segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Cem anos sem Machado de Assis


A morte de um dos gênios da nossa literatura completa 100 anos hoje. Machado de Assis escreveu uma obra de relevância universal sem nunca ter saído do estado do Rio.


“Não vou viver com ninguém. Viverei com o Catete, Largo do Machado, a Praia de Botafogo e do Flamengo”.
(Machado de Assis)

Artistas entram em cena na caminhada de Gabeira


Pedro Vieira
DEU NO JORNAL DO BRASIL

Eduardo Moscovis convocou colegas, e o candidato mostrou-se otimista


Apesar do tempo chuvoso, o Arpoador estava lotado, ontem. Através de um e-mail – criado pelo casal Eduardo Moscovis e Cynthia Howlett – convocando as pessoas para uma manifestação em favor da candidatura de Fernando Gabeira (PV), dezenas de artistas compareceram ao local para prestigiar o candidato. Moacir Góes, Cissa Guimarães, Lydia Matos, entre outros tantos, eram figuras presentes na manifestação. Apesar de estar em terceiro lugar, a manifestação inflou a confiança de Gabeira.

– Eu respeito todas as candidaturas, todos podem ter chance, mas acho que tenho o eleitor mais empolgado, ainda mais depois desta manifestação – orgulhou-se Gabeira, que disse se sentir grato e feliz com o apoio dos artistas.

O idealizador, Eduardo Moscovis, ficou impressionado com as centenas de pessoas que compareceram e contou como surgiu a idéia da manifestação.

– Era para ser uma manifestação pequena. Tive um sentimento de omissão e percebi que há muito tempo não tínhamos um candidato como o Gabeira, que tem propostas, não ataca os adversários e é transparente – explicou Moscovis, que confessou ser alheio à política. – Nunca me envolvi. Esta é a primeira vez que participo de uma manifestação assim.

Sua mulher, Cynthia Howlett, também assumiu estar distante da política, mas não se orgulha disso.


– A última vez que participei de uma manifestação política foi na época do Collor. Acho que era para nós estarmos acompanhando mais – admitiu Cynthia, brincando com o marido. - Normalmente, ele tem a idéia, mas sou eu quem executa.

Candidato de todos

Os candidatos a vereador aproveitaram para tirar uma casquinha da manifestação e levaram seus cabos eleitorais para reforçar as candidaturas. Acompanhando Gabeira, caminharam até metade da praia de Copacabana. A militância também esteve presente e garantiu: que Gabeira não é só Zona Sul.

– Hoje, todos estão preocupados com o meio ambiente. Não é só a Zona Sul, e o Gabeira tem essa preocupação ecológica – afirmou Felipe Cardoso, morador de Cavalcanti, na Zona Norte. – Através dos candidatos a vereador, Gabeira conseguiu atingir pessoas de toda a cidade.

Fernando Gabeira contesta números do Ibope no Rio

Marcelo Auler, RIO
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Deputado critica diferença entre instituto e Datafolha

Apontado nas pesquisas como o candidato à Prefeitura do Rio que mais tem crescido - uma alta de quatro pontos nas duas pesquisas mais recentes -, o deputado federal Fernando Gabeira (PV) contestou ontem os resultados do Ibope. Pesquisa do instituto, contratado pelo Estado e pela TV Globo, o coloca em terceiro lugar, com 10% das intenções de voto, mas a uma distância de 14 pontos do segundo colocado, o senador Marcelo Crivella (PRB). Pelo Datafolha, o candidato verde tem 15% e o bispo licenciado da Igreja Universal, 18%.

“Eu sempre disse que o Ibope estava a serviço do PMDB. Tenho condições de demonstrar que eles têm contrato com o PMDB no Estado inteiro. As pesquisas deles, no meu entender, não têm credibilidade. As pesquisas a que eu dou mais credibilidade são a do Datafolha e a do GPP, onde a situação é muito parecida”, disse, durante uma caminhada ontem de manhã na orla da zona sul do Rio.

Pelas pesquisas, o peemedebista Eduardo Paes (29% tanto no Ibope quanto no Datafolha) já estaria praticamente garantido no segundo turno. A segunda vaga é que está indefinida. Mas, pelo Ibope, Crivella, com 24%, seria o mais provável concorrente. Já pelo Datafolha, três candidatos estariam em empate técnico: Crivella, com 18%, Gabeira, com 15% e Jandira Feghali, do PCdoB, com 13% (pelo Ibope ela tem apenas 9%).

Embora desponte com possibilidades de alcançar o segundo turno como o segundo mais votado, Gabeira recusa-se a fazer a campanha do voto útil entre os chamados eleitores de esquerda. Ele garante que chegará ao segundo turno com o voto progressista. “Respeito todas as candidaturas, acho que todos, trabalhando, podem ter chance. Com os votos de consciência eu vou chegar lá.”

Para ele, nesta última semana, o importante serão os eleitores conscientes. “Esta semana é decisiva, onde o principal protagonista não é o candidato, é o eleitor. Quem tiver os eleitores mais decididos, mais empolgados e com mais argumentos, vai levar. Estou certo que tenho os eleitores mais confiantes, mais empolgados, mais decididos.”

Em campanha na zona oeste, Crivella preferiu não polemizar com os institutos de pesquisa. “A melhor pesquisa, para mim, é o carinho que tenho recebido do povo nas ruas”, disse, segundo seus assessores. Ele destacou que tem chances de ir ao segundo turno.

Daqui para o futuro


Wilson Figueiredo
DEU NO JORNAL DO BRASIL


Não é exagero dizer que o Brasil anda sem sair do lugar, como quem se esfalfa para fazer quilômetros na esteira. Haja paciência. Não há recordes nem recordistas no desempenho humano sobre esteiras rolantes. Os que saírem vitoriosos das urnas, em número muito inferior aos que entraram, celebrarão como for possível, e os derrotados simularão júbilo cívico por conta da democracia. Como nada muda, a não ser de endereço postal, a democracia segue em frente com a ilusão dos mais novos temperada pelo cansaço dos mais velhos. Faz parte do ritual. Os eleitores vão reincidir na conclusão de que na democracia sempre se volta ao ponto de partida, ou então não é.

A despeito do que possa acontecer e, com toda a certeza, do que vai ocorrer de um jeito ou de outro, o bordão nacional entoará que o Brasil nunca mais será o que era. Uma pena, se for privado do que tem de melhor, que é a disposição para a democracia. Pesquisas adiantam o resultado das urnas, não o futuro cuja existência universal Santo Agostinho negou em suas confissões. Dizia ele que, depois de muito esperar, quando percebia, o futuro já tinha passado. Fugidio por natureza, quando sai de onde está, vai direto para o passado. O presente não é com ele, mas conosco. Não quer dizer muito, mas o que está para acontecer deixa no ar a impressão de conteúdo histórico denso. Vai ver são as mesmas bolhas de sempre. Seja o que for, o pacote estará dialeticamente correto quando sair das urnas, e politicamente resolvido, sem esquecer de apresentar novas dificuldades a velhos problemas.

O Brasil está preparado. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mais do que grande eleitor no plano municipal, mantém a forma no vazio da própria sucessão, que continua em todas as cabeças, inclusive dos favoráveis ao terceiro mandato. Acredita-se que a hipótese se desfez mas se refaria como bonificação pelos dois anteriores. Um mandato a mais, não faz diferença. A versão segundo a qual o raio não cai duas vezes no mesmo lugar não se aplica ao mandato presidencial no Brasil, onde o precedente da reeleição abriu a porteira. Somos experimentalistas natos. Não haverá mais presidente que se contente com o primeiro mandato, nem argumento que o detenha. Pode-se garantir que, excluídas as mulheres, fogo de morro acima, água de morro abaixo e o terceiro mandato presidencial, ninguém pode impedir quando chega a oportunidade.

Se o desempenho do governador José Serra mantiver a preferência acintosa nas pesquisas, a futura sucessão presidencial manterá curso natural? Não é preciso pagar para ver. É de graça. O Brasil continua politicamente aberto. Os partidos escondem-se exatamente quando deviam apresentar, como responsáveis pelas candidaturas, programas de governo – municipal, estadual ou federal _ e alguém com capacidade pessoal e compromisso de realizar o que for proposto, e proposto por ser viável, não para enganar. No caso de José Serra, o interesse contrário não está nos concorrentes ocultos, mas ao lado dele na mesma social-democracia nominal. O terceiro mandato pode até ressuscitar. Há tempo de sobra.

O PSDB tem endereço histórico à esquerda, embora ilegível desde que o neoliberalismo se dissipou e as variantes perderam o rumo. A democracia se diz imunizada contra o golpismo republicano, mas não avalia o efeito negativo da falência da representação política. Os partidos fazem de conta que não tem gravidade o desencontro entre a opinião pública, de fundamento pequeno-burguês, e a representação política de costas para o eleitor. Tem, e muita. Trará perigo o efeito tardio da pérfida solução de manter aberto, mas vazio de poder, o Congresso Nacional nas duas décadas de controle militar da República. O efeito perverso explica-se com o desinteresse pelo debate de qualidade e o gosto pela ociosidade de alta remuneração, mas sem dignidade política. As conseqüências mantiveram-se ocultas por falta de oportunidade, mas reapareceram por necessidade. As sementes da ditadura eram de uma planta venenosa: deixar o Congresso aberto só serviu para expor o vazio legislativo à execração pública e erodir a credibilidade representativa.


A primavera chegou com buquês de pesquisas que garantem a Lula, por cima da confusão, votos de prosperidade eleitoral da maneira que for possível.

Entrevista - Gilmar Mendes: "O aparato policial do Estado hoje está fora do controle"


Andréa Michael e Felipe Seligman
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


Presidente do STF diz que grampo em diálogo serviu para criar uma "reação" e mostrar que país atingiu limite em que "é preciso dizer basta"


PRESIDENTE DO STF (Supremo Tribunal Federal), o ministro Gilmar Ferreira Mendes, 52, afirmou que o aparato policial do Estado está fora de controle e que o grampo ilegal do qual ele foi vítima no último mês de julho serviu para alertar os Poderes constituídos da situação que o país atravessa. Em entrevista concedida à Folha na manhã da sexta-feira, Mendes disse ser contrário a qualquer miniassembléia constituinte, que chamou de "aventura", e afirmou considerar urgente reformas constitucionais ou infraconstitucionais.

O presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, diz que é preciso modificar o sistema de eleições e também a elaboração e aplicação do Orçamento, que, segundo ele, deve ser impositivo pelo menos parcialmente e não apenas meramente indicativo, como é hoje.

FOLHA - Depois de 20 anos, o que está ultrapassado na Constituição?

