierra Maestra. E terminou ruindo sobre os próprios pés de barro, com a ajuda de democratas de verdade que participaram da difícil reconstrução das instituições enquanto muitos aventureiros da guerra suja ainda sonhavam com o sangrento assalto ao poder.
A dupla Paulo e Tarso não está sozinha na leitura distorcida destes eventos históricos. As comissões de burocratas que distribuem generosamente dinheiro público à guisa de remunerar os serviços prestados à luta contra a ditadura prestam idêntico desserviço à Nação. Não tem sentido subtrair dinheiro que deveria servir para resgatar a tal da dívida social, à qual Lula vive se referindo, para pagar indenizações milionárias a ex-combatentes que optaram pela luta e agora tratam essa opção imatura, mas consciente, como um investimento, conforme apontou com lucidez Millôr Fernandes. A notícia da entrada de 175 ex-militares, que logo serão seguidos por mais 425, na Justiça contra a União para pedir indenização por terem combatido no Araguaia parece absurda apenas por causa da conclusão equivocada de que havia algozes, num lado, e vítimas, no outro. Essa conclusão ganhou foros de verdade absoluta, sem fundamento histórico algum, pelo uso competente e cínico da lição dada pelo mago da propaganda nazista, Joseph Goebbels, segundo quem uma mentira se torna verdadeira se incessantemente repetida.
Vítima então e herói sobrevivente da luta dos democratas contra a ditadura, Lula recorreu à falácia para ganhar apoio e votos. Seria tão bom se deles fizesse melhor uso!
José Nêumanne
O presidente da República pode não ser um homem letrado nem ilustrado, mas até seus adversários mais ferrenhos, que não toleram a hipótese do terceiro mandato nem em pesadelo, devem concordar que ele tem um bom senso invejável, além de um enorme talento para driblar obstáculos. Foi o que ele fez, aparentemente de maneira brilhante, na semana passada, ao encontrar uma solução salomônica para a proposta inoportuna e insensata feita por seu ministro da Justiça, Tarso Genro, e seu secretário de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, de reabrir unilateralmente a Lei da Anistia para punir apenas os torturadores.
Se cedesse à pressão dos comandantes militares e desautorizasse os dois auxiliares na cerimônia de apresentação dos novos oficiais-generais, terça-feira 12, no Palácio do Planalto, poderia passar a impressão de que carece de apoio da caserna para permanecer no legítimo posto em que está por decisão majoritária e soberana do povo brasileiro. Se, ao contrário, nada falasse, autorizaria uma insensata exumação de esqueletos da guerra suja, que não se sabe a quem poderia interessar, mas com certeza não interessa à sociedade nacional nem, por extensão, à paz em seu governo. O presidente calou na reunião com os oficiais, mas falou mais tarde em cerimônia no quartel-general de um dos maiores inimigos dos militares descontentes com a proposta de Paulo e Tarso: a União Nacional dos Estudantes (UNE). A escolha do lugar exalta os méritos do estrategista. A frase cunhada para encerrar o assunto comprova seu talento inato e invulgar de lidar com as palavras, ainda que muitas vezes atropele a gramática. Num arroubo digno de fazê-lo figurar entre os governantes que se celebrizaram pelo estilo conciliador quando detinham o bastão de mando, de dom Pedro II a Getúlio Vargas, de Bernardo Pereira de Vasconcelos a Tancredo Neves, Lula jogou o tema para escanteio num carrinho retórico, sem machucar ninguém: ele afirmou que era preciso “transformar os mortos em heróis, e não em vítimas”.
A sentença funcionou como um calmante para os quartéis inquietos com a reabertura da discussão imprópria. Os comandantes e seu chefe, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, saíram comemorando o encerramento da discussão e a dupla Paulo e Tarso não se sentiu desautorizada nem repreendida. Mas a reencarnação do justiceiro rei hebreu Salomão no ex-dirigente sindical metalúrgico não passa de um truque impreciso do ponto de vista semântico, de lógica canhestra e falacioso no ângulo histórico, embora muito sagaz politicamente. Não há, ao contrário do que a sentença insinua, oposição entre a condição de vítima e o heroísmo. Há até muitas vezes uma relação estreita, embora não obrigatória: nem toda vítima é herói, mas muitas vezes o herói tem de ser vitimado antes, assim como o é o mártir.
No caso que serviu de tema à fala presidencial, quem foi torturado na ditadura militar exige tratamento de herói da democracia, embora não o tenha sido. Salvo raras exceções que confirmam a regra, os inimigos da ditadura militar de direita não lutavam pelo Estado Democrático de Direito, mas por outra ditadura, de sinal oposto, cujos exemplos - a Rússia de Lenin e Stalin, a China de Mao, a Cuba de Fidel Castro ou o Camboja de Pol Pot - são tão próximos de uma democracia quanto as tiranias de Nero, Calígula, Gengis Kahn, Hitler, Franco e Mussolini. Houve, sim, heróis da democracia na resistência civil contra os militares no Brasil - e Lula está entre eles, pois ajudou a desmoralizar a legislação autoritária com as greves que liderou, à custa de prisão e pena. Mas nenhum deles pegou em armas para enfrentar a ditadura.
Ao contrário do que imaginam os ingênuos que crêem nas versões falaciosas politicamente corretas de que havia nas ruas das metrópoles e nos sertões do Araguaia mais uma versão do conflito entre o Bem e o Mal, a idéia de derrubar o regime autoritário pelas armas não contribuiu para sabotá-lo. Mas colaborou para torná-lo mais cruel e talvez mais longevo. A ditadura durou mais do que era previsto que durasse pelos oficiais que interromperam o mandato de João Goulart, em 1964, porque teve a própria fúria contra as instituições nutrida pela aventura insensata dos que tentaram implantar no Brasil as idéias insanas do foquismo cubano dos barbudos de Sierra Maestra. E terminou ruindo sobre os próprios pés de barro, com a ajuda de democratas de verdade que participaram da difícil reconstrução das instituições enquanto muitos aventureiros da guerra suja ainda sonhavam com o sangrento assalto ao poder.
A dupla Paulo e Tarso não está sozinha na leitura distorcida destes eventos históricos. As comissões de burocratas que distribuem generosamente dinheiro público à guisa de remunerar os serviços prestados à luta contra a ditadura prestam idêntico desserviço à Nação. Não tem sentido subtrair dinheiro que deveria servir para resgatar a tal da dívida social, à qual Lula vive se referindo, para pagar indenizações milionárias a ex-combatentes que optaram pela luta e agora tratam essa opção imatura, mas consciente, como um investimento, conforme apontou com lucidez Millôr Fernandes. A notícia da entrada de 175 ex-militares, que logo serão seguidos por mais 425, na Justiça contra a União para pedir indenização por terem combatido no Araguaia parece absurda apenas por causa da conclusão equivocada de que havia algozes, num lado, e vítimas, no outro. Essa conclusão ganhou foros de verdade absoluta, sem fundamento histórico algum, pelo uso competente e cínico da lição dada pelo mago da propaganda nazista, Joseph Goebbels, segundo quem uma mentira se torna verdadeira se incessantemente repetida.
Vítima então e herói sobrevivente da luta dos democratas contra a ditadura, Lula recorreu à falácia para ganhar apoio e votos. Seria tão bom se deles fizesse melhor uso!
José Nêumanne, jornalista e escritor, é editorialista do Jornal da Tarde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

VISITA AO PAÍS DOS RICOS MAIS RICOS
Clóvis Rossi
SANTANDER - Já tratei recentemente, neste espaço, da lenda da queda da desigualdade e dos números da miséria brasileira, explicitada em pesquisa que o Ibase (a ONG do Betinho) fez com os beneficiados pela Bolsa Família.
Faltava só visitar os ricos.
Andrés Oppenheimer ("Miami Herald", prêmio Pullitzer) se antecipou e mostra o que só pode ser surpresa para os que acreditam em duendes ou na lenda da queda da desigualdade.Vejamos os dados por ele coletados no "Informe Mundial da Riqueza-2008", preparado por Capgemini e Merrill Lynch:
1 - Os ricos da América Latina estão enriquecendo mais rapidamente que seus pares de todas as demais regiões do mundo e já acumularam US$ 6,2 bilhões em valores financeiros, sem contar imóveis e coleções de arte.
2 - Nos três anos mais recentes, os ricos latino-americanos viram suas fortunas aumentar 20,4%, enquanto os pobres árabes donos do petróleo só ficaram 17,5% mais ricos. Os norte-americanos, então, tadinhos, engordaram suas contas apenas 4,4% (essa gente ainda vai morrer de fome nesse ritmo).
3 - Em que países os ricos ficaram ainda mais ricos? Adivinhou: Brasil, claro, o Brasil de Luiz Inácio Lula da Silva e do Partido dos Trabalhadores. Ah, no segundo lugar no torneio do enriquecimento aparece quem? Sim, ela, a Venezuela do "socialismo do século 21" (vai ver que é o socialismo que distribui renda para os ricos). Só depois é que aparece o Chile, que, desde a ditadura Pinochet, é o queridinho dos tais mercados.
Conclusão, algo óbvia, mas correta de Oppenheimer: "Em vez de ostentar o recorde de concentração de riqueza, a região deveria esforçar-se para ter maior número de indivíduos moderadamente ricos e muito menos pobres".
E o Brasil deveria parar de festejar lendas e misérias.
Clóvis Rossi
SANTANDER - Já tratei recentemente, neste espaço, da lenda da queda da desigualdade e dos números da miséria brasileira, explicitada em pesquisa que o Ibase (a ONG do Betinho) fez com os beneficiados pela Bolsa Família.
Faltava só visitar os ricos.
Andrés Oppenheimer ("Miami Herald", prêmio Pullitzer) se antecipou e mostra o que só pode ser surpresa para os que acreditam em duendes ou na lenda da queda da desigualdade.Vejamos os dados por ele coletados no "Informe Mundial da Riqueza-2008", preparado por Capgemini e Merrill Lynch:
1 - Os ricos da América Latina estão enriquecendo mais rapidamente que seus pares de todas as demais regiões do mundo e já acumularam US$ 6,2 bilhões em valores financeiros, sem contar imóveis e coleções de arte.
2 - Nos três anos mais recentes, os ricos latino-americanos viram suas fortunas aumentar 20,4%, enquanto os pobres árabes donos do petróleo só ficaram 17,5% mais ricos. Os norte-americanos, então, tadinhos, engordaram suas contas apenas 4,4% (essa gente ainda vai morrer de fome nesse ritmo).
3 - Em que países os ricos ficaram ainda mais ricos? Adivinhou: Brasil, claro, o Brasil de Luiz Inácio Lula da Silva e do Partido dos Trabalhadores. Ah, no segundo lugar no torneio do enriquecimento aparece quem? Sim, ela, a Venezuela do "socialismo do século 21" (vai ver que é o socialismo que distribui renda para os ricos). Só depois é que aparece o Chile, que, desde a ditadura Pinochet, é o queridinho dos tais mercados.
Conclusão, algo óbvia, mas correta de Oppenheimer: "Em vez de ostentar o recorde de concentração de riqueza, a região deveria esforçar-se para ter maior número de indivíduos moderadamente ricos e muito menos pobres".
E o Brasil deveria parar de festejar lendas e misérias.
terça-feira, 19 de agosto de 2008
O QUE PENSA A MÍDIA
EDITORIAIS DOS PRINCIPAIS JORNAIS DO BRASIL
http://www.pps.org.br/sistema_clipping/mostra_opiniao.asp?id=1062&portal=
EDITORIAIS DOS PRINCIPAIS JORNAIS DO BRASIL
http://www.pps.org.br/sistema_clipping/mostra_opiniao.asp?id=1062&portal=
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

SOB O PATROCÍNIO DA BELA VIOLA
Dora Kramer
Entre políticos e marqueteiros a assertiva é cláusula pétrea: quando começar o horário gratuito de propaganda na televisão e no rádio é que o eleitor fará suas escolhas de fato. Só então o quadro de vencedores e perdedores poderá ser traduzido com mais fidelidade pelas pesquisas.
Pois bem, começa hoje o período de 42 dias, mas a avaliação não é unânime. Para o eleitorado em geral trata-se de um verdadeiro suplício.
Uma legítima subtração unilateral do direito de ver e ouvir o que lhe interessa. Se o cidadão não tem TV paga, ou vai aos afazeres ou fica ali vendo aquilo cansado de saber que as belas violas produzidas por publicitários podem muito bem esconder pães bolorentos.
O problema é que, como dizia um velho jogador do Sport Clube Recife sempre citado pelo senador Marco Maciel, é que a conseqüência vem depois. No caso, o eventual bolor só aparecerá depois do enterro de Inês. Ou seja, quando o eleito, ou eleita, começa a governar e aí não há como recuar.
Por esse raciocínio simplesinho - e, portanto, ao alcance de todos - nem gente interessada diretamente na política, por diletantismo, engajamento, hobby ou imperativo profissional, costuma compartilhar do entusiasmo e da esperança dos políticos em relação ao horário eleitoral.