GILMAR MENDES -
Temos de situar esse texto na história. Saíamos de um processo ditatorial, de insegurança total.
Imaginava-se que o porto seguro era a Constituição constitucional, o que levou a um texto mais analítico. Tínhamos um quadro inflacionário muito evidente no governo [José] Sarney, que ao final chegou aos 84,32% ao mês.
Não por acaso a Constituição incorpora direito à revisão de vencimentos, à correção no âmbito da Previdência. Mas a grande vitória do Brasil no campo político foi conseguir maioria constitucional para fazer as reformas, independentemente da alternância de poder.Não sou favorável a uma miniconstituinte. O texto constitucional não comporta esse tipo de aventura.

FOLHA - O que precisa mudar?


MENDES - É urgente uma reforma política. Os senhores [da imprensa] têm registrado a absorção de funções do Legislativo pelo excesso de medidas provisórias, a presença excessiva de suplentes no Senado. Isso passa pela revisão do modelo eleitoral.

FOLHA - Recentemente houve críticas de que o STF, com seus poderes, estaria legislando.


MENDES - É uma crítica inevitável. Não se trata de uma opção do STF em face da moda. Decorre do texto constitucional.
Há um problema de funcionalidade decorrente do próprio mecanismo do sistema eleitoral, que adotamos desde 1932, o modelo proporcional, que dificulta a formação de maioria para um modelo decisório e está produzindo distorções.
De um lado, a intervenção excessiva do Executivo, distorções na realidade orçamentária, que acredito ser um ponto sério de reforma, para ter um Orçamento digno deste nome, real, efetivo, minimamente impositivo. Você pode ter necessidade de adaptação, mas hoje temos grandes problemas, inclusive da manipulação do sistema político, pelas tais emendas parlamentares.A feitura do Orçamento à medida que a fila anda, com a abertura de créditos extraordinários a cada momento para situações que são corriqueiras. É preciso rediscutir.

FOLHA - Isso vai e volta.


MENDES - É como se fosse reformar um avião em pleno vôo com seus próprios passageiros.Essas pessoas se perguntam: "O que vai acontecer comigo?".
Dizem: "Mas esse modelo é bom porque ele propiciou a minha eleição". Por isso que é difícil, mas o país reclama. Não temos no Supremo Tribunal Federal qualquer pretensão de substituição do Legislativo.
Mas, muitas vezes, temos atividades complementares.

FOLHA - Por que a súmula do nepotismo não foi cumprida?


MENDES - Trata-se de um fenômeno que é jurídico, constitucional, mas que é político e cultural. Isso existe no Brasil desde sempre. Está sendo cumprida. É uma questão de tempo.

FOLHA - O sr. tem uma formação técnica, mas também ocupou cargos por indicação política. Como o sr. vê essa relação?


MENDES - Acho importante, porque me dá visão mais complexa das coisas. Primo por coerência. As posições que sustentei, por exemplo, no governo Fernando Henrique, eu as sustento hoje com a mesma transparência. E em temas absolutamente antipáticos, que defendo por convicção, como prerrogativa de foro e todos os temas ligados ao Estado de Direito.

FOLHA - Daí as críticas de ter concedido tão rapidamente um habeas corpus a Daniel Dantas?


MENDES - Concedi nesse caso, como em todos os que chegam ao tribunal relacionados a inúmeros anônimos.

FOLHA - No caso da Operação Satiagraha, o senhor declarou recentemente que não era legal a atuação da Abin como polícia judiciária.


MENDES - Disse o seguinte: inicialmente, essa participação foi negada. Depois se disse que houve uma cooperação tópica para assuntos estratégicos. A terceira versão foi a de que participaram dois ou três servidores previamente designados.
Em outro momento se descobrem que eram 52 agentes da Abin, e depois 56 agentes, e não sei se paramos por aí.
Revela-se também uma quantidade enorme de dinheiro despejado nisso. A Abin não foi subsidiária. Pergunto: pode haver uma cooperação nesse nível? Quem autoriza?

FOLHA - Sua opinião.


MENDES - Entendo que não. Isso é indevido e não estou a discutir provas, estou a dizer: que projeto político se escondia atrás disso? Era criar o quê?
Uma super Abin e PF, uma fusão delas duas? Será que foi disso que nos livramos a partir da revelação desses fatos? Que projeto se escondia atrás disso?Que a Constituição não contempla eu não tenho a menor dúvida. Polícia judiciária é atividade da Polícia Federal.
Que possa haver alguma cooperação, pode haver. Pode-se considerar como cooperação quando a presença do órgão de cooperação é maior do que a do órgão que recebe o apoio?

FOLHA - Qual o reflexo disso sobre a legalidade da operação?


MENDES - Sobre isso nem falo. A questão concreta não tem relevância alguma, a não ser no momento em que ela ilumina o projeto institucional que estava por trás disso. E acho que era extremamente perigoso para a democracia. Uma mente perversa pensou isso.

FOLHA - Qual é o impacto institucional do grampo telefônico do qual o sr. foi alvo?


MENDES - No plano institucional, tenho a impressão de que há algum tempo o Brasil denuncia o descontrole dessas áreas e de alguma forma nós até toleramos e legitimamos esse processo, como o vazamento sistemático, a não-punição dessas pessoas.
Isto nos demandava uma reação. Mas quando a questão se alçou a esse plano de ouvir senadores, ministros do Supremo, e quando isso se comprovou, então isso chamou a atenção da sociedade e atingiu aquele limite no qual é preciso dizer basta. É preciso que haja uma reação porque nós estamos na verdade no plano do excesso das anomalias.
Tenho impressão que foi nesse sentido. O presidente se sentiu atingido, os presidentes das Casas se sentiram atingidos, todos se sentiram de alguma forma afetados por isso. Nós todos no Judiciário de alguma forma éramos afetados por isso e também co-responsáveis, porque deixamos isso crescer sem limites.


FOLHA - Mas quem está fora de controle?


MENDES - Acho que o aparato policial. Claro que há outros problemas, mas obviamente que se tolerou esse tipo de coisa e o aparato policial, com suas negociações com a mídia, se autonomizou diante do próprio Judiciário. A Operação Têmis [Deusa da mitologia grega que era convocada em julgamentos de magistrados], por exemplo. Se deu esse nome por quê? Sendo uma investigação que começou no âmbito do próprio Poder Judiciário, mas quando ela vai para a polícia ela ganha esse nome. Pensado para denegrir a imagem do Poder Judiciário.O relator [ministro do STJ Felix Fisher] decide não prender os eventuais envolvidos e é desqualificado por delegados da Polícia Federal. As representações que ele fez para o Ministério Público resultaram arquivadas. Ontem, eu li os episódios envolvendo o ministro Fisher e me senti um pouco envergonhado de não ter reagido.

FOLHA - Mas ficar preso ao debate não tira o foco das investigações?


MENDES - Isso não tem nada a ver com o combate à impunidade. Estou falando como quem trabalhou na lei de interceptações telefônicas, na lei dos crimes organizados, na lei de lavagem de dinheiro, eu estava no Ministério da Justiça nesse período. Não se trata de nenhuma transação. Agora, combate ao crime organizado dentro dos ditames do Estado de Direito. É possível combater o crime organizado dentro das regras do Estado de Direito? É e é isso que se quer.

FOLHA - E o projeto de lei para punir o vazador que aborda também a punição de jornalista. Isso fere um preceito fundamental?


MENDES - Não conheço o projeto do governo, mas tenho a impressão de que nós temos hoje um tal descritério e um tal descontrole no vazamento que temos que fazer uma séria atuação nesta área. Que se abra inquérito imediatamente ao vazamento. Hoje temos um problema muito sério e isso é um problema do governo.

Um capitalismo que se dê ao respeito


Fábio Wanderley Reis

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Em matéria dedicada ao plano do governo dos Estados Unidos para o resgate das finanças do país, diz a revista "The Economist", na edição de 25 de setembro, que "a idéia de qualquer resgate é profundamente perturbadora para qualquer capitalista que se dê ao respeito". A sugestão é a de que um capitalista que se preze não deve ter por que ir ao Estado de chapéu na mão - ou, de modo mais amplo, a de que um capitalismo autêntico prescinde do Estado, a não ser como provedor de segurança institucional-legal para as transações privadas.

As proporções da crise financeira agora vivida pela economia americana trazem a indagação de como relacionar essa perspectiva com a idéia do "espírito animal" dos capitalistas - ou, em outra expressão de Keynes, com a tendência do capitalismo à "selvageria". Um Estado limitado a garantir o quadro legal geral é, como tudo indica que teremos de aprender de novo de maneira penosa, compatível com formas de atuação dos capitalistas que nada têm a ver com certo cavalheirismo vitoriano apontado por alguns entre os supostos da economia neoclássica, redundando antes na busca irresponsável e gananciosa de ganho. E o Estado (tal como, para fazer justiça, a própria "The Economist" vem frisando há tempos) tem necessariamente de exercer ativamente a vigilância e a fiscalização que neutralizem as tendências "selvagens". Um capitalismo que se dê ao respeito será aquele em que o Estado contenha a selvageria.

O drama crucial envolvido reside num aspecto que tem sido destacado, especialmente por autores de inspiração marxista, com a fórmula da dependência estrutural do Estado e da sociedade capitalistas em relação aos interesses dos donos do capital. Uma face benigna dessa dependência se tem em que os interesses "animais" dos capitalistas - ao criar empresas, crescimento econômico, oportunidades de emprego - podem apresentar-se legitimamente como correspondendo ao interesse público. A perversão disso, ou a face maligna, tem a ver com o fato de que a assimilação dos interesses dos capitalistas ao interesse público torna-se imperiosa, se certamente não mais legítima, justamente quando a selvageria faz desandar as coisas, como agora, e ameaça a todos com a catástrofe. Nesse momento, em vez da mera assimetria de ganhos em favor dos capitalistas, o que temos é a necessidade - com cheiro de chantagem - de que as perdas sejam socializadas, e o Estado, com os contribuintes a reboque, deve comparecer não como mero regulador, mas como ator decisivo, capaz de proteger os capitalistas (não necessariamente, por certo, cada um deles) das consequências de seu próprio destempero.

Mas a crise de agora traz novidades importantes. Em primeiro lugar, com respeito ao quadro geral da nova dinâmica econômica globalizada e seus correlatos. A intensa financeirização e as criações do "espírito animal" quanto a ela levaram antes a crises várias em países mais ou menos periféricos. Mas, enquanto o jogo corresse bem nos países centrais, era difícil imaginar que a ação coordenada em nível transnacional para contrapor-se às crises viesse de fato a ocorrer com a eficácia necessária: que cada país fizesse o "dever de casa" da prosperidade que a globalização dos ricos prometia. Atingido o coração do sistema econômico mundial, porém, torna-se muito mais realista a expectativa de de que venhamos a ter medidas de impacto eventualmente planetário, até pelas assimetrias econômicas mesmas do mundo globalizado.