No início, há um acompanhamento interessado, troca de comentários, debates de avaliações, mas com uma semana - não é preciso mais - aquele desfiar de números, obras, afirmações categóricas baseadas em dados saídos sabe-se lá de onde, cansa pelo hermetismo. Os programas começam a parecer falados em sânscrito sem legenda.
O resultado óbvio é o desinteresse. A não ser quando ocorre algo de inusitado (para o bem ou para o mal) ou especialmente criativo.
Só que as chances de o imponderável fazer uma surpresa é cada vez menor.
Suas excelências têm tanto medo de errar e os marqueteiros tanto pavor de perder o emprego e/ou ficar com má fama no mercado, que andam dentro de regras muito estritas, ousam quase nada e preocupam-se mais com a produção do adversário do que em produzir bons acertos.
Conclusão, já há várias eleições os programas obedecem ao mesmo padrão: os dos ricos uma lindeza sem conteúdo e o dos pobres uma tristeza sem forma e tentativa tosca de conteúdo.
Claro, é preciso “mastigar” para a massa a mensagem. E política, sabemos como é um assunto maçante, complicado e intrincado.
Nos debates de televisão ocorre o mesmo. São tantas as limitações impostas pelas assessorias de todas as partes, que não se instala o debate. A corrida é para ver quem consegue receber do mediador mais elogios (ou menos reprimendas) por ter se mantido dentro dos minutos reservados às perguntas, respostas, réplicas e tréplicas.
Quando a pergunta é boa, vale dizer, instigante, politicamente interessante, o candidato sai pela tangente.
Escola fundada por Paulo Maluf. Seja qual for a pergunta a resposta é sempre dada na conveniência de quem responde, independentemente da relação entre uma coisa e outra.
Desse modo, de onde a certeza de que o horário eleitoral define voto se escolha eleitoral é um ato político e os atos de campanha são todos referidos nos valores e ditames da propaganda?
Não há certeza alguma. Há, sim, uma repetição baseada em exemplos de sucesso (ou fracasso) nas primeiras eleições da redemocratização, mas hoje mais parecem uma lenda urbana.
Quem ganha eleição é “onda” - criada por uma conjunção de fatores, entre os quais o desempenho do candidato, independentemente dos enfeites publicitários, é o principal. E, nesse aspecto, o horário eleitoral não anda fazendo nem marola.
“Calamity Jane”
Dora Kramer
Entre políticos e marqueteiros a assertiva é cláusula pétrea: quando começar o horário gratuito de propaganda na televisão e no rádio é que o eleitor fará suas escolhas de fato. Só então o quadro de vencedores e perdedores poderá ser traduzido com mais fidelidade pelas pesquisas.
Pois bem, começa hoje o período de 42 dias, mas a avaliação não é unânime. Para o eleitorado em geral trata-se de um verdadeiro suplício.
Uma legítima subtração unilateral do direito de ver e ouvir o que lhe interessa. Se o cidadão não tem TV paga, ou vai aos afazeres ou fica ali vendo aquilo cansado de saber que as belas violas produzidas por publicitários podem muito bem esconder pães bolorentos.
O problema é que, como dizia um velho jogador do Sport Clube Recife sempre citado pelo senador Marco Maciel, é que a conseqüência vem depois. No caso, o eventual bolor só aparecerá depois do enterro de Inês. Ou seja, quando o eleito, ou eleita, começa a governar e aí não há como recuar.
Por esse raciocínio simplesinho - e, portanto, ao alcance de todos - nem gente interessada diretamente na política, por diletantismo, engajamento, hobby ou imperativo profissional, costuma compartilhar do entusiasmo e da esperança dos políticos em relação ao horário eleitoral.
No início, há um acompanhamento interessado, troca de comentários, debates de avaliações, mas com uma semana - não é preciso mais - aquele desfiar de números, obras, afirmações categóricas baseadas em dados saídos sabe-se lá de onde, cansa pelo hermetismo. Os programas começam a parecer falados em sânscrito sem legenda.
O resultado óbvio é o desinteresse. A não ser quando ocorre algo de inusitado (para o bem ou para o mal) ou especialmente criativo.
Só que as chances de o imponderável fazer uma surpresa é cada vez menor.
Suas excelências têm tanto medo de errar e os marqueteiros tanto pavor de perder o emprego e/ou ficar com má fama no mercado, que andam dentro de regras muito estritas, ousam quase nada e preocupam-se mais com a produção do adversário do que em produzir bons acertos.
Conclusão, já há várias eleições os programas obedecem ao mesmo padrão: os dos ricos uma lindeza sem conteúdo e o dos pobres uma tristeza sem forma e tentativa tosca de conteúdo.
Claro, é preciso “mastigar” para a massa a mensagem. E política, sabemos como é um assunto maçante, complicado e intrincado.
Nos debates de televisão ocorre o mesmo. São tantas as limitações impostas pelas assessorias de todas as partes, que não se instala o debate. A corrida é para ver quem consegue receber do mediador mais elogios (ou menos reprimendas) por ter se mantido dentro dos minutos reservados às perguntas, respostas, réplicas e tréplicas.
Quando a pergunta é boa, vale dizer, instigante, politicamente interessante, o candidato sai pela tangente.
Escola fundada por Paulo Maluf. Seja qual for a pergunta a resposta é sempre dada na conveniência de quem responde, independentemente da relação entre uma coisa e outra.
Desse modo, de onde a certeza de que o horário eleitoral define voto se escolha eleitoral é um ato político e os atos de campanha são todos referidos nos valores e ditames da propaganda?
Não há certeza alguma. Há, sim, uma repetição baseada em exemplos de sucesso (ou fracasso) nas primeiras eleições da redemocratização, mas hoje mais parecem uma lenda urbana.
Quem ganha eleição é “onda” - criada por uma conjunção de fatores, entre os quais o desempenho do candidato, independentemente dos enfeites publicitários, é o principal. E, nesse aspecto, o horário eleitoral não anda fazendo nem marola.
“Calamity Jane”
A dianteira de Marta Suplicy, o recuo de Geraldo Alckmin e a inércia dos índices de intenção de votos de Gilberto Kassab apontam para o seguinte: considerando que o ex-governador e o atual prefeito nadam nas águas do mesmo eleitorado, para perder, Marta terá de se esforçar.
Por exemplo, dando asas a Marta Tereza Smith de Vasconcelos Suplicy e seu temperamento indomável.
Plano diretor
O PSDB não gosta das idéias de Fernando Henrique Cardoso, que não consegue convencer o partido a sair da toca congressual e se abrir à sociedade, mas seu principal adversário político gosta.
Neste ano o presidente Luiz Inácio da Silva já fez duas reuniões com os chamados intelectuais (artistas, acadêmicos etc.) e agora prepara um grande encontro com o pessoal do cinema.
Resolvido o problema eleitoral com os muito “necessitantes”, por intermédio dos programas assistencialistas, o presidente está obviamente dedicado a reconquistar os bem “pensantes”.
Lula não dorme no ponto. Já a moçada que pretende desalojar PT e adjacências do Poder ressona no muro no embalo da lei do menor esforço, indiferente à lei segundo a qual cobra que não anda não engole sapo.
DEU NO BLOG DE LUCIA HIPPOLITO

VÃO TENTAR DE NOVO
Lucia Hippolito
Novamente, o Palácio do Planalto atropela o presidente da Câmara, deputado Arlindo Chinaglia, e se intromete em assuntos do Legislativo.
Agora é a vez da reforma política.
É muito curioso. Quando a sociedade, os governadores e os empresários reclamam do excesso de impostos, o governo lança o canto de sereia da reforma tributária.
O pacote vai para o Congresso... e lá desaparece num poço profundo. Deve existir um museu de propostas de reforma tributária dentro do Congresso brasileiro.
Quando a chantagem política da base aliada atinge níveis insuportáveis para o governo, ou quando a Justiça Eleitoral decide preencher os vácuos de legislação, lança-se a isca da reforma política.
O cardápio atual de reforma política abrange voto em lista, financiamento público exclusivo ou financiamento público misturado com doação de pessoas físicas, inelegibilidades, fidelidade partidária e coligações.
A última pesquisa de opinião que se conhece a respeito de alguns desses temas é uma Pesquisa CNT/Sensus divulgada no ano passado.
Entre os entrevistados, 74% eram contra o voto em lista de candidatos apresentados pelos partidos, enquanto 16,5% eram a favor.
Sobre o financiamento público exclusivo das campanhas, 75,2% eram contra, enquanto só 18,7% eram a favor. Finalmente, sobre a fidelidade partidária, 50,5% eram a favor, enquanto 40,5% eram contra.
E o que mais anda dizendo o eleitor brasileiro?
Que quer maior proximidade entre ele e os eleitos. Que quer controlar mais o exercício do mandato de seu representante. Que não quer deputados trabalhando dois dias e meio por semana.
Que não quer deputados e senadores ganhando salários astronômicos e não pagando imposto de renda sobre todos os ganhos. Que não quer relações espúrias entre políticos e lobistas, ou entre políticos e bicheiros.
Mas o Palácio do Planalto decidiu ignorar tudo isto e quer empurrar pela goela do eleitor abaixo uma reforma política que pode modificar profundamente a forma como os eleitores escolhem seus representantes.
E acha que pode fazer isto tudo sem consultar o eleitor.
O Palácio quer mudar alguma coisa para que nada mude.
Quer voto em lista fechada para perpetuar o poder dos caciques e dos aparelhos partidários.Quer financiar campanhas com o nosso dinheiro.
Mas nem tudo é ruim na proposta. Acabar com as coligações em eleições proporcionais é fundamental para diminuir um pouco a extrema distorção do atual sistema eleitoral brasileiro.
Aumentar as restrições à elegibilidade de cidadãos com ficha suja é outra proposta alvissareira.
Reforçar a fidelidade partidária pode compor o tripé de boas propostas.
Lucia Hippolito
Novamente, o Palácio do Planalto atropela o presidente da Câmara, deputado Arlindo Chinaglia, e se intromete em assuntos do Legislativo.
Agora é a vez da reforma política.
É muito curioso. Quando a sociedade, os governadores e os empresários reclamam do excesso de impostos, o governo lança o canto de sereia da reforma tributária.
O pacote vai para o Congresso... e lá desaparece num poço profundo. Deve existir um museu de propostas de reforma tributária dentro do Congresso brasileiro.
Quando a chantagem política da base aliada atinge níveis insuportáveis para o governo, ou quando a Justiça Eleitoral decide preencher os vácuos de legislação, lança-se a isca da reforma política.
O cardápio atual de reforma política abrange voto em lista, financiamento público exclusivo ou financiamento público misturado com doação de pessoas físicas, inelegibilidades, fidelidade partidária e coligações.
A última pesquisa de opinião que se conhece a respeito de alguns desses temas é uma Pesquisa CNT/Sensus divulgada no ano passado.
Entre os entrevistados, 74% eram contra o voto em lista de candidatos apresentados pelos partidos, enquanto 16,5% eram a favor.
Sobre o financiamento público exclusivo das campanhas, 75,2% eram contra, enquanto só 18,7% eram a favor. Finalmente, sobre a fidelidade partidária, 50,5% eram a favor, enquanto 40,5% eram contra.
E o que mais anda dizendo o eleitor brasileiro?
Que quer maior proximidade entre ele e os eleitos. Que quer controlar mais o exercício do mandato de seu representante. Que não quer deputados trabalhando dois dias e meio por semana.
Que não quer deputados e senadores ganhando salários astronômicos e não pagando imposto de renda sobre todos os ganhos. Que não quer relações espúrias entre políticos e lobistas, ou entre políticos e bicheiros.
Mas o Palácio do Planalto decidiu ignorar tudo isto e quer empurrar pela goela do eleitor abaixo uma reforma política que pode modificar profundamente a forma como os eleitores escolhem seus representantes.
E acha que pode fazer isto tudo sem consultar o eleitor.
O Palácio quer mudar alguma coisa para que nada mude.
Quer voto em lista fechada para perpetuar o poder dos caciques e dos aparelhos partidários.Quer financiar campanhas com o nosso dinheiro.
Mas nem tudo é ruim na proposta. Acabar com as coligações em eleições proporcionais é fundamental para diminuir um pouco a extrema distorção do atual sistema eleitoral brasileiro.
Aumentar as restrições à elegibilidade de cidadãos com ficha suja é outra proposta alvissareira.
Reforçar a fidelidade partidária pode compor o tripé de boas propostas.
No entanto, a forma escolhida pelo Palácio do Planalto é a mais equivocada possível.
Novamente atropelando o Legislativo. Novamente ignorando a vontade do eleitor.
DEU EM O GLOBO

PÃO COM MANTEIGA
Merval Pereira
Merval Pereira
NOVA YORK. O "Guia Eleitoral de Michael Moore", o cineasta que se especializou em combater o governo de George Bush através de verdadeiros panfletos políticos, como o documentário sobre os atentados de 11 de setembro de 2001, está sendo lançado por estes dias e é uma boa mostra de como a esquerda americana está inquieta com a fase atual da campanha de Barack Obama. Moore traça com ironias algumas estratégias para os Democratas perderem "a eleição mais ganha dos últimos tempos", criticando posturas conservadoras que estão sendo adotadas para tentar ampliar o eleitorado de Obama.
Como o discurso de Obama contra o Irã, repetindo a posição radical, segundo Moore, do governo Bush e do próprio McCain. Uma coisa que anda irritando Moore é a maneira "gentil" como McCain estaria sendo tratado pelos republicanos, sempre dispostos a destacar seu lado de "herói de Guerra" ou mais "liberal" em questões delicadas como a imigração, mas não destacam com igual ênfase, na sua opinião, o lado radical de McCain com relação às intervenções militares ou à ajuda que, mais até que Bush, estaria propenso a dar às companhias de petróleo.
Moore adverte: "Lembrem-se, nós não estamos na Suécia. Heróis de Guerra sempre vencem". Uma recente pesquisa do Pew Institute parece dar razão a Moore. Enquanto muitos dos apoiadores de Obama são capazes de citar alguma coisa de que gostam em McCain, como suas habilidades pessoais e experiência, 53% dos que apóiam McCain não conseguem gostar de Obama em nenhuma modalidade.
Um dos pontos críticos citados por Michael Moore é a inclinação para o centro politico, que levaria o candidato democrata a escolher um vice mais conservador, ou até mesmo um dissidente do Partido Republicano. O cineasta diz que, agindo dessa maneira, a campanha democrata está tirando o ânimo de milhares de voluntários que terão que estar atuando ativamente no dia da eleição para levar o maior número de eleitores para votar, como aconteceu durante as primárias.
Ecoando uma sensação que predomina na esquerda americana, Michael Moore diz que Obama não deve abandonar uma estratégia que deu certo até agora e levou milhares de pessoas a participarem das eleições primárias devido à promessa de mudanças e novos ventos na política. Ele lembra que existem cerca de cem milhões de pessoas que não se sentem interessadas em votar, e seria preciso que daí saíssem os novos votos para eleger Barack Obama, e não tentar mudar votos conservadores com promessas conservadoras, que negam a base de sua candidatura, que é a mudança.
A mesma pesquisa do Pew Institute revela que, a poucos dias do começo das convenções, a distância que separa Obama de McCain se reduziu à margem de erro. A diferença que, no fim de junho, era de oito pontos percentuais passou agora a ser de apenas três pontos, 46% contra 43%. Segundo o instituto, dois fatores principais são responsáveis por essa mudança de comportamento do eleitorado: McCain está aumentando o apoio que tem entre republicanos e brancos evangélicos, e também entre trabalhadores brancos.
Além disso, McCain teve ganhos em sua imagem de liderança. Uma crescente percentagem de eleitores vê nele o candidato que pode ter o melhor julgamento em uma crise e o que é capaz de fazer acontecer. Ao mesmo tempo, Obama não conseguiu avançar muito no apoio dentro do seu próprio partido, não assumindo boa parte dos votos que foram dados para Hillary Clinton.
Embora Obama perca para McCain entre os eleitores brancos registrados por 51% contra 39%, esses números não são muito diferentes dos registrados neste mesmo momento nas eleições de 2000 (Bush 52% contra 41% para Al Gore) e de 2004 (Bush 50% contra 42% para John Kerry). O problema é que, com esses números, os democratas perderam as duas últimas eleições.
Também algumas diferenças demográficas continuam se repetindo hoje, com eleitores brancos evangélicos, que têm maiores salários e vivem no Sul, entre os mais fortes apoiadores de McCain, como já o foram de Bush. Isso mostra que a questão racial não está influindo na decisão do eleitor.
Mas questões como idade e educação do eleitor estão influindo mais na escolha este ano. Uma pequena maioria de 51% de eleitores brancos de até 30 anos apóia Obama, e McCain lidera por uma pequena margem entre os de mais de 30 anos, enquanto Bush liderava fortemente entre os dois tipos de eleitores. Obama também está recebendo mais apoio entre os eleitores com educação universitária do que entre aqueles que não freqüentam a universidade, o que introduz nesta eleição uma diferença entre o voto dos mais educados, que não existia nas eleições anteriores.
A corrida presidencial está tão apertada que um em cada três eleitores é classificado entre os que podem ainda mudar o voto e entre os independentes nada menos do que 46% estão nessa categoria volúvel. O forte de Obama continua sendo sua ligação com o cidadão comum (embora sua silhueta fina seja vista como um problema entre o americano médio) e sua promessa de mudança.
Mas mesmo entre seus eleitores, o que mais incomoda nele é a inexperiência. No momento, sua campanha está sendo muito pressionada pela cúpula partidária e pelos governadores democratas para que ele abandone a postura de prometer mudanças genéricas para tratar mais do dia-a-dia da população, fazer a chamada política do bread and butter (pão com manteiga). Justamente o que a esquerda, simbolizada no livro de Michael Moore, não quer.
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

OS CÉREBROS E A “TERCEIRA ONDA”
Clóvis Rossi
Clóvis Rossi
SANTANDER - Vem aí o que os especialistas chamam de "terceira onda" de migrações internacionais, na forma de competição por talentos de alto nível.
O aviso foi dado ontem por Ronald Skeldon, da Escola de Estudos Sociais e Culturais da Universidade britânica de Sussex, no seminário "Globalização, Migração Internacional e Desenvolvimento". É uma promoção do Clube de Madri, centro de estudos que reúne 69 ex-chefes de governo, hoje presidido pelo chileno Ricardo Lagos.
Se a previsão estiver correta, será mais uma onda de fuga de cérebros, tema que esteve em moda não faz tanto tempo assim. O Brasil muito provavelmente será vítima, na medida em que já está havendo uma diáspora formidável de brasileiros mesmo antes de aberta a temporada de caça.
Mas Skeldon discute a idéia de fuga de cérebros: segundo ele, dos latino-americanos (brasileiros incluídos, como é óbvio) que emigraram para os Estados Unidos, 55% receberam treinamento no país de destino. Ou seja, a maioria não fugiu propriamente, mas desenvolveu-se lá mesmo. É uma tese discutível, na medida em que não leva em conta o custo da educação de base feita no país de origem.
Reforça a idéia de uma onda de caça a talentos o fato de que a União Européia aprovou, embora ainda não tenha implementado, um Pacto Migratório, que prevê buscar médicos nos países emergentes ou pobres para devolvê-los depois de devidamente treinados e aperfeiçoados. Guillermo de la Dehesa (Centro para Pesquisa de Política Econômica, de Londres), autor de um livro lançado ontem sobre migrações, avisa que, quando voltam, os médicos não vão para as áreas em que são mais necessários.
O Brasil, que permitiu uma diáspora descontrolada, pode preparar-se para a nova onda. Agora, cérebros são mais importantes na tal economia do conhecimento.
DEU NO VALOR ECONÔMICO

PRA TUDO ACABAR NA QUARTA-FEIRA
Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo
Ainda no início da crise financeira que ora assola o planeta, escrevi na "Folha de S. Paulo" que os economistas divergiam a respeito da intensidade, abrangência e duração da maré vazante. Em meio ao fogo cruzado das controvérsias, não faltaram analistas de boa reputação que insistiam em separar a pororoca financeira da supostamente saudável situação da economia real.
Walras, Wicksell, Hayek e Milton Friedman formularam teorias distintas, mas todas elas acolheram a hipótese da separação entre os "fatores reais" e os "fatores monetários". Os chamados novo-clássicos, escorados na hipótese das expectativas racionais, proclamaram a irrelevância dos fatores monetários e decretaram que as forças reais da produtividade e da poupança são as fontes de dinamismo das economias e da sucessão de ciclos que as acomete. Na contramão da "visão natural-realista" das economias de mercado, Keynes se dispôs a investigar as propriedades da Economia Monetária da Produção. Nela, imperam a divisão do trabalho, a propriedade privada das empresas, o pagamento de salários monetários aos trabalhadores e a moeda de crédito administrada pelos bancos. Sem a criação de meios de pagamento e o provimento de liquidez pelo sistema bancário, os empresários não podem comprar os meios de produção e pagar os salários aos trabalhadores.
Nessa economia, as expectativas dos empresários a respeito dos lucros futuros, ou seja, da captura dos ganhos proporcionados pelo aumento da produtividade social do trabalho, só são viabilizadas mediante o adiantamento de capital monetário. Isso, por sua vez impulsiona a competição pela inovação tecnológica incorporada nas novas gerações de insumos e equipamentos.
As relações de crédito-débito e as ações geram um estoque de direitos de propriedade e de apropriação sobre a riqueza e a renda da sociedade. As avaliações desses direitos nos mercados especializados passam a comandar as condições em que o crédito é ofertado pelos bancos e demandado pelas empresas. Elas determinam o ponto de demanda efetiva, ou seja, o estado de expectativas que permite a "criação" de valor, isto é, de certo nível de renda na "economia real".
O desenvolvimento da economia monetária da produção suscitou, sim, a subordinação do sistema de crédito à lógica da acumulação produtiva. Mas, ao mesmo tempo, ensejou a possibilidade de episódios especulativos, crises de crédito e seu rastro de destruição de valores. O economista Cláudio Borio, do Bank of International Settlements, discute, em artigo recente, as conseqüências da maior integração comercial e produtiva das economias, e crescente interdependência dos mercados financeiros "liberalizados". A combinação entre esses fenômenos, diz, acentuou o caráter pró-cíclico dos sistemas financeiros e impulsionou a criação de desequilíbrios cumulativos entre credores e devedores - famílias, empresas e países -, com sérias conseqüências para a eficácia das políticas monetárias nacionais.
A fragilidade financeira não decorre do comportamento irracional dos agentes, mas sim das relações entre os possuidores de riqueza
A questão central, na opinião do economista do Bank of International Settlements, reside nas limitações da política monetária, enclausurada nas metas de inflação, diante da excessiva inclinação dos sistemas financeiros a desatar movimentos pró-cíclicos. "Enquanto o sucesso da luta contra a inflação foi extraordinário, o mesmo não pode ser dito da estabilidade financeira. Desde a liberalização do início dos anos 80, observamos flutuações cada vez maiores na expansão do crédito e no preço dos ativos. Esses fenômenos desencadearam crises financeiras com conseqüências materiais para a economia real."
Borio suspeita que as regras microprudenciais (terrível neo-anglicismo) impostas às instituições pelos acordos da Basiléia I e II tiveram pouca eficácia para conter a sistemática subestimação dos riscos suscitada pelas articulações entre crédito farto e o valorização dos ativos. A despeito dos códigos da Basiléia, as "conjeturas" dos bancos e dos investidores - guiadas pelas benesses e ilusões da Grande Moderação - deflagraram as interações "virtuosas" entre o movimento de preços dos ativos e a euforia descontrolada na avaliação dos riscos de crédito. Tudo acabou na quarta-feira, quando sobreveio a ressaca da impropriamente chamada crise do subprime.
Borio chama a atenção para o caráter sistêmico, ou seja, macroeconômico dos processos de "euforia e desilusão". Como Minsky, ele admite que, em seu movimento de expansão, a economia monetária da produção produz endogenamente as situações de fragilidade financeira que culminam na crise e na destruição de valor da riqueza acumulada, com danos à economia real.
O desenvolvimento da fragilidade financeira não decorre do comportamento irracional dos agentes, mas sim do peculiar sistema de relações que se estabelece entre os possuidores de riqueza. Minsky sustentou que a formação dos preços dos ativos é determinada por fortes interações subjetivas entre os participantes do mercado. As condições de liquidez se alteram endogenamente ao longo do ciclo: primeiro, abundante; depois, eufórica; para, finalmente, desaparecer diante da demanda desesperada dos que carregam ativos cujas receitas tornaram-se inferiores aos pagamentos contratuais decorrentes da dívida assumida.
A rede de pagamentos formada pelo sistema bancário é crucial para o funcionamento adequado dos mercados. Ela se constitui na infra-estrutura que facilita o "clearing" e a liquidação de operações entre os protagonistas da economia monetária. A preservação dessas instituições, que estão na base do sistema de provimento de liquidez e de pagamentos, justifica as intervenções de última instância dos bancos centrais, sob pena de uma crise de liquidez se transformar numa crise de crédito com efeitos desastrosos sobre a chamada "economia real".
Não por acaso, Borio propõe a adoção, ao longo do ciclo, de medidas discricionárias - tais como requerimentos de margem mais rigorosos e restrições quantitativas aos empréstimos, atuando em conjugação com os instrumentos preventivos já existentes - para impedir a alavancagem excessiva e imprudente.
Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, e professor titular do Instituto de Economia da Unicamp, escreve mensalmente às terças-feiras.
Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo
Ainda no início da crise financeira que ora assola o planeta, escrevi na "Folha de S. Paulo" que os economistas divergiam a respeito da intensidade, abrangência e duração da maré vazante. Em meio ao fogo cruzado das controvérsias, não faltaram analistas de boa reputação que insistiam em separar a pororoca financeira da supostamente saudável situação da economia real.
Walras, Wicksell, Hayek e Milton Friedman formularam teorias distintas, mas todas elas acolheram a hipótese da separação entre os "fatores reais" e os "fatores monetários". Os chamados novo-clássicos, escorados na hipótese das expectativas racionais, proclamaram a irrelevância dos fatores monetários e decretaram que as forças reais da produtividade e da poupança são as fontes de dinamismo das economias e da sucessão de ciclos que as acomete. Na contramão da "visão natural-realista" das economias de mercado, Keynes se dispôs a investigar as propriedades da Economia Monetária da Produção. Nela, imperam a divisão do trabalho, a propriedade privada das empresas, o pagamento de salários monetários aos trabalhadores e a moeda de crédito administrada pelos bancos. Sem a criação de meios de pagamento e o provimento de liquidez pelo sistema bancário, os empresários não podem comprar os meios de produção e pagar os salários aos trabalhadores.
Nessa economia, as expectativas dos empresários a respeito dos lucros futuros, ou seja, da captura dos ganhos proporcionados pelo aumento da produtividade social do trabalho, só são viabilizadas mediante o adiantamento de capital monetário. Isso, por sua vez impulsiona a competição pela inovação tecnológica incorporada nas novas gerações de insumos e equipamentos.
As relações de crédito-débito e as ações geram um estoque de direitos de propriedade e de apropriação sobre a riqueza e a renda da sociedade. As avaliações desses direitos nos mercados especializados passam a comandar as condições em que o crédito é ofertado pelos bancos e demandado pelas empresas. Elas determinam o ponto de demanda efetiva, ou seja, o estado de expectativas que permite a "criação" de valor, isto é, de certo nível de renda na "economia real".
O desenvolvimento da economia monetária da produção suscitou, sim, a subordinação do sistema de crédito à lógica da acumulação produtiva. Mas, ao mesmo tempo, ensejou a possibilidade de episódios especulativos, crises de crédito e seu rastro de destruição de valores. O economista Cláudio Borio, do Bank of International Settlements, discute, em artigo recente, as conseqüências da maior integração comercial e produtiva das economias, e crescente interdependência dos mercados financeiros "liberalizados". A combinação entre esses fenômenos, diz, acentuou o caráter pró-cíclico dos sistemas financeiros e impulsionou a criação de desequilíbrios cumulativos entre credores e devedores - famílias, empresas e países -, com sérias conseqüências para a eficácia das políticas monetárias nacionais.
A fragilidade financeira não decorre do comportamento irracional dos agentes, mas sim das relações entre os possuidores de riqueza
A questão central, na opinião do economista do Bank of International Settlements, reside nas limitações da política monetária, enclausurada nas metas de inflação, diante da excessiva inclinação dos sistemas financeiros a desatar movimentos pró-cíclicos. "Enquanto o sucesso da luta contra a inflação foi extraordinário, o mesmo não pode ser dito da estabilidade financeira. Desde a liberalização do início dos anos 80, observamos flutuações cada vez maiores na expansão do crédito e no preço dos ativos. Esses fenômenos desencadearam crises financeiras com conseqüências materiais para a economia real."
Borio suspeita que as regras microprudenciais (terrível neo-anglicismo) impostas às instituições pelos acordos da Basiléia I e II tiveram pouca eficácia para conter a sistemática subestimação dos riscos suscitada pelas articulações entre crédito farto e o valorização dos ativos. A despeito dos códigos da Basiléia, as "conjeturas" dos bancos e dos investidores - guiadas pelas benesses e ilusões da Grande Moderação - deflagraram as interações "virtuosas" entre o movimento de preços dos ativos e a euforia descontrolada na avaliação dos riscos de crédito. Tudo acabou na quarta-feira, quando sobreveio a ressaca da impropriamente chamada crise do subprime.
Borio chama a atenção para o caráter sistêmico, ou seja, macroeconômico dos processos de "euforia e desilusão". Como Minsky, ele admite que, em seu movimento de expansão, a economia monetária da produção produz endogenamente as situações de fragilidade financeira que culminam na crise e na destruição de valor da riqueza acumulada, com danos à economia real.
O desenvolvimento da fragilidade financeira não decorre do comportamento irracional dos agentes, mas sim do peculiar sistema de relações que se estabelece entre os possuidores de riqueza. Minsky sustentou que a formação dos preços dos ativos é determinada por fortes interações subjetivas entre os participantes do mercado. As condições de liquidez se alteram endogenamente ao longo do ciclo: primeiro, abundante; depois, eufórica; para, finalmente, desaparecer diante da demanda desesperada dos que carregam ativos cujas receitas tornaram-se inferiores aos pagamentos contratuais decorrentes da dívida assumida.
A rede de pagamentos formada pelo sistema bancário é crucial para o funcionamento adequado dos mercados. Ela se constitui na infra-estrutura que facilita o "clearing" e a liquidação de operações entre os protagonistas da economia monetária. A preservação dessas instituições, que estão na base do sistema de provimento de liquidez e de pagamentos, justifica as intervenções de última instância dos bancos centrais, sob pena de uma crise de liquidez se transformar numa crise de crédito com efeitos desastrosos sobre a chamada "economia real".
Não por acaso, Borio propõe a adoção, ao longo do ciclo, de medidas discricionárias - tais como requerimentos de margem mais rigorosos e restrições quantitativas aos empréstimos, atuando em conjugação com os instrumentos preventivos já existentes - para impedir a alavancagem excessiva e imprudente.
Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, e professor titular do Instituto de Economia da Unicamp, escreve mensalmente às terças-feiras.
DEU NO VALOR ECONÔMICO

PERCEPÇÃO DE LULA MUDA RADICALMENTE
Raymundo Costa
Circula em gabinetes bem localizados de Brasília uma pesquisa do Ipsos Public Affairs com um bem acabado retrato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 47 dias de uma eleição municipal e a pouco mais de dois anos da eleição presidencial. Após dois anos e meio de governo, Lula é um homem inteiramente diferente, aos olhos do eleitor, em relação ao metalúrgico de barba mal-aparada que em 1989 concorreu pela primeira vez à Presidência da República: Lula se livrou dos rótulos, símbolos, preconceitos e carimbos.
Para quem achava que Lula era incapaz de administrar um carrinho de pipoca, que sua experiência se resumia a tocar a peãozada de São Bernardo do Campo e uma passagem um tanto discreta pela Assembléia Nacional Constituinte, chega a surpreender os 71% que o Ipsos contabilizou para os que disseram que o presidente "tem experiência administrativa". Experiência administrativa era o item mais baixo (56%) em abril de 2005, data de início da série, antes portanto do escândalo do mensalão, que fez desabar todos os índices do presidente.
Curioso notar que os índices que se mantiveram mais estáveis foram aqueles que afirmam que Lula era "gente como a gente" ou "entende os problemas dos pobres", ambos, na apuração feita no mês de julho, com 77%. Mas assim como a identificação de classe aparece de modo estável desde abril de 2005 (como todos os outros, também caiu no final daquele ano), foi mesmo o "mensalão" que jogou para baixo os "atributos intrínsecos" do presidente: o terceiro deles, "tem o passado limpo", caiu de 66% para 46% de abril a novembro de 2005, o ano da grande crise. Atualmente, está em 55%, um índice considerado bom diante do terremoto ocorrido no terceiro ano de governo do PT.
A pesquisa Ipsos foi realizada entre os dias 23 e 30 de julho últimos, sendo selecionadas 70 cidades em nove regiões metropolitanas. Foram ouvidas 1.000 pessoas "face a face". A margem de erro é de três pontos percentuais com intervalo de confiança de 95%. O Valor teve acesso ao resultado das entrevistas - trabalho mensal intitulado "Pulso Brasil Onda 40" - com compromisso de não divulgar os responsáveis por sua contratação.
População aprova atributos do presidente
A moralidade não era àquela época (1989) um problema do PT. Os problemas eram o "sapo barbudo", a falta de experiência administrativa, mas sobretudo, talvez, a falta de preparo de Lula da Silva, que não dispunha de um diploma universitário, para ocupar o cargo e - pedra cantada - sua suposta fragilidade intelectual diante dos luas-pretas do PT, aqueles que enfim manipulariam, dos bastidores, as rédeas do poder.
O início do governo Lula deu essa impressão, com a evidência de que homens-fortes dividiam o comando, como eram então o chefe da Casa Civil, José Dirceu, e o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, os dois potenciais candidatos à sucessão de Lula. Tempos depois Lula livrou-se dos dois, passou a se sentir mais leve para governar, mas cabe o registro de que entre abril e pelo menos julho de 2005, a maioria ja tinha como "atributos de bom gestor" do presidente o "pulso forte" e o preparo "para ocupar o cargo",
Atributos que também foram para o fundo do poço com o mensalão. Os índices mais tarde se recuperariam, como os demais. Atualmente, 67% dos eleitores dizem que Lula "tem pulso forte, é decidido" - índice que continua alto mas tem oscilado para baixo com mais força que os demais. Mais ainda: 74% dos entrevistados aparentam não ter problema com o fato de o presidente não ter diploma universitário e o considerara preparado para o cargo. São índices que aos poucos parecem se tornar definitivos.
Evidente que nem tudo é inqüestionavelmente promissor para os entrevistados da Ipsos. Os próprios índices que medem os atributos do presidente já apresentaram melhores resultados que os de julho. No momento, muito embora mais da metade da população (54%) acredite que o país está no rumo certo, o otimismo é 4% menor que no mês anterior. "O que pode ser reflexo da percepção da alta dos preços dos alimentos e do aumento da inflação", diz a Ipsos. A avaliação positiva para a administração Lula se mantém relativamente estáveis, totalizando 57% ótimo e bom.
"A avaliação dos "atributos intrínsecos" do presidente apesar de bastante positiva, verificou pequena queda, já seus "atributos de bom gestor" permanecem inalterados. As pequenas oscilações nestas avaliações não indicam que a popularidade de Lula irá se reverter nos próximos meses". E a eleição é daqui a 47 dias.
Raymundo Costa
Circula em gabinetes bem localizados de Brasília uma pesquisa do Ipsos Public Affairs com um bem acabado retrato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 47 dias de uma eleição municipal e a pouco mais de dois anos da eleição presidencial. Após dois anos e meio de governo, Lula é um homem inteiramente diferente, aos olhos do eleitor, em relação ao metalúrgico de barba mal-aparada que em 1989 concorreu pela primeira vez à Presidência da República: Lula se livrou dos rótulos, símbolos, preconceitos e carimbos.
Para quem achava que Lula era incapaz de administrar um carrinho de pipoca, que sua experiência se resumia a tocar a peãozada de São Bernardo do Campo e uma passagem um tanto discreta pela Assembléia Nacional Constituinte, chega a surpreender os 71% que o Ipsos contabilizou para os que disseram que o presidente "tem experiência administrativa". Experiência administrativa era o item mais baixo (56%) em abril de 2005, data de início da série, antes portanto do escândalo do mensalão, que fez desabar todos os índices do presidente.
Curioso notar que os índices que se mantiveram mais estáveis foram aqueles que afirmam que Lula era "gente como a gente" ou "entende os problemas dos pobres", ambos, na apuração feita no mês de julho, com 77%. Mas assim como a identificação de classe aparece de modo estável desde abril de 2005 (como todos os outros, também caiu no final daquele ano), foi mesmo o "mensalão" que jogou para baixo os "atributos intrínsecos" do presidente: o terceiro deles, "tem o passado limpo", caiu de 66% para 46% de abril a novembro de 2005, o ano da grande crise. Atualmente, está em 55%, um índice considerado bom diante do terremoto ocorrido no terceiro ano de governo do PT.
A pesquisa Ipsos foi realizada entre os dias 23 e 30 de julho últimos, sendo selecionadas 70 cidades em nove regiões metropolitanas. Foram ouvidas 1.000 pessoas "face a face". A margem de erro é de três pontos percentuais com intervalo de confiança de 95%. O Valor teve acesso ao resultado das entrevistas - trabalho mensal intitulado "Pulso Brasil Onda 40" - com compromisso de não divulgar os responsáveis por sua contratação.
População aprova atributos do presidente
A moralidade não era àquela época (1989) um problema do PT. Os problemas eram o "sapo barbudo", a falta de experiência administrativa, mas sobretudo, talvez, a falta de preparo de Lula da Silva, que não dispunha de um diploma universitário, para ocupar o cargo e - pedra cantada - sua suposta fragilidade intelectual diante dos luas-pretas do PT, aqueles que enfim manipulariam, dos bastidores, as rédeas do poder.