Além disso, a expectativa de novidades parece justificar-se também pela maneira específica em que se dá o impacto da crise nos Estados Unidos. Para começar, temos a coincidência de sua manifestação mais dramática com o auge da campanha para a eleição do sucessor de George Bush. Se as coisas podem talvez acomodar-se sem ressonâncias mais negativas quando se trata simplesmente de negociações mais ou menos sigilosas entre agentes poderosos do mercado e altos representantes sobretudo do poder executivo, as ressonâncias são grandemente amplificadas quando o Sr. Mercado tem de ir ao Congreso, como diz também "The Economist", em circunstâncias em que, por outro lado, um presidente pato-manco mercadista e dedicado a cortar impostos dos ricos tem de ir contritamente à televisão tentar atrair a bênção dos eleitores para o que aparece aos olhos de muitos como doação de dinheiro à rica e odiada Wall Street - e doação feita a toque de caixa, antes que o mundo acabe e enquanto o patrimônio modesto de muitos se derrete. Na pergunta dirigida pelo senador John Tester, Democrata de Montana, a Hank Paulson, secretário do Tesouro, e Ben Bernanke, presidente do Fed, relatada por Timothy Egan em blog do New York Times: "Por que temos uma semana para decidir se vamos apropriar 700 bilhões de dólares ou se o sistema financeiro do país vai pelo ralo?"

Diante da incúria evidente a todos os condenados a sofrer as consequências, o que agora é difícil imaginar é que continue tudo na mesma.

Fábio Wanderley Reis é cientista político e professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais. Escreve às segundas-feiras

A volta a Keynes e a insanidade dos mercados


Luiz Carlos Mendonça de Barros
DEU NO VALOR ECONÔMICO

O agravamento da crise nos mercados financeiros recolocou o nome de John Maynard Keynes e suas idéias no centro do debate econômico. Sempre que os excessos de uma economia sem regulamentação ocorrem, esta volta às idéias do grande economista britânico se repete. Talvez tenha sido uma crítica sensata e inteligente aos limites do chamado livre mercado sua grande contribuição ao pensamento humano. Por isto sua presença imaginária seja tão forte nos dias de hoje.

Para mim, o grande legado de Keynes continua sendo seu raciocínio brilhante na análise dos fenômenos econômicos reais. Keynes sempre procurava entender estas questões respondendo, inicialmente, a uma pergunta simples, mas definitiva: "Qual é o problema que estamos tentando resolver?"

Esta metodologia, mais de engenheiro do que de economista, está sempre presente nos momentos mais ricos de sua vida. O leitor que quiser constatá-la deve ler seu trabalho "How to pay for the War".

Uma vez conhecido em detalhes o problema a ser enfrentado, ele partia para a elaboração de uma possível solução dentro do quadro teórico disponível para as economias de mercado. Por isto sempre disse a meus alunos que não seguissem com rigor religioso o arcabouço teórico de Keynes, pois ele envelheceu com a evolução das economias de mercado, mas que aprendessem sua forma única de pensar a economia.

Para entender a grave crise financeira de hoje, vamos seguir o método keynesiano de pensar. Se assim o fizermos, chegaremos a um ponto central para explicá-la: a utilização sem limites da securitização de operações de crédito ocorrida nestes últimos anos. Uma das grandes invenções financeiras modernas, sua utilização em um ambiente de regulamentação frágil, acabou por arrastar os mercados a uma situação gravíssima. Para sair desta armadilha, que ameaça arrastar a economia do mundo para uma recessão profunda e extensa, será necessária a mobilização de recursos fiscais em grande proporção, de forma a salvar da insolvência um grande número de instituições financeiras.

E por que a securitização de créditos pode ser responsabilizada por isto? Porque sua utilização - sem controle adequado, repito - destruiu duas cláusulas pétreas do sistema bancário: a relação formal e operacional entre credores e devedores e o controle quantitativo da alavancagem das operações de crédito.

A primeira cláusula é responsável pelo conhecimento da capacidade de pagamento dos devedores individualmente e pela possibilidade de, diante de um problema de inadimplência, uma negociação direta entre credor e devedor. No caso dos derivativos criados pelo agrupamento de devedores em um único contrato, estes mecanismos tradicionais não podem ser exercitados de forma eficiente em um momento como este. Ao se agrupar devedores espalhados por diferentes regiões geográficas e sem um cadastro individual conhecido, perderam-se muitas décadas de conhecimento da atividade bancária.

Tudo foi substituído por um tratamento estatístico, altamente complexo e não testado em condições extremas. A ilusão de que as agências de rating de crédito detinham uma tecnologia sem possibilidade de falhas fez com que estes títulos se espalhassem pelo mundo. Passaram a fazer parte das carteiras de investimento um número imenso e diversificado de investidores institucionais, todos certos de terem uma avaliação correta dos riscos incorridos.

Outro problema desta metodologia é que havia um claro conflito de interesse na ação das agências, na medida em que estas eram remuneradas por serviços prestados aos emissores destes títulos. Recentemente foram divulgados e-mails trocados por funcionários destas empresas e que revelam procedimentos inadequados.

Por outro lado, a utilização descuidada da securitização enfraqueceu de forma importante a limitação quantitativa da relação dívida em circulação e capital do sistema bancário. Ao retirá-los dos livros dos bancos - e, portanto, dos limites do acordo da Basiléia -, a securitização permitiu uma expansão sem controle do crédito ao setor privado, principalmente aos indivíduos. Este excesso, em um ambiente de grande confiança na economia, levou ao crescimento desmedido do endividamento do consumidor, principalmente nos Estados Unidos. Não por outra razão, o consumo dos americanos representa hoje mais de 70% do PIB na maior economia do planeta.

Pior ainda, a certeza de que o risco de crédito nas operações securitizadas seria repassado para terceiros fez de um grande número de intermediários financeiros apenas uma fonte geradora de ativos. Remunerados em função do volume de contratos que conseguiam produzir, sem assumir riscos de inadimplência, qual o incentivo de se buscar devedores com capacidade inconteste de honrar seus compromissos? Na forma como operou o sistema bancário, nenhuma exigência de coobrigação de crédito existia na cadeia de negociação destes títulos. No caso das cessões de operações de crédito dentro do sistema bancário, este é um cuidado que esteve sempre presente no passado.

Este sistema operou trilhões de dólares, durante mais de cinco anos, sem que os órgãos reguladores atentassem para os riscos envolvidos. Como sempre acontece, esta verdadeira corrente da felicidade continuou até que as restrições financeiras reais dos devedores se impusessem e criassem a crise iniciada em julho do ano passado. Várias outras disfunções foram aparecendo ao longo do processo e também contribuíram para a dimensão da crise atual. Cito apenas uma para ilustrar esta minha observação: os próprios bancos aumentaram ainda mais a oferta de crédito ao utilizarem os chamados conduits para contornar os tênues limites de endividamento bancário em funcionamento.

O resultado deste período insano de crescimento descontrolado é a constatação de que será necessária uma injeção de capital no sistema financeiro de mais de US$ 1 trilhão para estabilizar a percepção de risco dos bancos. Este número é uma prova do descontrole dos últimos anos e nos mostra a incapacidade que tem hoje os BCs e outras instituições públicas de acompanhar a evolução criativa - ou destrutiva - do sistema financeiro moderno.

Luiz Carlos Mendonça de Barros , engenheiro e economista, é diretor-estrategista da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações. Escreve mensalmente às segundas.

"Temos medo, e o medo transformou-se numa indústria"


DEU NO DIÁRIO DE NOTÍCIAS (LISBOA)

Concita de Gregorio. A escolha da ex-jornalista do 'La Repubblica' para comandar os destinos do 'L'Unità', não gerou consenso. Críticos dizem estar em risco o importante diário do país. As mulheres aplaudem a opção, sinal da mudança dos tempos. O DN traz-lhe o pensamento da nova directora do mítico jornal comunista

"Vivemos no eterno presente, sem memória e sem perspectivas", afirmou ao diário espanhol El Mundo a nova directora do italiano L'Unità. Concita de Gregorio, a ex-jornalista estrela de outro título italiano de esquerda, o La Repubblica, iniciou funções em Agosto, e tornou-se na primeira mulher a segurar no leme do mítico jornal do Partido Comunista Italiano, fundado pelo filósofo Antonio Gramsci em 1924.

"[Vivemos] na total ausência de responsabilidade. Só pensamos em nós mesmos", afirmou a jornalista, filha de mãe espanhola e de pai italiano. "É um problema estrutural. Temos medo: do outro, de perder, de não sermos fortes. E o medo transformou-se numa indústria. Esse é o nosso consenso: o medo", concluiu Concita, natural de Pisa e mãe de quatro filhos romanos (dos 23 aos cinco anos).

A esquerda também não está confortável no mundo real, afirmou, num espanhol perfeito, refere o título da Prisa. "Está a mudar de era, passando pela fase pós-ideológica, tentando entender a realidade. Está há 30 anos na jaula ideológica, opinando sobre qualquer coisa, seja o que for, com preconceitos e de orelhas tapadas." Por isso, tem forjado o "berlusconismo, anestésico para as cabeças (...), êxtase de lotaria, comerciantes desonestos e política cabaret, ética das pernas bonitas e do milio- nário golfista, modelo de arquétipo social Alberto Sordi [actor e cantor italiano], insolente e bajulador à vez, temperado com alguma visita a Putin ou a Kadhafi".

Talvez tenha sido por isso que Concita de Gregorio aceitou a proposta de Renato Soru, fundador da Tiscali, uma operadora de Internet, e governador da Sardenha, para dirigir o L'Unità, especula o jornal espanhol. De Soru, um dos homens mais ricos do mundo segundo a norte-americana Forbes, diz ser um "empreendedor muito moral, fora de moda e pouco falador, um anti-italiano". Além disso, a jornalista de 43 anos afirma que não aceitou o cargo "para fazer carreira, nem pelo dinheiro, nem para gritar", mas "para baixar o tom de voz, para falar das coisas reais, e para tentar explicar onde está a substância e onde estão os truques".

Receitas e dicas para mulheres?

"Já chega de opinião, agora precisamos de factos", escreveu Concita de Gregorio no seu primeiro editorial do L'Uni-tà, publicado no dia 26 de Agosto. A escolha da jornalista para dirigir o diário foi uma surpresa para muitos italianos, pouco habituados a ver mulheres em posições de poder. "Aposto que agora vamos ver muitas receitas simples para mães trabalhadoras, e conselhos sobre como se comportarem como prostitutas quando os maridos chegarem a casa", escreveu no diário de direita Il Giornale o italiano Paolo Guzzanti, um colunista e jurista conservador.