O início do governo Lula deu essa impressão, com a evidência de que homens-fortes dividiam o comando, como eram então o chefe da Casa Civil, José Dirceu, e o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, os dois potenciais candidatos à sucessão de Lula. Tempos depois Lula livrou-se dos dois, passou a se sentir mais leve para governar, mas cabe o registro de que entre abril e pelo menos julho de 2005, a maioria ja tinha como "atributos de bom gestor" do presidente o "pulso forte" e o preparo "para ocupar o cargo",
Atributos que também foram para o fundo do poço com o mensalão. Os índices mais tarde se recuperariam, como os demais. Atualmente, 67% dos eleitores dizem que Lula "tem pulso forte, é decidido" - índice que continua alto mas tem oscilado para baixo com mais força que os demais. Mais ainda: 74% dos entrevistados aparentam não ter problema com o fato de o presidente não ter diploma universitário e o considerara preparado para o cargo. São índices que aos poucos parecem se tornar definitivos.
Evidente que nem tudo é inqüestionavelmente promissor para os entrevistados da Ipsos. Os próprios índices que medem os atributos do presidente já apresentaram melhores resultados que os de julho. No momento, muito embora mais da metade da população (54%) acredite que o país está no rumo certo, o otimismo é 4% menor que no mês anterior. "O que pode ser reflexo da percepção da alta dos preços dos alimentos e do aumento da inflação", diz a Ipsos. A avaliação positiva para a administração Lula se mantém relativamente estáveis, totalizando 57% ótimo e bom.
"A avaliação dos "atributos intrínsecos" do presidente apesar de bastante positiva, verificou pequena queda, já seus "atributos de bom gestor" permanecem inalterados. As pequenas oscilações nestas avaliações não indicam que a popularidade de Lula irá se reverter nos próximos meses". E a eleição é daqui a 47 dias.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
GOVERNO QUER ENDURECER COM 'FICHA-SUJA' E NANICOS
Vera Rosa
Proposta, que vai na contramão de decisão do STF, permite que candidato seja inelegível mesmo sem decisão de última instância
O governo vai enviar ao Congresso proposta de reforma política que torna mais rígidas as regras para barrar o lançamento de candidatos com ficha suja. A idéia, que entra em confronto com recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), abre caminho para que candidatos condenados tornem-se inelegíveis, mesmo que a sentença não tenha sido julgada em última instância. Não é só: pela cláusula de barreira em discussão no Planalto, partidos que não elegerem 10 deputados federais ficarão tão desidratados que praticamente deixarão de existir, pois perderão direito ao fundo partidário e ao tempo de TV na propaganda política.
Se a cláusula sugerida pelo governo estivesse em vigor hoje, partidos como o PSOL da ex-senadora Heloísa Helena - com três deputados federais - não poderiam indicar líder nem ter espaço em comissões parlamentares. Também nesse ponto a proposta contraria decisão do STF.Motivo: em 2006, os maiores partidos aprovaram norma pela qual as legendas que não atingissem 5% dos votos no País e pelo menos 2% em 9 Estados ficariam impedidas de funcionar no Congresso, mas os nanicos recorreram ao STF e conseguiram derrubar a cláusula, considerada inconstitucional.
Com a intenção de mexer novamente nesse vespeiro, a versão preliminar da requentada reforma política foi apresentada ontem ao presidente Lula pelos ministros da Justiça, Tarso Genro, e das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro.
A proposta será levada nesta semana ao presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e pode ser modificada até chegar ao plenário. Na tentativa de facilitar a votação, o governo pretende encaminhar o projeto “fatiado”, em seis tópicos, depois das eleições. Os pontos sugeridos pelo Planalto são financiamento público de campanha, voto em lista fechada, fidelidade partidária, fim da coligação proporcional, inelegibilidade e cláusula de barreira. Os dois últimos itens prometem ruidosa polêmica.
“Não vamos estabelecer nenhuma queda-de-braço com o Legislativo”, disse Múcio. “Queremos contribuir e debateremos o quanto for necessário.”
O STF rejeitou, no dia 6, pedido da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) para que candidatos processados fossem declarados inelegíveis. Alegou, para tanto, que ninguém pode ser impedido de disputar enquanto o processo não tiver transitado em julgado. A lista dos “fichas-sujas” da AMB incluía concorrentes a prefeitura.
Na avaliação do governo, há acusações graves que podem impedir candidaturas antes mesmo da sentença definitiva, como as de crime e tráfico de drogas. A proposta acata, porém, o princípio da fidelidade estabelecido pelo STF, de que os mandatos parlamentares pertencem aos partidos. Mesmo assim, o projeto concede anistia aos infiéis. Caso o texto receba sinal verde, políticos serão liberados para trocar de legenda um mês antes das eleições desde que tenham permanecido nela por 3 anos.
Vera Rosa
Proposta, que vai na contramão de decisão do STF, permite que candidato seja inelegível mesmo sem decisão de última instância
O governo vai enviar ao Congresso proposta de reforma política que torna mais rígidas as regras para barrar o lançamento de candidatos com ficha suja. A idéia, que entra em confronto com recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), abre caminho para que candidatos condenados tornem-se inelegíveis, mesmo que a sentença não tenha sido julgada em última instância. Não é só: pela cláusula de barreira em discussão no Planalto, partidos que não elegerem 10 deputados federais ficarão tão desidratados que praticamente deixarão de existir, pois perderão direito ao fundo partidário e ao tempo de TV na propaganda política.
Se a cláusula sugerida pelo governo estivesse em vigor hoje, partidos como o PSOL da ex-senadora Heloísa Helena - com três deputados federais - não poderiam indicar líder nem ter espaço em comissões parlamentares. Também nesse ponto a proposta contraria decisão do STF.Motivo: em 2006, os maiores partidos aprovaram norma pela qual as legendas que não atingissem 5% dos votos no País e pelo menos 2% em 9 Estados ficariam impedidas de funcionar no Congresso, mas os nanicos recorreram ao STF e conseguiram derrubar a cláusula, considerada inconstitucional.
Com a intenção de mexer novamente nesse vespeiro, a versão preliminar da requentada reforma política foi apresentada ontem ao presidente Lula pelos ministros da Justiça, Tarso Genro, e das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro.
A proposta será levada nesta semana ao presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e pode ser modificada até chegar ao plenário. Na tentativa de facilitar a votação, o governo pretende encaminhar o projeto “fatiado”, em seis tópicos, depois das eleições. Os pontos sugeridos pelo Planalto são financiamento público de campanha, voto em lista fechada, fidelidade partidária, fim da coligação proporcional, inelegibilidade e cláusula de barreira. Os dois últimos itens prometem ruidosa polêmica.
“Não vamos estabelecer nenhuma queda-de-braço com o Legislativo”, disse Múcio. “Queremos contribuir e debateremos o quanto for necessário.”
O STF rejeitou, no dia 6, pedido da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) para que candidatos processados fossem declarados inelegíveis. Alegou, para tanto, que ninguém pode ser impedido de disputar enquanto o processo não tiver transitado em julgado. A lista dos “fichas-sujas” da AMB incluía concorrentes a prefeitura.
Na avaliação do governo, há acusações graves que podem impedir candidaturas antes mesmo da sentença definitiva, como as de crime e tráfico de drogas. A proposta acata, porém, o princípio da fidelidade estabelecido pelo STF, de que os mandatos parlamentares pertencem aos partidos. Mesmo assim, o projeto concede anistia aos infiéis. Caso o texto receba sinal verde, políticos serão liberados para trocar de legenda um mês antes das eleições desde que tenham permanecido nela por 3 anos.
DEU NA GAZETA MERCANTIL
PROPOSTA DO PLANALTO RESTRINGE REPRESENTATIVIDADE DE PARTIDOS
Karla Correia
O governo deve enviar ao Congresso até a próxima semana um conjunto de propostas para fomentar a discussão em torno da reforma política onde, ao mesmo tempo em que afaga parlamentares criando uma pequena folga nos critérios de mudança de partido aprovados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por outro lado estabelece uma rígida cláusula de barreira.
Nesta, legendas com menos de 10 deputados federais eleitos perdem o direito à atuação partidária no Congresso, bem como à participação no fundo partidário e ao tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão. Essa limitação atingiria hoje ao menos sete siglas com representação no Parlamento: PSol, PHS, PTdoB, PRTB, PMN, PRB e PTC.
A negociação dos pontos apresentados pelo Palácio do Planalto ontem à noite, aos ministros das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, e da Justiça, Tarso Genro, deve correr sob o signo da cautela. Os itens da reforma política desejada pelo governos, tema da reunião de Coordenação Política que aconteceu ontem no Planalto, serão apresentados ao Congresso apenas como "sugestões" à discussão já entabulada pelos parlamentares.
O conjunto de medidas envolve, além da cláusula de barreira, o financiamento público, a coligação em eleições proporcionais, a fidelidade partidária e um projeto com critérios "mais rigorosos e mais claros" para a questão da inelegibilidade, explica o ministro José Múcio. A idéia e aumentar a restrição aos candidatos "ficha suja" permitindo a impugnação das candidaturas de políticos condenados em segunda instância no Judiciário.
De acordo com o ministro, o detalhe que - na avaliação do Planalto - dará mais chances de aprovação ao pacote proposto pelo governo é a ausência de um projeto de lei unificando todos os itens. Cada ponto deverá ser negociado em projetos separados, o que diminuiria o risco de uma polêmica entre parlamentares em torno de uma proposta colocar em risco todas as demais.
"Vamos comer pelas beiradas, negociando ponto por ponto", diz José Múcio. Segundo o ministro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva só entrará na discussão assumindo a "paternidade" das propostas uma vez que haja consenso com o Congresso em relação aos pontos apresentados.
Foi para aumentar as possibilidades desse consenso que o governo incluiu entre os itens levados ao Parlamento a criação de uma janela para a mudança de partido, proporcionada a candidatos que já teriam cumprido o prazo três anos e quatro meses na legenda original. Um mês antes da realização da convenção nacional de sua sigla, esse candidato teria a possibilidade de mudança, segundo a proposta do governo. A troca de partido também seria facultada àqueles parlamentares eleitos por partidos que não conseguirem cumprir a cláusula de barreira de dez deputados federais.
Lula em campanha
Karla Correia
O governo deve enviar ao Congresso até a próxima semana um conjunto de propostas para fomentar a discussão em torno da reforma política onde, ao mesmo tempo em que afaga parlamentares criando uma pequena folga nos critérios de mudança de partido aprovados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por outro lado estabelece uma rígida cláusula de barreira.
Nesta, legendas com menos de 10 deputados federais eleitos perdem o direito à atuação partidária no Congresso, bem como à participação no fundo partidário e ao tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão. Essa limitação atingiria hoje ao menos sete siglas com representação no Parlamento: PSol, PHS, PTdoB, PRTB, PMN, PRB e PTC.
A negociação dos pontos apresentados pelo Palácio do Planalto ontem à noite, aos ministros das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, e da Justiça, Tarso Genro, deve correr sob o signo da cautela. Os itens da reforma política desejada pelo governos, tema da reunião de Coordenação Política que aconteceu ontem no Planalto, serão apresentados ao Congresso apenas como "sugestões" à discussão já entabulada pelos parlamentares.
O conjunto de medidas envolve, além da cláusula de barreira, o financiamento público, a coligação em eleições proporcionais, a fidelidade partidária e um projeto com critérios "mais rigorosos e mais claros" para a questão da inelegibilidade, explica o ministro José Múcio. A idéia e aumentar a restrição aos candidatos "ficha suja" permitindo a impugnação das candidaturas de políticos condenados em segunda instância no Judiciário.
De acordo com o ministro, o detalhe que - na avaliação do Planalto - dará mais chances de aprovação ao pacote proposto pelo governo é a ausência de um projeto de lei unificando todos os itens. Cada ponto deverá ser negociado em projetos separados, o que diminuiria o risco de uma polêmica entre parlamentares em torno de uma proposta colocar em risco todas as demais.
"Vamos comer pelas beiradas, negociando ponto por ponto", diz José Múcio. Segundo o ministro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva só entrará na discussão assumindo a "paternidade" das propostas uma vez que haja consenso com o Congresso em relação aos pontos apresentados.
Foi para aumentar as possibilidades desse consenso que o governo incluiu entre os itens levados ao Parlamento a criação de uma janela para a mudança de partido, proporcionada a candidatos que já teriam cumprido o prazo três anos e quatro meses na legenda original. Um mês antes da realização da convenção nacional de sua sigla, esse candidato teria a possibilidade de mudança, segundo a proposta do governo. A troca de partido também seria facultada àqueles parlamentares eleitos por partidos que não conseguirem cumprir a cláusula de barreira de dez deputados federais.
Lula em campanha
O roteiro de participação do presidente Lula nas campanhas municipais também foi discutido na reunião. Lula pretende ampliar seu circuito de aparições nos palanques de candidatos aliados, originalmente restrito a São Paulo e São Bernardo do Campo (SP), incluindo as capitais Vitória (ES), Natal (RN) e Recife (PE).
A disputa pelo uso da imagem do presidente tem piorado as relações entre partidos aliados ao Planalto, mas que concorrem nas eleições municípios por coligações diferentes. O melhor exemplo é Salvado, onde o prefeito e candidato à reeleição, João Henrique , do PMDB, disputa a imagem do presidente com o deputado federal e candidato à prefeitura da capital baiana, o petista Walter Pinheiro.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
O PESO DO HORÁRIO ELEITORAL
Editorial / O Estado de S. Paulo
A contar de hoje, serão 45 dias de propaganda no rádio e na TV para as eleições municipais de 5 de outubro: em cada meio, uma hora diária, dividida em duas sessões, um dia para os candidatos a vereador, outro, para os candidatos a prefeito, menos aos domingos; e, também aos domingos, 30 minutos de anúncios de até 60 segundos, ao longo da programação, apenas para os aspirantes às prefeituras. Pode-se criticar a duração do horário eleitoral. Não bastariam, talvez, 21 dias até a antevéspera da votação? Nesse caso, teriam menos a reclamar os brasileiros para quem a política em geral e a conversa dos políticos em especial não passam de um aborrecimento - ainda mais esta última, por desarrumar o horário nobre que organiza as noites da maioria da população. Também se queixariam menos os eleitores cujo nível de informação torna esse período praticamente irrelevante para as suas escolhas nas urnas.
O que não se pode, no entanto, é condenar o chamado horário gratuito, ou porque seria uma mistificação ou porque o público, afinal, não se interessaria pelo espetáculo. Ambas as alegações são superficiais e parecem situar-se cada vez mais na contracorrente dos fatos sabidos - com a ressalva de que toda generalização é arriscada quando se trata de 15 mil candidatos a prefeito e outros 350 mil a vereador, disputando o voto de 130 milhões de eleitores em 5.500 municípios de um país continente. Isto posto, diga-se desde logo que o modelo brasileiro de campanha, dando aos políticos acesso à mídia eletrônica, sob normas concebidas para reduzir a desigualdade de oportunidades eleitorais entre eles, é muito mais democrático do que, por exemplo, o dos Estados Unidos, onde partidos e candidatos dependem dos lobbies do poder econômico para bancar com as suas doações os astronômicos custos da sua propaganda na televisão.
Além disso, no horário eleitoral, os políticos brasileiros já não conseguem engabelar os eleitores como decerto gostariam. A sucessão dessas temporadas bienais, de um lado, e a intimidade dos espectadores com os artifícios da linguagem televisiva, de outro - esta é uma das sociedades mais vidradas em TV que se conhecem -, combinam-se para tornar transparentes a grande número de eleitores os truques cênicos com que os marqueteiros tentam manipulá-los. Nos últimos 20 anos, pois, o brasileiro aprendeu razoavelmente a distinguir o joio do trigo nos shows de caça ao voto. E os caçadores sabem disso. Hoje em dia, em nenhuma outra modalidade de emissão, seja noticiosa, publicitária ou de entretenimento, os respectivos produtores esquadrinham sem cessar e tão de perto - online, a rigor - as reações do público como as equipes dos candidatos a cargos majoritários. À medida que amadurecem, tais respostas reduzem o espaço à pirotecnia e à enganação.
Mesmo nas breves inserções que podem ir ao ar a todo instante - e que se diferenciam dos horários fixos por focalizar antes a imagem com que os candidatos querem ser identificados do que as prioridades de governo pelas quais querem ser votados -, a engenharia da persuasão leva em conta constantemente o juízo do eleitor. Este, por sinal, costuma ficar mais atento do que se supõe ao que lhe é dito e mostrado, principalmente nos primeiros e nos últimos dias do ciclo (reproduzindo as curvas de audiência das novelas). Pesquisas vinculam esse estado de espírito à percepção de que o horário gratuito é a rara circunstância em que os políticos falam diretamente com ele, eleitor, em vez de falar só com outros políticos ou com o pessoal que encontra nas suas incursões eleitorais. Por isso, o período funciona como uma espécie de tira-teima, em que os votantes - no caso, cada vez mais seguros do que esperam de um prefeito - passam a limpo as suas impressões prévias dos candidatos.
Por fim, os efeitos da propaganda no rádio e na TV não dependem estritamente da sua massa de ouvintes e espectadores. Toda comunicação, como se sabe, flui em duas etapas: na primeira, os que a receberam formam a própria opinião a respeito; na segunda, formam, com as suas versões, a opinião dos que não foram diretamente alcançados pela mensagem. Com o horário eleitoral não é diferente - e desse modo influi poderosamente na definição do voto popular.
Editorial / O Estado de S. Paulo
A contar de hoje, serão 45 dias de propaganda no rádio e na TV para as eleições municipais de 5 de outubro: em cada meio, uma hora diária, dividida em duas sessões, um dia para os candidatos a vereador, outro, para os candidatos a prefeito, menos aos domingos; e, também aos domingos, 30 minutos de anúncios de até 60 segundos, ao longo da programação, apenas para os aspirantes às prefeituras. Pode-se criticar a duração do horário eleitoral. Não bastariam, talvez, 21 dias até a antevéspera da votação? Nesse caso, teriam menos a reclamar os brasileiros para quem a política em geral e a conversa dos políticos em especial não passam de um aborrecimento - ainda mais esta última, por desarrumar o horário nobre que organiza as noites da maioria da população. Também se queixariam menos os eleitores cujo nível de informação torna esse período praticamente irrelevante para as suas escolhas nas urnas.
O que não se pode, no entanto, é condenar o chamado horário gratuito, ou porque seria uma mistificação ou porque o público, afinal, não se interessaria pelo espetáculo. Ambas as alegações são superficiais e parecem situar-se cada vez mais na contracorrente dos fatos sabidos - com a ressalva de que toda generalização é arriscada quando se trata de 15 mil candidatos a prefeito e outros 350 mil a vereador, disputando o voto de 130 milhões de eleitores em 5.500 municípios de um país continente. Isto posto, diga-se desde logo que o modelo brasileiro de campanha, dando aos políticos acesso à mídia eletrônica, sob normas concebidas para reduzir a desigualdade de oportunidades eleitorais entre eles, é muito mais democrático do que, por exemplo, o dos Estados Unidos, onde partidos e candidatos dependem dos lobbies do poder econômico para bancar com as suas doações os astronômicos custos da sua propaganda na televisão.
Além disso, no horário eleitoral, os políticos brasileiros já não conseguem engabelar os eleitores como decerto gostariam. A sucessão dessas temporadas bienais, de um lado, e a intimidade dos espectadores com os artifícios da linguagem televisiva, de outro - esta é uma das sociedades mais vidradas em TV que se conhecem -, combinam-se para tornar transparentes a grande número de eleitores os truques cênicos com que os marqueteiros tentam manipulá-los. Nos últimos 20 anos, pois, o brasileiro aprendeu razoavelmente a distinguir o joio do trigo nos shows de caça ao voto. E os caçadores sabem disso. Hoje em dia, em nenhuma outra modalidade de emissão, seja noticiosa, publicitária ou de entretenimento, os respectivos produtores esquadrinham sem cessar e tão de perto - online, a rigor - as reações do público como as equipes dos candidatos a cargos majoritários. À medida que amadurecem, tais respostas reduzem o espaço à pirotecnia e à enganação.
Mesmo nas breves inserções que podem ir ao ar a todo instante - e que se diferenciam dos horários fixos por focalizar antes a imagem com que os candidatos querem ser identificados do que as prioridades de governo pelas quais querem ser votados -, a engenharia da persuasão leva em conta constantemente o juízo do eleitor. Este, por sinal, costuma ficar mais atento do que se supõe ao que lhe é dito e mostrado, principalmente nos primeiros e nos últimos dias do ciclo (reproduzindo as curvas de audiência das novelas). Pesquisas vinculam esse estado de espírito à percepção de que o horário gratuito é a rara circunstância em que os políticos falam diretamente com ele, eleitor, em vez de falar só com outros políticos ou com o pessoal que encontra nas suas incursões eleitorais. Por isso, o período funciona como uma espécie de tira-teima, em que os votantes - no caso, cada vez mais seguros do que esperam de um prefeito - passam a limpo as suas impressões prévias dos candidatos.
Por fim, os efeitos da propaganda no rádio e na TV não dependem estritamente da sua massa de ouvintes e espectadores. Toda comunicação, como se sabe, flui em duas etapas: na primeira, os que a receberam formam a própria opinião a respeito; na segunda, formam, com as suas versões, a opinião dos que não foram diretamente alcançados pela mensagem. Com o horário eleitoral não é diferente - e desse modo influi poderosamente na definição do voto popular.
DEU NO JORNAL DO BRASIL
NA TV, O REAL INÍCIO DA CAMPANHA
Editorial/Jornal do Brasil
A PROPAGANDA ELETRÔNICA NO HORÁRIO eleitoral gratuito começa hoje e, com ela, instaura-se uma nova e decisiva fase da corrida para a sucessão municipal. Embora seja um terreno sobre o qual trafegam consideráveis divergências, a exposição no rádio e na TV costuma modificar o quadro de intenções de voto detectado até aqui. Para muitos, a campanha começa para valer agora o momento em que o eleitor entra definitivamente em campo. Se a propaganda eletrônica já não decide o voto, o tempo na TV informa quem são os candidatos. Acelera-se o compasso da dinâmica eleitoral. Os cenários se cristalizam. Propostas são exibidas com maior clareza. Pro pagadores de ilusões podem ser descortinados.
Se é uma das faces pedagógicas da campanha, a propaganda eletrônica é também um espaço fértil para a proclamação de façanhas e virtudes questionáveis. Conforme o Jornal do Brasil já sublinhou mais de uma vez neste espaço, os candidatos precisarão exibir projetos concretos destinados a aplacar os problemas que atormentam os cariocas. Deverão colocar o dedo nas profundas feridas que abalam a cidade com incômoda insistência. Esta tarefa só será plenamente cumprida com a chegada do horário eleitoral gratuito algo que dificilmente o corpo-a-corpo das ruas dá conta.
A propaganda no rádio e na TV constitui também uma boa hora para que, na comparação possível entre as campanhas e os candidatos, o eleitor possa decidir melhor que nome deseja para administrar a cidade nos próximos quatro anos. As mazelas do Rio, como se sabe, exigem um síndico à frente da prefeitura eficiente, intolerante com o erro, preocupado com os rumos dos últimos anos, ciente da desordem ge neralizada e zeloso com os en cantos de uma cidade tão ma ravilhosa quanto tisnada pela in competência. São atributos que o prefeito Cesar Maia prometeu alcançar e não conseguiu.
Os candidatos terão a opor tunidade ainda de se desven cilharem de pontos fracos que possivelmente os tornarão eleitoralmente mais frágeis. Conforme mostram os repórteres Marcelo Migliaccio e Renata Victal, hoje no JB, o ataque às vulnerabilidades dos concorrentes é prática comum em exibição no horário eleitoral gratuito. A partir de hoje, portanto, será possível saber se Marcelo Crivella vai buscar distanciar-se da Igreja Universal. Se os problemas no campo da segurança pública abalarão a candidatura de Eduardo Paes. Se Solange Amaral continuará atrelada à imagem de um combalido prefeito. Se Jandira Feghali vai além dos temas relacionados à saúde. Se Alessandro Molon conseguirá surfar na onda do prestígio do presidente Lula. Se Chico Alencar e Fernando Gabeira vão mostrar consistência diante de um eleitorado dividido.
Esses e outros pontos de interrogação começarão a ser respondidos a partir de hoje. (Na verdade, o eleitor-espectador só poderá assistir aos candidatos à prefeitura amanhã, pois hoje é dia daqueles que desejam um assento na Câmara de Ve readores). Ao eleitor convém ficar atento. Períodos eleitorais, insista-se, convidam os políticos a viajar pelo campo das fantasias. A imaginação dos candidatos muitas vezes eleva-se a altitudes inverossímeis. Apreciam sublinhar os próprios feitos e virtudes e ignoram as deficiências. A vida real, contudo, desaconselha tais equívocos. Que até outubro os 12 candidatos produzam um espetáculo edificante para a cidade e apaguem em definitivo da memória do eleitor as debilidades da última campanha municipal um processo cambaleante que resultou na apatia e na frustração do Rio. Os cariocas esperam que o debate escape dos insultos mútuos e da mera demarcação de diferenças individuais em nome da extensa agenda de discussões relevantes sobre os problemas que aguardam o futuro prefeito.