De acordo com a associação Save the Children, que avalia as condições das mulheres e das crianças com base nos rendimentos, participação política e saúde, a Itália está no segundo lugar dos países mais atrasados da Europa ocidental em termos de direitos das mulheres e equidade social (ranking liderado por Portugal). Neste contexto, a escolha de Concita de Gregorio é vista como assinalando uma possível mudança cultural no país.

"Fiquei muito surpreendida. É realmente um sinal de que os tempos estão a mudar, e de que Itália está a aproximar-se dos Estados Unidos da América e do standard dos países europeus" mais avançados, afirmou Anna Mazzone, editora da revista Formiche.

"Na Itália, temos tido a percepção de que não é suposto que um jornal político cubra direitos ou questões sociais relativas às mulheres", disse uma jornalista do L'Unità, que preferiu manter o anonimato. Razão que terá levado as mulheres a aplaudir a decisão. "Estou feliz como uma criança por, finalmente, ver uma mulher a dirigir o jornal", afirmou Maria Anna Sabelli, uma médica de Milão que é leitora há 30 anos.

Relativamente ao rumo que o jornal vai tomar, Concita de Gregorio garante que "vai ser diferente". Porque é preciso "indicar caminhos", "outras vias", que permitam chegar a "outros mundos possíveis". Apesar de confiante, a nova directora sabe que isso é algo que "vai levar tempo", e que precisa da contribuição de "todos, um por um". "Os jornais", conclui, "são objectos insubstituíveis, cuja lentidão é uma garantia para se dizer a palavra justa, e aprofundar, um antídoto para este tempo veloz em que a objectividade está morta."

O que pensa a mídia

Editoriais dos principais jornais do Brasil
http://www.pps.org.br/sistema_clipping/mostra_opiniao.asp?id=1101&portal=

domingo, 28 de setembro de 2008

Gabeira passa Jandira e está em 3º


DEU EM O GLOBO

No Datafolha, diferença para Crivella, em segundo, é só de 3 pontos; no Ibope, de 14


Aoito dias da eleição, duas pesquisas divulgadas ontem, do Datafolha e do Ibope, mostram que Fernando Gabeira (PV) passou Jandira Feghali (PCdoB) e assumiu o terceiro lugar na preferência do eleitor para a prefeitura do Rio. No Datafolha, Gabeira cresceu quatro pontos percentuais em relação ao levantamento anterior, de 11% para 15%, enquanto Jandira permaneceu com 13%. No Ibope, Gabeira também subiu quatro pontos, de 6% para 10%, e Jandira manteve os 9%.

A diferença entre as duas pesquisas é que o Datafolha registra agora um triplo empate técnico entre Marcelo Crivella (PRB), que manteve seus 18%; Gabeira, agora com 15%; e Jandira, com 13%. A margem de erro é de três pontos, para mais ou para menos, o que caracteriza o empate técnico. No Ibope, porém, Crivella ainda está bem distante dos outros dois, com 24%, 14 pontos percentuais a mais que Gabeira, que chegou aos 10%, e 15 pontos a mais que Jandira.

Nas duas pesquisas, Eduardo Paes (PMDB) cresceu e ampliou a liderança. No Datafolha, ele subiu de 26% para 29% e tem 11 pontos percentuais à frente de Crivella. No Ibope, Paes subiu de 27% para 29%, e tem cinco pontos percentuais a mais que Crivella, que subiu um ponto, de 23% na pesquisa anterior para 24%.

- A distância entre Crivella e Jandira está no limite do empate técnico. Podemos dizer que ele está na frente dela. Mas entre Crivella e Gabeira há, de fato, empate. A clara ascensão de Gabeira é o destaque desta pesquisa - disse Mauro Paulino, diretor-geral do Datafolha.

No Ibope, contudo, a diferença de 14 pontos entre Crivella e Gabeira está bem acima da margem de erro, de três pontos. No Datafolha, Alessandro Molon (PT) foi de 4% para 5%, Solange Amaral (DEM) caiu de 5% para 4%, e Chico Alencar (PSOL) ficou nos 3%. Os demais não superam 1%. No Ibope, Solange caiu de 5% para 3%, Molon foi de 4% para 2% e Chico de 1% para 2%.

O Datafolha informou que o crescimento de Gabeira se deve principalmente à sua performance entre os mais ricos e escolarizados. Ele saltou 12 pontos (de 20% para 32%) entre os que ganham mais de R$4.150, faixa em que Paes perdeu nove pontos (foi de 30% para 21%). Crivella oscilou positivamente, de 7% para 9%. Entre os eleitores com nível universitário, o candidato do PV tinha 18% e pulou para 26%. Paes tinha 25% e caiu para 22%. Crivella permaneceu com 7%.

Paes é mais forte entre os idosos; Gabeira, com jovens

Paes tem maior apoio entre os que têm mais de 60 anos (36%), entre os que têm até ensino fundamental (33%) e entre os que ganham até dois salários mínimos (33%). Crivella tem penetração nas mesmas fatias de eleitorado de Paes, atingindo 27% entre os eleitores com ensino fundamental e 25% dos eleitores que ganham até dois salários mínimos. Gabeira é mais forte entre os jovens, faixa em que obtém 20%; entre os que têm ensino superior (26%) e entre os que recebem mais de dez salários mínimos (32%). Jandira mantém percentuais entre 11% e 14% nas diversas faixas de renda e escolaridade.

O Datafolha não fez simulações de segundo turno envolvendo Gabeira. Paes ganha de Crivella por 57% a 30%, e de Jandira, por 48% a 41%. Mas Jandira vence Crivella por 52% a 34%, no caso de confronto direto entre eles. Já o Ibope fez simulação de segundo turno com a presença de Gabeira. Paes vence Crivella por 44% a 29%, vence também Jandira, por 45% a 28%, e sobre Gabeira tem vantagem ainda maior, de 49% a 17%. O Ibope informou que não houve mudanças significativas na taxa de rejeição dos candidatos.

O Datafolha ouviu 1.184 pessoas entre 25 e 26 de setembro. A pesquisa recebeu o registro RPE 35/2008. O Ibope ouviu 1.204 eleitores entre 23 e 25 de setembro, e registrou a pesquisa na 228ª Zona Eleitoral, sob o número 38/08.

As pesquisas provocaram reações destintas nos candidatos. Alçado ao terceiro lugar, Gabeira deixou de lado a promessa de não atacar adversários e passou a criticá-los, sem citar nomes, sob justificativa de "reafirmar diferenças".

- Tenho promessa de não ocupar máquina pública com os partidos políticos. Não sei se meu adversário que irá ao segundo turno se comprometerá a isso. Há candidatos que pertencem a partidos bastante vorazes em relação a empregos públicos, mas vou deixar para explicitar essas diferenças quando os dois candidatos estiverem na arena (no segundo turno) - disse Gabeira, que fez corpo a corpo em Campo Grande, Santa Cruz e Bangu, na Zona Oeste.

Em relação às diferenças entre os dois institutos, Gabeira acusou o Ibope, que registrou pior desempenho dele, de não ser sério:

- O Ibope é contratado pelo PMDB, por isso não tem nenhuma credibilidade.

Jandira voltou a atacar seus adversários e disse desprezar pesquisas.

- Não comento mais pesquisas. O que marca é que há 50% de indecisos. Podemos ir para o segundo turno. Esses números, em que são utilizadas margens de erro, são objetivamente parciais. Pesquisa para mim é na urna - disse, em carreata por Campo Grande e Santa Cruz.

Paes, em carreata por Vila Valqueire, Bento Ribeiro e Oswaldo Cruz, festejou as pesquisas:


- Vejo com otimismo e alegria. A população está entendendo claramente a nossa mensagem. Vou continuar acordando muito cedo, dormindo tarde e apresentando propostas para a cidade.

Crivella preferiu minimizar os resultados.

- Os números são discrepantes, mas falta apenas uma semana para a gente ver quem está com a razão. Vamos para o segundo turno e ganhar a eleição. Esqueçam pesquisa, há muitos interesses por trás - disse ele, em Cascadura.

Chico Alencar preferiu lembrar que metade dos eleitores ainda não se decidiu:

- Pelo que vejo na rua, essa fatia do eleitorado ainda está sendo disputada.

Solange Amaral, foi lacônica:

- Estou trabalhando, aprofundando a campanha e centrando nas zonas Oeste e Norte.

Já Molon criticou os resultados do Ibope:

- Em relação ao Ibope, nada a comentar, a não ser a evidente manipulação da pesquisa. A discrepância é, no mínimo, estranha. Em relação ao Datafolha, há um altíssimo percentual de indecisos (39%), o que confirma as previsões dos especialistas de que a disputa irá até o último dia, e o nosso crescimento e ultrapassagem em relação a Solange. Vamos continuar crescendo.

Palmas para Lula


Ferreira Gullar
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Nunca os pobres se sentiram tão protegidos e nunca os banqueiros lucraram tanto no Brasil

O ALTO índice de popularidade do presidente Lula tem suscitado a reflexão dos comentaristas que se sentem desafiados a explicá-la. A tarefa não é das mais fáceis e, por isso mesmo, as explicações nem sempre coincidem, muito embora sejam, na sua maioria, pertinentes. E porque o assunto envolve numerosos fatores e causas, resta sempre algum ponto que ainda não foi explicitado.

Vou tentar examinar alguns deles e, para isso, terei que tocar em aspecto já argüidos mas que não se podem excluir na apreciação do tema. Um deles é, sem dúvida, a estabilidade econômica de que o país goza hoje e de que não gozaria se as teses de Lula, contra o Plano Real, tivessem prevalecido. Não faço tal observação com outro propósito senão o de tentar definir a natureza dessa popularidade e suas possíveis conseqüências para o processo político.O fato de Lula, eleito presidente, ter adotado a política econômica que combatera ferozmente, revela-se uma louvável sensatez, revela também, ao mesmo tempo, por ele não reconhecer o débito de hoje e o equívoco do passado, certa carência de escrúpulos, o que explica muita coisa da popularidade de que desfruta hoje.

Certamente, essa popularidade se deve também aos programas sociais de amparo às camadas desfavorecidas da sociedade, antes aplicados em Campinas (SP) e Brasília, depois adotados por Fernando Henrique em âmbito nacional e que Lula manteve e ampliou. Mas também aqui, mais uma vez, procurou turvar a água e apresentar-se como o criador do programa, fundindo os dois programas existentes e mudando-lhes o nome. Com isso, prejudicou-lhes a eficiência, por dificultar a avaliação precisa dos resultados. Como era de se esperar, aumentou a ajuda a cada família e a dotação global para abranger o maior número possível de famílias, que hoje somam cerca de 11 milhões, o que equivale a mais de 40 milhões de indivíduos. Bastaria, portanto, o Bolsa Família para lhe garantir uma ampla aprovação das camadas pobres do povo. Isso é do conhecimento de todos.