Editorial/Jornal do Brasil
A PROPAGANDA ELETRÔNICA NO HORÁRIO eleitoral gratuito começa hoje e, com ela, instaura-se uma nova e decisiva fase da corrida para a sucessão municipal. Embora seja um terreno sobre o qual trafegam consideráveis divergências, a exposição no rádio e na TV costuma modificar o quadro de intenções de voto detectado até aqui. Para muitos, a campanha começa para valer agora o momento em que o eleitor entra definitivamente em campo. Se a propaganda eletrônica já não decide o voto, o tempo na TV informa quem são os candidatos. Acelera-se o compasso da dinâmica eleitoral. Os cenários se cristalizam. Propostas são exibidas com maior clareza. Pro pagadores de ilusões podem ser descortinados.
Se é uma das faces pedagógicas da campanha, a propaganda eletrônica é também um espaço fértil para a proclamação de façanhas e virtudes questionáveis. Conforme o Jornal do Brasil já sublinhou mais de uma vez neste espaço, os candidatos precisarão exibir projetos concretos destinados a aplacar os problemas que atormentam os cariocas. Deverão colocar o dedo nas profundas feridas que abalam a cidade com incômoda insistência. Esta tarefa só será plenamente cumprida com a chegada do horário eleitoral gratuito algo que dificilmente o corpo-a-corpo das ruas dá conta.
A propaganda no rádio e na TV constitui também uma boa hora para que, na comparação possível entre as campanhas e os candidatos, o eleitor possa decidir melhor que nome deseja para administrar a cidade nos próximos quatro anos. As mazelas do Rio, como se sabe, exigem um síndico à frente da prefeitura eficiente, intolerante com o erro, preocupado com os rumos dos últimos anos, ciente da desordem ge neralizada e zeloso com os en cantos de uma cidade tão ma ravilhosa quanto tisnada pela in competência. São atributos que o prefeito Cesar Maia prometeu alcançar e não conseguiu.
Os candidatos terão a opor tunidade ainda de se desven cilharem de pontos fracos que possivelmente os tornarão eleitoralmente mais frágeis. Conforme mostram os repórteres Marcelo Migliaccio e Renata Victal, hoje no JB, o ataque às vulnerabilidades dos concorrentes é prática comum em exibição no horário eleitoral gratuito. A partir de hoje, portanto, será possível saber se Marcelo Crivella vai buscar distanciar-se da Igreja Universal. Se os problemas no campo da segurança pública abalarão a candidatura de Eduardo Paes. Se Solange Amaral continuará atrelada à imagem de um combalido prefeito. Se Jandira Feghali vai além dos temas relacionados à saúde. Se Alessandro Molon conseguirá surfar na onda do prestígio do presidente Lula. Se Chico Alencar e Fernando Gabeira vão mostrar consistência diante de um eleitorado dividido.
Esses e outros pontos de interrogação começarão a ser respondidos a partir de hoje. (Na verdade, o eleitor-espectador só poderá assistir aos candidatos à prefeitura amanhã, pois hoje é dia daqueles que desejam um assento na Câmara de Ve readores). Ao eleitor convém ficar atento. Períodos eleitorais, insista-se, convidam os políticos a viajar pelo campo das fantasias. A imaginação dos candidatos muitas vezes eleva-se a altitudes inverossímeis. Apreciam sublinhar os próprios feitos e virtudes e ignoram as deficiências. A vida real, contudo, desaconselha tais equívocos. Que até outubro os 12 candidatos produzam um espetáculo edificante para a cidade e apaguem em definitivo da memória do eleitor as debilidades da última campanha municipal um processo cambaleante que resultou na apatia e na frustração do Rio. Os cariocas esperam que o debate escape dos insultos mútuos e da mera demarcação de diferenças individuais em nome da extensa agenda de discussões relevantes sobre os problemas que aguardam o futuro prefeito.
DEU EM ZERO HORA
UM COMÍCIO DE 45 DIAS
Editorial/Zero Hora
Editorial/Zero Hora
Começa nesta terça-feira o período mais importante da campanha para a eleição dos prefeitos e vereadores dos mais de 5 mil municípios brasileiros. Num momento em que a população do país revela um desalento em relação a seus políticos, a propaganda obrigatória de rádio e TV representa uma chance para os partidos e candidatos tentarem reconquistar a confiança e reverter essa tendência. Não se trata apenas de um resgate que beneficiará os políticos de maneira geral, devolvendo-lhes prestígio e confiabilidade. Trata-se acima de tudo do fortalecimento e da qualificação da própria democracia, que não se aprimora sem que seus agentes sejam competentes e éticos e sejam assim reconhecidos pela sociedade.
A existência de um horário eleitoral para os partidos e candidatos não deixa de representar uma espécie de financiamento público. O acesso ao espaço de televisão e de rádio é gratuito apenas para os partidos e candidatos, não para o país, que paga por ele. Por isso sua utilização deve ser responsável e produtiva. Pesquisas indicam que o desencanto com os políticos se reflete na audiência do programa eleitoral, mas, ao contrário do que comumente se pensa, tal audiência não é pequena: atinge direta ou indiretamente a maioria da população, constituindo-se em fator decisivo para que eleitores conheçam os candidatos e façam as escolhas. O horário obrigatório criou para os candidatos um imenso comício eletrônico e alterou radicalmente, desde que foi instituído, a própria maneira de se fazer campanha eleitoral. Além do varejo dos contatos pessoais, dos apertos de mão, dos cartazes e santinhos, das carreatas e dos próprios comícios, a televisão e o rádio abriram a possibilidade de um contato no atacado. Essa circunstância faz com que, na prática, comece hoje efetivamente a campanha às prefeituras e câmaras municipais.
Estas considerações revelam o quanto esse novo momento do calendário eleitoral é importante para os candidatos e para os eleitores. Elas sugerem também o nível de responsabilidade que está embutido no uso desse instrumento que a sociedade coloca a serviço dos candidatos para a qualificação da democracia. Para os destinatários das mensagens que a partir de hoje chegam aos lares brasileiros, o fundamental é que a companha seja construtiva e propositiva. Mais do que críticas ou ataques pessoais, ou seja mais do que os aspectos negativos, e muito mais do que palco para a demagogia, o horário da propaganda em rádio e televisão ensejará que partidos ou frentes partidárias apresentem propostas objetivas capazes de levar a avanços na qualidade da administração e a padrões éticos compatíveis com o que a população quer e merece.
segunda-feira, 18 de agosto de 2008
DEU EM GRAMSCI E O BRASIL

O ATIVISMO JUDICIAL MAL COMPREENDIDO
Luiz Werneck Vianna
Faz tempo que a afirmação do Poder Judiciário na cena política brasileira não é mais objeto de controvérsia, fato reconhecido por analistas de diversas procedências ideológicas e pelos partidos políticos. Nada mais natural, uma vez que a Carta de 1988 definiu este Poder como um lugar estratégico a fim de que os princípios e os direitos fundamentais nela previstos ganhassem condições de eficácia, impondo inclusive limites à expressão da vontade majoritária quando viesse desalinhada da vontade geral consubstanciada no seu texto.
A chamada judicialização da política deve sua origem tanto ao legislador constituinte quanto à cidadania que, progressivamente, foi se apropriando, em suas práticas, dos novos institutos criados pela Carta, e não, como em outros contextos nacionais, pelo ativismo dos seus magistrados. Aqui, por várias razões, entre as quais o peso de uma formação positivista na cultura jurídica dos juízes, a judicialização da política encontrou mais resistência do que adesão, do que é exemplo mais forte o destino do mandado de injunção, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) converteu em letra morta.
Nesse sentido, a origem da judicialização da política deve ser buscada, de um lado, na iniciativa do legislador, e, de outro, nas demandas da cidadania no sentido de encontrar proteção dos seus direitos contra o Estado e as empresas. A origem de um processo social, porém, não contém em si todas as possibilidades do desenvolvimento da sua trajetória, sujeito, no seu curso, a muitas outras influências. Assim com os juízes — de início estranhos à nova institucionalidade, quando não refratários a ela —, que, com as transformações geracionais produzidas em seu corpus, com a emergência de uma nova bibliografia, e, talvez sobretudo, diante da crise do sistema da representação política, passam a se orientar pela filosofia política expressa na Constituição que pressupõe um Judiciário, na medida em que compreendido a serviço do ideal da igual liberdade, como instrumento de concretização dos direitos fundamentais.
A adesão a esta orientação, que se generaliza na corporação, não deve ser identificada a um ativismo judicial que ignore as fronteiras que apartam o juiz do político, e que pretenda, em nome do justo e da salvação pública, investir a Justiça do papel de um legislador providencial. A judicialização da política não deriva de um eventual sistema de orientação dos juízes, mas da nova trama institucional trazida pela moderna sociedade capitalista, que pôs o direito, seus procedimentos e instituições no centro da vida pública, e, neste preciso sentido, ela já é parte constitutiva das democracias contemporâneas.
Instituir o juiz como legislador, tal como, na prática, significa a pretensão dos Tribunais Eleitorais de recusarem registro a candidaturas a cargos eletivos sem base na lei, e apenas em nome do princípio da moralidade, é contrapor o justo ao direito. Quem e como se definir um candidato de “ficha suja”, e, como tal, sem direito a concorrer às eleições? Cada caso será um caso, examinado na ausência de qualquer regra prévia? Mas o juiz não será livre, nem livre e responsável, pontua com lucidez J. Derrida, “se não se referir a nenhum direito, a nenhuma regra ou se, por não considerar nenhuma regra como dada para além da sua interpretação, ele suspender sua decisão, detiver-se no indecidível ou então improvisar, fora de qualquer regra e de qualquer princípio” (Força da lei. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 45).
Na ausência de regras, a relevância do atual movimento de importantes setores da magistratura, contando com a presença da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que visa interditar a via eleitoral para candidatos de “ficha suja” — em si, um objetivo legítimo por critérios éticos e de moralidade pública —, ao insistir apenas no caminho judicial, perde de vista as amplas possibilidades que se apresentam aos seus propósitos na sociedade civil e na esfera pública, especialmente na arena parlamentar.
A opção pela via do ativismo judicial diante de oportunidades reais para a consecução do mesmo objetivo no campo da política institucionalizada não consiste em uma boa alternativa. Longe de ampliar apoios e alianças para os fins perseguidos pode, muito contrariamente, indispor contra eles, em razão do meio utilizado, o sistema político e seus principais personagens, e, ainda pior, tornar vulnerável a arquitetura constitucional que reservou ao Judiciário um papel saliente para a concretização dos direitos fundamentais.
O ativismo judicial, quando bem compreendido, estimula a emergência de institucionalidades vigorosas e democráticas e reforça a estabilização da nossa criativa arquitetura constitucional. Quando mal compreendido, entretanto, este ativismo é sempre propício à denúncia de um governo de juízes, de uma justiça de salvação, referida casuisticamente aos aspectos materiais em cada questão a ser julgada. Mal compreendido leva a concepções de uma justiça que abdica da defesa da integridade do Direito, tal como a conceituam, na esteira de Dworkin, Nonet e Selznick, e se torna, mesmo que em nome das melhores intenções, um instrumento do seu derruimento.
Rio, 14 de agosto de 2008.
Luiz Werneck Vianna
Faz tempo que a afirmação do Poder Judiciário na cena política brasileira não é mais objeto de controvérsia, fato reconhecido por analistas de diversas procedências ideológicas e pelos partidos políticos. Nada mais natural, uma vez que a Carta de 1988 definiu este Poder como um lugar estratégico a fim de que os princípios e os direitos fundamentais nela previstos ganhassem condições de eficácia, impondo inclusive limites à expressão da vontade majoritária quando viesse desalinhada da vontade geral consubstanciada no seu texto.
A chamada judicialização da política deve sua origem tanto ao legislador constituinte quanto à cidadania que, progressivamente, foi se apropriando, em suas práticas, dos novos institutos criados pela Carta, e não, como em outros contextos nacionais, pelo ativismo dos seus magistrados. Aqui, por várias razões, entre as quais o peso de uma formação positivista na cultura jurídica dos juízes, a judicialização da política encontrou mais resistência do que adesão, do que é exemplo mais forte o destino do mandado de injunção, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) converteu em letra morta.
Nesse sentido, a origem da judicialização da política deve ser buscada, de um lado, na iniciativa do legislador, e, de outro, nas demandas da cidadania no sentido de encontrar proteção dos seus direitos contra o Estado e as empresas. A origem de um processo social, porém, não contém em si todas as possibilidades do desenvolvimento da sua trajetória, sujeito, no seu curso, a muitas outras influências. Assim com os juízes — de início estranhos à nova institucionalidade, quando não refratários a ela —, que, com as transformações geracionais produzidas em seu corpus, com a emergência de uma nova bibliografia, e, talvez sobretudo, diante da crise do sistema da representação política, passam a se orientar pela filosofia política expressa na Constituição que pressupõe um Judiciário, na medida em que compreendido a serviço do ideal da igual liberdade, como instrumento de concretização dos direitos fundamentais.
A adesão a esta orientação, que se generaliza na corporação, não deve ser identificada a um ativismo judicial que ignore as fronteiras que apartam o juiz do político, e que pretenda, em nome do justo e da salvação pública, investir a Justiça do papel de um legislador providencial. A judicialização da política não deriva de um eventual sistema de orientação dos juízes, mas da nova trama institucional trazida pela moderna sociedade capitalista, que pôs o direito, seus procedimentos e instituições no centro da vida pública, e, neste preciso sentido, ela já é parte constitutiva das democracias contemporâneas.
Instituir o juiz como legislador, tal como, na prática, significa a pretensão dos Tribunais Eleitorais de recusarem registro a candidaturas a cargos eletivos sem base na lei, e apenas em nome do princípio da moralidade, é contrapor o justo ao direito. Quem e como se definir um candidato de “ficha suja”, e, como tal, sem direito a concorrer às eleições? Cada caso será um caso, examinado na ausência de qualquer regra prévia? Mas o juiz não será livre, nem livre e responsável, pontua com lucidez J. Derrida, “se não se referir a nenhum direito, a nenhuma regra ou se, por não considerar nenhuma regra como dada para além da sua interpretação, ele suspender sua decisão, detiver-se no indecidível ou então improvisar, fora de qualquer regra e de qualquer princípio” (Força da lei. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 45).
Na ausência de regras, a relevância do atual movimento de importantes setores da magistratura, contando com a presença da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que visa interditar a via eleitoral para candidatos de “ficha suja” — em si, um objetivo legítimo por critérios éticos e de moralidade pública —, ao insistir apenas no caminho judicial, perde de vista as amplas possibilidades que se apresentam aos seus propósitos na sociedade civil e na esfera pública, especialmente na arena parlamentar.
A opção pela via do ativismo judicial diante de oportunidades reais para a consecução do mesmo objetivo no campo da política institucionalizada não consiste em uma boa alternativa. Longe de ampliar apoios e alianças para os fins perseguidos pode, muito contrariamente, indispor contra eles, em razão do meio utilizado, o sistema político e seus principais personagens, e, ainda pior, tornar vulnerável a arquitetura constitucional que reservou ao Judiciário um papel saliente para a concretização dos direitos fundamentais.
O ativismo judicial, quando bem compreendido, estimula a emergência de institucionalidades vigorosas e democráticas e reforça a estabilização da nossa criativa arquitetura constitucional. Quando mal compreendido, entretanto, este ativismo é sempre propício à denúncia de um governo de juízes, de uma justiça de salvação, referida casuisticamente aos aspectos materiais em cada questão a ser julgada. Mal compreendido leva a concepções de uma justiça que abdica da defesa da integridade do Direito, tal como a conceituam, na esteira de Dworkin, Nonet e Selznick, e se torna, mesmo que em nome das melhores intenções, um instrumento do seu derruimento.
Rio, 14 de agosto de 2008.

FESTA E ALEGRIA EM COPACABANA
Organizada pelo PPS, a marcha pela avenida Atlântica, em Copacabana, na bela manhã de domingo foi um sucesso.
A presença de muitos candidatos a vereador pelo partido, como Stepan Necerssian e Paulo Pinheiro, além do presidente nacional, Roberto Freire e outros dirigentes estadual e nacional, deu um brilho a mais ao evento.
Gabeira e Luiz Paulo caminharam pela orla alternando a trilha sonora: ora o jingle da campanha, ora uma bateria ao vivo com direito a uma passista da pesada.
A resposta dos eleitores foi imediata, sempre com aquele calor humano que caracteriza o corpo-a-corpo. Nada melhor do que um bocado de sol e som para começar o segundo tempo de uma campanha que amanhã chega às rádios e as televisões.
Organizada pelo PPS, a marcha pela avenida Atlântica, em Copacabana, na bela manhã de domingo foi um sucesso.
A presença de muitos candidatos a vereador pelo partido, como Stepan Necerssian e Paulo Pinheiro, além do presidente nacional, Roberto Freire e outros dirigentes estadual e nacional, deu um brilho a mais ao evento.
Gabeira e Luiz Paulo caminharam pela orla alternando a trilha sonora: ora o jingle da campanha, ora uma bateria ao vivo com direito a uma passista da pesada.
A resposta dos eleitores foi imediata, sempre com aquele calor humano que caracteriza o corpo-a-corpo. Nada melhor do que um bocado de sol e som para começar o segundo tempo de uma campanha que amanhã chega às rádios e as televisões.
O QUE PENSA A MÍDIA
EDITORIAIS DOS PRINCIPAIS JORNAIS DO BRASIL
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DEU NO JORNAL DO BRASIL

O PRÉ-SAL DA DEMOCRACIA
Wilson Figueiredo
Duas pesquisas simultâneas de opinião pública chegaram juntas à verificação de que o Brasil já tem uma classe média que ultrapassa a metade da população. Não se sabia mas se percebia que alguma coisa se passava na cabeça e no estômago do brasileiro. Apenas ninguém traduziu em conceitos os sinais antes que o IBGE e a FGV dessem a entender que a classe média estava aí para servir econômica e politicamente. A metade pode não ser suficiente mas já é referência digna neste "deserto de homens e de idéias", como observou com desalento Osvaldo Aranha, para engrenar um salto maior do que as pernas. Encheu-se o Brasil de homens mas faltaram idéias originais. Ninguém melhor do que o pequeno burguês, como é visto pelos localizados acima dessa faixa, e invejado pelos localizados abaixo do equador social, para assumir função histórica num país que não foi até hoje apresentado ao futuro, porque fatalmente um dos dois chega atrasado ao encontro e o outro desiste de esperar.
O que levou os dois institutos a atirarem juntos na mesma direção foi a conclusão, um pouco por acaso, para não dizer à brasileira, segundo a qual a parcela situada mais embaixo na escala social, batizada apenas com uma letra do alfabeto, já faz três refeições por dia (as noites não contam). Ora, ao alcançar esta marca, antes de tudo o brasileiro pode ser considerado cidadão e despertar para a responsabilidade política, com a qual ninguém nasce mas adquire, e quanto mais cedo melhor. Afinal, viver à margem da sociedade e dos semelhantes não é opção digna de animal gregário. A cidadania não o livrará, porém, de ser visto pelo foco clínico em que se distingue um pequeno burguês a olho nu, até aprender a usar corretamente os talheres à mesa, vestir-se de maneira apresentável (a ser definida pela moda), a partir das três refeições diárias, exceto nos regimes de emagrecimento. Aí já passa à categoria de burguês. Em seguida, a casa própria a perder de vista, e o automóvel, lhe completam o enxoval. Daí para cima, socialmente falando, a aferição seletiva tem critérios exclusivos. Já o burguês não é classificado apenas pela aparência, e sim pela renda.
Feita a apresentação, podem os políticos dispor, na caçada aos votos, de uma camada preciosa da cidadania emergente, cientificamente explorada, enquanto governo examina o que fazer no pré-sal que o separa do petróleo. Quando os dois se juntarem, pode ser que o Brasil faça pelo menos figura universal em números e se impunha nem que seja como novo rico, sempre melhor do que velho pobre, seja em olimpíadas esportivas ou no polimento da democracia resignada a esperar reformas. Há mais de duas décadas o Brasil está consolidando o estágio caracterizado pela aceitação da vontade política filtrada nas urnas. Tudo indica que o brasileiro se enfarou com a praxe republicana de contestar resultados eleitorais e reconheceu na maioria absoluta a primeira-dama da democracia representativa. Os golpes já deram o que tinham a oferecer e acabaram por tirar mais do que precisavam. As fraudes trocaram de roupa no intervalo. Firmou-se a convicção de que as urnas só passaram a falar a língua da democracia depois que se estabeleceu a certeza de que nada melhor do que um governo de esquerda ser sucedido por um de direita, ainda que (ou principalmente) com aparência de esquerda. Um verdadeiro milagre.
Coube ao governo Lula o mérito histórico de mostrar que esquerda e direita não foram varridas do mapa, e sim que a diferença caiu ao mínimo que poucos percebem. Tanto faz ser de esquerda como ter sido de direita. Sendo fictício o centro, de quatro em quatro anos, a esquerda e a direita vestem um novo sentido suficiente para fazer a felicidade de maior número. A maioria absoluta parece ter sido inventada na medida certa para o Brasil chegar à democracia. O vencedor chega na categoria de hóspede temporário. Os políticos estão em trajetória de baixa na opinião pública, mas como dizia o ministro Delfim Neto no seu tempo - "deixem ir primeiro o bandido, depois a gente manda o xerife".
A atual tentativa democrática já faturou seis mandatos presidenciais, um indireto (de transição) e cinco pelo voto direto, sem o menor risco de retrocesso. É o mais novo capítulo que o ambidestro presidente Lula está rascunhando, ora com a mão esquerda, ora com a direita. Quer vacinar logo a classe média contra surtos de apoliticismo, que foi a dengue do século passado.
Wilson Figueiredo
Duas pesquisas simultâneas de opinião pública chegaram juntas à verificação de que o Brasil já tem uma classe média que ultrapassa a metade da população. Não se sabia mas se percebia que alguma coisa se passava na cabeça e no estômago do brasileiro. Apenas ninguém traduziu em conceitos os sinais antes que o IBGE e a FGV dessem a entender que a classe média estava aí para servir econômica e politicamente. A metade pode não ser suficiente mas já é referência digna neste "deserto de homens e de idéias", como observou com desalento Osvaldo Aranha, para engrenar um salto maior do que as pernas. Encheu-se o Brasil de homens mas faltaram idéias originais. Ninguém melhor do que o pequeno burguês, como é visto pelos localizados acima dessa faixa, e invejado pelos localizados abaixo do equador social, para assumir função histórica num país que não foi até hoje apresentado ao futuro, porque fatalmente um dos dois chega atrasado ao encontro e o outro desiste de esperar.
O que levou os dois institutos a atirarem juntos na mesma direção foi a conclusão, um pouco por acaso, para não dizer à brasileira, segundo a qual a parcela situada mais embaixo na escala social, batizada apenas com uma letra do alfabeto, já faz três refeições por dia (as noites não contam). Ora, ao alcançar esta marca, antes de tudo o brasileiro pode ser considerado cidadão e despertar para a responsabilidade política, com a qual ninguém nasce mas adquire, e quanto mais cedo melhor. Afinal, viver à margem da sociedade e dos semelhantes não é opção digna de animal gregário. A cidadania não o livrará, porém, de ser visto pelo foco clínico em que se distingue um pequeno burguês a olho nu, até aprender a usar corretamente os talheres à mesa, vestir-se de maneira apresentável (a ser definida pela moda), a partir das três refeições diárias, exceto nos regimes de emagrecimento. Aí já passa à categoria de burguês. Em seguida, a casa própria a perder de vista, e o automóvel, lhe completam o enxoval. Daí para cima, socialmente falando, a aferição seletiva tem critérios exclusivos. Já o burguês não é classificado apenas pela aparência, e sim pela renda.
Feita a apresentação, podem os políticos dispor, na caçada aos votos, de uma camada preciosa da cidadania emergente, cientificamente explorada, enquanto governo examina o que fazer no pré-sal que o separa do petróleo. Quando os dois se juntarem, pode ser que o Brasil faça pelo menos figura universal em números e se impunha nem que seja como novo rico, sempre melhor do que velho pobre, seja em olimpíadas esportivas ou no polimento da democracia resignada a esperar reformas. Há mais de duas décadas o Brasil está consolidando o estágio caracterizado pela aceitação da vontade política filtrada nas urnas. Tudo indica que o brasileiro se enfarou com a praxe republicana de contestar resultados eleitorais e reconheceu na maioria absoluta a primeira-dama da democracia representativa. Os golpes já deram o que tinham a oferecer e acabaram por tirar mais do que precisavam. As fraudes trocaram de roupa no intervalo. Firmou-se a convicção de que as urnas só passaram a falar a língua da democracia depois que se estabeleceu a certeza de que nada melhor do que um governo de esquerda ser sucedido por um de direita, ainda que (ou principalmente) com aparência de esquerda. Um verdadeiro milagre.
Coube ao governo Lula o mérito histórico de mostrar que esquerda e direita não foram varridas do mapa, e sim que a diferença caiu ao mínimo que poucos percebem. Tanto faz ser de esquerda como ter sido de direita. Sendo fictício o centro, de quatro em quatro anos, a esquerda e a direita vestem um novo sentido suficiente para fazer a felicidade de maior número. A maioria absoluta parece ter sido inventada na medida certa para o Brasil chegar à democracia. O vencedor chega na categoria de hóspede temporário. Os políticos estão em trajetória de baixa na opinião pública, mas como dizia o ministro Delfim Neto no seu tempo - "deixem ir primeiro o bandido, depois a gente manda o xerife".
A atual tentativa democrática já faturou seis mandatos presidenciais, um indireto (de transição) e cinco pelo voto direto, sem o menor risco de retrocesso. É o mais novo capítulo que o ambidestro presidente Lula está rascunhando, ora com a mão esquerda, ora com a direita. Quer vacinar logo a classe média contra surtos de apoliticismo, que foi a dengue do século passado.
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