No entanto, não bastaria para assegurar a Lula a aprovação de que desfruta hoje. Ele lançou mão de outros recursos, como, por exemplo, manter-se permanentemente no palanque e na mídia, tudo fazendo para, com seus discursos e pronunciamentos, capitalizar, não apenas o resultado dessas iniciativas, como de tudo o que, de positivo, ocorre no país. Tudo o que ocorre de bom, foi ele quem fez; tudo o que ocorre de ruim, tem um culpado, que não é ele. E, como esta é sua principal ocupação, está sempre atento à mais mínima notícia que possa comprometer o "paraíso" em que ele transformou o Brasil: ao surgir uns primeiros sintomas de aumento da inflação, ele imediatamente culpou Bush e os países europeus. Não importa se é verdade ou não, já que a grande massa do povo não entende bem como essas coisas se dão; o que ele diz é aceito, porque ele é seu amigo e salvador e "os outros", seus inimigos.Lula tem a esperteza do demagogo, e não a esconde. Quando surgiu o escândalo do "dossiê", declarou: "O povo não sabe o que é dossiê; pensa que é alguma coisa doce". E por essa mesma razão, quando lhe perguntaram pela crise econômica, respondeu: "Pergunta pro Bush". E assim responsabilizava o presidente americano por uma crise que é do sistema econômico e não do governo.

Por que fez isso? Porque lhe interessa levar o povo a pensar que o presidente de um país é responsável por tudo, donde decorre que, se os Estados Unidos vão mal, a culpa é de Bush e, se o Brasil vai bem, é graças a Lula e a ninguém mais. Mas isso só vale até que alguma coisa dê errado, quando então o responsável será, inevitavelmente, alguém que não ele, a imprensa talvez ou os "inimigos" do Brasil.

E por falar em inimigos, vale lembrar que Lula tem um discurso para cada público e para cada ocasião; ultimamente, comporta-se, nos palanques, como se estivesse num palco: "Dilma, já pensou se isso acontecesse dez anos atrás?". A sorte é que temos no governo um mago das finanças, que é também uma metamorfose ambulante.

A sua popularidade deve-se também a um raro talento político, a que se soma o fato de, originário da classe operária, atuar como uma espécie de amortecedor dos conflitos entre pobres e ricos: em função disso, nunca os pobres se sentiram tão protegidos e nunca os banqueiros lucraram tanto. Os nossos capitalistas -do mesmo modo que Bush- não ligam quando ele posa de esquerdista. Sabem que os fatos valem mais do que as palavras. E daí, os aplausos gerais.
Atenção, auditório, palmas para o Lula, que ele merece!

Sístoles e diástoles


Nas Entrelinhas :: Luiz Carlos Azedo
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE


O Executivo passou a substituir o Legislativo e o Judiciário. Foram 20 anos de centralização e autoritarismo


Coube ao general Golbery do Couto e Silva, em célebre palestra na Escola Superior de Guerra (ESG), em 1980, resumir a ópera: a história política do Brasil é pendular, oscila entre a centralização e a descentralização. Não era uma idéia inovadora, porque Alberto Torres, no começo do século passado, e Oliveira Viana, pouco depois, já haviam registrado o fenômeno. Mas foi sistematizada para servir à política de Estado. Com base na célebre metáfora cardíaca da sístole (contração) e diástole (dilatação), Golbery formulou a estratégia de abertura política do governo Geisel: os militares se retiraram da política de forma organizada e tutelaram a longa transição à democracia.

Império


As Constituições brasileiras são bons retratos da centralização e descentralização políticas. A primeira sístole foi protagonizada por Dom Pedro I, que dissolveu a Constituinte de 1923 e outorgou a nossa primeira Carta Magna, a Constituição de 1824. A grande inovação liberal foi o direito à propriedade privada, transformado num entrave legal à abolição. Toda vez que se falava em acabar com a escravidão, se invocava a dogma liberal. O “Poder Moderador” do imperador estava acima do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. Os presidentes das províncias eram nomeados, votavam apenas homens livres e proprietários.

A Constituição de 1923 foi reformada duas vezes. Primeiro, no Ato Adicional de 1934, que criou as assembléias legislativas provinciais, com certa autonomia, fruto das pressões antiabsolutistas despertadas pela abdicação de Pedro I, três anos antes. Manteve, porém, o caráter unitário do Estado brasileiro. A segunda ocorreu em 1881, quando D. Pedro II já estava desgastado pelo abolicicionismo. Introduziu as eleições diretas e acabou com a divisão entre eleitores de paróquia e de província. Apenas a aristocracia, uma ínfima parte da população, tinha direito a voto.

República

A grande diástole foi a proclamação da República. A Constituição de 1891 foi inspirada nos Estados Unidos. Conferiu autonomia aos estados da federação e liberdade partidária. Foram estabelecidas eleições diretas para a Câmara, o Senado e a escolha do Presidente da República, mas soldados, religiosos, analfabetos e mulheres também não votavam. As eleições “a bico de pena” eram fraudulentas. Tudo veio abaixo na Revolução de 1930.

Com Getúlio Vargas, a Constituição de 1934 fortaleceu o governo federal, garantiu direito de voto às mulheres e aos jovens com mais de 18 anos, além de criar a Justiça Eleitoral e a Justiça do Trabalho. Mas durou pouco. Em 1937, Getúlio implantou o Estado Novo, com uma Constituição de inspiração fascista, a “Polaca”. A eleição para presidente passou a ser indireta, a imunidade parlamentar foi extinta. Era a grande sístole.

O fim da II Guerra Mundial patrocinou nova diástole. A Constituição de 1945 consagrou os princípios da democracia. Estados e municípios recuperaram a autonomia. Os poderes Legislativo e Judiciário voltaram ser independentes. A eleição para presidente da República voltou a ser direta. Em 1961, o Congresso impôs a João Goulart o parlamentarismo, sem o qual não tomaria posse o vice do presidente Jânio Quadros, que havia renunciado. Em 1963, um plebiscito restabeleceu o presidencialismo.

Estava em marcha, porém, nova sístole: o golpe militar de 1964. A Constituição de 1967 institucionalizou o regime militar. Manteve o bipartidarismo criado pelo Ato Adicional nº 2 e estabeleceu eleições indiretas para presidente da República. A sístole foi ainda maior com a Emenda Constitucional nº1, de 1969, que incorporou o Ato Institucional nº5. Dava ao presidente da República o direito de cassar mandatos de parlamentares e magistrados, suspender os direitos políticos dos cidadãos e legislar sobre matéria política, eleitoral, tributária e econômica. O Executivo passou a substituir o Legislativo e o Judiciário. Foram 20 anos de centralização e autoritarismo.

Sindicatos ricos e fracos

Suely Caldas
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A recente edição da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) apresenta um dado aparentemente contraditório: enquanto o trabalho com carteira assinada e a renda salarial crescem, cai o número de trabalhadores sindicalizados. Veja, leitor, o que aconteceu entre 2006 e 2007: 1) O emprego com carteira assinada cresceu 6,1% e o rendimento salarial, 3,2%; e 2) os sindicatos perderam 555 mil trabalhadores filiados, o que fez a taxa de sindicalização cair de 18,6% para 17,7% da população ocupada. A lógica seria a filiação sindical acompanhar a expansão do emprego formal. Mas os trabalhadores não seguem a lógica. Por que será?

O especialista em economia do trabalho José Márcio Camargo atribui isso a um certo desencanto dos trabalhadores com seus sindicatos, descrédito na forma de representá-los e enfrentar novos desafios da modernização dos meios de trabalho. A luta sindical moderna exige preparo das lideranças para diversificar o foco, ir além do tradicional aumento salarial. Mas a prática continua presa ao modelo das décadas de 70/80, quando o sindicalismo desafiou a ditadura militar e viveu seu auge nas famosas greves do ABC paulista lideradas por Luiz Inácio Lula da Silva.

“Hoje, só 10% dos trabalhadores estão sob a proteção dos sindicatos; os 90% restantes são lei de mercado. Desviar a luta sindical para outras reivindicações dá trabalho e os sindicatos não estão dispostos ou não sabem fazê-lo”, analisa Camargo.

Outro dado da Pnad confirma o que diz o especialista. O recente crescimento do emprego tem amortecido as tensões e propiciado entendimento na relação capital x trabalho. Tanto que 80% das categorias profissionais fecharam acordos com ganhos salariais acima da inflação. São os 90% mencionados por Camargo com reajustes de salários regidos pelo mercado, em que empregados e empregadores se acertam sem interferência dos sindicatos, que só comparecem depois, para formalizar legalmente o acordo.

Há quem considere essa situação transitória, fruto de uma conjuntura de crescimento do emprego e ganhos salariais, que leva os trabalhadores a dispensarem os sindicatos em defesa de seus interesses. Tão logo mude a realidade e aumentos salariais só sejam conquistados com enfrentamento político, eles voltariam a se filiar.

Essa avaliação pode até ser válida para as grandes indústrias, mas desconsidera mudanças estruturais ocorridas no mercado de trabalho: na década de 90 a introdução da automação enfraqueceu o emprego nas grandes indústrias e o fortaleceu no setor de serviços (informática, bancos, telecomunicações, etc.). E é nesse setor, sem tradição de luta e com desempenho sindical extremamente tímido e por vezes ausente, que acontece um fenômeno que precisa ser mais bem pesquisado: o desinteresse dos jovens que ingressam no mercado de trabalho pelos sindicatos e a descrença de que suas lideranças saberão mapear e conduzir seus problemas e carências. É o que Camargo chama de novo desafio para as lideranças sindicais de ampliarem seu foco de atuação além da reivindicação salarial.

Há ainda outras razões que explicam o enfraquecimento dos sindicatos captado pela Pnad. Arrefeceu o estilo aguerrido do ABC paulista, que contaminou o movimento sindical nos anos 70/80. Foi substituído por lideranças acomodadas, que se fecham nas suas sedes, discutindo como obter verbas do Ministério do Trabalho e do imposto sindical, e que descuidam da relação direta com seus representados. Esse fenômeno piorou nos últimos anos em razão da liderança política do presidente Lula, que deixou dirigentes sindicais confusos, tontos, preocupados em ocupar cargos no governo e agir com moderação para não atrapalhar o amigo presidente.

As reformas sindical e trabalhista, defendidas com tanto fervor nos tempos do Lula metalúrgico, foram enterradas; o governo delas desistiu. A sindical andou só um pouquinho, mas em marcha à ré, contra o que o ABC paulista pregava em 70/80. E, pior, com aprovação entusiasmada do ex-líder, hoje presidente. Trata-se do rateio do dinheiro do imposto sindical entre seis centrais sindicais. Aliás, eram três e multiplicaram-se depois que o presidente amigo acenou com a idéia de receberem dinheiro público. Agora querem criar a “contribuição negocial”, que o trabalhador vai pagar sem ser consultado.

Muito diferente dos tempos em que Lula gritava em assembléias em São Bernardo que o imposto sindical só produzia sindicalistas pelegos.

*Suely Caldas, jornalista, é professora da PUC-RJ

Desempate vale o tri


Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Longe do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso a vocação para o exercício do mau agouro, ainda mais quando se trata do próprio partido. Mas, no ritmo corrente, ele não descarta a hipótese de os tucanos virem a ter uma ingrata surpresa em 2010.

Se não tomarem jeito com urgência, seus correligionários correm o risco de perder a chance de voltar ao Palácio do Planalto e ainda vão deixar para o presidente Luiz Inácio da Silva o título de campeão no balanço de derrotas e vitórias nacionais entre PT e PSDB.

Em embates diretos, o placar registra duas vitórias para cada um. Lula perdeu duas (1994/ 1998), ganhou as duas seguintes (2202/2006) e, dentro de mais 24 meses, ambos os partidos jogarão pelo desempate, valendo a taça do tri.

No jogo de poder a alegoria não tem a menor importância. Inclusive porque, se for para contabilizar perdas e ganhos desde o reinício dos tempos democráticos, Lula estaria no vermelho.

E, como se sabe, está tudo azul para o lado do presidente. Tão azul que seu antecessor, presidente de honra do PSDB e há oito anos dublê de grilo falante e mensageiro de alertas solenemente ignorados pelo partido, anda sinceramente preocupado.

Ainda crê no favoritismo dos tucanos para a eleição presidencial de 2010, mas não menospreza a capacidade do adversário em solapar a dianteira. Muito menos é indiferente à inaptidão de seus aliados para administrar a vantagem, terminando por entregá-la a Lula de bandeja.

Por exemplo, Fernando Henrique já detectou o potencial destrutivo do charivari entre os tucanos por causa da eleição para a Prefeitura de São Paulo. Há tempos ele avisa que, desunido, o partido não sobe de novo a rampa do Planalto. No máximo, chega à beira do abismo e dali ao passo à frente é só uma questão de método.

Não foi ouvido, como de resto seguiu pregando no deserto quando, na quinta-feira, resolveu alertar mais uma vez pedindo que Geraldo Alckmin e Gilberto Kassab parem com as agressões mútuas.

“Em política, se você não enxerga mais longe, se não vê a estratégica, se olha só o imediato, você perde”, disse em tese a propósito do segundo turno da eleição municipal, mas, na prática, alertou seus navegantes sobre os obstáculos que produzem para uma trajetória satisfatória rumo a 2010.

FH, na realidade, não está explodindo em cataporas lilases por causa do resultado local. Se o tucanato ganhar do PT, com o PSDB ou com o DEM, muitíssimo melhor. Se perder, haverá tempo e condimentos para preparar uma limonada.

O susto pode ter o efeito pedagógico de mostrar aos guerreiros como se desviar do caminho do infortúnio e pode também transferir a guerra para o campo do adversário, uma vez que, eleita prefeita, Marta Suplicy pode até não assumir, mas seus aliados em São Paulo já estão a postos para brigar com Dilma Rousseff pela primazia da legenda do PT na eleição presidencial.

Sob um argumento prosaico: capital eleitoral. Na ministra, uma presunção; na prefeita, uma constatação.

A preocupação é com a conduta do PSDB ao fim do certame atual, início do próximo, este sim, fundamental.

A unidade, FH rebate na tecla, é o pré-requisito básico. Por isso, está entre os articuladores da chapa José Serra presidente, Aécio Neves vice. Garantidos a maioria dos votos em São Paulo e Minas Gerais, acredita, o resto do País vai atrás.

Só que não basta juntar os dois governadores dos maiores colégios eleitorais do País. É preciso, na visão de Fernando Henrique, que comecem a falar à sociedade, de preferência de forma a marcar a diferença em relação ao adversário.

Não significa fazer de Lula o Judas. Além de mau negócio eleitoral, o PSDB precisa aprender a falar bem de si antes de se dar ao desfrute de desconstruir a imagem do alheio. Na opinião do ex-presidente, é uma tarefa para ser executada menos com palavras e mais com atitudes.

Cita um exemplo: “As manifestações populares de apreço a Ruth foram produto de uma identificação com a conduta correta, a imagem limpa, o retrato de uma pessoa ética”, diz, enquanto o interlocutor torce para que as lágrimas continuem contidas e não atrapalhem o esforço de superação pela viuvez recente.

O segredo, na opinião dele, é atitude contrastante. Qualquer contraponto seria bem visto. Do elitismo ao populismo, que seja. “Melhor uma imagem de elite que imagem nenhuma.”
É isso. Fernando Henrique não diz assim, dá a impressão de que, mediante alguma resistência, acabaria assinando embaixo de algum escrito qualificando o PSDB como um partido com cara de nada. Ou de forma mais fina, sem feições definidas.

Na sua análise, a necessária arrumação vai além da forma. Urge alcançar o conteúdo.

Dar uma reduzida na soberba, uma turbinada na indolência e parar de confiar excessivamente na dianteira nas pesquisas: “Isso mostra um quadro atual de vantagem, mas é preciso interpretar as variantes e, sobretudo, não perder de vista que pontos ganhos precisam de cultivo ou se perdem com muita facilidade”.

Para Alckmin, tudo ou nada


Eliane Cantanhêde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


BRASÍLIA - A eleição municipal chegou à sua última semana com algumas surpresas (Gabeira crescendo no Rio...), indefinições emocionantes (Salvador embolada...) e uma certeza: Geraldo Alckmin tem de rezar aos céus para chegar ao segundo turno com Marta Suplicy.

Do contrário, não estará só perdendo uma eleição, mas jogando fora seu capital acumulado e dificultando suas condições de disputar o governo ou mesmo o Senado.

Alckmin bateu pé e conseguiu a sigla do PSDB para concorrer em 2006, contra todas as pesquisas e as evidências de que José Serra era mais competitivo. O mar estava mais para Lula do que para tucanos, e Serra igualmente poderia ter perdido. Mas a derrota de Alckmin teve peso maior, porque sua responsabilidade também era maior.

Alckmin voltou a bater pé e conseguiu a sigla do PSDB nas eleições municipais, contra a estratégia de Serra de, simultaneamente, fortalecer o aliado DEM e manter a prefeitura. Ou alguém tem dúvida de que a prefeitura é dos tucanos?

A teimosia empurrou Alckmin para o palanque, de onde assiste Gilberto Kassab avançar consistentemente e já passar à sua frente.

Nesta última semana, a disputa entre eles será de vida ou morte, com uma diferença: se Kassab perde essa, capitaliza o que conquistou e parte para outra. A sobrevivência de Alckmin será uma incógnita.

Enquanto isso, Marta Suplicy segue tranqüila na dianteira, mas preocupada com o teto do PT na capital e com uma reviravolta no segundo turno, que depende muito das seqüelas da campanha entre seus opositores. No primeiro turno, Alckmin deixou Marta de lado e elegeu Kassab como seu principal adversário. E no segundo, quem será adversário de quem?

Se recuperar a prefeitura dos tucanos para o PT, Marta poderá creditar o êxito a seus méritos, claro, mas também à divisão do PSDB e ao voluntarismo de Alckmin. Desse carimbo ele não se livra.

Sabor de derrota


Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


NOVA YORK. Barack Obama é um político do tipo do lutador de boxe, que dá gosto de ver pela elegância dos movimentos e golpes curtos e certeiros que aplica. Mas chega um momento em que é preciso decidir a luta, e aí falta a ele aquela garra que marca os demolidores. Ele pode ter ganhado o primeiro debate da disputa presidencial dos Estados Unidos por pontos - mais possivelmente houve um empate - mas fiquei com a sensação de que foi um empate com sabor de derrota para Obama. Possivelmente não haverá até as eleições momento mais favorável para ele em um debate político, e McCain temia isso quando tentou adiar o encontro. Depois de uma semana em que a política econômica do governo Bush, que já vinha há um ano dando sinais de falência múltipla, entrou em colapso explícito, não havia momento mais propício para um candidato democrata mostrar à nação o que fará a diferença, a partir de janeiro, na Casa Branca.

Os dois candidatos não se mostraram, até o momento, à altura da crise que o mundo vive. McCain fingiu um gesto de grandeza ao anunciar a suspensão da campanha presidencial para ir a Washington tratar do pacote econômico, mas viu-se logo que não passava de uma politicagem barata para tentar tirar algum proveito da crise econômica que o colocou, como candidato do partido que está no poder, em situação de fragilidade.

Barack Obama, por seu turno, mostrou-se sempre muito tímido diante da crise, e não foi outra sua postura no debate em Mississippi. Fora uma ou duas vezes em que ligou diretamente a política de Bush a McCain, não se aprofundou nas críticas, não apresentou soluções.

Os dois, aliás, pareciam autistas, falando de um orçamento que ninguém sabe como ficará porque ninguém sabe ainda o real tamanho dessa crise nem se o pacote econômico resolverá o problema. Se é que algum pacote será aprovado neste fim de semana.

Os dois candidatos claramente não querem assustar o eleitor, e preferem lidar com a questão econômica, que não é o forte de nenhum dos dois, de maneira mais genérica. Obama tem a vantagem de visar sempre a classe média americana, apesar de manter a promessa de cortar impostos de 95% das famílias, promessa que parece cada vez mais inviável a essa altura da crise.

McCain mantém tese de que liberando empresas e grandes investidores de impostos, eles produzirão mais riqueza para o país, o que beneficiará os mais pobres indiretamente. Uma filosofia econômica que Obama ligou à defesa da desregulamentação do mercado financeiro, que causou a quebradeira de Wall Street.

O cineasta e escritor Michael Moore escreveu recentemente um guia eleitoral onde, entre vários palpites, sugere sarcasticamente que o candidato democrata, Barack Obama, pare de ressaltar o heroísmo de seu adversário republicano John McCain "porque nos Estados Unidos os heróis sempre vencem no final".

Depois do debate de sexta-feira ele deve ter uma outra sugestão para Obama: pare de frisar que "John está certo" a cada resposta. Na enésima vez em que Obama repetiu a frase, como um cacoete, fiquei pensando aonde o levaria toda essa elegância de admitir que o adversário está certo, mesmo quando o contesta. Se fosse um recurso de ironia, o que realmente aconteceu umas poucas vezes, poderia ser usado para desmontar o adversário. Mas Obama é por demais elegante nas suas ironias.

Se, na parte econômica do debate, McCain conseguiu sobreviver a um previsível massacre como se não tivesse laços com o governo democrata, criticando mais duramente a gestão Bush e se colocando como um "maverick" (rebelde) diante da Casa Branca, na parte de política internacional foi a vez de Obama se sair melhor do que seus adversários previam.

Ele se colocou muito à vontade nas questões internacionais, mostrando que tem todo o conhecimento necessário para exercer o cargo que disputa. Apesar de McCain ter tentado o tempo todo fazê-lo passar por "ingênuo" ou inexperiente, repetindo várias vezes que "o senador Obama parece não entender", ou variações do mesmo tipo.

Até mesmo nas expressões faciais, em algumas vezes fazendo-se de nauseado, viu-se um McCain irritadiço com as posturas de Obama no campo internacional, como se não tivesse paciência para ouvir tanta bobagem.

Mesmo nessas ocasiões Obama não perdeu a pose de estadista que procurou exibir durante toda a noite e corrigiu comentários de McCain, sem se intimidar em nenhum instante.

Havia quem temesse, da parte republicana, a comparação na televisão entre a imagem esguia e altiva de Obama e a estatura baixa e o corpo retesado, muito por causa das torturas que sofreu no Vietnam, de McCain.

O senador republicano é um outro tipo de lutador, fecha a guarda e luta olhando para o chão, desferindo golpes curtos e certeiros mas sem o refinamento da oratória. Até mesmo sua cortante ironia ficou sem uso na noite do debate, com uma ou outra exceção.
Mas o que houve mesmo foi o contraste de gerações. O candidato republicano, mais de uma vez, ressaltou sua experiência em acompanhar os temas internacionais, mas ficou claro que McCain, como salientou Obama em um de seus melhores momentos, ainda tem a mentalidade de um político do século XX, quando os Estados Unidos tornaram-se a única potência mundial, em contraste com o mundo multipolar atual, que exige uma postura mais aberta ao diálogo entre as nações.

Não é à toa que o democrata Barack Obama é o candidato preferido no mundo todo. Ele quer que os Estados Unidos voltem a ser admirados e amados pelos outros países, e não temidos e até mesmo odiados. Quer, enfim, que "fazer a América" volte a ser o sonho dos que, como o seu pai no Quênia, via o país como o melhor lugar para se estudar e vencer na vida. A questão é saber se o eleitorado médio americano comunga desses ideais.

Juízo final


Alberto Dines
DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Visto daqui de Buenos Aires o apocalipse é ainda pior: a Argentina passa pelas mesmas angústias do resto do mundo, acrescida da sua carga particular de tormentos. O efeito tango é um lânguido rodopio em direção à tragédia que jamais se consuma. Dominado pela estridência generalizada, só é percebido nas vizinhanças.

O governo dos Kirchner insiste que não há inflação, mas ela é uma realidade nos supermercados, aumenta a cada dia o escândalo das valises com os dólares de Chávez e, acuada por manchetes cada vez mais estridentes, a Casa Rosada (que não é rosada, mas ocre) investe contra a imprensa, os ruralistas ameaçam reiniciar a pressão sobre o governo e a base sindical começa a mostrar rachaduras.

O que poderia ser visto como um conjunto de telenovelas paroquiais ganha conotações catastróficas no atual cenário econômico-político. O mundo não parou para mudar, está mudando em altíssima velocidade. A vida continua, mas está evidente que não pode continuar desta maneira. Agendas e cronogramas são atropeladas sem a menor cerimônia: as eleicões americanas que deveriam converter-se em marco para os novos tempos foram, de certa forma, antecipadas. O que deveria acontecer a partir de novembro acontece agora, atabalhoadamente, neste fim de semana.

Um dos novos jornais argentinos, Crítica de la Argentina, marcado pelo sarcástico muito portenho, alcunhou o presidente americano de Bushevik (contração de Bush com bolchevique), diante da sua pressa de empurrar o Estado dentro da esfera, até então reservada, aos mercados.

Em pouco mais de duas décadas assistimos ao desmoronamento da Cortina de Ferro e ao desmatamento da selva capitalista. O modelo democrático aparentemente expandiu-se, mas ainda não está claro se foi uma expansão estrutural, profunda, ou apenas cosmética. Democracia é algo mais do que a manutenção de um calendário eleitoral. A existência de três poderes não é garantia de representatividade. Uma democracia incapacitada para criar e exercer os contra-poderes não chega a ser democracia.

O desaparecimento das principais referências ideológicas processou-se com tamanha velocidade que tornou impossível a gestação de alternativas. O fim do comunismo stalinista e este naufrágio do capitalismo selvagem não foram acompanhados pelo gradual surgimento de alternativas, simbioses ou sincretismos. Como se por alguma razão mecânica a dialética tivesse desligado o seu mecanismo gerador de sínteses.

Imaginava-se que era chegada a hora do conceito social-democrático europeu. Mas a social-democracia européia enrolou-se sozinha ao apressar a complementação do seu produto mais legítimo, a União Européia. A ampliação do clube retirou dele algumas das suas matrizes. Partidos de extrema direita, nacionalistas, com tinturas quase-fascistas, jamais poderão produzir parcerias numa entidade vocacionada para um certo progressismo, originalmente supranacional, distributivista. O que sobrou como formato político foi o caudilhismo. E este caudilhismo nao é exclusivamente latino-americano: o que Vladimir Putin está fazendo na Rússia não difere muito dos esquemas voluntaristas de Hugo Chávez. Não por acaso andam tão próximos. A diferença entre eles reside na intensidade: Putin manda matar friamente seus adversários enquanto Hugo Chávez, tocado pelo sentimentalismo latino, não chega a tanto. Pelo menos por enquanto.

Abraçado a este bonapartismo, não muito diferente em matéria de resultados, descortina-se o vasto mundo do fundamentalismo islâmico. Em alguns casos, aparentemente livre de conotações personalistas, na realidade um absolutismo ainda pior porque está entranhado de dogmas religiosos.

Há poucas semanas parecia que caminhávamos para uma reedição do crash de Wall Street em outubro de 1929. Nestas horas angustiantes, parece que outra efeméride está sendo perversamente adicionada: o início da Segunda Guerra Mundial, em setembro de 1939.

Temos o privilégio de assistir ao insólito espetáculo da história sendo reescrita. Numa situação-limite como esta, não adianta subir a serra ou descer para a praia. A próxima segunda-feira promete ser um desassossego ainda maior.

» Alberto Dines é jornalista.

O que pensa a mídia

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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sábado, 27 de setembro de 2008

Paes lidera com 29%; Gabeira sobe e embola disputa pelo 2º turno


DA SUCURSAL DO RIO
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Candidato do PV foi de 11% para 15%; Crivella (PRB) se mantém com 18% e Jandira (PC do B) permanece com 13%


Cesar Maia, que encerra dois mandatos na Prefeitura do Rio, é reprovado por 36% dos entrevistados; governo tem a aprovação de 22%

A nove dias da eleição, pesquisa Datafolha mostra que Eduardo Paes (PMDB) ampliou a liderança pela Prefeitura do Rio, com 11 pontos à frente, e retrata um acirramento na disputa pelo segundo lugar, com Fernando Gabeira (PV) tendo crescido quatro pontos percentuais em relação ao levantamento anterior.

Paes foi de 26% para 29%, Marcelo Crivella (PRB) manteve 18%, Gabeira subiu de 11% para 15%, e Jandira Feghali (PC do B) permaneceu com 13%. A margem de erro é de três pontos, para mais ou para menos.

"A distância entre Crivella e Jandira está no limite do empate técnico. Podemos dizer que ele está na frente dela. Mas entre Crivella e Gabeira há, de fato, empate. A clara ascensão de Gabeira é o destaque desta pesquisa", disse Mauro Paulino, diretor-geral do Datafolha.

O peemedebista oscilou três pontos positivamente, tendo os maiores índices de apoio entre os que têm mais de 60 anos (36%), entre os que têm até ensino fundamental (33%) e entre os que ganham até dois salários mínimos (33%).O candidato do PRB tem penetração nas mesmas fatias de eleitorado de Paes, atingindo 27% dos votos entre os eleitores com ensino fundamental e 25% dos eleitores que ganham até dois salários mínimos.

Gabeira é mais forte entre os jovens, faixa em que obtém 20%, entre os que têm ensino superior (26%) e entre os que recebem mais de dez salários mínimos (32%).

Jandira mantém percentuais entre 11% e 14% nas diversas faixas de renda e escolaridade.

O crescimento de Gabeira se deve principalmente à sua performance entre os mais ricos e escolarizados. Gabeira saltou 12 pontos (de 20% para 32%) entre os que ganham mais de R$ 4.150, faixa em que Paes perdeu nove pontos (foi de 30% para 21%). Crivella oscilou positivamente de 7% para 9%.

Entre os eleitores com nível universitário, o candidato do PV tinha 18% e pulou para 26%. O peemedebista tinha 25% e foi para 22%. O postulante do PRB permaneceu com 7%.

Os demais candidatos continuam distantes. Alessandro Molon (PT) foi de 4% para 5%. Solange Amaral (DEM), apoiada pelo prefeito Cesar Maia, está numa linha descendente: no início do mês tinha 7%, passou para 5% em meados de setembro e hoje tem 4%. Chico Alencar (PSOL) permanece com 3%. Os outros não superam 1%.

Cesar Maia, que encerra dois mandatos à frente da prefeitura, é aprovado por 22% dos eleitores e reprovado por 36% deles. Mesmo entre os que avaliam sua administração como ótima ou boa, Paes lidera com 36%, Crivella tem 16%, Gabeira, 12%, e Solange, 11%.

O Datafolha não fez simulações de segundo turno envolvendo Gabeira. Paes bateria Crivella por 57% a 30%, e Jandira, por 48% a 41%. A candidata comunista venceria o rival do PRB por 52% a 34%, no caso de confronto direto entre eles.Cresceu de 30% para 35% o número de entrevistados que dizem que Paes está se saindo melhor no horário gratuito.

A avaliação de Gabeira também subiu, passando de 7% para 13% os que dizem que ele tem o melhor programa. Já a de Crivella caiu quatro pontos, passando de 16% para 12%.

O Datafolha ouviu 1.184 pessoas ontem e anteontem. Recebeu o registro RPE 35/2008.

Gabeira fica feliz com pesquisa

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Segundo o Ibope, candidato do PV já teria ultrapassado Jandira Feghali

A passagem de Fernando Gabeira (PV) para o terceiro lugar na pesquisa de intenção de voto realizada pelo Ibope, e ainda não divulgada, embolou ainda mais a disputa de quem vai para o segundo turno. Conforme adiantou o repórter Leandro Mazini, da coluna Informe JB, Gabeira está com 11%, um ponto percentual à frente da candidata do PCdoB, Jandira Feghali, o que caracterizaria empate técnico. O prefeitável do Partido Verde recebeu a notícia com entusiasmo, e considera que sua campanha está em uma reta ascendente com os eleitores.

– Acho que essa subida na pesquisa indica uma tendência, que deve seguir até o dia da eleição – acredita Gabeira.

O efeito decisivo e o efeito marginal


Jairo Nicolau
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


O apoio de Lula será um fator decisivo nas eleições municipais deste ano?


A CAMPANHA eleitoral deste ano tem reforçado duas tendências já vistas em eleições anteriores. Na falta de nome melhor, vou chamar a primeira de rotinização das campanhas.Desde a redemocratização, esta é a sétima eleição para prefeitos e vereadores. As eleições já não são mais a novidade que eram na década de 80.

Aos poucos elas foram assumindo um caráter menos excepcional e mais rotineiro. As campanhas ficaram mais curtas, mais concentradas na TV, viram a maioria dos militantes voluntários desaparecerem, poluem menos as cidades e despertam menos interesse dos eleitores e da imprensa.

Vejo a cobertura rarefeita que a campanha tem recebido dos jornais neste ano e lembro dos cadernos especiais de outras disputas. Observo os carros sem adesivos e lembro de eleições passadas, quando avaliava a força do candidato contando os adesivos.

A segunda tendência é a concentração da discussão da campanha nos temas locais. Aos poucos, eleitores vão aprendendo quais são as reais atribuições do prefeito. Aprendem que ele tem responsabilidade pelo trânsito da cidade, mas pouco pode fazer para gerar emprego em larga escala. Aprendem que as prefeituras podem cuidar bem da educação infantil, mas não da superior. Aprendem que, por mais que se diga o contrário, a responsabilidade maior pela segurança pública é do governador, e não do prefeito.

Cada cidade tem sua agenda particular. Em algumas, a disputa assume um caráter plebiscitário, sobretudo quando o prefeito atual concorre à reeleição. Em outras, a disputa se dá em torno de umas poucas famílias/ grupos dominantes. Em alguns lugares, os partidos influenciam mais a disputa. Em outros, vale o peso de lideranças carismáticas. Mas, em quase todas elas, candidatos e eleitores estão pensando nos problemas e soluções de sua cidade, de costas para o que acontece em outros lugares.

Não conheço candidato a prefeito que tenha sido vitorioso falando de temas nacionais ou concentrando seu programa em grandes questões doutrinárias. A última vez que a política nacional influenciou para valer uma disputa para prefeito foi em 1988, quando o Exército invadiu a CSN, matou e feriu trabalhadores. O evento, ocorrido poucos dias antes do pleito, comoveu o país e produziu uma maré de votos para os partidos de esquerda nas maiores cidades. Alguns analistas e parte da imprensa parecem não gostar da tendência ao municipalismo das eleições e buscam desesperadamente sinais de nacionalização. A premissa é que uma eleição municipal determinará a disputa de dois anos depois. 2008 teria que explicar 2010. Por isso, tanto espaço para os bastidores da escolha em Belo Horizonte. Por isso, a importância da disputa na cidade de São Paulo.

Por isso, o presidente deve influenciar decisivamente o pleito deste ano.Porém, as evidências dessa associação são tênues. Para ficar em um exemplo: em um estudo, comparei os votos obtidos por Lula em 2008 com os dos PT em 2006 e descobri que a associação estatística entre eles é praticamente inexistente.

Pelo que vi em outras campanhas e pelo que tenho acompanhado nesta, continuo convencido de que as eleições municipais são movidas basicamente pelos temas locais. Os atores externos à vida municipal têm quase sempre efeito marginal sobre o resultado final da disputa.

Quando sugiro que as coisas se passam assim ouço a pergunta inevitável: não será diferente com Lula? Não adianta lembrar que já houve uma eleição em 2004, no meio do primeiro mandato de Lula, e que os efeitos de seu apoio não foram tão expressivos.

A confusão talvez ocorra por conta do que cada um de nós chama de influência. Ou, como está na pergunta de hoje, o que cada um entende como "fator decisivo". Não duvido de que o apoio do presidente possa ajudar alguns candidatos a subir um pouco.

Em uma disputa muito acirrada,esses pontinhos podem até fazer a diferença. Mas isso não é o mesmo que dizer que o apoio do presidente é decisivo.

Dito de outra maneira: sem boas propostas para a cidade, sem ser reconhecido pelos moradores como uma liderança importante, sem conseguir criar uma conexão com eleitores, não há quem se eleja prefeito. Isso determina seu sucesso ou seu fracasso. O resto é, no máximo, efeito marginal.


JAIRO NICOLAU, 44, doutor em ciência política, é diretor de Ensino do Iuperj. Durante as eleições deste ano assina uma coluna na veja.com .

Em busca de um eixo


Marco Aurélio Nogueira
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Foi preciso que Soninha Francine, candidata do PPS à Prefeitura de São Paulo, associasse a Câmara Municipal paulistana a um “balcão de negócios” para que os eleitores se lembrassem de que existem vereadores na capital do Estado. Segundo a candidata, ali é bastante usual a prática de aprovar projetos em troca de cargos, favores e propina. Não foi propriamente uma declaração inédita ou contrária à voz do povo. Mas caiu como uma bomba no plenário do órgão.

A poucos dias do primeiro turno das eleições, os vereadores paulistanos assistem a um prolongamento constrangedor da situação de intransparência em que se encontram, como se entre o Palácio Anchieta e a cidade existisse uma névoa espessa a bloquear a visão dos cidadãos. A opinião pública é indiferente aos vereadores, que são por ela vistos como representantes de si próprios, incapazes de exercer papel positivo na vida urbana, no controle dos atos do prefeito ou no processamento das demandas da população. Poucos eleitores sabem em quem votaram nas últimas eleições, quem foi eleito e em quem votarão no próximo dia 5.

Entre os 55 vereadores paulistanos há, evidentemente, pessoas de mérito, combativas e verdadeiramente preocupadas com a cidade, a começar da própria Soninha, mas não somente dela. Mas estes políticos não parecem ter força e articulação suficientes para dar à Câmara maior peso e relevância, nem para desfazer a imagem negativa e a indiferença popular que a cerca. Se levarmos em conta a complexidade dos problemas urbanos de São Paulo, a dimensão da cidade e as tensões que atravessam o cotidiano de seus moradores, é fácil perceber o prejuízo que se tem com esta situação, que despoja a população de uma instância confiável de representação política.

Devemos, com certeza, relativizar o argumento, pois o problema não se esgota na referência a uma suposta má qualidade dos representantes. Tem que ver com o conjunto do sistema político e não pode ser compreendido fora dele. Expressa a resistência notável de uma cultura política de tipo clientelista e fisiológico que remonta ao Brasil colonial e se reproduz como praga pelas frestas da condição ultramoderna em que passamos a viver, ajudando a dramatizá-la e sendo ao mesmo tempo turbinada por ela. Reflete a perda de eixo das instituições políticas em geral, que ficaram vazias de poder, pobres de imaginação e impotentes diante da força do mercado e da fragmentação social, que não se deixa articular nem dirigir.

Olhando as coisas mais em detalhe, a situação é produto de um sistema eleitoral que personaliza as disputas e incentiva os candidatos a constituírem - para si, e não para seus partidos - nichos de legitimação e conquista de votos que, com o passar do tempo, acabam por corporativizar os parlamentares e atrelá-los a uma lógica particularista cega para o coletivo. Vítimas não inocentes deste sistema, os partidos são por ele arrastados e condicionados. Não participam das eleições como forças ideológicas ou programáticas coesas, não se comportam como expressão de um movimento orgânico dotado de opinião, mas somente como instrumentos de luta pelo poder. Enredados pelos fios perversos do sistema e perdendo inserção na sociedade, deixam de selecionar seus candidatos ou de submetê-los a alguma coerência. Basta dar uma espiada nos personagens que passam pela propaganda gratuita para que se visualize a gravidade da situação. O cenário é marcado pelo mais puro bestialógico.

Os programas eleitorais também dão sua contribuição. São mais midiáticos do que políticos ou educativos. Têm maior qualidade na parte dedicada aos candidatos a prefeito, mas são simplesmente patéticos quando se trata dos candidatos à Câmara. Tratam-nos como secundários, aprisionando-os em camisas-de-força que facilitam as coisas para os mais inexpressivos e tolhem os talentosos. Não abrem espaços para debates que valorizem o trabalho legislativo e expliquem à população a sua importância. Não fomentam a discussão substantiva nem dizem ao eleitor qual a relevância e a posição que tal ou qual candidato tem no partido a que está vinculado.

O círculo se fecha depois das urnas. O sistema não cuida da qualificação dos eleitos. Não agrega nada à bagagem técnica e política com que chegam à Câmara. As sessões plenárias são o que são, não há o que esperar delas. Mas algo poderia acontecer fora delas. No entanto, são raras as tentativas de reproduzir no Palácio Anchieta as iniciativas tomadas, por exemplo, pela Assembléia Legislativa de São Paulo e pelo Congresso Nacional para melhorar a formação e a atualização dos quadros parlamentares, tanto dos políticos quanto dos assessores. Cursos, seminários, debates, conferências, muita coisa poderia ser feita para dar maior consistência às bancadas e aos vereadores.

Haverá, certamente, quem questione este diagnóstico, considere-o exagerado e injusto para com as coisas boas que existem na Câmara. É inegável que lá dentro há vida inteligente e que ao longo do tempo os vereadores têm ajudado a escrever a história política e administrativa da cidade. A Câmara Municipal é um espaço estratégico mal aproveitado, um recurso carregado de potência represada e subutilizada. Tão logo encontre um eixo político que a organize e a politize de forma substantiva, produzirá resultados. Para que isso aconteça precisa entrar na agenda democrática, ser discutida, analisada, criticada.

No mínimo por ter destacado a questão, o alerta de Soninha veio em boa hora. Pode ter sido genérico e impreciso, mas criou um fato e deu aos eleitores uma oportunidade a mais para que reflitam sobre o voto que depositarão nas urnas em 5 de outubro. No curto prazo, não é de prever que a qualidade se altere a ponto de modificar o rumo das coisas. Mas oportunidades existem para serem aproveitadas, e é da concatenação delas no tempo que nascem as grandes transformações.

Marco Aurélio Nogueira, professor de Teoria Política da Unesp, é autor dos livros Em Defesa da Política (Senac, 2001) e Um Estado para a Sociedade Civil (Cortez, 2004)